segunda-feira, 30 de junho de 2014

E o pessoal se diverte

POR ET BARTHES


No estado de Utah, nos Estados Unidos, esse pessoal se diverte a saltar das alturas. Você teria coragem?



Plan MOB: entre o pobre e o paupérrimo

JORDI CASTAN

Plan Mob. O nome escolhido pelo IPPUJ soa estranho. Uma olhada rápida no sufixo MOB e a tradução assusta: inclui de máfia até turbamulta, passando por ralé e canalha, isso só nos sustantivos. Se formos para verbos aí encontraremos de atacar a tratar mal, passando por reunir-se em grupo, fica a dúvida se o nome é só uma escolha infeliz ou um surto de sinceridade do IPPUJ, que quer nos avisar do que vem pela frente.


O questionário disponível no site do IPPUJ não decepciona. A proposta toda do Plano de Mobilidade está dentro do padrão que o joinvilense tem aprendido a esperar do IPPUJ. Na falta de que venha algo mais (pelo informado até agora, não parece), a proposta pode ser classificada entre pobre e paupérrima. Transparece que foi concebida e executada de forma apressada, porque a pressa continua a estar presente nessa ânsia de fazer o que faz anos já deveria ter sido feito.

Pessoalmente, faz tempo que não espero qualquer coisa vinda da Fundação IPPUJ e assim dificilmente me decepciono. Porque já se sabe que de onde menos se espera é de onde nada sai. É verdade que conseguem me surpreender quase sempre, mas já não me decepcionam mais.

O questionário colocado à disposição dos joinvilenses não é só pobre na sua concepção. Pior que pobre é ofensivo, porque trata o tema da mobilidade e da contribuição do cidadão de forma estulta. A simplificação a que reduz o debate desconsidera uma abordagem completa da mobilidade e converte o debate num grande varejo. As nove perguntas predefinidas misturam elevados com o horário do comércio ou das escolas e colocam lado a lado binários com comportamento dos motoristas. Uma verdadeira salada mista em que tudo cabe.

O debate que o IPPUJ e a Prefeitura continuam devendo é estratégico. Quais temas não podem ficar fora do debate é qual será o nosso modelo de mobilidade? Para onde a cidade irá adensar ou crescer? Quais os modelos e os pros e os contras de cada um deles? E, principalmente, como se complementam ou integram os diversos modais e o ordenamento físico? Seria interessante se o Plano de Mobilidade explicasse como a mobilidade da Joinville do futuro lidará com a imobilidade que representarão as Faixas Viárias, essa genial criação sambaquiana enquistada na LOT, que pretende colocar, num único lugar, mobilidade, pólos geradores de tráfego, indústrias, prédios com mais pavimentos e comércio de grande porte. Mas para isso será preciso elaborar os estudos técnicos que falta apresentar ainda.

Será interessante poder participar das consultas públicas "a jato" ou express, uma após a outra, com horário fixado e que não permitem mais que uma participação semântica da sociedade. O que no Brasil denominamos "para inglês ver". Como é possível que, depois de ter cometido os mesmos erros na condução do processo da LOT, esses senhores ainda não tenham aprendido a fazer as coisas direito? E insistam em voltar a cometê-los. Será que, por acaso, a inépcia e a inoperância são contagiosas e se espalham como uma epidemia, desde o primeiro andar da Prefeitura até todos os demais andares e gabinetes?

A ideia que parece permear o dito plano de mobilidade é a de que se façam milhares de propostas, se sugira, se contribua, assim legitimar o processo. Por baixo devem aparecer umas 100.000 respostas, contando os 20.000 questionários que serão distribuídos na rede municipal, não menos de 50.000 contribuições devem vir, via o site do IPPUJ. Depois uma bela tabulada dos resultados, "abracadabra": o plano esta pronto com ampla participação cidadã. O debate ficará para as futuras audiências públicas, com horário exíguo para perguntas e respostas. E todos felizes. Todos não, né? É bom lembrar que já tentaram montar essa pantomima "democrática" com a LOT e não tem dado certo.

Plano de mobilidade é muito mais que responder nove perguntinhas com respostas predeterminadas. Fazer bem feito exige seriedade, conhecimento, competência e trabalho. E esses elementos parecem cada dia mais escassos nas margens do Cachoeira. O pior ainda é que tudo isso é pago com o nosso dinheiro.

sexta-feira, 27 de junho de 2014

Plano de Mobilidade "express" e os erros do planejamento urbano de Joinville

POR CHARLES HENRIQUE VOOS

Depois de muitos anos pedindo (juntamente com dezenas de movimentos populares da cidade), e do Plano Diretor de 2008 determinar, o Plano Setorial de Mobilidade e Acessibilidade sairá do papel. Batizado de "PlanMob" (nome que remete à dissertação de mestrado do atual Presidente do IPPUJ¹), o estudo irá determinar a organização dos deslocamentos efetuados em Joinville, seja de pessoas ou mercadorias. A notícia, em um primeiro momento, pode ser maravilhosa. Entretanto, os erros do passado (os quais cansamos de alertar) prejudicarão todo o processo, podendo até anular o tom democrático que a Prefeitura de Joinville está impondo.

Anulará por alguns motivos, históricos e atuais, os quais fazemos questão de relembrar:

  1. O Plano Diretor de Joinville, aprovado em 2008, já pedia a elaboração deste plano. Desde lá passaram-se 6 anos e pouca coisa foi feita até esta semana;
  2. A pesquisa Origem-Destino, aplicada junto à população em 2010, corre o risco de estar defasada, pois de junho de 2010 (mês de execução da pesquisa) até maio de 2014, a cidade ganhou 76.513 veículos emplacados (segundo dados do Detran-SC) e a passagem de ônibus passou dos R$ 2,30 para R$ 3. É óbvio que os dados não correspondem à realidade;
  3. O Conselho da Cidade, eleito em 2013 após vários questionamentos judiciais pela sua natureza antidemocrática na composição dos delegados, tem, em seu núcleo principal, membros cooptados pelas principais entidades empresariais da cidade, articuladoras dos interesses dos setores imobiliários;
  4. A Lei de Ordenamento Territorial, discutida dentro do antidemocrático conselho prevê "faixas viárias", como já alertamos muitas vezes aqui no Chuva Ácida, sem estas estarem previstas ou planejadas em conjunto com um plano de mobilidade;
  5. O Plano Nacional de Mobilidade (lei 12587/2012) exige que os municípios tenham seus planos de mobilidade até abril de 2015. Como também já relatamos, não é nenhum "favor" ou "retrato de trabalho" da atual gestão. É uma imposição legal. Faltam 10 meses para o prazo estourar. 
  6. A tão propagada licitação do transporte coletivo não saiu do papel novamente. Os contratos com Gidion e Transtusa foram renovados após os incessantes avisos de que de nada adiantaria discutir licitação sem um plano de mobilidade. Sob risco de nova judicialização caso a licitação ocorresse sem a confecção do plano, a Prefeitura recuou. 
  7. O recuo da Prefeitura é estratégico: dá mais tempo para pensar sobre a licitação (até o momento o IPPUJ não sabe o que fazer em relação a este assunto) e abre um dito "debate democrático" com a população, anos após os pedidos dos movimentos populares. 
  8. Segundo o plano de trabalho apresentado pela Prefeitura nesta semana, estão previstas consultas públicas nos bairros de abrangência das oito subprefeituras. Apenas um debate por região para uma cidade de 520 mil pessoas, e durante jogos da Copa do Mundo em algumas delas. Se você não puder estar presente, tem um formulário no site do IPPUJ com respostas altamente tendenciosas, pois é fechado, ou seja, você não pode escrever o que quiser. Depois disto,haverá reuniões de grupos de trabalho, que terão apenas 10 dias para analisarem, e fazerem a leitura técnica da cidade inteira. Como especialista, este estudo demora cerca de 30 a 60 dias após as reuniões comunitárias. principalmente levando em conta o porte de Joinville. Soma-se ainda o fato de que haverá audiência pública, novamente uma por região, para validação das propostas apresentadas pela UFSC e grupos de trabalho. Ao fim, como "cereja do bolo", tudo vai para o antidemocrático Conselho da Cidade, para análise e alterações em longos 15 dias, quando tudo, infelizmente, sucumbirá perante as necessidades dos conselheiros, representantes - ou cooptados por - do capital imobiliário organizado da cidade.
Qual é o motivo de tanta pressa, após 6 anos de inércia? Se a Prefeitura (principalmente o IPPUJ) tivesse seguido as orientações dos movimentos populares, teríamos quase quatro anos para montar um processo efetivamente participativo, com amplo debate e prudência na tomada de decisões. Com a Lei de Ordenamento Territorial a Prefeitura se fechou, e com o Plano de Mobilidade quer fazer tudo às pressas, digna de transportadoras express. A cidade perde novamente, enquanto os interesses de poucos se sobressaem, como sempre.

¹ CONSTANTE, Vladimir Tavares. Bases para o Plano Diretor de transporte de Joinville : proposta de alternativas. 1 v. Dissertação (Mestrado) - Universidade Federal de Santa Catarina, Centro Tecnológico, Programa de Pós-Graduação em Engenharia Civil, Florianópolis, 2002.

quinta-feira, 26 de junho de 2014

Festival de Bizarrices que Assola a Copa

POR CLÓVIS GRUNER

Na semana passada, Felipe Silveira indagava, em seu texto, qual o legado principalmente político da Copa, cuja realização coincidiu com o primeiro aniversário das chamadas “jornadas de junho”, além das muitas manifestações ocorridas imediatamente antes e durante o evento. Não é fácil fazer um balanço de acontecimentos recentes e, nesse caso especificamente, ainda em desenvolvimento: toda afirmação e análise serão sempre provisórias e mesmo precárias, pois o que parecia certo hoje, pode apresentar configurações novas amanhã.

Mas se não se pode falar com segurança do legado político da Copa, as duas últimas semanas sinalizaram para outra herança, essa já passível de ser catalogada e analisada mais acuradamente: se os critérios para avaliar o sucesso do evento incluíssem a quantidade de bizarrice escrita e falada por alguns blogueiros, comentaristas e torcedores nos últimos dias, não tenho dúvidas de que essa seria mesmo a “Copa das Copas”. Pincei alguns exemplos que julguei, sob meu ponto de vista, os mais significativos.

“Hoje eu tive um sonho, que foi o mais bonito...” - Nos anos de 1980 não faltou quem acreditasse que esses versos de Roberto Carlos, se ouvidos ao contrário, revelavam seu conteúdo satânico. Salvo engano, Xuxa também conspirou com o capeta, mais ou menos na mesma época. Sempre achei que chafurdar atrás de mensagens subliminares em músicas, filmes, animações, etc..., era coisa de gente paranoica e desocupada, a quem faltava principalmente senso do ridículo. Pois não é que um dos blogueiros preferidos dos neocons brasileiros fez descer o hábito a um patamar ainda mais patético? Economista de formação, Rodrigo Constantino já defendeu a privatização dos tubarões com base em uma leitura muitíssimo peculiar do liberalismo econômico. Não me surpreendeu, portanto, sua teoria de que o símbolo da Copa contém uma mensagem petista subliminar: a cor vermelha do 2014. Quando escreveu o artigo defendendo a privatização dos tubarões, Constantino publicava os textículos que cometia no Orkut. Hoje suas redações escolares estão hospedadas no site de uma revista nacionalmente conhecida, o que lhe valeu uma tiração de sarro, no Twitter do jornalista americano Vincent Bevis, correspondente brasileiro do LA Times. É a globalização da bizarrice.

“Não que eu seja melhor, mas eu paguei mais caro” - Enquanto os Black Blocs apanhavam da polícia nas ruas, os Yellow Blocs expressavam seu patriotismo e paixão pelo futebol da seleção canarinho comendo coxinha de ossobuco, bebendo cerveja Karavelle e champagne Chandon e ouvindo roda de samba animada por Seo Jorge, aquele que mora em Los Angeles porque o Brasil, esse “país de merda”, nunca lhe deu oportunidade, mas que em nome da coerência não se recusou a faturar uns trocadinhos exibindo sua brasilidade quando a Copa veio para cá. Uma etnografia dos Yellow Blocs revela facetas interessantes de uma parte de nossa elite: eles não se consideram melhor que ninguém, mas ficam indignados quando pagam 5 mil dinheiros para entrar em uma festa e são tratados em pé de igualdade com quem pagou míseras trezentas moedas. Tem uma consciência social agudíssima, e identificam nas filas dos banheiros e na falta de garçons para servir as tais coxinhas de ossobuco, os mesmos problemas cotidianos enfrentados pelos milhões de brasileiros, obrigados a amargar horas em filas nos postos de saúde e a se contentar com coxinha de frango com catupiri tabajara. Temem a violência, porque levar uma facada no baço não é mole. E acham que Dilma mereceu ser xingada “por causa de tudo o que ele fez no país”, embora nenhum deles saiba dizer exatamente o que. E não precisam, porque o importante mesmo quando se manda uma presidenta tomar no cu, é o “fundamento do pensar”. Bizarro. 

“Tem de ler 40 livros” - Eu não nego ao Eduardo Bueno um mérito: o cara traduziu “On the road”, a bíblia beat, o que não é pouca coisa. Isso antes, bem antes de dar início a uma coleção de títulos que visavam “popularizar” a história do Brasil com livros que, se por um lado pecam pela quase absoluta falta de rigor, por outro aproximam os leitores ditos comuns de uma história que nós, acadêmicos, nem sempre primamos por tornar acessível. Se verter Kerouac ao português não fez diferença significativa no seu nível de popularidade, a tal coleção o alçou à condição de celebridade, e daí para um programa de comentários sobre Copa do Mundo e temas afins foi um pulinho. Em um deles, Peninha chamou o Nordeste de “bosta” e provocou reações indignadas. Tivesse bom senso, ele teria se explicado, culpado o tal contexto e se desculpado pela colocação no mínimo infeliz. Mas optou por dar um piti e desancar aos gritos seus críticos, recorrendo a argumentos de autoridade que dizem mais sobre sua fragilidade intelectual que da relevância de sua obra. Imagino que não deve ser fácil ver-se alvo da indignação de tantos, mas faz parte do jogo: está na hora desse povo das síndromes persecutórias entender que, sim, esse é um país democrático onde se pode falar o que quiser. Mas esperar que todo mundo os aplauda é tão bizarro quanto chamar o Eduardo Bueno de historiador.

quarta-feira, 25 de junho de 2014

Atiram na Chauí para acertar Lula

POR JOSÉ ANTÓNIO BAÇO

E de repente Marilena Chauí virou alvo de estimação da direita insipiente (passe a redundância). Tudo porque a filósofa ousou dizer que odeia a tal classe média. Ora, posso até achar excessivamente teatral a forma que ela usa para fazer a afirmação, mas o fato é que em termos de conteúdo teria pouco a discordar. Ah... para todos os efeitos, sou “classe média” e não me sinto ofendido.

Qual é o argumento de Marilena Chauí? A filósofa diz que essa tal classe média “é uma
abominação política porque é fascista, uma abominação ética porque é violenta e uma abominação cognitiva porque é ignorante”. Ela sabe de história e deve ter as suas razões. Aliás, a única coisa que eu talvez questionasse é a definição do objeto, porque prefiro a terminologia mais tradicional que define essas classes médias como “pequena burguesia”.

É fácil aceitar a tese, em especial quando Marilena Chauí traz a discussão para o plano do cognitivo. Porque para a pequena burguesia a ignorância é quase um investimento compulsório. Aliás, eu iria mais longe ao defender a tese de que ela pura e simplesmente rejeita o pensamento. Porque é objetivista, individualista e simplória. E, no caso do Brasil, anda perplexa com as mudanças na estrutura social do país e o surgimento da tal nova classe média.

Para evitar confusões, entendo ser incorreta a expressão "nova classe média". O que houve
nos últimos anos foi o ingresso de novos trabalhadores no mercado. Mas que não podem ser incluídos no pacote da tal classe média, uma vez que as suas visões de mundo são diferentes. No entanto, provocam o horror da pequena burguesia - a histórica e real - que teme perder o monopólio de privilégios mantido por décadas. 

Óbvio que as generalizações não ficam bem. E é claro que há gente da pequena burguesia que consegue ver um palmo à frente do nariz. A pequena burguesia repulsiva é aquela que tem sangue nos olhos e se deixa levar pelo ódio de classe. Aliás, esse ódio provoca-lhes uma certa esquizofrenia, porque não se encaixa nos seus próprios códigos morais. Os caras odeiam ao mesmo tempo em que os seus códigos rejeitam a ideia do ódio. Certo, anônimos?

Mas voltemos a Marilena Chauí. É evidente que ninguém está preocupado com ela pessoalmente. Até porque a maioria não faz a mais pálida ideia de quem seja a filósofa (e filosofia é coisa de fracassados que não conseguiram passar no vestiba de medicina). Encontrar uma alminha que tenha lido pelo menos duas míseras linhas dos escritos da pensadora é tão provável quanto saber os números da próxima Mega-Sena. 

O que interessa, então? O processo é simples: demonizar a professora e fazer com que ela apareça ao lado do ex-presidente Lula, de forma a contagiar a sua imagem. Pura semiótica. A pequena burguesia vive da imagem, não do fato. Mas, cá entre nós, esse argumento até ajuda a justificar a tese da abominação cognitiva defendida por Marilena Chauí: na sua indisfarçável insciência, a pequena burguesia ainda não se deu conta de que não é possível derrubar um ex-presidente. 

Bem ao jeito das redes sociais, o pessoal anda por aí a reproduzir vídeos editados de forma a passar a ideia de que o pensamento de Marilena Chauí representa o PT e também o ex-presidente Lula. E como a coisa não corresponde aos fatos, comete-se uma omissãozinha aqui e outra ali para esconder a história na sua totalidade. Eis um filme a mostrar o que aconteceu no mesmo evento... momentos depois.



terça-feira, 24 de junho de 2014

Construir uma Comunicação Popular é um grande passo para a mudança

POR FELIPE SILVEIRA

Cá com meus botões e convicções, entendo que transformar o mundo (pra melhor) passa por três áreas fundamentais: Educação, Legislação e Comunicação. Escolhi a última para atuar, mas entendendo que formam um tripé de uma possível mudança.

Falo em possível mudança porque é preciso entender que as mesmas coisas formam, atualmente, o tripé do conservadorismo. Temos uma educação que forma cabeças obedientes, resignadas, conservadoras e medrosas; temos leis que limitam a coragem, a ousadia, a transformação, leis que privilegiam quem tem mais em detrimento de quem tem menos; e uma comunicação voltada para não conhecermos e consequentemente não refletirmos adequadamente sobre a nossa sociedade.

E é dessa forma porque as leis foram feitas pelos grupos que se beneficiam delas, assim como o formato e o currículo escolar. Da mesma maneira que as concessões de rádio e televisão foram dadas para os mesmos grupos ou seus representantes.

Para haver a mudança, portanto, é preciso que o povo tome a frente desses meios e promova a mudança. É algo que está ocorrendo no campo da Comunicação, mas que pode ser ampliado.

Cada vez mais surgem alternativas relevantes de veículos e narrativas, como a Mídia Ninja, a Agência Pública, blogs, páginas de facebook etc. Ao mesmo tempo, a internet é invadida pelas empresas tradicionais, como Globo e RBS, que usam seu poder econômico e político para dominar o setor. Você pode analisar isso reparando nos próprios hábitos. Como você se informa pela internet? Quais páginas curte? Quais compartilha? Você conhece sites alternativos ou vai primeiro no Globo Esporte, no GSHOW ou no ClicRBS?

Eu entendo que é preciso fortalecer os veículos alternativos. Primeiro, com audiência. Criar o hábito de visitar esses sites e se informar por eles. Em segundo, com dinheiro. Há diversos veículos que contam com possibilidade de assinatura e doação. É preciso grana para fazer bom jornalismo e boa comunicação. Nem que seja para pagar um salário para quem produz. Em terceiro, é preciso boicotar aqueles que já provaram não ter credibilidade. A rede globo, por exemplo, apoiou a ditadura e manipulou debates eleitorais. Por que merece a sua audiência?

Ou aquele tradicional jornal local que sempre apoia as elites...

Além dos sites, há a questão dos jornais comunitários. Uma experiência riquíssima é a do Jornal do Paraíso, produzido pelos moradores do bairro, com apoio do curso de jornalismo do Ielusc. Para quem lembra da imagem que se tinha do bairro Jardim Paraíso há alguns anos, percebe-se uma mudança gigante para os dias de hoje. Não se pode dizer que o jornal é o responsável pela mudança, mas também não se pode negar sua importância nesse contexto.

CONVITE

É por essas e outras que o Centro de Direitos Humanos Maria da Graça Bráz (CDH) criou o Núcleo de Comunicação Popular e Direitos Humanos, que vai debater, no dia 5 de julho, a partir das 16 horas, essas e outras questões, com a intenção de fomentar e fortalecer a comunicação alternativa local. Todos os interessados estão convidados.

Confirme sua presença aqui.

Adestrando


Mulheres e rótulos

POR ET BARTHES

É um anúncio comercial, mas serve de referência para analisar as questões de gênero no mercado de trabalho.



segunda-feira, 23 de junho de 2014

Morro abaixo e sem freio!


A praia de Joinville

POR JORDI CASTAN

Joinville não pode ficar atrás e o prefeito anunciou, na semana passada, que há um projeto para construir uma praia artificial no Espinheiros. Joinville redescobre o mar. A cidade, que estava de costas para o mar, descobre a sua vocação marítima e propõe construir uma praia. 

O discurso do prefeito Udo Dohler me lembrou o daquele político em campanha que, ao chegar a uma cidadezinha do interior, antes de descer do carro com pressa pergunta ao seu assessor o que deve prometer aos eleitores? O assessor responde que a cidade precisa de “um posto”. O candidato no seu inflamado discurso promete construir “uma ponte”, o assessor esbaforido, corre pra informar que a cidade não tem nem um rio sequer e que não precisa de nenhuma ponte. O candidato não deixa por menos e promete que colocara um rio em baixo da nova ponte.

Me ocorrem duas possibilidades para que o prefeito proponha esta praia. Neste momento, a primeira é que o prefeito tenha ouvido outra coisa e entendido errado. Quem sabe algum assessor tenha sugerido uma praça, ainda que se fosse uma praça aqui em Joinville, teria dito um parque. Pode ser que tenham sugerido um palco, ou até um posto. E do jeito que os postos de saúde andam incomodando o prefeito, talvez ele tenha preferido propor uma praia, achando que construir uma praia no Espinheiros será mas fácil que construir e equipar um posto de saúde.

A segunda possibilidade é que da forma que o prefeito anda fascinado pelo desenvolvimento imobiliário de Joinville e pensando em quanto aumentaria a arrecadação do IPTU com a construção de mais prédios. O prefeito, com inveja de Florianópolis ou de Balneário Camboriú, talvez tenha pensado em construir uma praia para poder implantar uma faixa viária a que porá o nome de Beiramar e poderá autorizar a construção de espigões de mais de 15 pavimentos, assim Joinville também terá a sua Avenida Atlântica, ou a sua Copacabana sambaquiana.



Mas imaginemos, por um instante, que o prefeito acredite mesmo que é possível construir uma praia artificial nos manguezais das margens da Lagoa de Saguaçu. Não seria bom que alguém o avisasse antes que pode estar se metendo numa bela encrenca? Primeiro precisaria despoluir a lagoa, que há décadas sofre com o esgoto doméstico e metais pesados, depositadas no lodo. Que ainda falta muito investimento para que Joinville chegue a ter metade do seu esgoto tratado e que enquanto isso não aconteça a Lagoa de Saguaçu é um esgoto a céu aberto. Que Joinville tem outras prioridades mais urgentes e mais importantes que essa praia. Mas se alguém lhe disse-se seria que ele escutaria?

sexta-feira, 20 de junho de 2014

Joinville passou longe da Copa

POR CHARLES HENRIQUE VOOS

Lembro-me bem de quando a Arena Joinville foi construída, e de como os políticos locais fantasiaram em torno do estádio. Era cômico de ver como a imprensa local comprou a ideia, inclusive lançando o estádio recém-inaugurado como um dos possíveis locais para a Copa do Mundo, caso um dia ela acontecesse no Brasil (depois de duas ou três ampliações, claro). A "estrutura" da Arena, "digna de excelência", padece desde sua inauguração, com remendos ao projeto inicial, infiltrações, e seguidas notícias de não-liberação por parte dos Bombeiros para os campeonatos que ali são disputados.

Em segundo lugar, a estrutura de Joinville para receber grandes eventos, como uma Copa do Mundo, é muito pequena. Por mais que três hotéis da cidade fossem chancelados pela FIFA, o Aeroporto é insuficiente e precário (a novela ILS se arrasta há anos) e não havia condições, nem em meados dos anos 2000, nem hoje, da cidade se envolver nestes eventos. Não é a toa que somente grandes capitais foram escolhidas como sedes dos jogos, as quais fizeram parte do combo especulação-flexibilização-lucro que uma cidade do porte de Joinville não poderia oferecer, perante o tamanho dos negócios gerados em torno da Copa.

Esta euforia de cidade-sede dos jogos acabou cedo, quando a FIFA anunciou as cidades pré-selecionadas, e Joinville estava de fora. Os agentes locais não se davam conta de que a estrutura local era infinitamente inferior às outras, por mais que, dentro de Santa Catarina, Joinville se sobressaia. A luta então passou para abrigar alguma seleção, como cidade de treinamento. As falácias continuaram, como a atração de seleções européias, pela ligação da colonização germânica da região, etc. Até a Rússia foi sondada, graças ao Bolshoi. Vale lembrar que a Rússia joga em Curitiba, aqui pertinho, mas mesmo assim escolheu o interior de São Paulo. Os alemães, por exemplo, montaram uma enorme estrutura no interior da Bahia.

Alguns imaginavam, como último suspiro, que a cidade estaria cheia de turistas atraídos pela Copa do Mundo. Infelizmente Joinville não é uma cidade turística, ainda mais se for para "gringo" ver. Para piorar, o Aeroporto que poderia receber os voos excedentes de Curitiba, não teve registros de receber voos extras criados pela demanda da Copa. Restou à cidade de Joinville assistir os jogos pela TV.

Está claro que, desde o começo, não houve um planejamento sério para a atração de alguma seleção, ou até mesmo uma maior inserção da cidade neste evento de proporções mundiais que é a Copa do Mundo. Desde a "invenção" de que a Arena Joinville poderia receber jogos (para esconder os problemas estruturais de seu nascimento) até as negociações políticas para hospedar alguma seleção, nada de sério aconteceu. Apenas uma viagem no "oba-oba" que a Copa provoca, dando margem à interpretações de que "há trabalho", ou algo do gênero.

quinta-feira, 19 de junho de 2014

Enfim, o bolsa-mortadela


POR JOSÉ ANTÓNIO BAÇO

A palavra bolsa entrou de forma definitiva para o léxico comum dos brasileiros. Aliás, foram os opositores do Bolsa Família a dar um enorme impulso para a coisa, ao chamarem o programa do governo de bolsa-esmola (programa que, vale dizer, na hora das eleições a oposição começa a amar de paixão). A coisa foi tão séria que até o velho ditado ficou desatualizado: “jacaré que dorme de touca vira bolsa”. Não serve mais. No patropi hoje tudo vira bolsa.

O pessoal foi com tanta sede ao pote que escorregou na maionese. E saiu aí pelas redes sociais inventar coisas como bolsa-prostituta, bolsa-bandido ou bolsa-crack. É estranho ver pessoas adultas e aparentemente "instruídas" a levarem esse tipo de patacoada a sério. Parafraseando La Boétie, é o discurso da boçalidade voluntária. E não adianta tentar repor a verdade com fatos. A lógica é simploriazinha: não venha com a verdade, porque eu não acredito.

Bolsa para cá, bolsa para lá: este é o Brasil da política nos últimos tempos. Mas de tanto insistir no tema, agora esse pessoal abriu a guarda e permite uma ironia. Eis que me sinto autorizado a introduzir o termo “bolsa-mortadela” na semântica das eleições. Atenção, não vamos matar o mensageiro, porque não estou a inventar (não adianta a escrever comentários mal-educados). A coisa saiu no insuspeito "Estadão".

Leio, no jornalão, um interessante título sobre a convenção que confirmou a candidatura de Aécio Neves à Presidência da República: “Ato reúne 5 mil pessoas, entre filiados e militância paga”. Informa ainda o texto que participantes – alguns sem título de eleitor – admitiram receber 25 reais pela presença. Uma coordenadora desmentiu e disse que eles teriam direito apenas ao “lanche”. É pura ousadia política. Ainda nem ganharam as eleições e já estão a inovar: o primeiro ato foi criar essa bolsa-mortadela. Isso promete.

Sei que é difícil agradar a todos. Mas mesmo sendo fã confesso e incondicional da mortadela (a que chamo carinhosamente “mortandela”), eu esperava algo mais arrojado. Parece que o budget não anda muito alto (25 real é mal – pus no singular para rimar), mas mortadela é coisa de pobre. Parece coisa do PT. O pessoal devia seguir aquele antigo conselho político: “chega de realidade, façam promessas”. Ou seja, chega de mortadela, eu quero é caviar. 

P.S.: Por falar em sanduíche, não adianta escrever a xingar. Hoje não tem pão para maluco. Nem mortadela.

quarta-feira, 18 de junho de 2014

Pós-copa

 POR FELIPE SILVEIRA

Já é hora de pensar o pós-copa. Para quem interpretou literalmente o #NãoVaiTerCopa (dizem que teve estrangeiro que deixou de vir por causa disso), para quem achou que haveria um caos nos aeroportos, para quem achou que os estádios não ficariam prontos, para quem falou que o Brasil passaria “vergonha internacional”, bom, a dita cuja está aí. Sai de cena o “imagina na copa” para a entrada da pergunta: e agora, passada a copa, o que vamos fazer?

Não sou daqueles que acham que o resultado da copa vai influenciar as eleições, embora não descarte a possibilidade, e muito menos estou falando de eleições aqui. A     questão que importa – e aí respinga nas eleições – é o que aprendemos com a batalha encerrada ao apito final do evento.

Já escrevi por aqui que a copa expôs as contradições do capitalismo ao povo brasileiro, mesmo que não se tenha plena consciência disso. Ao mesmo tempo que foi agente, a copa foi uma espécie de bode expiatório. Toda revolta – do black bloc ao coxinha (sem comparar) – tinha a copa como alvo bem claro. Passado o evento, é preciso ajustar a mira.

Olavetes, azedevetes e constantinetes continuarão a apontar para Dilma, que por sua vez poderá se defender com os resultados de uma copa até então espetacular, que é o que boa parte dos fãs do esporte mais popular do planeta estão achando.

A esquerda, por sua vez, tem um desafio, que é mostrar as consequências e continuidades do evento a partir daquilo que ele foi e tem sido: a subserviência ao sistema capitalista.

Tem, também, que pensar no novo. Um novo projeto, uma nova alternativa. Popular, comunitária, com promoção da igualdade e dos direitos humanos. Isso é o básico, o óbvio. O encerramento deste ciclo da copa parece um bom momento para reforçar.


Obs.: Não digo nem acho que se deve esperar a copa acabar para dar continuidade às lutas. Tem bastante gente dizendo isso, por isso ressalto que não disse.

terça-feira, 17 de junho de 2014

O futebol e as figuras de linguagem

POR CAROLINA PETERS

A primeira vez que me interessei por futebol foi após ler "A Pátria de Chuteiras", reunião de crônicas de Nelson Rodrigues. Em verdade, não foi por futebol. Foi por seu estilo. Possivelmente, o primeiro livro sobre o qual menti ser aquele que gostaria de ter escrito.

Nelson me comoveu a ponto de me mobilizar a aprender o que é um impedimento e de tirar do fundo do armário o manto sagrado – a camisa vintage do Clube de Regatas Flamengo – não só porque as listras horizontais haviam voltado à moda, mas porque "todo brasileiro já foi Flamengo por um instante, por um dia". E eu, que uma vez Flamengo na infância por influência paterna, sempre Flamengo.

Eu gostaria de poder falar sobre futebol. De participar da catarse de uma arquibancada de estádio. De ter assistido desde o começo este Portugal e Alemanha e dizer o quanto de fato a seleção alemã foi melhor e mereceu ganhar. Impôs ritmo ao jogo, dominou a partida desde o início. Comentar o alto nível técnico de sua seleção de conjunto, ao passo em que as últimas semanas de incerteza sobre a condição física de Cristiano Ronaldo botaram os portugueses apreensivos e durante o jogo se percebeu a tamanha dependência de CR7.

Mas assisti não mais que o segundo tempo de jogo, durante minha hora de almoço, e mais do que os lances, o que me chamava atenção era o desenho perfeito das sobrancelhas de Cristiano Ronaldo. Eu, que recentemente aderi aos lápis de sobrancelhas. E o olhar impassível de Angela Merkel, diante do quarto gol da seleção alemã. Como se o desenrolar e todo o decorrer da partida já fosse previsivel, evidente. Como se a superioridade da seleção alemã se impusesse como um fato.

Talvez eu, como uma Peters, devesse me solidarizar com a seleção de meus antepassados, que estreou nessa copa de maneira exemplar. Mas a Alemanha de meus dois bisavôs paternos não é essa, que hoje controla a União Europeia. A Alemanha de vô Paulo e vô Mathias é muito mais Portugal.

Muitos sociólogos e antropólogos já se dedicaram a estudar o futebol como uma metassíntese das sociedades. Talvez por não sentir o futebol, não sentir, a despeito do que sempre tentou meu pai, pertencente a esse mundo, que do meu lugar de mulher parece absolutamente hostil, eu não consiga parar de pensar nesse jogo como uma metáfora.

Uma dentre algumas possíveis leituras que temos visto nessa Copa, desde o gol contra brasileiro que abriu a temporada, no momento em que país afora manifestantes eram duramente reprimidos e presos arbitrariamente, tendo seu direito à integridade desrespeitado. O que eu vi em campo, e vi, na ausência de expressão de Merkel, e no olhar desolado dos jogadores portugueses exaustos, foi a Troika, mostrando ao mundo todo seu domínio de bola.

segunda-feira, 16 de junho de 2014

O risco e a incerteza

POR JORDI CASTAN


Vez por outra os posts deste espaço têm como tema a administração pública, a sua forma de funcionar ou de não fazê-lo com a eficiência que, como contribuintes e cidadãos, gostaríamos.

Boa parte das críticas se dirigem à figura do prefeito. Ter focado a sua campanha eleitoral na imagem de gestor e num suposto conhecimento dos problemas da saúde faz com que as cobranças e criticas sejam mais veementes agora. É parte do preço a pagar por haver criado expectativas maiores que as que poderia atender. Para complicar um pouco mais as coisas para o seu  lado, o prefeito repetiu como um mantra durante toda a campanha e mesmo depois de eleito que o problema não era falta de dinheiro e sim falta de gestão. Há dezenas de vídeos por aí que provam o como é perigoso falar sem conhecimento do que não se sabe em profundidade.

A pergunta que muitos nos fazemos, e que gostaria de compartir com os leitores é: por que a qualidade das decisões do poder publico é tão ruim? Não há um único tema que nos permita dizer ter sido bem conduzido do início ao fim. O joinvilense já sabe que as obras não serão entregues no prazo, que o orçamento vai estourar, que a qualidade final não será a melhor, que o processo será judicializado, que as ruas estão ficando às escuras, que a pintura das faixas de pedestres não dura um ano escolar, que faltou prever isso ou aquilo. E, o que é pior, que não só ninguém será punido ou responsabilizado, nem tampouco nenhuma autoridade assumirá um pedido publico de desculpas pela sua incompetência. Como se a incompetência fosse algo inerente à coisa pública e fosse “normal” ou aceitável que seja assim.

Me ocorre que parte do problema se centra no processo de tomada de decisão dos gestores públicos. Há uma diferença sensível entre correr riscos e não ter certeza. Qualquer pessoa toma decisões constantemente. Executivos e autoridades em cargos de primeiro escalão são chamados a tomar um maior número de decisões da maior responsabilidade e, por isso, suas decisões têm uma maior relevância e seus erros ficam mais em evidência.

Podemos dividir o processo de tomada de decisão em três categorias:

- Sabemos os resultados da nossa ação – Este é o caso mais fácil. Se aperto o botão do elevador o elevador se movimentará. Se coloco a chave certa na fechadura correta a porta se abrirá.

- Não sabemos os resultados, porém conhecemos as probabilidades - Neste caso o risco está presente. Se for jogar a um cassino, antes mesmo de colocar um pé nele ou de sentar na mesa de jogo sabemos que há possibilidades de ganhar ou de perder. Portanto ninguém se surpreenderá com o resultado.

- Não sabemos nem o resultado, nem as probabilidades – Isso é incerteza e a incerteza nos faz ignorantes, porque não sabemos o que pode acontecer.

Tanto na vida cotidiana como no poder público,  como é a nossa administração municipal - e neste momento me atrevo a dizer que no caso que nos ocupa -, os tomadores de decisão não podem deixar o prefeito sozinho com esse abacaxi. Acreditam que estão tomando as suas decisões baseados na segunda hipótese, quando os resultados mostram que estão decidindo pela terceira.

É justamente a ignorância que faz que as decisões tomadas acreditando que se conhecem todas as probabilidades ou alternativas, sejam na realidade um salto no escuro e os resultados sejam completamente imprevisíveis.

Um bom indicador de quanto há de ignorância na tomada de decisão é olhar um pouco atrás, ler alguns jornais velhos e ver com que frequência o que aconteceu é completamente diferente do que tinha sido previsto. Mantendo o foco na gestão sambaquiana, vamos pôr o foco em alguns casos: 

Os recursos transferidos ao CDL para organizar o Natal Luz e que hoje estão pendentes de um processo no TCE (Tribunal de Contas do Estado);

O caso do Crematório em que alguém acreditou que poderia descumprir a lei autorizando um empreendimento sem seguir todos os passos do processo legal (hoje o crematório continua sem poder funcionar); 

Os parques da cidade são casos anedóticos, nunca se concluem no prazo e dentro do custo.

Continuamos? Não há melhor exemplo que o da LOT. Quantas vezes o poder público tem obviado as diferentes alternativas possíveis e insistido em buscar atalhos que tem se convertido numa sequência interminável de quebra-cabeças. A licitação do estacionamento rotativo ou a manutenção da iluminação pública, ou....ou... é só ir acrescentando.



Vivemos em uma sociedade preparada para a segunda hipótese, a do risco, pois correr riscos calculados  faz parte do dia a dia de qualquer administrador que toma suas decisões baseado nas probabilidades. Mas vivemos uma realidade muito mais próxima da terceira hipótese a de que ignoramos e mesmo assim decidimos correr riscos, o resultado esta aí à vista de todos.

sexta-feira, 13 de junho de 2014

#copa2014: torcer até vai; festejar não

POR CHARLES HENRIQUE VOOS

Quando o Brasil entrou em campo na abertura do mundial de futebol, na tarde de ontem, lembrei-me de quando era criança e gostava de acompanhar todos os jogos da Copa. Além de colecionar figurinhas, ou estudar as tabelas, o futebol por si só era o objeto principal daquele sonho infantil. Ao retornar a consciência para a realidade, em 2014, estava eu, em frente ao televisor, torcendo para a seleção brasileira.

Poderia ser como sempre foi. Mas não foi.

Sempre defendi aqui no blog, na sala de aula e em outros espaços nos quais convivo de que a FIFA, juntamente com o governo federal e os gestores estaduais e municipais de todas as 12 sedes, promoveram um atentado aos direitos básicos garantidos na Constituição Brasileira de 1988. É notório e sabido para a maioria que a Copa foi uma coisa inventada que se sobrepõe ao planejamento das cidades, porque em nome dos megaeventos vale tudo: remoções de famílias (estima-se que aproximadamente meio milhão de pessoas foram afetadas direta ou indiretamente) para construir estádios no lugar, operários morreram devido a obras de estádios feitas às pressas, em dispensas de licitações e outras situações já cantadas há muito tempo, ao contrário dos aproveitadores de uma situação eleitoral.

Aproveitadores estes que se situam dentro de grupos políticos (ou possuem simpatia com estas organizações) sobretudo pelas eleições que se aproximam. O problema da Copa é generalizado, pois foi construído pelos gestores dos 12 governos estaduais e mais os 12 governos municipais de cada sede, compostos por representantes dos mais diversos partidos políticos, da esquerda à direita. As remoções e violações do Direito à Cidade foram operacionalizadas por todos, sem exceções, e não somente pelo Palácio do Planalto. Longe de não reconhecer a culpa de quem está lá, xingar a presidenta faz parte de um desconhecimento sobre tudo o que vem acontecendo com a política urbana dos megaeventos desde que foram anunciados em meados dos anos 2000. É desconhecer a profundeza das questões que levam milhares às ruas há muitos anos (muito antes das "Jornadas de Junho"), lutando pela função social do espaço urbano.


Os pobres ficaram longe dos estádios. A miscigenação tão característica de nosso país não era a realidade da Arena Corinthians Itaquera São Paulo Isentão, pois eu só via brancos em grande maioria no estádio. Sinal de alguma coisa errada. Sinal de que a Copa, desde o começo, não foi para todos. Não foi para quem mais sofre com os problemas diários de nossa nação. Nem de longe.

Sendo assim, não consegui festejar e nem ao menos gritar "gol", como fizera em outros momentos de minha vida. Fiquei torcendo pela seleção, mas longe do clima de "festa" e "oba-oba". E muito menos entrarei na onda de uma massa que vaia sem dar os créditos aos verdadeiros protestos, mirando em uma parte dos responsáveis por tudo o que vemos aí.

O jogo acabou, a Copa acabará mês que vem. A atual questão urbana brasileira, por sua vez, parece não ter fim.

quinta-feira, 12 de junho de 2014

Começou!


POR CLÓVIS GRUNER

Quando a seleção brasileira entrar no Estádio do Itaquerão hoje à tarde, disputando contra a Croácia a partida de abertura da Copa do Mundo 2014, estará em jogo muito mais que o hexacampeonato. Desde o início das mobilizações de rua contra o torneio da FIFA, e apesar do slogan, todo mundo sabia que teria Copa e, penso, nunca foi a intenção inviabilizá-la. Parece-me que se buscou a possibilidade de tecer sobre ela uma outra narrativa, mais aberta e plural e capaz de levar em conta, de atribuir sentido e visibilidade às contradições decorrentes de sua organização.

Uma narrativa que não encobrisse, sob as camadas do ufanismo governamental e publicitário, as muitas formas de violência que compuseram também o roteiro da Copa do Mundo, e sobre as quais, não fossem as mobilizações, restaria um pacto de silêncio e o consequente esquecimento. Como disse em texto publicado há poucas semanas aqui no Chuva, a estimular as manifestações, e descontados os muitos oportunismos e oportunistas de plantão, há um conjunto de demandas legítimas e uma porção mais que justa de indignação pela maneira enviesada como muitas das decisões foram tomadas e executadas.

Além disso, como bem observou Vladimir Safatle em texto publicado na Folha de São Paulo de terça-feira, as manifestações sinalizaram para um incômodo descompasso entre os estrategistas de marketing – e não só os do governo – e parte da população brasileira. E embora não concorde com parte da abordagem do filósofo, que parece ecoar a ideia de que “o gigante acordou”, porque penso que ele nunca esteve adormecido, estou de acordo quando afirma que o roteiro sempre previamente traçado desde cima para o “povo” – basicamente “celebrar a aclamar” – dessa vez não funcionou: os atores não aderiram ao espetáculo que lhes foi designado e criaram seu próprio cenário. Houveram equívocos e alguns excessos, por certo, mas no âmbito geral o mise-en-scène das ruas foi o necessário e criativo contraponto ao discurso oficial.

FUTEBOL E POLÍTICA – Claro que as implicações políticas disso não podem ainda ser medidas em toda a sua extensão. E elas tampouco são novidade. Os usos políticos do futebol vem de longa data: em 1958, Juscelino Kubitschek, o “presidente bossa nova”, não se furtou a usar a conquista da Jules Rimet para inflar o espírito nacionalista e a adesão da sociedade ao seu projeto desenvolvimentista, os tais “50 anos em 5”. Pouco mais de uma década depois, o general Médici, o presidente assassino, fez do tricampeonato conquistado no México uma de suas cortinas de fumaça a encobrir os muitos crimes praticados pela ditadura – além da corrupção, a censura, as prisões arbitrárias, a tortura e o extermínio de dissidentes. E não se pode negar que, sob certo aspecto, em ambos os casos a estratégia deu certo.

Obviamente os contextos eram diversos de agora. Entre outras coisas, o futebol e a Copa do Mundo não eram ainda essa máquina que movimenta bilhões de dólares mundo afora; tampouco a FIFA era a entidade poderosa que é hoje. Mas talvez justamente o triplo agigantamento ajude a entender porque dois ex-presidentes, FHC e Lula, insistiram tanto em trazer para cá a Copa do Mundo. Lula conseguiu, e certamente quando recebeu a confirmação, em 2007, de que o Brasil seria o país sede do torneio, ele esperava outra coisa que não as ruas tomadas de manifestantes indignados e tanques do exército dispostos a “assegurar a ordem” contra toda eventual desordem.

Vai ter Copa e, particularmente, penso que o prejuízo, tanto econômico como político, será menor do que teme meu colega de blog José António Baço. Não será a “Copa das Copas”, como quer a presidente Dilma Rousseff? Bastante provável. Mas talvez não seja igualmente o desastre desejado pela oposição que, carente de tudo – principalmente carente de um projeto para o país – torce para que tudo dê errado e que as imagens de uma hecatombe possam ilustrar a campanha eleitoral e disfarçar a ausência de ideias. De minha parte, continuo a pensar que o principal legado da Copa é o sempre necessário e bem vindo amadurecimento democrático, com todas as contradições que ele comporta. E se junto vier o hexa, tanto melhor.