POR GUILHERME GASSENFERTH
Este texto foi
originalmente escrito em 18 de maio de 2011. De lá para cá, os gays conseguiram
o direito à união civil homoafetiva no STF, mas os direitos básicos (à vida, à
dignidade, à tolerância) continuam desrespeitados. O PLC 122 não foi aprovado
ainda. Portanto, o texto continua atual em sua defesa dos seres humanos.
O debate aqui pelos comentários está aberto! Participe. Todas as opiniões contrárias, desde que respeitosas, serão consideradas.
A imagem acima ainda o choca? É bom que leia este texto então.
O título do texto foi extraído da música Paula e Bebeto, de
autoria de Caetano Veloso e Milton Nascimento.
Dia 17 de maio, é o Dia Internacional Contra a Homofobia, e
neste ano, completar-se-ão 22 anos da retirada do "homossexualismo"
da CID - Classificação Internacional de Doenças da OMS - Organização Mundial de
Saúde. Há 22 anos a ciência reconhecia que não há doença, desvio ou disfunção
no comportamento homossexual. A ciência já avançou, mas alguns homens continuam
atrasados e retrógrados, tentando utilizar-se de textos escritos há mais de
3.500 anos como justificativa para suas conclusões.
No mesmo Dia Internacional Contra a Homofobia, o jornal
Folha de S. Paulo, em seu editorial de 17 de maio de 2011, age ou com má fé ou
com leviandade e levanta preocupação com o Projeto de Lei Complementar 122 (PLC
122), notadamente porque, segundo eles, o PLC 122 é um mecanismo que poderá ser
usado para cercear a liberdade de expressão. Veja trechos do texto:
"A amplitude e a indefinição dos termos ergueria uma
espada sobre qualquer discurso ou escrito que condene a homossexualidade.
Poderia ser acusado de ‘induzir’ a discriminação e, em tese, levar à pena de
reclusão por um a três anos, mais multa."
Sim! Qualquer discurso ou escrito que condene a
homossexualidade tem que ser criminalizado. Alguém pode condenar o negro? Ou o
judeu? Contra o gay também não deve poder.
Nós gays não escolhemos nascer assim. Quem em sã consciência
ESCOLHERIA um caminho que lhe renderá uma vida com preconceito, discriminação,
intolerância, dificuldades? Ninguém, em pleno uso de suas faculdades mentais
ESCOLHE ser algo que lhe trará prejuízos e sofrimento.
Eu fui educado em boas escolas; tenho pai e mãe casados, que
sempre me encheram de amor e carinho e que convivem harmoniosamente com toda a
família, muito bem estruturada; não convivi quando criança com gays ou
lésbicas; assisti aos mesmos desenhos que qualquer criança que hoje tem 26 anos assistiu;
brincava na rua com os amigos; subi na árvore; nunca tive bonecas, mas sim
carrinhos; sempre tirei boas notas na escola... e aí? Onde que o MEIO definiu
que eu seria gay? Eu nasci assim. E tenho orgulho de ser assim.
Não tenho problema nenhum com heterossexuais, pelo
contrário: devo minha existência à deles, e para mim eles são tão normais como
eu. Nós gays amamos os heterossexuais e não criaremos uma “ditadura gay”.
Jamais tentarei impor a algum heterossexual a "conversão" à
homossexualidade, até porque isso não existe. A "conversão sexual"
não existe e é um produto que mesmo no fim do século XX já era rechaçado.
Então, se eu nasci gay, se eu naturalmente sou assim, quem
poderá acusar-me de estar errado? Se a homossexualidade é encontrada mesmo
entre os animais, como não poderá ser algo natural?
O texto da Folha prossegue: “Parlamentares evangélicos temem
que o projeto, se aprovado, venha criminalizar a pregação contra os gays. A
relatora, contudo, propôs como única modificação ao texto da Câmara que seja
aberta exceção para "a manifestação pacífica de pensamento decorrente de
atos de fé".
Desculpe-me a Senadora Marta Suplicy, mas nem essa exceção
deveria haver. Pregação contra os gays deve ser também crime! A ausência de
pregação contra os gays não implica em aceitação da homossexualidade, mas
simplesmente como um processo de tolerância,como o próprio Cristo ensinara. Ninguém
quer obrigá-los a gostar de nós, apenas a nos tolerar e respeitar.
E afinal, quem tem direito de pregar contra mim? “Aquele que
de entre vós está sem pecado seja o primeiro que atire pedra”. (João, 8:7). A
história das igrejas não é imaculada, pelo contrário!
Ainda a Folha, em seu texto: “E se alguém se manifestar
pacificamente contra homossexuais, mas não por motivos religiosos? Poderá ser
preso, censurado?”.Evidentemente, deverá ser preso e censurado. Volto a
comparar (afinal, será a mesma lei): alguém pode manifestar-se pacificamente
contra os negros? Contra as mulheres? Não. E com a inclusão de idosos,
deficientes e gays, nem estes grupos poderão ser alvo de manifestação
“pacífica” contra. Pacífica entre aspas, pois não consigo enxergar como a
manifestação contra uma minoria possa estar relacionada à palavra paz. Paz é a
favor, não contra.
Aos religiosos das diversas denominações, tolero-os e
respeito-os todos, e os amo como irmãos que somos em Cristo. E falando Nele...
contou-nos Mateus, no capítulo 22, versículos 37 a 40: "Respondeu-lhe
Jesus: Amarás ao Senhor teu Deus de todo o teu coração, de toda a tua alma, e
de todo o teu entendimento. Este é o grande e primeiro mandamento. E o segundo,
semelhante a este, é: Amarás ao teu próximo como a ti mesmo. Destes dois
mandamentos dependem toda a lei e os profetas." E veja-nos o que
ensinou-nos a Bíblia em I João 4:11 "Amados, se Deus assim nos amou,
também nós devemos amar uns aos outros." É amor ao próximo essa peregrinação anti-gay que
alguns líderes religiosos apregoam?
Continua o editorial: “A criminalização da homofobia resulta
de um impulso nobre, que objetiva proteger pessoas discriminadas pelo que fazem
em sua vida privada. Não pode, porém, servir para cercear liberdades que
fundamentam a própria convivência civilizada e democrática.”. Meus caros
editores, mesmo a liberdade precisa possuir limites. Não é porque somos livres
que eu tenho o direito de fazer o que eu bem entender. Não posso pegar uma arma
e atirar em alguém. Da mesma forma, a discriminação contra gays deve ser
criminalizada.
Vamos à nossa Constituição Federal de 1988, que já em seu
preâmbulo afirma: “Nós, representantes do povo brasileiro, reunidos em
Assembléia Nacional Constituinte para instituir um Estado Democrático, destinado
a assegurar o exercício dos direitos sociais e individuais, a liberdade, a
segurança, o bem-estar, o desenvolvimento, a igualdade e a justiça como valores
supremos de uma sociedade fraterna, pluralista e sem preconceitos, fundada na
harmonia social e comprometida, na ordem interna e internacional, com a solução
pacífica das controvérsias, promulgamos, sob a proteção de Deus, a seguinte
CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA FEDERATIVA DO BRASIL.”
Vamos adiante, na nossa Constituição Cidadã: “Art. 1º: A
República Federativa do Brasil [...] tem como fundamentos: [...] II – a
cidadania; III – a dignidade da pessoa humana”.
“Art. 3º: Constituem objetivos fundamentais da República
Federativa do Brasil: [...] IV – promover o bem de todos, sem preconceito de
origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação”.
E, por fim: “Art. 5º: Todos são iguais perante a lei. [...]
III – Ninguém será submetido a tortura ou a tratamento desumano ou degradante”.
Um conhecido afirmou: se um evangélico não quiser
alugar uma edícula no fundo de sua casa para um gay, ele tem que ter esse
direito. Peraí! E o gay pode ser humilhado porque o evangélico (no exemplo
citado) não quer lhe alugar? Se isso não é submeter o gay a tratamento
desumano, não sei o que é.
Citamos alguns dos principais trechos de nossa Carta Magna.
O PLC 122 é isso. É um projeto de lei que reforça o que a Constituição já
prevê. Por que não aprová-lo? Nós estamos falando de dignidade, cidadania,
discriminação, preconceito, de uma SOCIEDADE FRATERNA, PLURALISTA E SEM
PRECONCEITOS.
O PLC 122 quer criminalizar a discriminação dos não-heterossexuais assim como a Lei 7.716/1989 criminaliza a discriminação arbitrária por cor de pele, etnia, origem nacional e religião. O PLC quer incluir orientação sexual, idosos e deficientes na mesma lógica. Nesta proposta, se um gay resolver agredir um heterossexual ele sofrerá a mesma pena que se o inverso tivesse acontecido.
Nossos direitos não tiram os direitos dos outros. Quanto
mais seres humanos tiverem direitos civis assegurados, mais pleno será o estado
democrático que se busca em nosso ideário republicano.
Para finalizar o raciocínio: o Grupo Gay da Bahia (GGB)
denunciou 266 assassinatos motivados por violência homofóbica só em 2011.
Alguém pode dizer que a homofobia não existe ou que ela é inofensiva? 266
pessoas perderam suas vidas porque eram gays, lésbicas, travestis ou
transexuais. O Brasil é o campeão mundial de assassinatos homofóbicos. E isso,
puritanos e moralistas, é certo? Cadê o berreiro? “Não matarás”, diz o decálogo
de Moisés. Mas não é o que os homofóbicos assassinos observaram na hora de
materializar seu ódio e seu destempero mental contra um homossexual. Vale dizer
ainda que o número de homicídios homofóbicos está numa preocupante progressão:
nos três primeiros meses de 2012 o número dobrou em relação a 2011. Mas não
esmoreceremos em nossa luta!
Tiradentes foi insurrecto por defender a redução da carga
tributária. Gandhi levantou-se contra a opressão da metrópole inglesa imposta á
Índia. Martin Luther King fez seu discurso ecoar em 1968 e ajudou a estabelecer
direitos civis aos negros norte-americanos. Mandela fez uma revolução pacífica
e ajudou a acabar com a segregação oficial que existiu até há pouco tempo na
África do Sul. Brasileiros, heteros e não-heteros, é chegado o momento. Agora é a nossa vez de
buscarmos pacificamente (mas com firmeza) nossos direitos, de procurarmos nossa
inserção social, de lutarmos contra a homofobia, e de batalharmos pelo direito
de amar a quem quisermos! Vamos em frente, em nome do amor!
“E a gente vai à luta, e conhece a dor, consideramos justa
toda forma de amor”. Lulu Santos
Quem quiser obter mais informações, sugiro o site
www.plc122.com.br - atualizado e cheio de informações valiosas.