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quarta-feira, 25 de julho de 2018

Fake news, a mentira e a homofobia

POR CLÓVIS GRUNER
Um tuite do vereador carioca Carlos Bolsonaro, publicado no dia 13 último, devolveu às redes sociais uma fake news que vem sendo compartilhada desde 2017, sugerindo que homens gays são pedófilos. Avisado que se tratava de um material comprovadamente mentiroso, Bolsonaro não apenas manteve a postagem, como publicou novos posts associando a homossexualidade masculina e a pedofilia (você pode ler a história aqui).

No mesmo dia, Danilo Gentili usou sua conta na rede para alertar seus seguidores que, em breve, eles verão as “Folhas e UOL da vida manchetando que vc é um monstro preconceituoso se não aceitar a pedofilia”. Isso porque, há uma “geração sendo doutrinada nas universidades para defender isso quando subirem aos postos de editores, agentes da mídia e políticos”. Alertado da mentira, também manteve o post e publicou outro de igual teor, compartilhado um dia antes no Twitter de Voldemort.

Não tenho dúvidas que Gentili e Bolsonaros sabiam o que faziam mesmo antes de serem alertados da mentira, e terem continuado a disseminá-la é um claro indício disso. Associar a homossexualidade masculina à pedofilia é tão falso quanto falar em “ditadura gay” ou, variações do mesmo tema, que “gays querem impor seu estilo de vida” e que o movimento LGBT reivindica “privilégios jurídicos”, mais ou menos como as igrejas.

Mas a disseminação de inverdades, nesse caso, esconde dramas e problemas reais para os quais – e também não tenho dúvidas disso – nenhum deles está realmente preocupado. O primeiro deles é, justamente, o da pedofilia. O último levantamento sobre o tema, de 2016 e divulgado recentemente, revela números assustadores: cerca de 13 mil menores foram vítimas de algum tipo de abuso sexual naquele ano, a maioria perpetrados por familiares ou pessoas conhecidas.

É dentro de casa – e também em alguns templos e sacristias –, portanto, que reside o perigo maior. Apesar disso, a CPI dos maus tratos, liderada pelo senador Magno Malta, e os milicianos do MBL, preferiram atacar museus e artistas, escolas e professoras/es, em um discurso agora reiterado pelos tuites de Gentili e Bolsonaros, que estigmatizam, no limite da criminalização, as práticas e relações homoeróticas, colocando-as no mesmo nível da pedofilia e do abuso infantil.

Na prática, nossos conservadores e seus porta-vozes nas mídias e parlamentos não se importam em manipular um problema real, como a pedofilia ou o abuso infantil, se isso servir a um propósito: atacar e desqualificar LGBTs e seus movimentos, mantendo-os à margem de quaisquer direitos, autorizando e legitimando a violência, física e simbólica, sistematicamente praticada contra eles.

Um ódio fundamental – Somos, entre os países democráticos, um dos que mais mata sua população LGBT. Segundo dados da Secretaria de Direitos Humanos da Presidência da República, em 2011 – ano do último levantamento do órgão federal – cerca de 19 violações contra LGBTs aconteceram, em todo o pais, diariamente. As estatísticas se referem às agressões notificadas e, levando-se em conta a precariedade, as inúmeras dificuldades e mesmo o medo de registrar agressões sofridas, é provável que a incidência seja maior.

Os números são também assustadores no que se refere ao assassinato de gays, lésbicas, transgêneros e travestis: no mesmo ano da pesquisa realizada pela SDH, foram registrados 266 mortes; levantamento feito pelo Grupo Gay da Bahia para 2014, registra um aumento significativo, totalizando 326 assassinatos. No ano passado, esse número saltou para 445 vítimas. O número de mortos é maior entre a população gay masculina, seguida de perto pelos travestis.

Confundidos com homossexuais, nos últimos anos cerca de 20 homens heteros foram assassinados. Em 2014, Alex, de apenas oito anos, foi espancado até a morte pelo pai, que o achava “afeminado” e queria que ele “andasse como um homem”. No ano passado, Itaberlly Lozano, de 17 anos, foi morto a facadas pela mãe e o padrasto que esconderam o corpo, depois de carbonizado, em um canavial. O índice de suicídios entre adolescentes e jovens gays é igualmente desalentador.

Mas a violência não é apenas física. A homossexualidade ainda é vista e tratada como doença, inclusive por profissionais da saúde. Gays são preteridos ou demitidos de empregos por serem gays. São constrangidos em lugares públicos e hostilizados quando demonstram afeto (um simples andar de mãos dadas pode gerar reações violentas imprevisíveis); expulsos do convívio familiar e de amigos; desrespeitados em ambientes públicos, inclusive em escolas, espaços de formação de cidadanias e cidadãos; ridicularizados por programas de humor e humoristas politicamente incorretos.

Militantes denunciam isso há muito tempo. Conseguiram poucos, tímidos avanços, mas esbarram na indiferença, inclusive de governos de esquerda: em 2011, Dilma Rousseff mandou suspender a distribuição do “kit anti-homofobia” (que os detratores chamaram, pejorativamente, de “kit gay”), cedendo às pressões da bancada conservadora. Uma esfera pública não inteiramente laicizada e atravessada pela vontade religiosa corrobora para perpetuar um estado de coisas, que trata alguns indivíduos como subcidadãos em função de sua orientação sexual.

Apesar disso, Bolsonaros, Gentili e seus milhares de seguidores insistem no discurso cretino e mentiroso de uma “ditadura gay” e ousam falar em “privilégios”, enquanto mentem sobre homossexualidade e pedofilia. E mentem porque eles sabem o tipo de efeito que essa associação produz. E porque não suportam que LGBTs tenham acesso e assegurem mesmo os direitos mais elementares. Às vezes, um tuite não é só um tuite. É um reservatório inteiro de ódio.

sexta-feira, 30 de janeiro de 2015

Movimento LGBT, é preciso mesmo tantas letrinhas?

EMANUELLE CARVALHO

Ocorre frequentemente, nas situações mais distintas. Na TV, com uma reportagem  que trata o assunto indevidamente e confunde a população. No rádio, ao trocarem qualquer identidade de gênero ou orientação pela palavra gay. E também quando você está lá, bebendo aquela cerveja com os amigos e de repente alguém toca no assunto: "É como a galera GLS, Manu". Você corrige rapidamente para LGBT, e o logo os questionamentos sobre nomenclaturas, expressões de gênero, orientação sexual começam a surgir, e com eles as dúvidas tão comuns.


Mas será que é preciso tantos nomes diferentes? Será que a gente não pode chamar tudo de homossexualidade pra ficar mais fácil?
Não, a resposta correta é não. 

E não é porque nós somos "tudo bicha pintosa que gosta de frufru, glamour e purpurina" (até por que tem muita sapatão caminhoneira nesse barco, tem muita diversidade  nesse bolo, mas isso é outro papo, ou melhor, outro texto). O fato é que nomear os comportamentos e identidades ajuda a debater sobre elas, cria um ambiente propício a diferenciação dessas identidades, orientações e culturas e a entender um pouco de suas subjetividades e desse conceito tão amplo que é a diversidade.
Quando dividimos os sujeitos LGTBs em letrinhas podemos debater suas demandas uma a uma. Podemos dar atencão a problemas não vistos por outros grupos e por isso, pouco evidenciados. Chamamos isso nos movimentos sociais de visibilidade (guarde bem essa palavra, vou utilizá-las bastante dialogando aqui nesse espaço).
Ao debater as demandas individualmente a gente pode devagarinho, passo a passo, visualizar algumas opressões da sociedade que comumente não veríamos mas que nos afligem e são motivos de muitos traumas. 

Por exemplo, mulheres lésbicas sofrem lesbofobia e dentro disso, problemas como estupros corretivos , onde uma parcelas de homens machistas idiotas acreditam que podem corrigir a sexualidade dessas mulheres estuprando-as.
Já os bissexuais sofrem com as ideias bifóbicas equivocadas de que suas mentes e corpos são indecisos, que querem tão somente a promiscuidade e que não conseguem sustentar relações monogâmicas. Somos na ideia da sociedade atual uma espécie programada para fazer sexo sem se apaixonar independente do outro ser alguém legal ou não, ser inteligente ou não, nos atrair ou não. Algo criado para agradar a homens heterossexuais, já que a bissexualidade masculina é sempre vista como um disfarce e pouco admitida sua existência (sim, é preciso provar que sua sexualidade existe!). Uma grande bobagem do fetichismo e estereótipo televisivo.

Mas será que nomear tanto e trocar frequentemente essas nomenclaturas não piora essa visibilidade? Será que não confunde as pessoas? Será que não era mais fácil falar somente sobre amor?
Claro que sim, mas isso não é de fato um problema. Nesta sociedade plural e pós moderna estamos acostumados a modificar as coisas o tempo todo. Em 1960 a minha mãe teve um lance com meu pai, já minha avó teve um chamego, meu irmão flertou aos 15 e eu fiquei aos 12. Viram só, estamos modificando nossas formas de falar, então por que a nossa sexualidade, sempre tão invisível e agora talvez um pouco mais debatida não pode receber um novo olhar?
Claro que pode.

É preciso atentar que algumas palavrinhas são ressignificadas, ou seja, recebem um novo sentido, uma nova carga simbólica, moral e política e outras podem ser utilizadas pejorativamente. Se você não sabe que termo utilizar com uma determinada pessoa ou determinado grupo, pergunte. Não é feio, não dói, e principalmente, não machuca o outro. 

Além disso, é preciso ter paciência para explicar  (estou trabalhando arduamente nisso gente!), especialmente aos que foram educados para um mundo mais cinza, que essa pluralidade de cores não nos inferioriza enquanto sociedade, pelo contrário, nos fazem sujeitos ainda mais tolerantes, fortes e múltiplos.

terça-feira, 23 de setembro de 2014

Essa Gente de Bem.

POR CAROLINA PETERS

Uma revoada de homofóbicos.
Vamos fazer as contas das últimas semanas. Um incêndio criminoso num CTG (Centro de Tradições Gaúchas) no Rio Grande do Sul, dias antes do local sediar a celebração da união de um casal de lésbicas. Uma travesti é espancada e atirada do alto de um caminhão em movimento em Caçapava, São Paulo. A notícia do caso, absolutamente desrespeitosa, a trata por o travesti*, anônimo -- mais uma mostra do péssimo jornalismo que acomete o país.

O caso que possivelmente contou com maior repercussão pela brutalidade e pelo desenrolar, é do assassinado do jovem goiano João Donati. Crime de brutalidade sem tamanho, João foi esquartejado e, para não deixar dúvidas da motivação do crime, o assassino deixou em sua boca um bilhete: vamos acabar com essa raça. Alguns -- os que certamente iam mal nas aulas de interpretação de texto na escola -- podem afirmar que o pronome poderia indicar muitas outras características. Mas os mais espertinhos sabem que "essa raça" se refere aos homossexuais. Os gays. Vi-a-do. B-I-C-H-A.

Parecia que diante de tamanho horror, uma ficha caiu. O termo homofobia virou palavra popular na pauta jornalística. Até que o assassino confessou. E de repente, tudo não passou mais de uma briguinha de amor. Como se um homem que admite ter sentido atração por outro homem, e depois assassina o menino de forma cruel, buscando apagar sua existência desmantelando seu corpo, e deixa tão clara mensagem, talvez até como forma de exorcizar os próprios fantasmas, não pudesse ser taxado de homofóbico.

E o caminho continua livre para a "gente de bem" que defende publicamente no horário gratuito "a vida e os valores da família", mas só da família que garanta o controle social, a propriedade. E a vida de quem interessa.

Fobia: aversão irracional, desproporcional.

Mas a homofobia não é somente a que choca os distraídos. Ao rés-do-chão e em doses mais homeopáticas ela também agride e mata. A revoada de homofobia das "gaivotas" da torcida são-paulina, uma forma de escárnio contra os rivais corintianos, é mais um sintoma. A forma como a homo-afetividade é usada para diminuir um adversário ou antagonista escancara o quanto na nossa sociedade existem pessoas cuja vida vale menos. Cuja vida é descartável.

Há algumas semanas, o próprio Corinthians manifestou seu repúdio aos gritos homofóbicos por seus torcedores. Ainda é pouco, mas quando um dos maiores times do país adota essa postura, é um respiro para quem espera um futebol mais inclusivo, dentro de campo e nas arquibancadas. E também dos portões pra fora. Afinal, o futebol é extensão da vida dos brasileiros. Eu já entrei na campanha para que o meu Flamengo assuma a mesma postura.



*Uma breve nota de gramática: Travesti é uma palavra de gênero neutro. O artigo concordará com o gênero com o qual a pessoa travesti se identifica para si e para o mundo através de diversas linguagens, entre as quais a vestimenta. Dizemos A travesti para as travestis de identidade feminina (sexo biológico masculino, mas identidade de gênero feminina). Dizemos O travesti quando se trata de pessoa de identidade de gênero masculina, nascida com sexo biológico feminino.

quarta-feira, 7 de agosto de 2013

"Lincoln" e a luta por direitos



POR FERNANDA M. POMPERMAIER

Assisti no último final de semana o filme "Lincoln" e não pude deixar de relacionar o recorte do momento histórico relatado no filme com o momento em que vivemos no Brasil e no mundo com relação às lutas pelos direitos LGBT's.

O filme se passa em 1865, último ano do mandato de Abraham Lincoln como presidente dos Estados Unidos. Ele está no cargo desde 1861, ano do início da Guerra da Secessão. Uma guerra civil que aconteceu entre os estados do norte - União, e estados do sul - Confederados. O sul mais agrário com latifúndios e mão de obra escrava, o norte mais industrializado e com alguns estados "livres".

O presidente busca acabar com a guerra, unir o país e ao mesmo tempo aprovar na Câmara dos Deputados a 13a emenda à Constituição que oficialmente iria abolir a escravatura  no país.

Para que a emenda seja aprovada, um deputado, branco, que há 30 anos luta pelos direitos dos negros precisa admitir, contra o seu desejo, que o objetivo da emenda não é afirmar que negros são iguais aos brancos. Mas que, como seres humanos eles devem ter assegurados direitos iguais frente à Constituição. Essa é uma manobra política que os republicanos promovem, inclusive na mídia, para convencer os escravistas a aprovarem a emenda.

Se parece muito com o tipo de manobra que precisa ser feita hoje no Congresso Nacional, intensamente manipulado por cristãos fundamentalistas e preconceituosos como Marco Feliciano ou Silas Malafaia, para que sejam convencidos a aprovarem direitos básicos ao grupo LGBT. É preciso que se afirme que as pessoas não precisam concordar com o estilo de vida do homossexual ou do travesti, (como se fossem necessárias suas aprovações), mas que homossexuais devem ter os mesmos direitos que heterossexuais. É preciso falar em tolerância, quando o próprio sentido da palavra tolerância traz em si embutida uma relação de superioridade. ("Eu sou melhor que você e tolero o seu comportamento). O que é absurdo.

E não acontece só no Brasil. O mundo todo está passando por mudanças em suas leis para garantir direitos a esse grupo tão marginalizado. Alguns países avançam mais rápido, como nosso vizinho Uruguai, outros mais lentamente, como a Rússia, com um presidente que instiga na população a violência contra os homossexuais. Mas o caminho da garantia de direitos ao grupo LGBT é um caminho sem volta. O preconceito uma vez quebrado na cabeça das pessoas não volta atrás. É apenas necessário esperar, respeitar o tempo da democracia, da discussão, da informação e o dia da igualdade fica cada vez mais próximo. É uma mudança cultural, e mudanças geram insegurança, tiram as pessoas das suas zonas de conforto. Mas eu acredito na capacidade de adaptação do ser humano, tenho certeza que vamos todos nos acostumar à essas novas famílias.

Em um momento do filme, Lincoln pergunta a alguns colegas de trabalho se eles acreditam que algumas pessoas nasceram no momento histórico errado. Imagino que ele se questionava se talvez não deveria ter nascido noutros tempos, se ele deveria mesmo estar fazendo parte daquele grupo de homens tão dividido, alguns tão preconceituosos, mas ainda assim com o poder de mudar o futuro de milhares de pessoas.
Eu particularmente acredito que ele estava no tempo certo. Acredito que são necessárias no mundo pessoas como ele, como Mandela, como a Madre Teresa entre inúmeros outros. Pessoas com empatia para enxergar o ser humano por trás da cor, da situação social ou da orientação sexual. Pessoas com coragem e inteligência para se expor em espaços coletivos, assumir seu apoio e lutar por causas como essa com serenidade e respeito.

Um dia olharemos para trás com vergonha por ter negado direitos ao grupo LGBT.

Da mesma forma como hoje nos envergonhamos da escravidão e do racismo.

sexta-feira, 27 de abril de 2012

Qualquer maneira de amor vale a pena, qualquer maneira de amor vale amar.


POR GUILHERME GASSENFERTH

Este texto foi originalmente escrito em 18 de maio de 2011. De lá para cá, os gays conseguiram o direito à união civil homoafetiva no STF, mas os direitos básicos (à vida, à dignidade, à tolerância) continuam desrespeitados. O PLC 122 não foi aprovado ainda. Portanto, o texto continua atual em sua defesa dos seres humanos.

O debate aqui pelos comentários está aberto! Participe. Todas as opiniões contrárias, desde que respeitosas, serão consideradas.

A imagem acima ainda o choca? É bom que leia este texto então.

O título do texto foi extraído da música Paula e Bebeto, de autoria de Caetano Veloso e Milton Nascimento.

Dia 17 de maio, é o Dia Internacional Contra a Homofobia, e neste ano, completar-se-ão 22 anos da retirada do "homossexualismo" da CID - Classificação Internacional de Doenças da OMS - Organização Mundial de Saúde. Há 22 anos a ciência reconhecia que não há doença, desvio ou disfunção no comportamento homossexual. A ciência já avançou, mas alguns homens continuam atrasados e retrógrados, tentando utilizar-se de textos escritos há mais de 3.500 anos como justificativa para suas conclusões.

No mesmo Dia Internacional Contra a Homofobia, o jornal Folha de S. Paulo, em seu editorial de 17 de maio de 2011, age ou com má fé ou com leviandade e levanta preocupação com o Projeto de Lei Complementar 122 (PLC 122), notadamente porque, segundo eles, o PLC 122 é um mecanismo que poderá ser usado para cercear a liberdade de expressão. Veja trechos do texto:
"A amplitude e a indefinição dos termos ergueria uma espada sobre qualquer discurso ou escrito que condene a homossexualidade. Poderia ser acusado de ‘induzir’ a discriminação e, em tese, levar à pena de reclusão por um a três anos, mais multa."

Sim! Qualquer discurso ou escrito que condene a homossexualidade tem que ser criminalizado. Alguém pode condenar o negro? Ou o judeu? Contra o gay também não deve poder.

Nós gays não escolhemos nascer assim. Quem em sã consciência ESCOLHERIA um caminho que lhe renderá uma vida com preconceito, discriminação, intolerância, dificuldades? Ninguém, em pleno uso de suas faculdades mentais ESCOLHE ser algo que lhe trará prejuízos e sofrimento.
Eu fui educado em boas escolas; tenho pai e mãe casados, que sempre me encheram de amor e carinho e que convivem harmoniosamente com toda a família, muito bem estruturada; não convivi quando criança com gays ou lésbicas; assisti aos mesmos desenhos que qualquer criança que hoje tem 26 anos assistiu; brincava na rua com os amigos; subi na árvore; nunca tive bonecas, mas sim carrinhos; sempre tirei boas notas na escola... e aí? Onde que o MEIO definiu que eu seria gay? Eu nasci assim. E tenho orgulho de ser assim.

Não tenho problema nenhum com heterossexuais, pelo contrário: devo minha existência à deles, e para mim eles são tão normais como eu. Nós gays amamos os heterossexuais e não criaremos uma “ditadura gay”. Jamais tentarei impor a algum heterossexual a "conversão" à homossexualidade, até porque isso não existe. A "conversão sexual" não existe e é um produto que mesmo no fim do século XX já era rechaçado.

Então, se eu nasci gay, se eu naturalmente sou assim, quem poderá acusar-me de estar errado? Se a homossexualidade é encontrada mesmo entre os animais, como não poderá ser algo natural?

O texto da Folha prossegue: “Parlamentares evangélicos temem que o projeto, se aprovado, venha criminalizar a pregação contra os gays. A relatora, contudo, propôs como única modificação ao texto da Câmara que seja aberta exceção para "a manifestação pacífica de pensamento decorrente de atos de fé".

Desculpe-me a Senadora Marta Suplicy, mas nem essa exceção deveria haver. Pregação contra os gays deve ser também crime! A ausência de pregação contra os gays não implica em aceitação da homossexualidade, mas simplesmente como um processo de tolerância,como o próprio Cristo ensinara. Ninguém quer obrigá-los a gostar de nós, apenas a nos tolerar e respeitar.

E afinal, quem tem direito de pregar contra mim? “Aquele que de entre vós está sem pecado seja o primeiro que atire pedra”. (João, 8:7). A história das igrejas não é imaculada, pelo contrário!

Ainda a Folha, em seu texto: “E se alguém se manifestar pacificamente contra homossexuais, mas não por motivos religiosos? Poderá ser preso, censurado?”.Evidentemente, deverá ser preso e censurado. Volto a comparar (afinal, será a mesma lei): alguém pode manifestar-se pacificamente contra os negros? Contra as mulheres? Não. E com a inclusão de idosos, deficientes e gays, nem estes grupos poderão ser alvo de manifestação “pacífica” contra. Pacífica entre aspas, pois não consigo enxergar como a manifestação contra uma minoria possa estar relacionada à palavra paz. Paz é a favor, não contra.

Aos religiosos das diversas denominações, tolero-os e respeito-os todos, e os amo como irmãos que somos em Cristo. E falando Nele... contou-nos Mateus, no capítulo 22, versículos 37 a 40: "Respondeu-lhe Jesus: Amarás ao Senhor teu Deus de todo o teu coração, de toda a tua alma, e de todo o teu entendimento. Este é o grande e primeiro mandamento. E o segundo, semelhante a este, é: Amarás ao teu próximo como a ti mesmo. Destes dois mandamentos dependem toda a lei e os profetas." E veja-nos o que ensinou-nos a Bíblia em I João 4:11 "Amados, se Deus assim nos amou, também nós devemos amar uns aos outros." É  amor ao próximo essa peregrinação anti-gay que alguns líderes religiosos apregoam?

Continua o editorial: “A criminalização da homofobia resulta de um impulso nobre, que objetiva proteger pessoas discriminadas pelo que fazem em sua vida privada. Não pode, porém, servir para cercear liberdades que fundamentam a própria convivência civilizada e democrática.”. Meus caros editores, mesmo a liberdade precisa possuir limites. Não é porque somos livres que eu tenho o direito de fazer o que eu bem entender. Não posso pegar uma arma e atirar em alguém. Da mesma forma, a discriminação contra gays deve ser criminalizada.

Vamos à nossa Constituição Federal de 1988, que já em seu preâmbulo afirma: “Nós, representantes do povo brasileiro, reunidos em Assembléia Nacional Constituinte para instituir um Estado Democrático, destinado a assegurar o exercício dos direitos sociais e individuais, a liberdade, a segurança, o bem-estar, o desenvolvimento, a igualdade e a justiça como valores supremos de uma sociedade fraterna, pluralista e sem preconceitos, fundada na harmonia social e comprometida, na ordem interna e internacional, com a solução pacífica das controvérsias, promulgamos, sob a proteção de Deus, a seguinte CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA FEDERATIVA DO BRASIL.”

Vamos adiante, na nossa Constituição Cidadã: “Art. 1º: A República Federativa do Brasil [...] tem como fundamentos: [...] II – a cidadania; III – a dignidade da pessoa humana”.

“Art. 3º: Constituem objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil: [...] IV – promover o bem de todos, sem preconceito de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação”.

E, por fim: “Art. 5º: Todos são iguais perante a lei. [...] III – Ninguém será submetido a tortura ou a tratamento desumano ou degradante”.

Um conhecido afirmou: se um evangélico não quiser alugar uma edícula no fundo de sua casa para um gay, ele tem que ter esse direito. Peraí! E o gay pode ser humilhado porque o evangélico (no exemplo citado) não quer lhe alugar? Se isso não é submeter o gay a tratamento desumano, não sei o que é.

Citamos alguns dos principais trechos de nossa Carta Magna. O PLC 122 é isso. É um projeto de lei que reforça o que a Constituição já prevê. Por que não aprová-lo? Nós estamos falando de dignidade, cidadania, discriminação, preconceito, de uma SOCIEDADE FRATERNA, PLURALISTA E SEM PRECONCEITOS.

O PLC 122 quer criminalizar a discriminação dos não-heterossexuais assim como a Lei 7.716/1989 criminaliza a discriminação arbitrária por cor de pele, etnia, origem nacional e religião. O PLC quer incluir orientação sexual, idosos e deficientes na mesma lógica. Nesta proposta, se um gay resolver agredir um heterossexual ele sofrerá a mesma pena que se o inverso tivesse acontecido.

Nossos direitos não tiram os direitos dos outros. Quanto mais seres humanos tiverem direitos civis assegurados, mais pleno será o estado democrático que se busca em nosso ideário republicano.

Para finalizar o raciocínio: o Grupo Gay da Bahia (GGB) denunciou 266 assassinatos motivados por violência homofóbica só em 2011. Alguém pode dizer que a homofobia não existe ou que ela é inofensiva? 266 pessoas perderam suas vidas porque eram gays, lésbicas, travestis ou transexuais. O Brasil é o campeão mundial de assassinatos homofóbicos. E isso, puritanos e moralistas, é certo? Cadê o berreiro? “Não matarás”, diz o decálogo de Moisés. Mas não é o que os homofóbicos assassinos observaram na hora de materializar seu ódio e seu destempero mental contra um homossexual. Vale dizer ainda que o número de homicídios homofóbicos está numa preocupante progressão: nos três primeiros meses de 2012 o número dobrou em relação a 2011. Mas não esmoreceremos em nossa luta!

Tiradentes foi insurrecto por defender a redução da carga tributária. Gandhi levantou-se contra a opressão da metrópole inglesa imposta á Índia. Martin Luther King fez seu discurso ecoar em 1968 e ajudou a estabelecer direitos civis aos negros norte-americanos. Mandela fez uma revolução pacífica e ajudou a acabar com a segregação oficial que existiu até há pouco tempo na África do Sul. Brasileiros, heteros e não-heteros, é chegado o momento. Agora é a nossa vez de buscarmos pacificamente (mas com firmeza) nossos direitos, de procurarmos nossa inserção social, de lutarmos contra a homofobia, e de batalharmos pelo direito de amar a quem quisermos! Vamos em frente, em nome do amor!

“E a gente vai à luta, e conhece a dor, consideramos justa toda forma de amor”. Lulu Santos

Quem quiser obter mais informações, sugiro o site www.plc122.com.br - atualizado e cheio de informações valiosas.

sábado, 5 de novembro de 2011

Eu não tenho preconceito, mas...


POR GUILHERME GASSENFERTH

Há algumas semanas eu assistia a uma palestra sobre um tema interessante. Num dado momento, o palestrante fez o célebre prelúdio que sempre me deixa preocupado: “eu não sou homofóbico, mas...”. Esta introdução invariavelmente indica que uma assertiva preconceituosa está por vir. Para compreender melhor, é possível substituir a palavra homofóbico por racista, por exemplo. O comentário que vem a seguir provavelmente será preconceituoso. Afinal, alguém já viu uma pessoa não ser chata após dizer “não quero ser chato, mas...”?

Este preâmbulo que o palestrante em questão usou reflete uma dicotomia em nossa sociedade. É sabido que o preconceito e a discriminação são condenáveis, negativos, indesejados, mas por outro lado, ainda assim, vigem no pensamento e sentimento de muitos. Quando ele se justifica dizendo que não é homofóbico, é porque entende que sê-lo não é algo essencialmente bom. Se assim não fosse, não precisaria dizê-lo, pois a sua vindoura frase de teor homofóbico seria bem aceita pelos receptores da mensagem. Talvez apresente justificativa prévia para inconscientemente livrar-se da culpa pelo que vai falar. Mas mesmo assim ele vai adiante e diz o que pensa. Nestes casos, é o próprio porco que joga as pérolas.

Na mesma linha dos que dizem não ser homofóbicos, mas assim agem, estão os que “não tem nada contra, mas só não gostam dos afeminados.” Tenho muitos amigos e conhecidos que comentam comigo: “nada tenho contra você, você é meu amigo, mas não gosto das ‘bichinhas’”. Isto é medíocre e precisa ser extinto. É claro: quando não se é diferente, não há choque. Individualmente, nunca fui vítima de discriminação. Como não sou afeminado e insiro-me num estrato visto como ‘normal’ pela sociedade, em aspectos sociais, culturais, econômicos, profissionais etc., as pessoas não vêem em mim alguém diferente. É mais do mesmo, com a exceção do comportamento sexual e afetivo, mas que geralmente é praticado à luz da intimidade. O verdadeiro ser desprovido de preconceito é o que tem amizades com quem quer que seja, e usa como único critério as afinidades intelectuais, pouco lhe importando o modo de falar, vestir-se ou gesticular do amigo.

A homofobia só faz uma sociedade mais doente e injusta. É reprovável por todos os ângulos, sob todos os prismas, e deve, por isso, ser combatida, inclusive com a devida positivação legal.

Rogo a todos que considerem que diferentes pessoas, com diferentes credos, diferentes etnias e diferentes orientações sexuais são todas peças do complexo quebra-cabeças que é a sociedade e, portanto, devem ser não só toleradas, incluídas e respeitadas, mas trazidas ao bojo da igualdade que norteia uma convivência saudável e feliz.

Por fim, quero compartilhar: interessante pesquisa conduzida pela Universidade da Geórgia dividiu criteriosamente homens em grupos “homofóbicos” e “não-homofóbicos” e expôs os grupos a três vídeos de sexo: entre dois homens, entre um homem e uma mulher e entre duas mulheres. Apenas o grupo dos homofóbicos apresentou excitação durante a exibição do vídeo gay. Hm... Deixo esta conclusão por conta de cada um.

Guilherme A. Heinemann Gassenferth é empresário, envolvido com causas sociais e ativismo LGBTT e especialista em Gestão de Organizações do Terceiro Setor pela PUC PR.