Foi decepcionante. Estive atento à campanha para a Prefeitura de Joinville e, fora raros casos, foi tudo feito com os olhos em quatro anos. Não houve a preocupação de discutir os desafios estruturais para o futuro da cidade. É fácil entender, porque os políticos precisam conquistar os eleitores e as propostas mais complexas – que é preciso explicar – não são práticas. O problema é que isso torna o debate muito raso. Parece que ninguém pensa além das eleições.
É tudo um erro. As cidades estão cada vez mais complexas e exigem soluções de longo curso. Vamos pegar num exemplo batido: não se trata de acabar com os ônibus lotados. É pouco. É necessário dar resposta aos desafios do futuro e propor um novo sistema. É preciso levar a imaginação ao poder. Mas o que se viu, com raríssimas exceções, foi a pobreza de ideias. Tomei nota de alguns temas que gostaria de ver discutidos, mas que sequer foram mencionados.
1. Evolução da matriz econômica da cidade
Joinville é uma cidade industrial, mas com um perfil ligado a indústrias pesadas. É preciso repensar esse posicionamento. Sem abrir mão do que já existe, pensar no conceito de “smart city”, por exemplo. Estimular a transição para uma economia mais sustentável e de tecnologias limpas deve ser uma prioridade. As cidades inteligentes investem em energias renováveis, eficiência energética e atividades de baixo impacto ambiental. Há muita margem de manobra. E é possível aumentar o PIB da cidade investindo na inteligência. Mas o hábito do cachimbo faz a boca torta. Isso obrigaria a ter uma estratégia e ninguém, ao longo dos anos, teve essa preocupação.
2. Transporte público multimodal
O eleitor tem uma visão limitada os transportes públicos. Quando se fala no tema, todos pensam em ônibus porque é a realidade desde sempre. É como se fosse a única hipótese. Qualquer cidade precisa pensar em modelos multimodais e integrados. Houve uma proposta de metrô de superfície, mas a mensagem não chega ao eleitor. É preciso muito tempo para explicar e a dinâmica das campanhas não permite. Seria a solução? Se não, então é preciso buscar alternativas, porque os joinvilenses não podem ficar reféns da ditadura das empresas de ônibus para sempre. Mas a falta de estudos e debates mais amplos sobre outras possibilidades revela uma visão estreita dos desafios urbanos.
3. Reciclagem e recolha de lixo
Não é preciso inventar. É só fazer um benchmarking em cidades do tal Primeiro Mundo e copiar. A integração do setor público e privado encontra aqui um campo com potencial. A economia verde é lucrativa. Mas o sistema de gestão de resíduos em Joinville é precário. Modelos avançados de recolha e reciclagem de lixo, já implantados em cidades desenvolvidas, poderiam ser adaptados à realidade local. Aqui onde vivo, em Portugal, o meu lixo é recolhido por quatro tipos de caminhões diferentes, cada qual com um tipo de dejeto. É preciso um plano robusto que repense a gestão de resíduos, através de uma visão ambiental de longo prazo.
4. Visões provincianas impedem o turismo
O turismo em Joinville parece ser feito por gente que nunca viajou na vida. É um setor que devia estar planejado para ter um peso muito significativo o PIB da cidade. Mas não. O que que se tem é uma visão simplista e provinciana. Já falei nisto aqui, num texto em que me pus no papel de turista em Joinville, algo que faço todos os anos. E aí vai o spoiler: é muito ruim. O link está aqui .
5. Um planejamento que não planeja
É quase uma incúria falar em planejamento na Prefeitura de Joinville. A coisa começa já pelo nome: Secretaria da Administração e Planejamento. É quase um oxímoro. A administração trata de coisas burocráticas e chatas, enquanto o planejamento devia tratar de novas ideias, coisas criativas e propostas de fundo. Mas isso não existe. Se a gente chamasse Secretaria da Burocracia ficava tudo na mesma. Porque dali não sai uma única ação estratégia. O que se tem na prática é uma gestão reativa, sem metas para o futuro da cidade. O planejamento devia ser a espinha dorsal de qualquer governo municipal. Aliás, devia ser o local de onde sairiam as soluções para todos os outros itens mostrados neste texto.
As eleições são uma oportunidade de repensar o futuro de Joinville, mas o atual debate eleitoral não esteve à altura dos desafios. Não há um compromisso com as ideias que farão a diferença para estas e as próximas gerações. Porque a medida das “gerações” é sempre os quatro anos, quando os eleitores voltam às urnas. Enfim, o que temos é uma cidade rica, mas como um estilo de vida muito pobre.
É a dança da chuva.