segunda-feira, 31 de julho de 2023

Que tal pôr o Mercado Municipal de frente para o Cachoeira?

POR JOSÉ ANTÓNIO BAÇO

Um dia destes um amigo estava a elogiar o Mercado de Lages. Segundo ele, na comparação com o mercado municipal de Joinville, o nosso leva uma sonora goleada. Aproveitei para introduzir um argumento que parece interessante, mas que nunca vi ser discutido: é preciso que o mercado local deixe de estar de costas viradas para o rio. O ambiente proporcionado pelos flamboyants é muito agradável, mas um rio acrescenta encantos e tem enorme potencial. Aliás, um passarinho contou que os flamboyants poderiam estar em risco por serem árvores exóticas.

O tema é oportuno. A Prefeitura de Joinville pretende realizar uma obra a que chama Porto Cachoeira, um parque linear urbano às margens do rio. É uma boa iniciativa, que, aliás, só peca por tardia. Ter um espaço junto ao rio deveria ser a coisa mais natural do mundo. Mas sem querer jogar água no chope, o São Tomé que habita em mim quer ver para crer. O historial da cidade na "realização" de obras de grande porte não tem seguido o melhor dos percursos ao longo dos tempos.

Um parque linear é bom, mas o rio precisa de atenção para se tornar mais agradável. E uma pequena mudança no Mercado Municipal, voltando-o para o rio, podia ser um bom início. Aliás, seria um retorno às origens. É bom lembrar que, no fim do século XIX, o comércio obrigava a cidade a estar virada para o rio. O Cachoeira tinha cais, porto, armazéns e até o moinho de trigo. Foi então que prefeito Procópio Gomes de Oliveira construiu o primeiro Mercado Público, de arquitetura açoriana.
 
Quando Luiz Henrique da Silveira assumiu a prefeitura, o prédio foi demolido para dar lugar à construção que existe hoje, um exemplar daquilo que as pessoas chamam “estilo enxaimel”. Mas não tem estilo e nem é enxaimel. Hoje o Germano Kurt Freissler é um lugar agradável, mas ainda há muitas insuficiências para fazer do lugar um espaço turístico sem restrições. O espaço tem potencial para ser um "ex-libris" da cidade. Mas isso exigiria iniciativa, investimentos e um olhar para além das eleições.

Talvez seja boa ideia mudar o "modelo". Sem retirar o ADN do local, tentar aumentar a oferta e pôr o local mais em sintonia com os mercados modernos que vão surgindo pelo mundo. Como? Não me perguntem. Eu sou apenas o gajo que passa um mês por ano em Joinville e gosta de tomar uma cerveja à beira de um rio. Os gestores públicos, que são pagos para isso, que descalcem essa bota. Afinal, é para isso que as pessoas pagam impostos: para que eles encontrem soluções. Eu apenas faço sugestões.

É a dança da chuva.

Mercado de Lages


domingo, 23 de julho de 2023

No fio do bigode

 POR JORDI CASTAN

A CAJ (Companhia Águas de Joinville) é a joia da coroa da administração municipal. Uma empresa que, se for bem administrada, fiscalizada e cobrada poderá ser motivo de orgulho para todos os joinvilenses. Como toda empresa pública, seus processos estão sujeitos as leis. A famosa lei 8666 estabelece normas gerais sobre licitações e contratos administrativos pertinentes a obras, serviços, inclusive de publicidade, compras, alienações e locações no âmbito dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios. Esta lei foi atualizada com a publicação da 14133. A principal diferença entre a lei 8666 e a lei 14133 é que a nova lei 14133 se adequa às novas tecnologias e às necessidades do setor público atual.

Conheço bem a 8666, da época em que fui presidente da CONURB, empresa municipal de economia mista. Conheço menos a 14133, mas em nenhum dos seus artigos e parágrafos encontrei o termo “no fio do bigode” como forma de contratação ou de negociação ou acordo entre as partes, quando uma delas está sujeita ao cumprimento da lei. Mas de acordo com o depoimento dado na Câmara de Vereadores pelo proprietário do imóvel alugado à CAJ, tudo foi feito no "fio do bigode".

Fui estudar o significado da expressão e a época em que surgiu: o bigode era um símbolo de homem honrado, que, além de barba, tinha "vergonha na cara". Seu significado é prometer algo verbalmente, sem precisar de assinatura, e sua origem é incerta. Acredita-se que tenha surgido da frase germânica “Bei Gott”, usada em juramentos e que significa “por Deus”.

Nada de encontrar essa figura como forma válida e legal para contratação com o serviço público de produtos e serviços. Ainda para complicar, nesta época em que há tantos “homens” usando barba e bigode fica mais difícil poder assegurar que haja tanto homem honrado. Vai que duvido da honestidade de muitos que são. Mas o legislador quando não previu a contratação “no fio do bigode” deveria saber por que não o fez.

A história é simples, até simples demais. A CAJ contratou, se acreditarmos no depoimento do Sr, Arlindo Tambosi  que construiu um prédio completo para a Companhia Águas de Joinville. Sem outra garantia que o fio do bigode. No mínimo é temerário. O prédio em questão é a nova sede da CAJ localizada na região central de Joinville e foi construída sob medida para atender as demandas da Companhia, num modelo denominado BTS ou Build to Suite, numa tradução livre, construído para servir a um propósito específico.

Não vou entrar no mérito do saber se a nova sede melhorou o acesso do joinvilense, nem se representou um aumento da qualidade do atendimento ou do número de posições de atenção ao cliente porque não há ônibus passando na frente, não houve aumento do numero de posições. Portanto, até agora parece que não melhorou em nada a vida do cliente.

O processo de contratação desperta dúvidas, especialmente na forma de pago do aluguel, nos valores e nas parcelas contratadas. Está mais do que na hora de colocar luz neste esgoto em que esta se convertendo a que deveria ser motivo de orgulho para todos. Aliás, Joinville tem ainda um dos percentuais de cobertura de saneamento básico mais vergonhosos do Brasil, especialmente entre as cidades de seu porte. Quando a água da torneira deixa de ser incolor, inodora e insípida? É hora de investigar mais. 

terça-feira, 18 de julho de 2023

Se Floripa vai ter o Dia do Batman, Joinville devia ter o Dia do Riquinho

POR JOSÉ ANTÓNIO BAÇO

Floripa pode vir a ter o Dia do Batman. E eu, que sou muito invejoso, fico a imaginar a criação de uma data para Joinville poder competir com a capital. Depois de um extensivo benchmarking (palavrinha que esse pessoal do Novo adora de paixão), tenho uma sugestão a fazer: que tal criar o Dia do Riquinho? Sim, aquele menino podre de rico. Não sei se vocês concordam, mas acho que tem tudo a ver com a vida política da cidade.

Riquinho é um personagem das histórias em quadrinhos criado por Alfred Harvey e Warren Kremer. É um garoto herdeiro de uma fortuna. As histórias de Richie Rich, o seu nome em inglês, geralmente envolvem aventuras a explorar o seu parque de diversões privado ou a enfrentar vilões. Olha a metáfora aí, gente: poderíamos dizer que os vilões são os caras da esquerda (geralmente pobres de marré) e o parque de diversões seria a própria cidade. Não faz sentido?

Resumindo, Riquinho é conhecido por ser uma criança rica, muito rica. É herdeiro de uma fortuna incomparável, proveniente dos negócios bem-sucedidos de seus pais e ancestrais. Na história em quadrinhos, a sua riqueza é retratada através de uma mansão gigantesca, conhecida como "Mansão Rich". Sem querer ficar repisando nas metáforas, acho que podemos fazer outra analogia com um certo prédio na avenida Hermann August Lepper, que também é muito grande.

O personagem Riquinho é tido como inteligente, tudo graças à sua educação privilegiada. Mas há um contrassenso. Se existisse em carne e osso, o rapaz seria bolsonarista, até porque é uma questão de classe. Os muito ricos – em especial de Joinville – adoram Bolsonaro. Mas não existe coisa mais desinteligente do que ser bolsonarista. Enfim, mesmo que uma pessoa seja criada com iogurte de leite de beija-flor, isso não é garantia de pensamento sofisticado.

E como o pessoal que manda na city tem o mindset nas coisas do marketing, proponho a introdução de um processo de "ritual markerting". A data (um feriado, claro) seria a 15 de dezembro, o Dia do Jardineiro, e teria um ritual: nesse dia seria implantado o costume de dar flores e livros. A ideia é inspirada na festa de Sant Jordi, o santo padroeiro da Catalunha. Lá são rosas, mas em Joinville pode ser qualquer flor. Quanto aos livros, só obras do “filósofo” Olavo de Carvalho.

Vai ser um sucesso. Chupa, Batman. Chupa, Floripa.

É a dança da chuva.

Em Floripa, Dia do Batman. Em Joinville, Dia do Riquinho



sábado, 15 de julho de 2023

Joinville não gosta de Lula, Lula gosta de Joinville

POR JOSÉ ANTÓNIO BAÇO

A notícia foi veiculada em junho. A Secretaria de Saúde de Joinville aderiu ao programa Mais Médicos, com um pedido para a contratação de 51 médicos (é um número esquisito, mas todos sabemos que 51 é uma boa ideia). O Mais Médicos, agora retomado pelo Governo Federal, é um projeto vantajoso para os municípios, já que a prefeitura paga apenas os auxílios moradia e alimentação, com o Governo Federal assumindo as outras despesas. 

Muita gente podia imaginar entraves por parte do atual Governo Federal. Afinal, Joinville é um dos redutos mais bolsonaristas do país. É irônico lembrar o azedume revanchista do ex-presidente, que discriminou os governadores da região Nordeste, onde teve menos votos. Em 2019, ele afirmou que muitos dos governadores nordestinos "são socialistas". "Eles vão ter que falar que estão trabalhando com o presidente Jair Bolsonaro. Caso contrário, eu não vou ter conversas com eles", disse. 

Mas no caso de Joinville não houve qualquer entrave. Ainda esta semana, apenas um mês depois, o município soube que o pedido tinha sido aprovado e que os médicos iriam ser contratados. Qual a diferença entre Bolsonaro e Lula da Silva? É que Lula segue uma lógica muito clara: o presidente governa para todos os brasileiros, mesmo os que não gostam dele e não votaram nele. Lula segue o mais elementar espírito republicano, algo que o inelegível Bolsonaro nunca praticou e sempre desprezou.

A previsão é de que os médicos do iniciem as atividades até ao final deste ano. Mas não vamos fazer de contas que  muita gente ligada à esquerda não conseguiu esconder um certo sorriso. Porque, cá entre nós, não deixa de ser um tapa com luva de pelica no pessoal que odeia o atual presidente. Lula, que é odiado, faz o bem para a cidade. Bolsonaro, que é amado e até recebeu uma machadinha, sempre cagou e andou para a cidade e nunca trouxe qualquer contributo para a vida dos joinvilenses. Ironias...

Só faltava o presidente Lula criar o programa Mais Jardineiros. Isso sim ia fazer a felicidade da administração pública em Joinville.

É a dança da chuva.



sexta-feira, 14 de julho de 2023

Os meus filhos

POR JOSÉ ROBERTO PETERS

Amo meus filhos. São parecidos comigo e com a mãe deles, só que mais bonitos. São preparados, só que mais inteligentes. Têm qualidades e defeitos. Por isso estão preparados. Vão errar? Com certeza. Mas vão acertar muito mais. Minha filha é doutoranda, meu filho faz duas faculdades. Falam inglês, espanhol e sei lá mais que línguas. Se fossem viajar pelo mundo não seriam como eu: pra comer eu ia ter que fazer gestos ridículos de passar a mão pela barriga e meio que “abanar a língua”.

E é pra isso que a gente cria filhos: pra se virar no mundo, que é bem diferente do que era quando eu tinha a idade deles. Se eu tenho saudades do meu tempo? Não. Criar filhos hoje é mais fácil. Eles têm mais informação, mais teorias e mais acesso à informação. Imagino se meus pais vivessem no tempo do google — e não da “Barsa”, quando a gente estava em idade escolar —, onde estaríamos (eu e meus irmãos) hoje? Não porque o google é superior à Barsa, mas porque meus pais entendiam o poder da educação e da informação.

Hoje ouvi alguém no ônibus contar uma história (era uma conversa alheia) — no transporte coletivo não há como não ouvir — de uma mãe que estava tendo um problema: “Dois filhos: a filha doce e o filho rebelde, que tinham conseguido uma vaga numa ‘escola militar`”.

[Abro aqui um parêntesis (no caso usei colchetes): a escola é “militarizada” e não militar. A escola militar (das forças de segurança: polícia, exército etc.) tem um propósito: formar policiais, oficiais do exército etc. A escola militarizada tem o objetivo de “disciplinar” os alunos com: fazer tarefas, se calar ante os de hierarquia superior, não usar cabelos soltos e brincos (as meninas) ou cabelos grandes e brincos (os meninos) e que tais]. Fechado o parêntesis (ou colchetes), volto à história.

Pois bem, “a filha doce odiou. O filho rebelde amou. Ah! Dizia a que mulher que contava a história. ´As crianças de hoje — mesmo falando sobre adolescentes — não gostam de disciplina, não sabem cantar o hino nacional e não gostam de rezar`”. Parece que estas eram as atribuições que se queria na tal escola: obedecer, cantar o hino e rezar. Vai ver — e isso é um palpite — que a “filha doce” (que obedecia, sabia o hino e orava) descobriu que a vida é mais do que isso. E que o “filho rebelde” (que não obedecia, não sabia o hino e não orava) descobriu que a vida é também isso.

Ora, me lembrei de uma aula que dei em um curso de pós-graduação, em Goiânia, em que uma aluna falou que agora que a escola estava militarizada e a disciplina era outra: muito melhor. Eu perguntei sobre o aprendizado. Ela disse que “a mesma coisa de antes, ruim. Mas, pelo menos, não precisava ficar pedindo silêncio”. Isso: alunos dóceis e ainda sem aprender.

Paulo Freire dizia que educação é amor. Onde tem alguém disposto a ensinar e alguém disposto a aprender está estabelecida uma relação de educação. E a disposição para ensinar (ou aprender) é nata do ser humano (talvez a sua essência). E educar é libertar. É propor (e expor) o outro pro mundo. E o mundo é o que se vê por aí: tem de um tudo. Sonegar informação é dificultar a caminhada.

Assim, meus filhos, na medida do possível e das possibilidades — veja nessa construção: possível e possibilidades. O mesmo radical para dizer “o que demos conta” e “o que dava pra fazer” — vão até onde quiserem, mas terão que fazer a sua parte na construção e com as “armas” que demos e que têm. E estas “armas” são privilégios. Os defensores da tal meritocracia não levam em conta os privilégios. E é isso, todos deveriam ir até onde quiserem, independente do ponto de partida. Mas a gente sabe que não é bem assim. E não é só ensinar hino, obrigar a obedecer e fazer orar que vai fazer um cidadão. A vida é mais do que isso.
 
José Roberto Peters é pai de dois filhos e professor universitário.





quinta-feira, 13 de julho de 2023

Lugar de milico é nos quartéis, não nas escolas

POR JOSÉ ANTÓNIO BAÇO

Mas que boa notícia. O Ministério da Educação decidiu acabar com essa coisa das escolas militares. Há quase quase 200 instituições na mira, em todo o país, e o desmanche dessa aberração bolsonarista exige alguns cuidados. É claro que já existe um certo choro e ranger de dentes, em especial dos militares que vêm atuando na gestão escolar e educacional dessas instituições. Afinal, uma graninha extra sempre calha bem. E os militares brasileiros parecem habituados à teta estatal.

“A partir desta definição, iniciar-se-á um processo de desmobilização do pessoal das Forças Armadas envolvidos em sua implementação e lotado nas unidades educacionais vinculadas ao Programa, bem como a adoção gradual de medidas que possibilitem o encerramento do ano letivo dentro da normalidade necessária aos trabalhos e atividades educativas", diz o ofício do Ministério da Educação. Traduzindo, quer dizer que lugar de milico é no quartel.

Educação é coisa séria e há muito a fazer neste caso. Ou melhor, a desfazer. Os defensores do modelo argumentam que, por impor disciplina, essas escolas trazem benefícios. É só estupidez. A disciplina é importante, mas o foco excessivo nesse aspecto não pode se sobrepor a outras áreas do conhecimento. Isso limita o desenvolvimento de habilidades acadêmicas e criativas, bem como a capacidade dos alunos de questionar e explorar diferentes ideias.

Os aspectos negativos são evidentes. A abordagem autoritária num mundo que exige pensamento crítico e criativo é o mais relevante. A hierarquia e a disciplina rígida levam a um ambiente onde a liberdade de expressão e individualidade são suprimidas. Não é pedagógico e também não aponta para a necessária vivência em democracia. O que surpreende em nada, uma vez que estamos a falar de uma iniciativa bolsonarista. E nada de bom vem de Bolsonaro.

Nem se trata de discutir a questão pedagógica. Os milicos sequer sabem o que é isso. Mas grana é grana e um extra no fim do mês seduz. Eis o problema: essas escolas estavam a se tornar um tremendo cabidão de emprego. Portanto, é melhor passar uma borracha nessa cagada. O Brasil precisa sair do atraso. O caminho precisa ser o futuro e não a volta desse fedor de 64. Voltem para os quartéis, senhores!

É a dança da chuva.



terça-feira, 11 de julho de 2023

Ei, Eduardo Bolsonaro, vai se f...

POR JOSÉ ANTÓNIO BAÇO

Há coisas que nem o diabo acredita. E não é que o deputado Eduardo Bolsonaro foi associar os professores a traficantes de drogas? O tipo disse disse que os pais precisam estar atentos a professores doutrinadores e que eles podem ser piores do que quem sequestra crianças para o tráfico. A fala surpreende? Não. Estamos a falar da tática de "dog whistle", usada para mobilizar o gado.

A família Bolsonaro é um caso típico de “dark factor”. Não sabe o que é? É uma teoria da psicologia que busca descrever um conjunto de características da personalidade associadas a comportamentos e tendências ruins. Também conhecido como “D-factor", ele se baseia na ideia de que existem traços negativos que são compartilhados e que podem influenciar uma série de comportamentos antiéticos ou imorais.

Eduardo é uma expressão de Jair. Aliás, no Brasil eu me atreveria a chamar “B-Factor, numa “homenagem” à alma sombria dos Bolsonaro. O conceito surgiu de estudos que tentavam explicar o comportamento humano negativo. As conclusões são baseadas em pesquisas que identificaram uma correlação entre diferentes traços de personalidade negativos, como o narcisismo a psicopatia e o sadismo. 

O "dark factor" fala de indivíduos com traços psicopáticos que podem ir da falta de empatia a comportamentos destrutivos. Vejam lá se estes fatores não correspondem ao bolsonarismo raiz: a falta de empatia, o uso da manipulação e da mentira, o comportamento impulsivo, a busca por poder e controle ou mesmo as práticas antiéticos. Se fosse uma aposta era jackpot. 

É claro que o deputado estava a falar para os bolsonaristas. Porque ainda há muita gente receptiva a esse tipo de discurso. Aliás, sem querer psicanalisar, não foi Bolsonaro que fez essas pessoas ficarem más, ele apenas libertou a maldade que estava reprimida em cada uma delas. A identificação com líder ocorre quando os seguidores projetam suas esperanças, aspirações ou a própria maldade nessa figura. 

O exemplo dos Bolsonaro permite lançar a suspeita de que a maldade pode ser genética. É tudo ruim. E pensar que esse Eduardo Bolsonaro é considerado o "intelectual" da família. Enfim, eu, como professor, só tenho uma coisa a dizer ao deputado. E vou escolher a forma mais acadêmica e letrada possível: “Ei, Eduardo, vai se foder, seu bosta”.

É a dança da chuva. 

Eduardo Bolsonaro: a favor das armas, contra os professores


domingo, 9 de julho de 2023

Socorro! Há um comunista debaixo da cama

POR JOSÉ ANTÓNIO BAÇO

O povo de Santa Catarina morre de medo de comunismo. E há políticos que estimulam essa doideira, como a deputada Júlia Zanatta, aquela das florzinhas. Credo! A mulher é mais bolsonarista que o próprio Bolsonaro. “Os deputados que votaram pela Reforma chancelaram ao Conselho Soviético a possibilidade de editar Lei Complementar. Não existe mais Constituição no país”, afirmou. 

Conselho Soviético? Mas o tema não era a Reforma Tributária? Que raio de deambulação mental permite introduzir os sovietes na equação? Até estaria tudo bem se não estivéssemos a viver num tempo em que a União Soviética não é União e muito menos Soviética. "Todo poder aos sovietes", diria alguém com a memória num longíquo 1917. Entenderam a deputada? Não? Tudo bem. Ninguém entende. 

O irônico é que a maioria das pessoas - deputados ou não - não faz ideia do que está a falar. Porque para essa gente, sobretudo os bolsonaristas, o comunismo não é um programa político ou um sistema de governo. É apenas o bicho-papão para assustar os tolos. Os catarinenses não votam contra a esquerda, mas contra o espantalho comunista criado pelo conservadorismo. 

Santa Catarina sofre de "comunismofobia". Quando um catarinense ouve a palavra "comunismo", surta e começa a delirar. É capaz de ver perigo quando alguém propõe que os pobres tenham três refeições por dia. O cidadão imagina, cheio de horror, o dia em que vai ser obrigado a partilhar o último pedaço de bolo com o vizinho. O povo catarinense, talvez uns 70% dele, transformou o bolsonarismo em estilo de vida.

Lula é o inimigo a abater. O atual presidente é o "comuna-mor", a encarnação de todo esse medo. É como se à noite Lula se transformasse num super-vilão que sai pelas ruas obrigando todas as pessoas a usar estrelinhas do PT. E como se fosse um Freddy Krueger vermelho, que invade os sonhos burgueses para pregar o comunismo. Enfim, esses comunas são bandidos capazes de qualquer crueldade. 

E o mais divertido. Os anticomunistas falam sobre comunismo sem jamais terem lido um texto. É como um jogo de telefone sem fio, mas em vez de palavras, eles passam e repassam estereótipos e caricaturas. Imaginam barbudos comunistas tentando implantar o regime soviético. Enfim, o medo do comunismo só não é maior que a burrice voluntária desse pessoal. Ninguém faz a mais pálida ideia do que está a falar.

Quem entra numa rede bolsonarista é logo capturado pelo anticomunismo mais primário. E nem vale a pena tentar argumentar porque são estados mentais muito rudimentares. É como no “Complexo do Pombo”: discutir com essa gente é o mesmo que jogar xadrez com um pombo. Ele derruba as peças, caga no tabuleiro e sai voando a cantar vitória. Então, rir (deles) é o melhor remédio.

É a dança da chuva.



sexta-feira, 7 de julho de 2023

Ah, Santa Catarina, sua ingrata...

POR JOSÉ ANTÓNIO BAÇO
Eis os fatos. Em 2023, com apenas seis meses do governo de Luiz Inácio Lula da Silva, o estado de Santa Catarina está a receber um volume muito considerável de verbas federais. O dinheiro está a chegar através de emendas parlamentares ou de investimentos na malha rodoviária do estado. Não deixa de ser irônico se considerarmos que Santa Catarina é considerada o mais ostensivo reduto bolsonarista do país.

Quanta diferença para o governo anterior. Mas não surpreende. Lula é um estadista, ao contrário do seu antecessor, que discriminou a região Nordeste, numa atitude revanchista pelo desempenho eleitoral pífio. Todos lembramos daquela declaração muito pouco republicana: “daqueles governadores de 'paraíba', o pior é o do Maranhão; tem que ter nada com esse cara", disse Bolsonaro para gáudio do seu gado.

Vamos falar de rodovias? Em três anos de governo de Jair Bolsonaro, entre 2020 e 2022, o investimento foi de R$ 1,1 bilhão. O governo Lula nem bem começou e em apenas seis meses destinou um total de R$ 1,3 bi. Ou seja, num curto espaço de tempo o presidente Lula fez mais do que Bolsonaro durante quase toda a sua administração. Se é que podemos chamar aquele desastre de "administração". 

Contra fatos não há argumentos. Durante o governo Bolsonaro, as obras andaram devagar, quase parando. O ex-presidente foi um inútil. E, afinal, a ligação a Santa Catarina não era amor. Era interesse nas férias. Muitas férias. Andar de jet-ski, passear de moto, pescar ou aglomerar durante a pandemia. Era preciso tirar férias de uma vida com agenda vazia em Brasilia. Fazer porra nenhuma deve ser estressante.

E que tal falar de emendas parlamentares. Há poucos dias, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva liberou um valor recorde de R$ 2,1 bilhões destinados às bancadas estaduais. E adivinhem. As maiores parcelas foram direcionadas para a bancada do Maranhão (R$ 171,1 milhões), com Santa Catarina ficando em segundo (R$ 147,9 milhões). Ah, Santa Catarina, sua ingrata.

Mas vejam a ironia. Dos 16 deputados federais de Santa Catarina, 11 votaram contra a Reforma Tributária, um projeto que a sociedade brasileira pede há quatro décadas. É um tema de interesse nacional, mas esses deputados catarinenses - todos bolsonaristas - votaram contra. Entre eles, o inenarrável Zé Trovão, representante de Joinville no Congresso Nacional. Aí é foda, Joinville. Aí é foda, Santa Catarina.

Bolsonaro veio passear, causou aglomeração e não trouxe dinheiro. Mas mesmo assim é amado pelos catarinenses.


quarta-feira, 5 de julho de 2023

Falar no diploma de Lula é só conversa para boi dormir

POR JOSÉ ANTÓNIO BAÇO

As cenas surgiram na internet, mas no início não reconheci aquele senhor idoso, muito alquebrado e com ar abatido, a dar uma entrevista no programa Roda Viva. Foi preciso pesquisar um pouco para saber que era o apresentador Carlos Alberto de Nóbrega, na desinteligência dos seus 87 anos. O excerto que circulou na internet tinha a ver com o diploma de Lula. Que tédio.

O homem não foi meigo. “O senhor me explica de um presidente da República, no dia que recebe o diploma de presidente, chora e diz que é o primeiro diploma que recebeu na vida? Um homem que não tem um curso ginasial, universitário, contábil, qualquer coisa que seja, ser presidente da República? Por isso que o país está desse jeito”, disparou o senhor da praça.

É apenas ranço de classe. No Brasil, um canudo universitário é historicamente associado a um status social mais elevado. Houve tempos em que ter um diploma na parede era um privilégio reservado aos ricos. Aliás, esse é um borrão difícil de limpar no inconsciente social da pequena-burguesia endinheirada. Os ricos brasileiros precisam ter pobres à volta para se sentirem verdadeiramente ricos.

Há um pavor de classe. Se os pobres começam a ter pleno acesso ao ensino, há o risco de se desequilibrar a “ordem natural”. É importante que os pobres fiquem no lugar dos pobres. E lugar de pobre não é nas universidades. A educação precisa continuar a ser um divisor de águas na sociedade: os ricos têm diplomas, os pobres não precisam. Porque, afinal, devem permanecer na escala inferior que lhes é destinada.

A intervenção do senhor, que herdou do pai um banco inteirinho (daqueles de sentar), foi logo atacada pelo pessoal da esquerda. Lembraram que Sílvio Santos, o verdadeiro dono da praça, também não tem diploma. Mas isso é apenas whataboutism e pouco contribui para discutir o que realmente interessa. Importante lembrar que nos dois primeiros mandatos, o atual presidente criou 18 novas universidades federais e 173 campus universitários.

Importante salientar também que, durante esse período, o governo petista conseguiu duplicar o número de alunos do ensino superior no Brasil. Ou seja, a população brasileira com ensino superior passou de 8,3%, em 2002, para quase 17% da população. Para ter uma comparação, é só dizer que os números de pessoas com ensino superior em Portugal, com 35%, e Suécia, onde o número sobe aos 43%. Há muito a fazer e Lula não baixa os braços.

Portanto, falar da falta de diploma do presidente é apenas conversa para boi dormir. Tudo misturado com uma boa dose de ressentimento de classe. Porque Lula tem muita inteligência emocional e sabe ler o mundo melhor que muitos dos seus críticos. É conversa de reacionários tentando ter algum tema, num tempo em que o governo está a conseguir pôr o país nos trilhos. Além de que um apoiante de Bolsonaro nada deve à inteligência.

É a dança da chuva.



 
Em tempo: em 2012, escrevi um texto chamado “Os licenciadozinhos contra o Doutor Lu”, aqui mesmo. Dá um pulinho lá.
http://www.chuvaacida.info/2012/05/os-licenciadozinhos-contra-o-doutor.html

segunda-feira, 3 de julho de 2023

Bolsonaro na Prefeitura de Joinville... já!

POR JOSÉ ANTÓNIO BAÇO

Jair Bolsonaro se ferrou. Ficou inelegível e a previsão é de que o seu futuro passe pela cadeia. Desde a leitura da sentença, o choro dos bolsonaristas ainda não parou e as redes sociais estão inundadas pelas lágrimas dessa gente. Depois de tantos malfeitos, os bolsonaristas continuam na defesa do seu “mito”. Faz sentido, uma vez que “mito” e “mentira” são sinônimos. Afinal, quando algo não é verdade, a gente diz: “isso é mito”. Ou não?

Fiquei curioso para saber as reações em Joinville, onde 76,6% votaram no sujeito. Dá o que pensar: já imaginaram que entre cada 10 pessoas há 8 bolsonaristas? É uma cidade difícil para encontrar amigos com dois dedos de testa. O rio Cachoeira também deve ter transbordado com as lágrimas dessa gente. E por falar no rio e em alagamentos, uma das reações que mais chamou a atenção foi a do prefeito da cidade.

Logo após a leitura da sentença de inelegibilidade (eita palavrinha disgramada), o prefeito de Joinville (do partido que se diz novo mas é velho e se diz liberal mas é ultraconservador) vestiu a pele do rapaz cordial e insinuou que a Justiça estava a exagerar na punição. O digníssimo prefeito correu para a sua conta do Twitter em defesa de Jair Bolsonaro, mesmo sem citar o seu nome. 

“A liberdade de expressão é um direito constitucional de todos os brasileiros. É lamentável que pessoas sejam julgadas e condenadas unicamente por expressarem suas opiniões. Defendo uma democracia com liberdade de diálogo e de opiniões”. Ora, a nota do prefeito é inconsistente, banal e vazia. Ou seja, em termos de ideias é uma mão cheia de nada. Serve apenas para deixar clara a sua opção bolsonarista.

A inelegibilidade de Bolsonaro parece importante para o prefeito, porque ele raramente aparece na rede do Elon Musk. Desde 2019 foram apenas 42 tuítes sobre assuntos que sequer pedem comentários. Mas se a preocupação é tão grande, fica aqui a sugestão: arranjar um lugar para Bolsonaro no segundo escalão da administração municipal. Afinal, não são cargos “elegíveis” e a escolha podia fazer muito pelo marketing da prefeitura.

E como estou a dar a sugestão, tomo a liberdade de ir mais longe: que tal oferecer a Secretária da Saúde, uma área na qual o ex-presidente tem enorme expertise. Mas faço um aviso: tem que ser rápido, porque a cada dia que passa a porta da cadeia se abre um pouco mais para Bolsonaro. A não ser, claro, que o deputado Zé Trovão, outro representante da cidade, e os seus parceiros consigam fazer passar o projeto de anistia para o ex-presidente.

É a dança da chuva.