sexta-feira, 29 de setembro de 2023

Em merenda que está ganhando não se mexe

POR JOSÉ ANTÓNIO BAÇO

Há uma frase do futebol que funciona quase como um mandamento: "em time que ganha não se mexe". O problema é que a regra não vale para a atual administração da Prefeitura de Joinville, com os seus frêmitos novidadeiros. É o caso das mudanças no sistema da merenda escolar da rede municipal. Mantendo a semântica futebolística, podemos dizer que o técnico mudou, o time marcou um gol contra e a torcida não perdoou.

Nos últimos dias, as redes sociais foram invadidas de reclamações de pais, alunos ou mesmo funcionários. E, claro, dos políticos. “Por que terceirizar? Governo Federal aumentou o repasse para alimentação escolar. Joinville já foi referência na qualidade da merenda, ganhando prêmios! As cozinheiras se sentem prejudicadas com essas mudanças e as crianças também com filas e porções menores”, questionou a vereadora Ana Lúcia Martins, na sua conta na rede social X (ex-Twitter).

É preciso reavivar a história recente. Em 2010, Carlito Merss, então prefeito de Joinville, recebeu o prêmio de melhor gestor da merenda escolar do Brasil, na categoria Grandes Cidades e Capitais. O prêmio foi concedido pelo Ministério da Educação, em parceria com a Associação Brasileira de Municípios, num reconhecimento ao trabalho da gestão municipal de Joinville na área da merenda escolar.

Quais foram as razões para a distinção? A prefeitura implementou uma série de ações para melhorar a qualidade da alimentação oferecida aos alunos da rede pública municipal, incluindo a aquisição de alimentos de qualidade, produzidos localmente, o desenvolvimento de cardápios saudáveis e nutritivos, a implementação de um sistema de controle de qualidade e a capacitação dos profissionais da área de alimentação escolar. 

O problema é que a moçada do Novo, partido que hoje ocupa a Hermann Lepper, é muito chegada em modernices. E vai que decidiram implantar um sistema que exige até o uso de QR Codes. OK... vamos contemporizar. Toda vez que um novo sistema é implantado existe o risco de haver confusão. Só que as reclamações não param. É menos comida, dizem uns. Não pode repetir, reclamam muitos. Não pode perder o cartão de controle, alertam outros.  Até houve alguém a dizer que chegou a faltar comida. 

Por que essas coisas acontecem? Vamos voltar à linguagem do futebol, com uma frase de Nelson Rodrigues: “o escritor brasileiro não sabe bater um escanteio". O que ele quis dizer com isso? Que muitas vezes as elites estão desconectadas da realidade do povo. Neste caso, alguém acredita que o atual prefeito já esteve numa fila de merenda de escola pública? Nem por sonho. É uma questão de classes sociais. Pois como diziam os mais antigos,  “quem nunca fez um bolo, não sabe como se cozinha".

É a dança da chuva.



quinta-feira, 28 de setembro de 2023

Bolsonaro, Osair e a cultura do estupro

POR JOSÉ ANTÓNIO BAÇO

Duas notícias destes dias que estão muito ligadas. 1. A primeira diz que Bolsonaro virou réu na Justiça por incitação ao crime de estupro. Estamos a falar do conhecido caso da deputada Maria do Rosário, quando o bonitão disse que ela "não merecia ser estuprada" por ser "muito feia". 2. Em segundo lugar a notícia, publicada por alguma imprensa alternativa, de que Osair Antonio Souza, secretário municipal de São João do Itaperiú (tão pertinho, né?) teria afirmado que a ministra Rosa Weber, do TSF, merece "ser eternamente estuprada".

O que há de comum entre os dois episódios? A "cultura do estupro", claro. É um produto da sociedade patriarcal, que ao longo da história foi causando assimetrias entre homens e mulheres. E o pior: ainda hoje é a moldura do quadro mental de homens com a cabeça no século XVIII. O caso é sério no Brasil, onde a cultura do estupro é um problema real e silencioso. Dados do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (IPEA) revelam que uma em cada cinco mulheres já foi vítima de violência sexual. E apenas um em cada 10 estupros é denunciado.

Para muitos homens as mulheres ainda são simples objetos sexuais. A violência de gênero – física e simbólica – é usada como mecanismo de controle e dominação. É o que torna comum a aceitação da violência sexual, a culpabilização das vítimas e a normalização do estupro. Daí o discurso carcomido do patriarcado: as mulheres são responsáveis pelo estupro, os homens não podem controlar seus impulsos sexuais ou que é normal agir de forma sexista.

Quando uma pessoa tem a atenção da mídia, como é o caso de um presidente da República, esse comportamento acaba virando referência para muitos. Jair diz uma anormalidade lá em Brasília e Osair se sente à vontade para repetir aqui em São João do Itaperiú. E assim a cultura do estupro vai se reproduzindo e tarda em desaparecer. Menos mal que a lei pode atuar nesses casos. Jair é réu. É esperar que Osair também venha a ser.

É a dança da chuva.



sexta-feira, 22 de setembro de 2023

Bolsonaristas estão feito baratas tontas

POR JOSÉ ANTÓNIO BAÇO

O governo Lula vai bem e recomenda-se. O Brasil vem colhendo uma série de bons resultados, tanto no plano interno quanto externo. Fui de férias na semana passada e fiquei uns dias na Espanha. Deu para ver que o noticiário dos nuestros hermanos vem abrindo espaços para o presidente Lula, apesar de não haver uma unanimidade. Em alguns casos, fica evidente o papel relevante do líder brasileiro no plano internacional, mas em outras situações o tom é mais crítico – os europeus não perdoam as ambiguidades do presidente no caso da invasão da Ucrânia.

Fazendo a ponte para o plano interno, as coisas também são favoráveis. Apesar de algumas resistências provocadas pelo “criptoprimeiro-ministro” Arthur Lira (que usa o seu poder de influência para barganhar e tirar vantagens), há motivos para otimismo. A economia cresce acima das expectativas, a inflação fica abaixo das previsões, o arcabouço fiscal dá garantias de estabilidade econômica, as exportações mantêm a tendência de alta. E, imaginem, a reforma fiscal pode acontecer depois de décadas de tentativas frustradas.

Mas o sucesso do governo, tanto no plano externo e interno, tem outras consequências. A oposição bolsonarista está numa tremenda enrascada. Os malucos estavam na torcida para tudo falhar e deram com os burros n´água. Dá um certo prazer constatar o fracasso da profecia de Paulo Guedes. Lembram? O iluminado ex-ministro previu que o Brasil ia virar “uma Argentina em seis meses e chegar a uma Venezuela apenas um ano e meio”. O mais hilário é ver que o tipo agora diz que o sucesso é resultado do trabalho dele. Ipiranga vai na canga.

Que fazer? Sem ideias e sem um projeto de governo, os bolsonaristas estão feito baratas tontas. E ficam agarrados à lógica da mentira. É mentir, mentir, mentir. O problema é que na maioria dos casos as mentiras tendem para o absurdo. O meu bolsonarista predileto, por exemplo, agora ataca o governo Lula com publicações sobre “orçamento secreto, cartão corporativo, queimadas da Amazónia, viagens para o exterior, vacinas (dengue), BNDES e gastos em publicidade”. É puro suco de bolsonarismo. Tudo o que Bolsonaro fez é assacado ao atual governo.

Todo governo precisa de uma oposição decente para estar alerta e corrigir cursos. Mas decência é tudo o que não se pode esperar do bolsonarismo. Sem discurso nem ideias, o que resta aos bolsonaristas é o espetáculo deprimente, como os protagonizados por gente inútil do calibre de Nikolas Ferreira, Gustavo Gayer ou o "jornalista" Alexandre Garcia. É bom ver o bolsonarismo definhar, mas também é importante ter em mente que o Brasil precisa de uma oposição séria e a sério.

É a dança da chuva.