sexta-feira, 29 de junho de 2018

Udo Dohler visto pelo Sandro Schmidt (1)

POR ET BARTHES
Já notaram como o prefeito anda sumido? Ninguém vê, ninguém sabe onde anda, ninguém tem notícias. Então, para os leitores e as leitoras matarem saudades, hoje vamos exibir o primeiro filme de uma série com charges do Sandro Schmidt feitas ao longo dos últimos anos.



quinta-feira, 28 de junho de 2018

Manuela d'Ávila: do manterrupting ao "mandumbing"

POR LEO VORTIS
Esta semana a expressão “manterrupting” entrou de vez para o vocabulário dos brasileiros, em especial através nas redes sociais. Tudo pode causa da entrevista da deputada Manuela D’Ávila no programa Roda Viva, da TV Cultura. Aliás, chamar aquilo de entrevista é generosidade, porque foi um show de boçalidade e ridículo machismo.

Nem vou falar do painel reunido para a entrevista, onde constava um assessor de outro candidato, porque isso já foi muito debatido. Ora, a entrevista é a alma do jornalismo. O papel do entrevistador é perguntar, em especial as perguntas incômodas. Mas também é saber perguntar e saber ouvir. A entrevista pode entrar para a história do jornalismo como um case study de “manterrupting”.

O tema já foi muito debatido (inclusive aqui mesmo pelo Clóvis Gruner) e por isso vou falar num tema paralelo. A influência da resistência ao machismo na linguagem. É que nos últimos tempos surgiu um rol de novas palavras todas ligadas a esse plano. Infelizmente em língua inglesa, porque o português é capaz de expressar essas ideias. Mas, enfim, importa que as coisas sejam nominadas e ganhem existência concreta.

O dicionário é extenso. A começar pelo “manterrupting”, que foi a marca maior na entrevista do Roda Viva. É quando um homem interrompe uma mulher, de forma a impedir que ela conclua o raciocínio. Mas as formas de expressão quotidiano foram enriquecidas por outras palavras que têm raiz na denúncia dos comportamentos machistas, ainda muito em sociedades como a nossa.

E dou alguns exemplos:
- Mansplaining
É talvez o de compreensão mais simples. É quando um homem tenta explicar a uma mulher coisas óbvias, que ela sabe muito bem.
- Bropriating
É quando, num ambiente de trabalho, um homem (“bro”) se apropria (“appropriating”) dos méritos de uma ação ou uma ideia de uma mulher.
- Gaslighting
É violência emocional. Os homens começam a tratar a mulher como maluca por alguma ação qualquer. “Você está doida? Não era essa a intenção”.
- Slutshaming
É quando os homens dizem que a mulher é uma vadia, apenas por ela ter um comportamento mais livre.
- Manspreading
É quando o homem senta nos transportes públicos e abre as pernas, de forma a ocupar também o espaço do banco vizinho.

Enfim, graças à maior exposição de ideias nas redes sociais essas palavras - entre tantas outras - acabaram por ganhar expressão. E no caso do programa Roda Viva vou me dar à liberdade de criar um neologismo: “mandumbing”. Ou seja, homens idiotizados. Aliás, quem se deu ao trabalho de ver a tal entrevista deve ter sentido dentro de um enorme Facebook, tal o nível ridículo dos entrevistadores.

quarta-feira, 27 de junho de 2018

Cultura do estupro e banalização da violência


POR CLÓVIS GRUNER
O cenário é o estúdio de gravação do “Roda Viva”, que segunda (25), na série de encontros com os presidenciáveis, supostamente entrevistou a deputada e candidata do PCdoB, Manuela D’Ávila. E digo supostamente, porque o que se viu passou longe de uma entrevista: a bancada “livremente escolhida” pela produção do programa não pretendia outra coisa além de desqualificar sua candidatura, e levou a tarefa a sério.

Parte da postura agressiva dos entrevistadores, que pareciam ter saído direto da Guerra Fria, se explica pelas posições ideológicas da presidenciável. E digo parcialmente porque, por exemplo, mesmo tensa, na entrevista com Guilherme Boulos o candidato do PSOL teve espaço para responder aos arguidores. Mulher e feminista, a Manuela D’Ávila não foi concedido o mesmo direito. Mas não pretendo analisar o programa ou defender o PCdoB, partido pelo qual não nutro nenhuma simpatia.

Cito o “Roda Viva” por um motivo: o embate entre Manuela D’Ávila e um dos coordenadores da campanha de Jair Bolsonaro e diretor da Sociedade Rural Brasileira, Frederico D’Ávila, em torno ao tema do estupro. Em um movimento mental tortuoso tão comum, por exemplo, entre os comentaristas anônimos desse blog, Frederico começou com a trajetória do avô, sobrevivente do nazismo, e terminou com a defesa da castração química como solução para o estupro. Em uma das muitas vezes que a interrompeu, afirmou que não existe “cultura do estupro” - para, em seguida, voltar ao avô.

Um dos argumentos (passe o exagero) do entrevistador é de que a castração química, ao punir exemplarmente os estupradores, resolveria o problema, argumento (passe, de novo, o exagero) brandido por Bolsonaro e um punhado de homens – e também algumas mulheres. A medida é defendida por quem entende o estupro como sexo, ainda que com violência, bastando para isso restringir, punir ou simplesmente eliminar o “desejo sexual”.

Não é sexo, é poder – Mas estupro não é sobre sexo; é sobre poder, e eles e elas ignoram, propositadamente ou não, que castrar quimicamente o estuprador pode até atacar um dos sintomas mas, fundamentalmente, deixa intocado o problema. Quando feministas enfatizam a importância, por exemplo, de se discutir relações de gênero nas escolas e outros espaços públicos, elas estão afirmando, entre outras coisas, que reduzir o estupro a um ato sexual, silencia sobre e reproduz o exercício de um poder que se sustenta na violência.

A castração química e sua lógica punitivista, nesse sentido, é parte intrínseca da cultura do estupro, razão pela qual Jair Bolsonaro e Frederico D’Ávila defendem a primeira e negam a existência da segunda. Mas o próprio Bolsonaro afirmou à deputada petista Maria do Rosário, que não a estuprava porque ela não merecia, para explicar depois que ela não merecia ser estuprada porque é feia. Alexandre Frota, um de seus cabos eleitorais no meio artístico (sim, estou dado a exageros hoje), contou em rede nacional como estuprou uma mulher, desqualificada ao longo da sua narrativa por ser “mãe de santo”.

Um pouco antes disso, o humorista Rafinha Bastos cunhou a piada segundo a qual mulheres feias devem não acusar, mas agradecer seu estuprador. Na mesma época, uma campanha da Nova Schin levou ao ar uma peça onde um homem invisível ameaça e constrange mulheres, invadindo seu vestiário. Questionado, o Conar respondeu com indiferença, alegando que a propaganda era “baseada em uma situação absurda”: o homem que constrange mulheres e invade seu vestiário, provocando horror e medo, é invisível.

Para alguns, se a mulher for feia ou homem, anônimo, o estupro é válido e, em alguns casos, pode ser até divertido. É nisso, parece, que acredita outro humorista, Danilo Gentili; segundo ele, um homem que espera uma mulher ficar bêbada para transar com ela é um “gênio”. Afinal de contas, se algo der errado e ele for denunciado, basta dizer que ela estava vestida de forma inadequada ou sozinha à noite em uma festa e bebeu demais: uma das características da cultura do estupro é responsabilizar a vítima pela violência de que é objeto.

A banalidade do mal – Nada disso é novidade: o estupro, ao contrário do que se afirma correntemente, não é uma aberração anti-civilizatória, fruto exclusivamente de algum comportamento monstruoso. Ele é, antes, uma prática que ao longo da histórica serviu para afirmar e consolidar diferentes experiências de dominação e, como exercício de poder e violência de homens sobre mulheres, é preexistente ao seu enquadramento jurídico moderno. Os exemplos abundam, e em nenhum deles estamos a falar de sexo.

Os conquistadores europeus estupraram mulheres indígenas na conquista do chamado “Novo Mundo”, nos séculos XVI e XVII, e africanas nos séculos XIX e XX. Nos genocídios étnicos, mulheres são estupradas antes de serem assassinadas; militares violentam mulheres quando vencem o inimigo, como foi o caso das alemãs pelos soldados russos; francesas acusadas de colaborar com a ocupação foram estupradas pelos seus concidadãos durante a chamada épuration legale; não muçulmanas são estupradas por fundamentalistas religiosos, etc...

No Brasil, portugueses estupraram índias durante o processo de ocupação da colônia; senhores brancos estupravam escravas nas senzalas; filhos das camadas médias e altas violentavam empregadas domésticas como iniciação à vida sexual. No Código Penal de 1940, o estupro era considerado um crime contra os costumes, a sociedade e seus valores, e não contra a mulher. Mesmo hoje, há decisões judiciais que, amparadas no artigo 59 do Código Penal, levam em conta a vida pregressa da vítima (seu comportamento sexual, por exemplo), para amenizar a responsabilidade do agressor.

É isso que mulheres denunciam como cultura do estupro e é contra isso que lutam. Sua banalização, e a negação é parte dela, corrobora para a naturalização da violência. Discutir e educar principalmente os homens para a igualdade nas relações de gênero pode não ser a única resposta, mas é um caminho necessário e urgente. O punitivismo sexista defendido por Bolsonaro e seu coordenador de campanha, por outro lado, não é a solução para o estupro. Antes pelo contrário, é parte do problema.

terça-feira, 26 de junho de 2018

Mito


Mamãe, falei. E foi só vira-latice...

POR JOSÉ ANTÓNIO BAÇO
Um dia destes vi, numa rede social, um post em que o tal Arthur do Val (do canal “Mamãe Falei”) teria “tomado uma surra de um petroleiro” num debate sobre a Petrobras. Uma surra verbal, diga-se. Fiquei curioso. Não pela surra, mas pela dúvida: quem convidaria um sujeito intelectualmente estéril para um debate? O que teria ele a dizer que alguém com dois dedinhos de testa queira ouvir?

O vídeo que rola na internet é apresentado da seguinte maneira: “com auditório lotado, com mais de 200 estudantes, estivemos no debate sobre a privatização da Petrobras, no Colégio Universitas, em Santos. E ouvimos muita besteira do MBL. Uma delas foi a reprodução, em tom jocoso, do velho mito elitista de que brasileiro é preguiçoso”. Sim... era uma tese: o brasileiro é um tipo vagabundo.

O cara disparou o velho clichê de que os brasileiros não prestam e os estrangeiros, estes sim, é que são bons e fazem tudo direitinho. Diz este grande pensador que não dá para entregar as coisas nas mãos do “brasileirinho gordinho folgado”, porque o cara não sabe jogar pelas regras da “competitividade internacional”. E ficamos a saber que brasileiros gordinhos são pouco competitivos. Ah... eis o complexo de vira-lata no seu esplendor.

A democracia tem os seus paradoxos e garante, às pessoas, o direito de dizer as besteiras que quiserem. Mas quando um energúmeno é levado a sério ao ponto de fazer palestras para estudantes, então é hora de refletir. Porque é quase atribuir um estatuto de ciência à ignorância, ao anti-intelectualismo e à iliteracia. E tudo tendo como pano de fundo a defesa da entrega do pre-sal aos gringos.

O viralatismo é a língua dos entreguistas. É gente culturalmente colonizada e para a qual o lugar do Brasil é mesmo a periferia do capitalismo. Aliás, vale lembrar Nelson Rodrigues, o criador da expressão. “Por complexo de vira-lata entendo eu a inferioridade em que o brasileiro se coloca, voluntariamente, em face do resto do mundo. O brasileiro é um narciso às avessas, que cospe na própria imagem”.

Pode parecer um episódio sem importância, mas é o sintoma de uma doença que está a corroer o tecido social. Essa ascensão do irracionalismo só pode empurrar o Brasil para o atraso. Os caras imaginam uma Suécia, mas estão a plantar as sementes de algo parecido com o Sudão do Sul. Afinal, como já disse alguém, os ignorantes levam vantagem sobre os sábios: a ignorância é grátis e a ciência custa dinheiro.

É a dança da chuva.



segunda-feira, 25 de junho de 2018

A sociedade que votará em outubro


POR JORDI CASTAN
Trump prende crianças em jaulas e as separa dos seus pais. Neste momento não é conveniente, para alguns, lembrar dos “coyotes” que atravessam a fronteira com crianças desacompanhadas e cobram caro por isso. Na Rússia, grupos de energúmenos incitam loirinhas desavisadas a repetir mantras ofensivos dos que desconhecem o sentido. A pátria de chuteiras está jogando cada dia pior e o herói nacional é, ao mesmo tempo, o atleta que acumula a maior dívida com a Receita Federal. Além de ser um menino malcriado.

A violência e os ataques de racismo, homofobia e machismo são tratados pela sociedade e especialmente pela imprensa, de forma diametralmente oposta dependendo de quem seja a fonte ou o alvo. Há esquecimento conveniente de alguns e glorificação de outros. No meio desta bagunça toda é interessante perceber qual é a reação e o papel de cada um dos segmentos que compõem o tecido social. A sociedade esta comporta por diversas tribos e cada uma delas tem comportamentos e atitudes diferentes. Entender e conhecer esse comportamento ajuda a compreender melhor o momento histórico que o país está vivendo.

Há os que não sabem. Hordas de ignaros convertidos em massa de manobra de uns e outros. Seguidores cegos de mitos, escravos da sua própria ignorância. Há os que não querem saber. E os que mesmo tendo o conhecimento e acesso a informação, preferem não saber. Acompanham a estes os que odeiam saber, os que não conseguem lidar com a verdade, que a deturpam, a tergiversam pela sua absoluta incapacidade de lidar com o seu ódio ou sua raiva.

Também há os que sofrem por não saber, os que carregam a sua incultura e desconhecimento como um pesado fardo que os prostra e os marca. Piores são os que sem saber, fingem que sabem, projetam a imagem de conhecedores, sábios de latão que refulgem com maior intensidade quanto maior é a ignorância que os rodeia. No Brasil de hoje, não são poucos os que triunfam sem saber. Tinha razão Rui Barbosa quando disse que aqui triunfavam as nulidades. Não há dia em que um deles triunfe e tenha seus quinze minutos de fama, alguns até mais de quinze, não são poucos os que tem sucesso durante anos, aclamados por multidões.

Mas nenhum grupo é mais nocivo e perverso, nem ocasiona males maiores, nem mais duradouros que o grupo formado pelos que vivem graças ao que os outros não sabem. Os que se aproveitam da ignorância e o desconhecimento dos demais são os que se denominam “políticos” e as vezes até usam o nome de “intelectuais”. Cada um dos grupos cumpre zelosamente sua missão na sociedade. O resultado do domínio de uns sobre os outros ou de predominância de outros sobre os uns define o modelo de sociedade e permite entender a importância e a forma de abordar cada um dos temas do quotidiano.

No que toca ao Brasil, é essa a sociedade que vota em outubro.

sexta-feira, 22 de junho de 2018

Capa da "Time" é um manifesto contra a intolerância

POR JOSÉ ANTÓNIO BAÇO
Diz a velha expressão que uma imagem vale vale por mil palavras. Nem sempre. Mas é assim no caso da capa da revista norte-americana “Time”, talvez a imagem mais viral da internet esta semana. Para quem ainda não viu, a montagem é formada por um fundo vermelho, com uma criança pequena a chorar à frente Donald Trump. O texto diz: “Bem-vindo à América”.

A capa é simples, como costumam ser as boas ideias. A imagem é formada pela foto de uma menina hondurenha, de dois anos, a chorar em frente a um implacável e gigantesco Donald Trump. O resultado é uma capa que vale por um manifesto anti-intolerância sem precisar de um discurso elaborado ou palavroso. Está tudo lá.

A foto da menina é de autoria de John Moore, da Getty Images, com um Prêmio Pulitzer no currículo. “Eu tive que parar e respirar fundo ”, disse o fotógrafo ao descrever a cena em que a criança chorava ao ver a mãe ser detida em McAllen, no Texas. “Tudo o que eu queria fazer era buscá-la. Mas eu não pude”, confessou.

A questão da separação de pais e filhos imigrantes detidos pelas autoridades norte-americanas foi o tema quente da semana. O presidente norte-americano esteve novamente na mira dos críticos, em todo o mundo. Mas para ele isso tem pouco significado, uma vez que Donald Trump está acostumado a fazer o que bem entende sem dar ouvidos aos críticos.

E para trazer mais confusão ao tema, surgiu um “fait-diver” a envolver a primeira-dama Melania Trump, que foi visitar os locais de detenção a vestir um casaco com a inscrição “I really don’t care, do U?" (eu realmente não ligo, e você). Donald Trump saiu em defesa da mulher, afirmando que a inscrição é uma referência à mídia (que ele chama “fake news”).

Enfim, tempos muito loucos. 


quinta-feira, 21 de junho de 2018

Congratulations, Trump!


O Brasil exportando escrotice para a Rússia (vídeo)

POR LEO VORTIS
Até pouco tempo o mundo vivia apenas com os conceitos de esfera privada e esfera pública. Mas o desenvolvimento da internet e das redes sociais levou a um terceiro patamar, a esfera digital. A exposição das mensagens tem um novo alcance e obriga a um outros comportamentos.

Há um novo quadro midiático. Em outros tempos havia coisas que permaneciam no âmbito das conversas de bar, sempre em circuitos fechados, e nunca chegavam ao julgamento público. No entanto, extrapoladas para o mundo digital hoje adquirem outra exposição e podem fugir ao controle.

É o caso dos brasileiros na Rússia, que estão a dar exemplos de machismo, homofobia e outras escrotices. O que antes passava por simples javardice na esfera privada, adquire outro valor quando transposto para a esfera digital. E os julgamentos são implacáveis (de forma justa, diga-se).

É interessante que a cada dia aparecem novos filmes que são mais do mesmo. Tudo isso prova a incapacidade que essas pessoas - endinheiradas e aparentemente “educadas” -  têm de lidar com as novas tecnologias. Mas, principalmente, parecem ter problemas em interpretar valores e entender outras culturas. Se são escrotos no Brasil, devem entender que o mesmo não se aplica a outros lugares. 

O filme a seguir traz alguns episódios que estão a chocar os brasileiros - nem todos os brasileiros, claro -, mas é importante lembrar que isso não vem de hoje. Essa gente endinheirada que veste amarelo acha que pode tudo. E estes episódios pedem um pulinho ao nem tão distante ano de 2014.




quarta-feira, 20 de junho de 2018

O que resta de Junho?


POR CLÓVIS GRUNER
O Facebook me lembra, domingo último (17), que há cinco anos eu era um em meio a multidão da foto que ilustra esse texto. Em Curitiba, a passeata da noite de 17 de junho, uma segunda-feira, foi a maior. Três dias depois, o frio intenso e a chuva dificultaram a presença nas ruas, justamente a data em que as mobilizações atingiram o ápice: em 20 de junho de 2013, mais de dois milhões de pessoas ocuparam praças e logradouros de cerca de 400 cidades em todo o Brasil.

Cinco anos depois, permanece em aberto a interpretação sobre as “Jornadas de Junho”, um indicativo não apenas da pluralidade do movimento, mas da dificuldade de apreendê-lo e situá-lo. Minha intenção é fazer um balanço daqueles eventos a partir de três perspectivas, que se cruzam: conectá-los a contextos mais amplos; analisar algumas de suas singularidades; e, enfim, um breve exame de seus desdobramentos e das distintas e contraditórias apropriações de seu legado.

O gigante acordou? – Apesar de repetido à exaustão, reafirmando a percepção de que Junho foi uma novidade na história política recente, a irrupção de uma força – uma “potência”, se costuma dizer – recalcada e finalmente liberada, há nisso um certo exagero e, em parte, um equívoco. Entre outras coisas, porque sugere serem as “Jornadas de Junho” um evento único e solitário em sua incompreensível singularidade.

Nada mais enganoso. De diferentes maneiras, 2013 se relaciona com uma miríada de eventos que o antecedem e com os quais partilha similaridades: os motins em Los Angeles, em 1992; os levantes na Grécia e nos países árabes, apenas um ano antes; a revolta nos subúrbios parisienses em 2005; ou a Revolta dos Pinguins, no Chile. Mesmo se olharmos apenas o contexto brasileiro, a imagem de um “gigante adormecido enfim desperto” tampouco se sustenta.

De um lado, penso ser importante ler Junho à luz de algumas mobilizações que o antecederam: 2012 foi o ano com o maior número de greves em uma década e meia – 873 registradas pelo Dieese –, organizadas por um sindicalismo que, agastado depois de cooptado pelos governos de esquerda, tentava uma retomada. É nesse mesmo contexto que surge o MTST, e recrudescem os movimentos por moradias e as ocupações urbanas. Em suma, meu argumento é de que a espontaneidade de Junho precisa ser contrastada a movimentos que, em certa medida, contribuíram para sua erupção.

Além disso, desde pelo menos o começo da gestão Dilma, o modelo desenvolvimentista e redistributivo, tônica dos governos petistas, apresentava sinais de desgaste. Quer dizer, tanto quanto sua espontaneidade, a combinação entre mobilizações sociais pregressas e a corrosão do pacto político que sustentou os governos de esquerda (e de certo modo, toda a Nova República), me parece igualmente significativo para entender as “Jornadas de Junho”.

“Anota aí: eu sou ninguém” – Mesmo a juventude, sua principal protagonista, não despertou do sono repentinamente. Foram os jovens, principalmente, os que se solidarizaram com as comunidades indígenas e quilombolas; denunciaram a violência contra a mulher nas “Marchas das vadias”; protestaram contra a homofobia, o racismo e a violência policial e, sem cessar, chamaram a atenção para a precarização das escolas e do ensino público brasileiro, por exemplo. O MPL, que convocou as primeiras manifestações, existe desde 2005 e já havia liderado outras mobilizações e ocupado as ruas antes.

A acusação, comum, de que as “Jornadas de Junho” foram a “antessala do golpe”, desconsideram, entre outros, o fato de que, diferente das manifestações pelo impeachment, o perfil socioeconômico de parcela significativa dos manifestantes de 2013 era de jovens estudantes e trabalhadores com renda de até cinco salários mínimos, moradores das regiões periféricas principalmente das grandes e médias cidades, fossem elas São Paulo (onde o movimento começou e ganhou força), Curitiba ou Joinville.

Não surpreende, nesse sentido, que foram o aumento na tarifa do transporte público e a violenta repressão policial que se abateu sobre os manifestantes, os detonadores do movimento. No primeiro caso, os 20 centavos foram o pretexto para exigências maiores – o direito ao transporte público, a mobilidade urbana, a ocupação do espaço público e a humanização das cidades –, com o MPL assumindo uma condição, mesmo provisória, de mediador entre algumas demandas por cidadania e qualidade de vida e as políticas governamentais.

No segundo, a midiatização das mobilizações evidenciou uma realidade vivida diuturnamente por muitos dos manifestantes, militantes ou não: a violência policial, televisionada e flagrada em celulares, cujos vídeos foram compartilhados às centenas, foi a principal responsável pelo repentino e inesperado apoio ao movimento: pesquisa realizada pelo Ibope e publicada no dia 18 de junho, mostrava uma aprovação de 75% dos brasileiros às manifestações. Uma vitória política, mas também uma abertura para entender a emergência das suas muitas contradições.

Nem golpista, mais que potência – No campo da esquerda, principalmente duas interpretações vigoram sobre Junho. Uma delas, já mencionada, vê nas manifestações uma manobra, fruto de uma conspiração intergaláctica cujo propósito final e fatal era o “golpe”. Outra parece acreditar que as mobilizações vagam em um vazio temporal e histórico, pura “potência”.

A primeira defende uma visão teleológica da história no interior da qual, em um tempo homogêneo e vazio, uma linha leva 2013 diretamente para 2016 e o impeachment. Sobra oportunismo político, falta um olhar atento às multiplicidades e contradições. A segunda descola o evento de sua historicidade e evita o olhar ao rés do chão. Nessa perspectiva, ele transita em um vácuo onde, igualmente, não há lugar para desacordos ou ambiguidades. Ambas desconsideram que, a partir de um certo momento, sua apropriação por uma nova multidão, em grande medida avessa inclusive às demandas do MPL, impôs ao movimento uma inflexão em sua trajetória.

Se nos primeiros dias era perceptível uma insurgência de inspiração libertária e anticapitalista contra o Estado, o mercado e as formas tradicionais da política representativa, à medida que as ruas ganham contornos mais difusos, operam-se uma metamorfose e uma ampliação das pautas, que se tornam igualmente difusas. Hoje é difícil negar que, em meio à ruptura ensaiada pelas manifestações, sua apropriação por setores midiáticos e de direita tentou, entre outras coisas, neutralizar as possibilidades de renovação à esquerda que o movimento anunciava. E, ao menos parcialmente, conseguiu.

Um legado contraditório – Nesse sentido, os embates começaram a ser travados no curso do próprio movimento, e as disputas narrativas pelo seu legado são sua continuidade. Se é verdade que são herdeiras das “Jornadas”, por exemplo, as ocupações nas escolas paulistas e paranaenses, também o é que, com muitas mediações, elas franquearam a tomada das ruas pelos grupos que, dois anos depois, pediram o impeachment de Dilma Rousseff, ainda que suas intenções passassem longe disso – a potência, afinal, não é uma via de mão única.

Em artigo publicado há alguns dias na Folha de São Paulo, Pablo Ortellado observava, acertadamente, que “quase todas as experiências do ciclo global de protestos de 2011-2013 despertaram forças poderosas que abalaram as instituições, mas quase nunca conseguiram lograr as mudanças aspiradas pelos manifestantes”. Junho de 2013 não escapa desse “flagrante descompasso” entre as mobilizações e seus resultados, modestos, afirma Ortellado; contraditórios, completo.

Em alguns países, como na Espanha, o caminho foi construir uma síntese possível entre a utopia libertária gestada pelos movimentos de rua e a institucionalização. No Brasil, estamos imersos em dilemas que impedem mesmo essa alternativa, entre outras razões, porque não há legenda ou liderança partidária capaz de fazê-lo, apesar dos esforços de marinistas. Será preciso, primeiro, superar a turbulência de agora. E ao que tudo indica, isso levará bem mais que os cinco anos que nos separam das “Jornadas de Junho”.

terça-feira, 19 de junho de 2018

O eleitor gosta mesmo de votar em corrupto?

POR JORDI CASTAN
O tema hoje deveria ser a Copa do mundo. Mas quem se importa com isso? Esqueci que tem uma parte importante do país que acredita que este é um evento importante e que não há nada mais transcendental que torcer pelo Brasil. Há também os que preferiram debater a apropriação da camisa da seleção pelos “coxinhas” e que por conta disso este importante símbolo nacional não deve ser mais usado pelos torcedores que não sejam coxinhas.

Não é preciso dizer que frente a estas discussões tão filosoficamente profundas, vou trocar de canal e propor que a nossa conversa aqui seja sobre outros temas, que, ao meu ver, deveriam ser mais importantes e motivas debates e mobilizações mais transcendentais e maiores que as que motivam a seleção e o mundial.

Proporia educação, mas perdemos feio. Segurança? Mas esse outro tema em que o Brasil está ruim na foto, com mais mortos por arma de fogo que países em guerra. Da saúde melhor passar, porque agora que acabou a greve dos caminhoneiros, não sei o que as autoridades vão inventar para justificar a falta de remédios, o estado precário de hospitais e Pronto Atendimentos (PAs) ou a falta dos materiais mais básicos e elementares.

Corrupção é um tema delicado, se houvesse algum tipo de premiação o Brasil ficava em primeiro e bem à frente do segundo. De Joinville melhor não falar, até porque há pouco de bom para contar. De um lado o silêncio cúmplice de uns. Do outro a inépcia supina de outros, e do outro a inércia de uma cidade que se apequena um pouco mais a cada dia.

Mas num país em que eleitor vota de novo em corrupto e o reelege uma e outra vez, é difícil imaginar que o povo não tenha culpa no cartório. Acho até que o eleitor gosta mesmo de votar em corrupto. Algum tipo de prazer mórbido o leva a votar em gente que deveria estar na cadeia fazendo companhia aos que já foram condenados e estão cumprindo pena.

Copa do Mundo é a versão do pão e circo (panem et circenses) dos romanos. Se alguém acha que fácil iludir o eleitor, está certo. Não há nada mais fácil que iludir o eleitor. Em outubro teremos a oportunidade de ver serem eleitos os mesmos de sempre. Votar em candidatos novos é uma alternativa para mudar.

Lanço aqui o desafio de não reeleger ninguém, para isso precisamos votar em candidatos novos, que não sejam corruptos, que tenham um histórico de defesa dos interesses da sociedade, gente com princípios e valores, mesmo que para isso tenhamos que, como Diógenes, sair pelas ruas, com uma lanterna a busca desses homens e mulheres que o país precisa.

Menos Copa e mais olho no Brasil, porque é quando a bola rola que as coisas ruins acontecem.

segunda-feira, 18 de junho de 2018

“Buceta rosa, buceta rosa”... e gente repugnante de amarelo

POR JOSÉ ANTÓNIO BAÇO
Tenho uma camisa da seleção brasileira, daquelas oficiais da Nike (apesar de, ao contrário dos brasileiros, ter pago apenas 10 euros por ela). Mas faz tempo que ela não sai do armário. As razões são evidentes. Nem preciso dizer que a “amarelinha”, antes um símbolo de brasilidade, acabou contaminada por divisões ideológicas neste imenso Fla-Flu político em que o Brasil se transformou.

E já que estamos no plano do simbólico, o maior incômodo é ver a camisa a expressar um estilo de vida molesto a todos os níveis. Vou resistir à análise simplista de dizer que é o símbolo do “coxinismo”. Afinal, a coisa é mais complexa, tem uma longa história e traz uma infausta ironia: os significados da camisa amarela foram apropriados por uma gente que não quer - e nem sabe - ser “brasileira”.

O ator social não é o coxinha em si. É o pequeno burguês brasileiro, gente que não se incomoda em viver num estado de apartheid social. Aliás, até se enquadra bem. É gente desrespeitosa, que  não sabe reconhecer as alteridades. O pequeno-burguês é, o outro não é. E quando você objetifica o Outro surgem doenças sociais como homofobia, racismo, misoginia, xenofobia, o preconceito contra o pobre etc. E também o machismo.

E por vezes acontece a tempestade perfeita. O palco é o Mundial 2018, na Rússia. Os protagonistas são um bando de pequenos-burgueses execráveis a vestir a camisa da seleção e num vergonhoso desrespeito pelo Outro. Ou, neste caso, pela Outra. Uma moça russa que foi envolvida por brucutus “uniformizados” de amarelo e a expressar a mais absoluta falta de caráter. 

“Buceta rosa”, “buceta rosa”, “buceta rosa”, gritavam enlouquecidos como se a barreira linguística fosse suficiente para escamotear a má formação, a falta de respeito pelo Outro e o mais repugnante machismo. Sim… esses são os “embaixadores” do Brasil, aqueles que levam o nome do país ao mundo. E, infelizmente, vestindo a famosa camisa da seleção. É por essas e outras que sempre que vejo alguém de amarelo fico à espera do pior...

É a dança da chuva.




sexta-feira, 15 de junho de 2018

CRÔNICA: a espada vingadora de Tokuda



POR MÁRIO PAGANINI
O leitor sabe o que é edaísmo? É o preconceito por causa da idade. Também costuma acontecer com os adolescentes, mas quem sofre a sério são os idosos. O mercado de trabalho é a prova. É comum ver anúncios de emprego a dizer, especificamente, que só são aceitos trabalhadores até aos 35 anos de idade. Ou seja, a pessoa que tem 40 anos é vista pelo mercado de trabalho como uma peça de museu.


Mas nem sempre. Se você já enfrentou uma situação de edaísmo, prepare-se para o seu momento de vingança. E a vingança vem pela espada de Shigeo Tokuda, um japonês baixinho que hoje tem 83 anos. E quando falo em espada é em sentido lato, porque o homem se tornou uma espécie de herói da terceira idade: até pouco tempo foi astro de filmes pornográficos na terra onde o sol levanta.


E levanta mesmo. Segundo uma reportagem da revista “Time”, Tokuda fez mais de 200 filmes pornô nos últimos anos (o último, ao que parece, em 2o15). E nunca deu mole (literalmente) para as parceiras de trabalho, sejam mulheres da mesma idade ou algumas ninfas de singelos 20 aninhos com as quais contracenou. Ah.. e vale lembrar que quando ele começou o Viagra ainda era uma miragem.


Shigeo Tokuda deveria ser um exemplo para todos os homens já mais entrados na idade. Quando se aposentou, em vez de ficar em casa a ver novela e jogar paciência, decidiu fazer um bico para passar o tempo.
 O homem podia ter optado pelo judô e passar o dia a agarrar homens. Também podia ter escolhido o kendô e ficar o tempo todo com a espada na mão. Mas ele sabia que a espada pode ser usada de maneira mais divertida, procurou um produtor de cinema e virou ator pornô.


A bem da justiça, Shigeo Tokuda deveria ser considerado herói nacional no Japão. Porque é graças a pessoas como ele que as estatísticas podem ser revertidas. Dizem que os japoneses são um dos povos que menos pratica sexo no mundo. Um estudo feito no país revela, por exemplo, que um em cada quatro casais - de todas as idades - não fez sexo no ano anterior. É f... Ou melhor, não é.


O mercado pornográfico para a terceira idade é um negocião no Japão. É o país que possui o maior percentual mundial de pessoas acima dos 65 anos e esse público parece ávido por pornografia. O sucesso de Shigeo Tokuda parece resultar do fato de os espectadores se identificarem com ele, por causa da idade.


O mais divertido é que ao longo de muito tempo a mulher e a filha nunca souberam do part-time de Shigeo Tokuda (que, como é óbvio, é apenas um nome artístico). No caso da mulher até dá para entender: ele provavelmente não quer levar trabalho para casa.

quinta-feira, 14 de junho de 2018

quarta-feira, 13 de junho de 2018

Os homens que não amam as mulheres


POR CLÓVIS GRUNER
Um juiz de Mococa, interior de São Paulo, ordenou judicialmente a esterilização de uma mulher, Janaína Aparecida Quirino, depois que o promotor público Frederico Liserre Barruffini instaurou ação judicial com o intento de constrangê-la a realizar o procedimento compulsoriamente. A alegação da promotoria foi que, moradora de rua, mãe de seis filhos e grávida de um sétimo, ela se recusou a fazer a laqueadura voluntariamente. A história veio à luz sábado último (09), na coluna do professor de Direito Constitucional, Oscar Vilhena, na Folha de São Paulo.

Desde então, o episódio repercutiu em outros veículos que ampliaram a cobertura e revelaram mais detalhes do caso, além de manifestações nas redes sociais, incluindo o apoio inconteste e irrestrito à medida da outrora estelar Janaina Paschoal, e um desmentido do juiz responsável pelo caso, Djalma Moreira Gomes Junior. Segundo ele, o procedimento foi realizado com o consentimento de Janaína Quirino, atualmente cumprindo pena por tráfico de drogas.

A trajetória de Janaína não é única em um país atravessado, historicamente, por contradições e desigualdades aparentemente insolúveis. A decisão do juiz, por outro lado e até onde sei, é inédita. Mas sua novidade, no entanto, está circunscrita ao ato – aliás, inconstitucional, o que tampouco parece fazer diferença em um país onde juízes driblam a legislação para contabilizar ganhos acima do teto constitucional.

No Brasil, a guerra contra os pobres vem de longa data. Mesmo antes de nos tornarmos nação, após nossa independência e durante o século XX, já no período republicano, nossas elites (econômicas, políticas ou intelectuais) não se furtaram a defender medidas drásticas, às vezes com o lastro da ciência, quando se tratou de sujeitar grupos vulneráveis. A decisão do juiz de Mococa é inédita, mas não é nova, porque retoma e atualiza uma ideia que foi lugar comum nas democracias ocidentais há até pouco menos de um século.

Eugenia e políticas de esterilização – Impulsionadas pelas teses naturalistas surgidas ainda nas primeiras décadas do século XIX, as teorias eugênicas se desenvolveram ao longo da segunda metade do oitocentos. Em seu cerne, a concepção da evolução humana como resultado imediato de leis biológicas e naturais que determinam o comportamento humano, sendo as raças constitutivas de um processo evolutivo no interior do qual se configuraram e cristalizaram as desigualdades.

A naturalização das diferenças legitimou um conjunto de proposições com desdobramentos políticos significativos: se as desigualdades são racialmente determinadas e estruturadas na natureza das populações, é possível asseverar a superioridade de uma raça sobre outras, mesmo a um nível mais cotidiano, afirmando a continuidade entre os caracteres racialmente determinados e a conduta moral dos indivíduos, por exemplo. A expansão colonialista levada a cabo pelas potências europeias se assentou, em grande medida, nesses discursos.

Amplamente aceita pela comunidade científica, a eugenia orientou igualmente ações políticas e governamentais dentro dos próprios países em que foi formulada. Nos Estados Unidos, por exemplo, estima-se que pelo menos 70 mil americanos foram esterilizados compulsoriamente, a esmagadora maioria mulheres, nas primeiras décadas do século XX. Os esforços americanos chamaram a atenção de Hitler, que tratou de aprimorar as tecnologias de eliminação dos indesejados, elevando-as a parâmetros industriais de resultados bárbaros e trágicos amplamente conhecidos.

A política eugenista de esterilização em massa seduziu também cientistas e políticos brasileiros. Uma das bandeiras da Sociedade Eugênica de São Paulo, criada pelo médico Renato Kehl em 1918 e que nos anos subsequentes tornou-se um movimento mais nacional, era a revisão do Código Civil. Ele defendia a inclusão de um dispositivo que autorizasse o Estado a proibir o casamento entre indivíduos que apresentassem algum risco da geração de uma prole com tendência à degenerescência. Em algumas versões, a proibição do casamento foi substituída pela esterilização compulsória.

Guerra contra os fracos – Houve um recuo dos discursos eugênicos depois da Segunda Guerra, por razões óbvias. Mas isso tampouco significou, particularmente no Brasil, um abrandamento das relações tensas e violentas entre o Estado e os grupos dominantes, cujos interesses sempre coincidiram, e as populações fragilizadas. Do golpe de 64 aos esquadrões da morte e à Candelária; dos massacres de Eldorado do Carajás ao Carandiru; de Belo Monte à Maré; da prisão de Rafael Braga ao assassinato de Marielle Franco, o Estado de exceção tem sido a regra.

Não surpreende que o recrudescimento de discursos eugênicos, incluindo a defesa da esterilização compulsória, ganhou novo fôlego com as políticas públicas de inclusão que, nas primeiras gestões petistas, impulsionaram a ascensão social de parcelas da população mais pobre. Misto de desinformação e preconceito, proliferaram desde então discursos que insistem em condenar grupos inteiros a uma espécie de subcidadania. E eles incluem assegurar ao Estado o direito de interferir nos corpos, notadamente naqueles considerados descartáveis, precários, indignos mesmo do luto, na expressão de Judith Butler.

E tem sido sobretudo os corpos femininos o objeto privilegiado desse novo front reacionário. Um exemplo: em 2014, o deputado estadual Carlos Bolsonaro, um dos herdeiros de Voldemort, defendeu que o Bolsa Família fosse concedido apenas às famílias cujas mulheres aceitassem se submeter “às cirurgias de laqueadura”. Como bom “liberal conservador”, Bolsonaro argumentava a favor da “liberdade individual” porque, mesmo garantindo ao Estado normatizar e condicionar o recebimento de um benefício à esterilização das beneficiadas, a cirurgia seria “uma escolha do cidadão”. O pai deve ter se sentido orgulhoso.

Não há nisso surpresa ou coincidência. De um lado, parte dos programas sociais, como o Bolsa Família, transfere a elas responsabilidades e lhes dá maior autonomia, “empoderando” mulheres de extratos economicamente mais desassistidos. De outro, assistimos uma ofensiva que desqualifica as políticas e discussões de gênero, vinda de parlamentares e entidades como o Escola sem Partido. A violência contra Janaína Quirino, nesse sentido, é a expressão de um desejo cada vez menos contido de estendê-la a outros e, principalmente, a outras Janaínas. A guerra contra os fracos não tem fim. Contra as mulheres, tampouco.

terça-feira, 12 de junho de 2018

Lula leu 21 livros em 57 dias. E os botocudos puseram a boca no mundo...

POR JOSÉ ANTÓNIO BAÇO
“Lula leu 21 livros em 57 dias”.
Só num lugar dominado por gente atrasada o tema podia virar polêmica. Mas esse lugar existe. E nem sou eu a dizer. Uma pesquisa divulgada no ano passado revela que a população brasileira é a segunda, entre 38 nações investigadas, com maior dificuldade em entender a própria realidade. Sempre foi assim, mas as redes sociais tornaram essa evidência gritante.

E por falar em social media, foi justamente no Twitter que o tema dos livros lidos por Lula ganhou força. A coisa acabou mesmo no plano da aritmética. Uma moça de nome Bruna Luiza produziu a seguinte pérola: “Se cada livro tem 150 páginas (o que é pouquíssimo para um livro normal), são 3150 páginas. Lula teria que ler 55 páginas por dia. Qualquer pessoa que costuma ler sabe que isso é irrealista, especialmente para um semi-analfabeto”. Viu?

Ora, é apenas ranço, preconceito e aquilo que podemos chamar ignorância petulante. O Brasil é um país onde persiste a lógica do apartheid social (ricos de um lado e pobres do outro) e ter um curso superior faz muita gente acreditar que é superior. Essa falta de noção faz com que muitos se sintam com autoridade para chamar o ex-presidente de analfabeto – ou semi-analfabeto, como no caso da moçoila.

É fato. Num país como o Brasil, onde a educação sempre foi privilégio, o diploma ainda funciona como elemento de distinção. Mas a verdade é que o país está cheio de obtusos com diplomas. Todos sabemos que, na prática, há pessoas que obtêm um canudo sem terem lido pelo menos dois míseros livros inteiros (se duvida, fale com algum professor). Tudo o que essas pessoas têm são noções epidérmicas sobre os fatos.

A ignorância petulante é resultado desse mal calculado complexo de superioridade. É uma auto-ilusão que leva as pessoas a se imaginarem num patamar intelectual elevado, quando, muitas vezes, estão abaixo disso. Muito abaixo. É o que mostra o caso da moça do Twitter, que considera irrealista ler 55 páginas num dia. Ah, minha cara Bruna Luiza, nem sempre é fácil entender que as nossas limitações são apenas nossas.

O preconceito impede de ver as coisas mais óbvias. Se uma pessoa se julga melhor que as outras apenas porque lê (e aqui há muito a questionar) ou porque tem um diploma, então ela é parte do problema. Aliás, é  um saco ver analfabetos funcionais - que às vezes sequer funcionam – arrotando superioridade apenas porque têm um canudo. Eita papo botocudo.

Enfim, parece muito provável que o ex-presidente tenha lido os tais 21 livros em 57 dias, até porque tem tempo de sobra. E, para finalizar, fica a dica: não tenho receio de afirmar que Lula entende mais de economia do que muito economista, de sociologia do que muito sociólogo, de administração que muito administrador. Entendedores entendem...

É a dança da chuva.


segunda-feira, 11 de junho de 2018

Uma geston eficientizaçada #sqn


POR JORDI CASTAN

Não posso evitar o sentimento de otário quando cruzo na rua com um desses sinaleiros “eficientizados” que geram uma economia de R$ 720.000 ao ano. Primeiro, porque uma administração pífia e inepta pode fazer qualquer coisa menos eficientizar alguma coisa. Nem o verbo “eficientizar” aparece no Aurélio. Deve ser desses neologismos que burocratas ficam inventando nas suas horas diárias dedicadas a praticar o onanismo mental.

Em outras palavras, esta gestón ineficiente, que vituperou a inteligência coletiva do joinvilense afirmando que não faltava dinheiro, mas gestão, mostrou depois de poucos dias que não tinha nem dinheiro, nem gestão. A resposta à eficientização dos sinaleiros veio na forma de um aumento brutal da COSIP. Assim, o joinvilense paga mais caro pela eficientização dos sinaleiros. Bingo! Alguma dúvida que o resultado seria esse?

Depois de trocar todas as luminárias vermelhas do Carlito pelas novas de LED, que são mais eficientes e, portanto, consomem menos energia, a lógica diria que a economia deveria ser transferida para o cidadão. E o valor extorsivo da COSIP seria reduzido. Nem preciso avisar que isso não vai acontecer. Seguiremos pagando mais caro pela eficientização da iluminação pública. E ganharemos o pomposo titulo de otário do ano, na categoria ouro, com menção honrosa. Porque trouxa que é trouxa merece ser homenageado e sua bovina mansidão reconhecida publicamente.

Em tempo, nenhum vereador tem se manifestado pelo desperdício de recursos públicos que representa converter em sucata as luminárias substituídas com menos de um terço da sua vida útil. Porque cidade rica se faz assim, jogando fora o que ainda serve, aumentando os valores das contribuições e taxas e administrando cada dia pior.

Para não ficar restrito à eficientização da iluminação pública, podemos incluir a da sinalização horizontal, as mudanças de trânsito, intempestivas e sem estudos técnicos que as sustentem, ou a administração por tentativa e erro. Com mais erros que tentativas, o que, convenhamos, tem muito mérito porque não é fácil cometer mais de um erro em cada nova mudança.

sexta-feira, 8 de junho de 2018

O ativismo identitário e a segunda morte de Dona Ivone Lara

POR CLÓVIS GRUNER 

O ativismo identitário conseguiu mais uma vitória de Pirro. Apenas três dias depois de anunciada como a intérprete de Dona Ivone Lara no musical “Dona Ivone Lara – um sorriso negro”, a sambista Fabiana Cozza renunciou ao papel, após os ataques violentos que sofreu de militantes ignorantes, entre outras coisas, que sua escolha não foi um capricho da produção do espetáculo.

Seu nome contava com o aval dos familiares de Ivone Lara e da própria biografada – falecida em abril último, aos 96 anos –, pois o projeto começou a ser concebido na década passada. A justificativa para a investida contra Fabiana foi que, filha de pai negro (e sambista) e mãe branca, ela não é uma “preta retinta”. Ao aceitar interpretar Dona Ivone Lara nos palcos, Cozza estaria usufruindo do privilégio de ter a pele mais clara e contribuindo para a invisibilidade de artistas negros de pele mais escura.

Não vou discutir a cor da pela e a negritude de Fabiana Cozza. Gente mais capacitada e com legitimidade de sobra já o fez, em apoio a ela – Leci Brandão, Chico César, Emicida, além dos familiares e da própria Ivone Lara. Meu objetivo é discutir a violência que tem sido a tônica da atuação de parte da militância, particularmente nas redes sociais, capitaneada por influenciadores e influenciadoras digitais ávidos por likes e novos seguidores.

A quem acompanha a terra quase sem lei que é a internet, não é novidade que parcela da esquerda brasileira que a frequenta, os chamados “movimentos identitários”, se caracteriza pela prática de um policiamento moralista, arrogante e autoritário. Hostis ao diálogo com quem consideram diferentes – e a diferença se tornou evidência e prova de culpa –, são pródigos em apontar inimigos por toda parte, nem que isso signifique produzi-los.

O comportamento é mais abertamente visível nos "influenciadores de opinião”. Com milhares de seguidores alguns deles, eles parecem menos preocupados em abrir espaços de discussão, qualificar o debate público, em suma, desmantelar as muitas estruturas de poder e preconceito que os oprimem, e mais em uma busca incessante por curtidas e comentários elogiosos, pela sensação de que exercem uma influência sobre um número cada vez maior de seguidores.

A política da lacração – Nesse sentido, a performance é mais importante que a argumentação, e quanto mais intolerante e sectário o comportamento com o interlocutor, maior a “lacração”. Há um misto de preguiça, arrogância e covardia a sustentar uma prática que prescinde do diálogo, substituindo-o pelo ressentimento puro e simples, e confunde confronto com violência, tomada aqui em sua acepção mais restrita: o ato de intimidar, pelo recurso à força – que é, nas redes, principalmente discursiva – aquele que se pretende desqualificar.

Há muita preguiça em uma rede de circulação de textos e ideias que, basicamente, se alimenta e retroalimenta de uma maneira autorreferente e autossuficiente. Em um bom número de blogs e perfis de ativistas, não apenas o esforço de leitura começa e termina dentro da própria rede, como se compartilha um tipo de convicção ingênua de que os movimentos negros, feminista e LGBT nasceram com eles. O passado, quando aparece, surge de forma anacrônica, quando não meramente ilustrativa.

Como resultado, se ignora o esforço de construção desses movimentos e as muitas e complexas redes que os ligam a diferentes temporalidades. Dito de outro modo, falta historicidade a uma boa parte dos movimentos e ativistas, que parecem viver em um contínuo presente porque julgam desnecessário inserir sua militância em um tempo mais amplo, que contemple o passado e suas descontinuidades, seus avanços e recuos.

A fixação no presente explica também a arrogância que se expressa em uma espécie de estoicismo vulgar e virtual: na conduta do militante, sempre moralmente certa e reta, não há espaço para a incoerência e a contradição. Esse novo estoicismo, de verniz moralizante, justifica a exposição pública, a desqualificação, o linchamento de quem escapa a ele e a identidade que o define. Lombrosianos redivivos, os militantes identitários atribuem ao seu inimigo um olhar determinista que naturaliza sua diferença, transformada em uma desigualdade irredutível.

Há algumas explicações possíveis para essas condutas. Uma delas é de que, sem vitórias significativas, apesar de algumas conquistas mais ou menos pontuais, e depois de verem suas reivindicações incorporadas, diluídas e, algumas delas, nunca atendidas, por governos de esquerda – a descriminalização do aborto, por exemplo, nunca avançou –, sobrou a esses movimentos a truculência e o extremismo alimentados, ambos, pelo ressentimento.

Tornado afeto central da militância identitária, o ressentimento é potencializado nas redes sociais. Elas permitem que sentenças sejam rapidamente promulgadas e executadas pelos tribunais populares midiáticos, sem o filtro da reflexão mais ponderada, do debate, do enfrentamento de posições, resumindo tudo a acusações que cabem em uma ou duas frases, com algum esforço, em um post. Grosso modo, os movimentos identitários retiveram o pior da justiça tradicional – seu caráter excludente, por exemplo –, sem preservar, no entanto, seus poucos méritos.

A identidade como violência – Em seu livro “Identidade e violência: a ilusão do destino”, o economista indiano Amartya Sen nos lembra que as identidades (étnicas, religiosas, de gênero, etc.) tanto confortam como matam, denunciando o risco do que chama de “cativeiro” quando a cultura se deixa dobrar à “ilusão identitária”. Ele defende que identidades são plurais e as fronteiras entre elas, porosas e historicamente constituídas.

Isso não significa renunciar a características que definem, simbolicamente, nosso “lugar” no mundo, nem desconhecer as desigualdades hierárquicas que atravessam as relações entre diferentes culturas. Mas reduzir a identidade a algo absoluto, uno e coeso é perigoso porque, entre outras coisas, incentiva a construção e a percepção do outro como inimigo, tomando-o a partir de uma essência (étnica, religiosa, de gênero, etc.) ela própria artificial – não desempenhamos, socialmente, um papel único, mas múltiplos, plurais e não raro contraditórios papéis.

Um dos custos dessa busca por uma identidade singular e essencialista é o reconhecimento sempre limitado do outro, dificultando as possibilidades do encontro e da troca dialógica a partir de características mais ou menos comuns. E se Sen associa esse movimento em especial aos grupos e ideias nacionalistas de cunho mais conservador, no Brasil tem sido principalmente parte da esquerda a desempenhá-lo.

Os ataques contra Fabiana Cozza são apenas o mais recente, mas não o primeiro e, desconfio, nem o último caso de violência simbólica, protagonizado pelas redes de militância em nome da identidade e reivindicando, como justificativa, o combate à discriminação e suas consequências. Não há dúvidas que denunciar e combater as diferentes formas de preconceito e suas muitas violências é uma tarefa ética e política das mais urgentes.

Mas se a intenção é realmente desmantelar as estruturas profundas que os produzem e reproduzem, a militância identitária poderia tentar substituir a estratégia do linchamento e da desqualificação pelo confronto e a crítica capazes de forjar alianças, por exemplo, ao invés de se fecharem e cerrarem possibilidades de diálogo. Afinal, o ativismo identitário, suponho, sabe quem são seus verdadeiros inimigos.

Mas a enfrentá-los, inventa novas monstruosidades e produz novos inimigos a serem combatidos e linchados publicamente, em uma sanha persecutória e punitivista que condenamos quando vem da direita ou do Estado. E supõe, ou simplesmente finge supor que, com essa prática lamentável em que se cruzam egos, ressentimentos e disputas mesquinhas por nacos de poder, está de fato tornando esse mundo um lugar mais suportável. Mas não está.

quarta-feira, 6 de junho de 2018

10 cuidados para ter no Facebook

POR LEO VORTIS
Durante muito tempo, o mundo viveu apenas com as esferas privada e pública. Mas as redes sociais vierem mudar essa realidade, introduzindo o conceito de esfera digital. As redes sociais, em especial o Facebook, são muito boas para comunicar, mas também podem representar um perigo em termos de quebra de privacidade.

Depois do escândalo da Cambridge Analytica, a imprensa mundial passou a fazer listas de recomendações sobre cuidados que você deve ter em relação ao Facebook. E hoje, baseado num texto do britânico “The Independent”, publico aqui um decálogo a conter algumas recomendações essenciais para preservar a sua privacidade.

1. A data do aniversário
Muita gente usa a data de aniversário como senha para muitas ações online. É possível que alguém parta desse dado para tentar acessar a sua conta bancária ou obter dados pessoais.
2. Número de telefone
Já imaginou alguém que você não conhece - e nem quer conhecer - telefonando a qualquer hora? Ou pior, entrando num processo de cyberbulling ou stalking – de cariz sexual ou não.
3. Abrir mão dos “amigos” 
Que tal abrir mão dos amigos que não são amigos? Segundo o “The Independent”, o professor de psicologia de Oxford, Robin Dunbar, desenvolveu uma tese segundo a qual uma pessoa só consegue manter  cerca de 150 relacionamentos estáveis. E a maioria dos amigos virtuais não estará ao seu lado quando precisar deles.
4. Fotografias de crianças ou jovens? Não…
Para começar, uma criança não pode dar permissão, mesmo aos pais. E como nunca se sabe quem está do outro lado, a melhor ideia é não abrir portas para intrusos, ainda que teoricamente virtuais.
5. Não revele a escola dos seus filhos
O número de crimes sexuais registrados tem crescido em alguns países. Evite dizer onde o seu filho está, porque os agressores sexuais podem estar à espreita.
6. Evite serviços de localização
Os sistemas Android ou o iPhone têm serviços de localização. Evite usar. Porque se alguém deseja prejudicá-lo não é boa ideia ele saber onde você está.
7. Evite comentários sobre o seu local de trabalho
É um caso comum. Cuidado com o que diz no Facebook, em especial sobre o trabalho. Qualquer pessoa – no caso, um chefe – pode acessar o seu perfil e ver o seu comportamento. Evite críticas públicas à sua empresa. Ah... mas há formas de excluir o acesso de certas pessoas.
8. Não marque o seu endereço
Muita gente marca o lugar onde vive e fornece o próprio endereço. Pode haver problemas. Por exemplo: há pessoas que gostam de mostrar fotografias das férias, enquanto ainda estão fora. Tudo bem. Mas é melhor não esquecer que há gente mal intencionada (os tais amigos do alheio) que fica sabendo que você não está em casa.
9. Numa relação? 
Guarde essa informação para si e para a sua vida pessoal. Há muitas razões. A primeira é que os relacionamentos acabam e a mudança de status sempre chama a atenção. A outra é que pessoas que não gostam de você também podem começar a chatear a sua cara metade. O mesmo vale para o resto da família.
10. Detalhes do cartão de crédito
Mas nem que a vaca tussa.

terça-feira, 5 de junho de 2018

Foram pedir intervenção no 62º BI? Só pode ser fake news...

POR JOSÉ ANTÓNIO BAÇO
As fake news são um problema sério destes tempos. É preciso ter muito cuidado com as coisas que aparecem na internet (e não só). E dou um exemplo recente de notícia falsa: circula, por aí, um vídeo que mostra uns grunhos em frente ao 62º Batalhão de Infantaria de Joinville pedindo intervenção militar. Tem que ser fake.

Só pode ser um vídeo forjado, com imagens falsas e uso de montagem em pós-produção. Está na cara que é fake, porque não há gente assim tão burra em Joinville. Eu, pelo menos, me recuso a acreditar. É uma cidade conservadora, sim, mas nunca desceria a esse nível de estupidez.

Aliás, a mentira é tanta que até vi umas imagens onde aparecem pessoas vestindo a camisa amarela da CBF. Ah... conta outra. Quem tem coragem de usar essa camisa depois da desgraça que têm sido os dois anos do governo Temer? Não em Joinville. E quem tem a falta de juízo de pagar 450 pilas por uma camisa que virou sinônimo de mico?

O filme é tão falso que aparece o argumento mais jegue possível. Se as Forças Armadas não ficarem ao lado da população, o Brasil vira uma Venezuela. Uai! Não faz sentido. Até porque não há esse perigo. Lá Maduro está a resistir o quanto pode para não entregar o petróleo. No Brasil, o pessoal entregou facinho, facinho para os gringos.

Para completar a insanidade, li o seguinte: “Os brasileiros não são venezuelanos! É hora das Forças Armadas trabalharem para a nação brasileira e não para um governo que quer que a nação pague o que foi roubada dela”. Peraê. Será que estão a falar de Temer, o resultado impeachment que eles pediram?

Só pode ser fake. Ninguém em Joinville seria tonto ao ponto de dizer esse tipo de asnice em público. E ninguém seguiria um maluco desses. Porque a ser verdade, só restaria usar a lógica do ditado antigo: se cobrir vira circo, se trancar vira hospício. Meu santo Simão Bacamarte, aí seria um caso de internamento.

É a dança da chuva.


Notícias fresquinhas (e verdadeiras) para os que acreditam não ter havido corrupção durante a ditadura militar

segunda-feira, 4 de junho de 2018

A greve dos caminhoneiros pôs o país de joelhos. E agora?


POR JORDI CASTAN
Não há como não comentar a greve dos caminhoneiros, seu desenvolvimento, seus impactos e os aprendizados a tirar dela. Comentar o que foi, o que não foi ou, melhor ainda, o que poderia ter sido e não foi.

Primeiro, não foi surpresa. Se alguém no governo - ou nos governos - diz ter sido pego de surpresa ou mente ou achou que não ia dar em nada, como quase tudo neste Brasil. Não foi falta de aviso. O setor de transporte rodoviário vive, desde faz tempo, numa crise que só tem se agravado. Cresceu - e muito - na onda dos preços controlados pelo governo e no crédito fácil que estimulou o consumo e levou ao aumento da frota além do necessário. Se agigantou na falta de infraestrutura adequada e disparou de vez quando a Petrobras passou a praticar preços de mercado. E acabou o sonho.

Um frete rodoviário de Natal a São Paulo custa aproximadamente R$ 16.000, dos quais quase R$ 13.000 são para pagar o óleo diesel, outros R$ 1.200 para pedágios, o resto para pagar o desgaste de pneus, manutenção, salário e despesas. E ainda falta remunerar o investimento. As contas só saem mesmo para quem não tem contato com o Brasil real.

É evidente que essa bomba estouraria mais cedo ou mais tarde. Estourou por conta do preço do óleo diesel e quando os caminhoneiros receberam o apoio da população. Porque é importante lembrar que, antes que aparecessem os oportunistas de sempre, a maioria da população apoiou a greve. Depois aos poucos o movimento foi perdendo foco. Ou talvez ganhando foco, até porque o foco era o preço do diesel e dos pedágios. E na medida em que o governo, tardiamente e devagar demais, atendeu as reivindicações dos grevistas, o brasileiro percebeu que de novo seria ele quem teria que pagar a conta. E neste ponto o apoio começou a arrefecer.

O resultado é que o governo não mexeu onde deveria. Todos vamos pagar o subsídio concedido aos caminhoneiros e ,já sabemos, que este modelo de subsídios pontuais a determinadas categorias em detrimento de outras, não resolve o problema, que fica só postergado. O Brasil precisa cortar na carne. Precisa cortar o número de carros oficiais, os supersalários - acima do limite constitucional -, os benefícios ilegais e imorais. Precisa reduzir as estruturas inchadas e ineficientes, cortar os R$ 28.000.000 que custa por dia o Congresso Nacional. Precisa cortar a carga tributária.

E não só não o fez, como escolheu cortar na saúde, na educação e na desoneração das exportações. Sem reduzir o tamanho do Estado, o Brasil não tem solução. O gasto público está fora de controle e o que poderia ter sido o início de um movimento para reduzir o tamanho do estado e cortar o gasto público acabou sendo só uma greve por R$ 0,46.

O Brasil segue deitado eternamente em berço esplendido. Quanto maior for o governo, menor será o cidadão. A greve expôs a fragilidade de um país que não tem nem governantes, lideranças e nem a infraestrutura capazes de enfrentar os problemas de frente e resolvê-los. O alerta está dado. O Brasil é um gigante com pés de barro. Se houver uma próxima greve, porque não devemos nos surpreender se tivermos outra a curto prazo, que seja geral, mais longa e com o apoio de todos, não haverá governo que resista. Um grupo de caminhoneiros usando WhatsApp colocou o país de joelho. É bom não esquecer.

Em tempo: tanto Santa Catarina como Joinville foram um péssimo exemplo de como lidar com uma greve. O governador e o prefeito agiram tarde e mal. Não estavam preparados para lidar com a gravidade da situação. Foram mal assessorados e não tiveram à altura da responsabilidade necessária.