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terça-feira, 11 de agosto de 2015

Plano de Educação: um choque ideológico.

POR PEDRO LEAL

Enquanto gênero é mantido fora do plano, uma realidade
cruel é exposta por movimentos sociais. Foto por Jéssica Michels
Aconteceu: a revelia dos movimentos sociais, que julgavam o plano incompleto e que não foram ouvidos, o Plano Municipal de Educação foi aprovado pela câmara, com apenas um voto contrário. Enquanto alguns podem ver a aprovação do plano como algo positivo e vantajoso para a cidade (afinal, é um plano de educação, e quem poderia ser contra um plano de educação, não é?), a aprovação em primeira instância é um problema significativo.

Em uma cidade com 17% de negros, e em um país que acumula casos diários de machismo, homofobia e transfobia, as minorias foram deixadas de lado. Embora o estado brasileiro seja nominalmente laico, a intromissão religiosa no poder público é cada vez mais comum. E tudo isso se faz manifesto em um plano de educação que, a revelia de recomendações da ONU e da Unesco, a revelia de legislação federal, e a revelia do princípio de laicidade, deixa de fora discussões importantes sobre raça, gênero, religião e orientação sexual.

Como notou em seu pronunciamento durante a sessão a outrora colunista do Chuva Ácida Emmanuelle Carvalho, estamos em uma cidade que ignora o ensino de história e cultura africana, determinado em lei desde 2003. Do contrário: professores tem sido impedidos de lecionar a respeito das religiões de matriz africana, ante a pressão por parte de conservadores. Coisa que não ocorre apenas em Joinville. Alunos de religiões africanas estão entre as principais vítimas de discriminação religiosa no país - e a escola é onde elas se sentem mais discriminadas.

Da mesma maneira, há um forte movimento organizado para impedir a inclusão de discussões sobre discriminação sexual e identidade de gênero nas escolas, assim como para combater a discriminação religiosa. Isso porque ao buscar a igualdade de direitos e a tolerância, as escolas estariam “passando por cima de valores familiares” e “anulando a identidade da criança”. Da mesma maneira, o reconhecimento da identidade de gênero ou da orientação sexual do jovem é vista por estes como "imposição". Sua negação, "seguir a natureza". Um paradoxo onde respeitar os desejos do indivíduo é impor, e negar sua essência é "dar liberdade". Lembrando que as tentativas de "endireitar" jovens LGBT são violentas, agressivas e muitas vezes terminam por condená-los a abandonar os estudos e o convívio familiar.

Grupos conservadores veem isso como imposição de “ideologia de gênero” e “intolerância religiosa” (sim, combater a discriminação de não cristãos é intolerância religiosas para alguns). como se a presunção tradicional quanto aos papéis de gênero e a heteronormatividade imposta não fossem também ideológicos. E como se fosse um direito impor seus preconceitos e suas opiniões sobre as crianças - argumento que nos EUA já foi usado para ditar o que pode ser ensinado em aulas de ciências e história, incluindo para tentar apagar menções ao período escravocrata.

Não há tal coisa como um discurso isento de ideologia. Como já bem dizia Bakhtin, todo signo é ideológico, seu significado dado pelo contexto e por construções sociais. E por extensão, toda linguagem o é. Dessa maneira, a ideia de um discurso, um uso deliberado da linguagem, que seja isenta de preconcepções ideológicas é um completo oximoro, tal qual “água seca” ou “gelo quente”.

A aprovação do plano de educação como está, o asco contra “ideologia de gênero” e a resistência contra o reconhecimento da laicidade estatal são provas fortes do debate ideológico que nos cerca: um embate entre um status quo vigente que se julga isento de ideologias e se vê ameaçado pelas tentativas de mudar o quadro social. E que se julga “igualitário” enquanto excluí aqueles que não se encaixam dentro de sua visão de mundo. Visão de mundo que teimosamente se diz "neutra" e "natural", isenta de preconceitos. Que se enxerga como a pura verdade, sem "corrupções'.

Vários dos tópicos que foram excluídos do plano quando este foi apresentado em junho foram justificados como formas de "evitar a intolerância religiosa contra cristãos". Pois bem: se permitirmos a discriminação para evitar a "intolerância pela discordância" (que me leva a pergunta em como reconhecer pessoas trans- por seu gênero ou reconhecer os direitos de outras crenças, por exemplo, prejudica religiosos), não estamos combatendo um preconceito. Estamos colocando este um grupo acima de todos. E isso é terrível para a democracia e para o convívio social.

Que esses problemas sejam corrigidos pela Comissão de Educação -  e que esta ouça os movimentos sociais ignorados na elaboração do plano. Eu me aprofundaria mais nos problemas em específico, mas acho que essa é uma tarefa para os membros dos movimentos sociais envolvidos - mais capacitados do que eu para falar dessas questões.

segunda-feira, 4 de maio de 2015

Davizinhos...

Davizinho por trás da máscara de bom moço
Crédito: Vitor Teixeira
POR PEDRO H LEAL

O clima atual exige que eu requente o personagem. Afinal, Davizinho nunca esteve tão vivo, tão ativo e tão raivoso.

Davizinho é um cidadão de bem; é uma pessoa direita - respeita as leis, paga seus impostos em dia, trata todos igualmente, luta pela democracia e pela liberdade. É íntegro e coerente, bem informado e respeitoso.

Ou assim ele gosta de pensar... Davizinho é um tipo bem comum que repete os mesmos bordões de senso comum para tudo, mas é um cidadão correto e íntegro, não é?

Quer dizer, ele respeita as leis de verdade, né? Nada de errado em comprar contrabando, em piratear, não é? "Bandido bom é bandido morto", diz Davizinho, sua resposta pronta para a violência urbana, mas quando tem que mostrar documentação na blitz é "abuso de autoridade". Para manifestante, a resposta pronta é bala de borracha, mas pro empresário que usa mão de obra irregular? "O estado tem que tirar a mão da economia". O rapazote que lhe abordou de madrugada? Tem que ser jogado na cadeia pro resto da vida! Agora, o colega que foi processado por racismo? "Ah, mas e a liberdade de expressão?".

Ele trata todos igualmente, ou assim gosta de pensar. Davizinho não é racista - ora, ele sequer acredita que isso exista! Não, o problema, diz ele, é que os negros se vitimizam demais e o branco é oprimido nisso. "Racista, eu? Ora, mas minha empregada é negra!" responde: "A polícia não é racista, tem PMs negros", alega: "Se tantos negros não fossem bandidos, não teria porque barrar eles", defende - sempre tapando os olhos. Ele desviar quando vê o rapaz de pele mais escura vindo a distância não tem nada de racismo, não, é só precaução. "Esse é o tipo do bandido", explica.

Tampouco é homofóbico. Só não quer essa "depravidade" perto dele. "Quer ser gay, é escolha sua", diz, "Só faça isso longe da minha vista". Pro Davizinho típico, que totalmente não é homofóbico, vivemos uma ditadura gay. A mera ideia de um beijo gay na TV lhe causa repulsa. Legalizar o casamento civil, uma afronta aos direitos individuais, mas como afronta, ele não consegue explicar. E se o filho for gay? "Não tenho que me preocupar com isso, meus filhos serão criados direito". Pois como todos sabem... isso aí de viadagem? É pai relapso.

Davizinho acredita piamente na meritocracia e por isso, se opõe intensamente à programas sociais. "Depois pobre se enche filho pra ganhar bolsa família e não ter que trabalhar", reclama o Davizinho, tirando informação sabe se lá de onde. Se ele conseguiu chegar onde está, por que esses vagabundos não conseguem? Afinal, ele também é pobre - certo que estudou em colégio particular e já tirou férias na Europa, mas a ajuda dos pais nada teve a ver, não é?

Ao menos ele é bem informado. Quer dizer, ele não lembra quando foi a última vez que leu um jornal. Todo mundo sabe que a mídia é governista e mentirosa. Do que importa, ninguém cobre: Ninguém fala da perseguição contra os empresários; dão espaço para "vagabundas", mas não se fala de como o homem é oprimido; cheio de cobertura de protesto, deviam proibir isso (a cobertura. O protesto, Davizinho já proibiu na sua cabeça).

Os mensaleiros foram julgados e condenados, mas Davizinho ainda bate nessa tecla. "O maior esquema de corrupção da história", diz e quando confrontado com esquemas maiores? "Tem muita coisa que não foi descoberta porque a mídia petista acobertou!". O alvo da vez é “o petrolão”, mas o resto ele ignora. Seu envolvimento com as notícias se resume àqueles comentaristas que dizem o que ele quer - tipo aquela moça que falou do carnaval... Ela falou agora dos bárbaros invadindo o espaço de bem e dos vândalos disfarçados de professores, né?

Bom mesmo era na ditadura - não que Davizinho admita isso: quer dizer, ele admite que é a favor dos militares. Só não admite que era uma ditadura, porque "ditadura é coisa da esquerda". E de esquerda ele entende: nazismo? esquerda. Ditaduras? Todas de esquerda! Obama? Comunista! Partidos no Brasil? Todos de esquerda. Ele ouviu assim. Aquela verdade que vem da barriga, e não do cérebro essa é o bastante pro Davizinho.

É. Davizinho é um cidadão de bem... Mas ele é bem intencionado, e não é isso que importa? O seu coração está no lugar certo, pensa o Davizinho. Ele só quer livrar a sociedade desses parasitas e gerar um espaço onde o cidadão bem seja seguro e protegido contra os "bandidos". E não é isso que importa? Agora só espera um minutinho que Davizinho tem que ir desumanizar a rede um pouco.

*Qualquer semelhança com Davis reais ou imaginários é coincidência - Nem todo Davizinho é Davi, e nem todo Davi é Davizinho. Qualquer semelhança com o célebre (e aposentado) personagem Almeidinha não é: Davizinho e Almeidinha são parentes - praticamente pai e filho.

quinta-feira, 28 de novembro de 2013

Festival de Bizarrices que Assola o País II


POR CLÓVIS GRUNER

Fiquei meio fora do ar a semana toda. Sem tempo até pra fuçar no Facebook, alimentei secretamente a esperança de, ao colocar de volta a cara na realidade – virtual ou não – seria gratamente presenteado com algumas boas notícias. Mas nada: o noticiário continua a produzir bizarrices em escala geométrica. Tantas que precisei de um bisturi para selecionar apenas as quatro que compõem o segundo volume do meu Febiapa – o Festival de Bizarrices que Assola o País.

DO DOMÍNIO DO FATO AO DOMÍNIO DO FRETE – Com um zelo surpreendente para uma imprensa e mídias que há até alguns dias pareciam dispostas a moralizar o país, ficamos sabendo do “helicóptero de carreira” de um deputado estadual de Minas Gerais, apreendido com inacreditáveis 400 quilos de coca. Não, você não leu errado nem eu me equivoquei: não eram 400 litros de Coca, a Cola, mas quase meia tonelada do mais puro pó, aquele que não levanta poeira. O deputado se chama Gustavo Perrella e pertence a um partido recentemente criado, o Solidariedade. Ele e o pai, o senador José Perrella (PDT), são aliados do governador e presidenciável Aécio Neves, do PSDB, o que talvez explique a solidariedade – com o perdão do trocadilho – dos meios de comunicação. O deputado tratou de responsabilizar rapidamente piloto e co-piloto, afirmando nada saber sobre a carga cheirável transportada em seu helicóptero.  Aliás, o combustível da eufórica viagem foi todinho pago pela Assembleia Legislativa de Minas. Bizarro.

DURA LEX, TUDO BEM; MAS SED LEX JÁ É VANDALISMO – Flagrado como responsável por um rombo de mais de meio bilhão de reais – estimativas falam de R$ 570 milhões, aproximadamente –, o PSDB decidiu se defender. E o fez acusando o Ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo, de manipular as investigações sobre a quadrilha que, sob o comando de tucanos de altíssima plumagem, passou os últimos anos superfaturando obras no metrô paulistano. E como o ministro teria manipulado o processo? Ora, enviando provas e demais documentos do caso à Polícia Federal. Isso mesmo. Para a alta cúpula tucana, o problema não é o superfaturamento, nem a propina paga aos políticos do PSDB ou os enormes prejuízos causados aos cofres públicos de São Paulo. O problema mesmo, de verdade, é que o Ministro da Justiça fez o que se espera de um Ministro da Justiça e encaminhou documentos e provas à PF, tudo com a clara intenção de prejudicar o PSDB e desviar a atenção para a prisão dos mensaleiros, óbvio. Não deu muito certo, porque os principais veículos de informação continuam a falar muito de Dirceu e Genoíno e muito pouco da corrupção em São Paulo, numa desproporção que seria intrigante não fosse tão reveladora. Em homenagem a FHC: très bizarre.

DIVERSIDADE, DESDE QUE BEM BRANQUINHA – Como quem manda na Copa é a FIFA, e o Brasil será sede do certame em 2014, andamos um tanto submissos aos caprichos da entidade. E eles são muitos. Nessa semana, os donos da bola decidiram que Lázaro Ramos e Camila Pitanga não era o casal apropriado para apresentar a cerimônia do sorteio da Copa do Mundo. Vetados, foram substituídos por Fernanda Lima e Rodrigo Hilbert. Não se trata, claro, de racismo – afinal, não somos um país racista, nem tampouco a FIFA, não é mesmo? Tanto que Margareth Menezes e Olodum, entre outros artistas, se apresentarão na mesma cerimônia, tudo para mostrar ao mundo a diversidade étnica brasileira, segundo ainda a mesma FIFA. Trocando em miúdos: animar a plateia, tudo bem. Afinal, se temos anualmente o carnaval, não custa organizar um fora de hora para exportar via satélite nossa contagiante alegria. Mas ser mestre de cerimônia exige classe e postura, e o que pensariam plateias mundo afora ao serem confrontadas com a imagem improvável de dois negros apresentando uma cerimônia oficial? A lógica da FIFA parece ser a mesma dos comentadores anônimos de blogs: se mostramos ao mundo nossos negros e escondemos nossos talentos brancos, alguém vai pensar que somos racistas. Democracia racial se faz garantindo igualdade de oportunidades, diriam esses mesmos anônimos. Mas a responsabilidade não é da entidade maior do futebol se alguns são mais iguais que os outros. Bizarro, tudo muito bizarro: o veto e os anônimos.

“IDEOLOGIA-A, EU QUERO UMA PRA VIVER” – Quando o escreveu, Cazuza certamente não imaginou que seu verso ecoaria tanto e tão profundamente na direita conservadora brasileira. Fica difícil imaginar o que seria dela, hoje, sem ter uma ideologia para temer e ideólogos por toda parte para odiar. A bola da vez é a professora Cléo Tibiriçá, professora de Comunicação e Expressão na Fatec de Barueri . Ela virou objeto de bullying virtual levado a cabo por uma organização chamada “Escola sem partido”. A tal organização a acusou publicamente de colocar em prática um plano de ensino que objetiva criar “a maior aversão possível a tudo o que não se identifique com uma visão esquerdista ou progressista da sociedade, da cultura, da economia e da história”. Se não estivesse tão ocupado em entender como o gramscianismo adentrou o Vaticano, depois da declaração do Papa sobre a economia de mercado, Olavo de Carvalho certamente acusaria Cléo Tibiriçá de conspirar contra a Civilização Ocidental. O caso é apenas mais um em um elenco de aberrações produzido pela organização, que se diz neutra, mas trata professores como criminosos e alunos e pais como um bando de imbecis. Além disso, basta uma visita à sua página e a apregoada neutralidade cai por terra. Nela, pipocam artigos de viés de direita e conservador, assinados por um elenco de autores a quem se pode acusar de tudo, menos de não terem uma ideologia. Nada contra, há quem goste e se identifique com o estilo “I see red people”. Mas se a organização insiste em policiar e atacar a ideologia dos outros e disfarça a sua própria sob o manto de uma suposta e mentirosa neutralidade, a coisa é mais que bizarra. É desonesta.

quinta-feira, 19 de abril de 2012

2012 será a eleição do látex

POR GUILHERME GASSENFERTH

O látex é a secreção esbranquiçada produzida por algumas plantas, notadamente a seringueira, que dá origem à fabricação da borracha. Na virada do século XIX para o século XX, o produto foi tão importante que resultou em investimentos importantes na região amazônica, como o símbolo da riqueza do ciclo da borracha, o Theatro Amazonas, ou ainda a compra do Acre da Bolívia (este último foi um dos mais caros investimentos nacionais, pois a única coisa que resultou até hoje foi o Acre). A partir do látex, é possível produzir variados produtos, como o pneu, as luvas descartáveis, a borracha escolar e a camisinha.

Trazendo o texto para o título, é possível afirmar que a cada ano mais o que se vê são as diferenças históricas apagadas. Na última segunda li que em Porto Alegre a candidata Manuela d’Ávila, do Partido Comunista do Brasil, marxista-leninista, será apoiada pelo PSD, o expoente da neosemvergonhice que tomou conta dos partidos brasileiros. Oras, como pode isto? Um partido comunista, de esquerda, que há 30 anos estava empunhando armas contra a ditadura militar cujos líderes agora o respaldam? O PSD é filho do PP e do Democratas (cof!), este último a derivação do PFL, o símbolo máximo da direita liberal brasileira! Passaram a borracha na história. Em Curitiba, o PT vai apoiar o ex-tucano e agora trabalhista Gustavo Fruet. Passaram a borracha na história. Bem, quando se vê a ex-guerrilheira Dilma e outros petistas curvarem-se aos conservadores direitistas evangélicos em nome da governabilidade, nada mais se deve esperar. Passaram a borracha na história.

As esquisitices ocorrem também em Santa Catarina. Em 2002, Luiz Henrique, protagonizou o enterro da lucidez ideológica ao apoiar Serra no primeiro turno e Lula no segundo. Passou a borracha na história. Quatro anos depois, o PMDB, único opositor legal ao regime militar, aliou-se aos ex-inimigos para vencer as eleições estaduais. Ver Luiz Henrique da Silveira de mãos dadas com Jorge Bornhausen causou náuseas em muita gente. E a aliança outrora inacreditável prossegue até hoje. Passaram a borracha na história.

Trazendo a discussão pra nossa cidade, o bizarro show de incoerência também tem lugar. Em Joinville, o PT é aliado do PP, o conservador Partido Progressista (cof!), e tem seu vice no PR, filho de pais extremamente direitistas: PL e PRONA. Passaram a borracha na história. O social-democrata PSDB (cof!) do prefeiturável Tebaldi busca no socialista PPS (cof!) seu vice. Passaram a borracha na história.

Na última eleição à presidência da Câmara de Vereadores, o show de horrores foi tão intenso que após passarem a borracha na história ainda a tacaram na cara do eleitor. Juntos, DEM, PDT, PPS, PMDB e PT. A prefeitura respaldou seu maior crítico na Câmara, e o marxista Adilson Mariano ganhou voto da liberal Dalila Leal, que apesar do nome foi infiel aos princípios ideológicos do seu partido. Passaram a borracha na história.

Até a população conscientizar-se do seu poder e resolver mobilizar-se para dar um basta nestas histórias tristes, seja na urna ou seja nas ruas, o espetáculo funesto tende a prosseguir.

Minha maior preocupação com estas composições exóticas é ter nenhuma boa opção para sentar-se no principal gabinete à Hermann Lepper, 10. E sem boas opções para escolher, qualquer candidato eleito será maléfico à cidade. E aí, com um iminente apagão de gestão, passaremos a borracha em (mais) 4 anos da nossa história. 

terça-feira, 13 de dezembro de 2011

Um tamanduá perdido


POR CHARLES HENRIQUE

Ao ler o texto do historiador Clóvis Gruner aqui no Chuva Ácida semana passada, me deparei com os questionamentos da época em que eu era apenas um graduando em Ciências Sociais, pisando em ovos, e tentando descobrir qual a minha “função” neste mundo capitalista-tecnicista. Afinal, ser cientista social não é uma tarefa fácil hoje em dia. Encontrar um aqui em Joinville é tão raro quanto achar um tamanduá na fauna brasileira.

Pode ser um desabafo - ou apenas um texto para lembrar o dia do sociólogo que foi comemorado neste último sábado, dia 10, mas ao ler este mesmo texto do Gruner, relembrei muito de uma das últimas aulas antes de me formar, quando um professor pediu para comparar a função do cientista social com algum animal. Não tive dúvidas: o tamanduá além de ser raro (sofre um vertiginoso processo de extinção), “fuça” os lugares mais inimagináveis em busca de seu alimento (no caso do cientista é o conhecimento) e é um bicho estranho para os demais. Em Joinville, cidade “industrial” e cheia de ideologias impregnadas, é triste ver que não há a valorização deste profissional, bem como centros acadêmicos que repliquem e construam outros curiosos e descobridores dos porquês das relações sociais. Muitos querem que não haja “ninhos de cupins e formigas” aqui nessa cidade, infelizmente.


Em Joinville, sem generalizar, se você está em busca de conhecimento e de ter uma profissão, o que importa é ir para as exatas ou partir para as “sociais aplicadas” (termo bonito esse, né? as sociais “inaplicadas” seriam o quê?) que terá um vasto campo. Profissionais das ciências humanas dependem da sala de aula para conseguir atuar, até o dia em que outra pessoa de uma formação nada a ver com a condizente dê aulas em seu lugar, seja na rede de ensino regular ou em universidades.

O Estado também não colabora. Na Prefeitura há um ou dois tamanduás. A rede pública estadual chega a colocar qualquer um como professor de sociologia. É triste. Quando trazem universidades públicas para cá, são aquelas que atendem a “vocação” da cidade, ou seja, com um perfil perfeito para o grande capital industrial: formar mão-de-obra para o setor secundário de nossa economia. Ok, a cidade de Joinville tem esse tamanho e “poderio” justamente por ser deste perfil, mas não podemos replicar este modelo cegamente. A variedade de conhecimentos construídos e compartilhados enriquece, ao contrário do modelo vigente, que segrega.

Por isso somos poucos aqui. Se não há um “habitat” propício, muitos migram para outras cidades, e outros, largam tudo. A sociedade não está acostumada. Poucos conhecem e são amigos de um cientista social. Mas há uma luz no fim do túnel, pois vejo em cada dia brotar um pensamento crítico em especial na geografia e na história, ciências que possuem cursos de formação em nossa cidade.

Peço desculpas ao leitor pelo “low profile” deste texto, mas, o barulho tem que ser feito. Não é “puxar sardinha” para um lado ou outro, muito menos preconceito com todas as outras profissões, mas cada uma tem sua parcela de contribuição na sociedade. Aqui em Joinville, muitos não querem que o pensamento crítico aflore e que os questionadores surjam. O Chuva Ácida é um exemplo de que olhares de diversas correntes tenham uma essência equiparada pela visão crítica das coisas. Por isso que faço parte deste grupo e me identifico com todos. O nosso convívio como urbanitas necessita de mais tamanduás para “equilibrar o ecossistema” de Joinville.