quarta-feira, 15 de agosto de 2012

Joinville em cinco sentidos


 POR AMANDA WERNER

AUDIÇÃO 
O dia mal amanhece e não é preciso despertador. O silêncio de uma longa noite de sono é quebrado pelo canto estridente, quase metálico, da Aracuã, anunciando o novo início.  Em seguida, ouve-se o barulho de algum cortador de grama e o zumbido quase ininterrupto dos Vaps, funcionando a todo o vapor.
Cabrum! Alguém corre para dentro de casa, não sem antes recolher a roupa que está no varal.  É a chuva que chega forte, escorrendo pelas calhas, e, logo, alguém exclama: Éééééégua! Meu Senhor! Deste jeito vamos virar sapos!
Para o alento de todos, a chuva torrencial passa, e seu som é suavemente substituído pelo canto dos canários-da-terra e sabiás.

OLFATO
Emerge o cheiro de terra molhada, de ar fresco pós-tempestade e a sensação de conforto ocupa seu espaço.  É hora de arejar a casa, pois tudo cheira a mofo. Ao colocar as almofadas pra fora, alguém machuca o dedo com uma farpa de madeira do sofá, ou, um pai, acidentalmente se corta ao fazer a barba. E a mãe recomenda: passa Minâncora! O agradável odor canforado inebria e, imediatamente, remete à adolescência, quando a tradicional pomada era usada para secar espinhas. Ou à infância, quando aplicada em assaduras. Mas há um odor, nada agradável que predomina e faz plano de fundo para quem mora perto: o do Rio Cachoeira. E quando ouço os antigos dizerem que nem sempre foi assim, alimento a esperança de que mais agradáveis ares virão.

TATO
O pé está molhado dentro do sapato. E há também um pouco de lama. Os desavisados, que desconhecem o efeito das marés altas em dias de chuva, têm água até os joelhos. Em pleno centro da cidade! Não há como desviar de tantas poças d’água no caminho. Uma toalha é oferecida para secá-los. Úmida. Se o calor asfixiante do verão traz as picadas de butucas e maruins, e também dos borrachudos (haja repelente!). Abre a temporada dos refrescantes banhos de rio, nos Quiriris e Piraís deste pedacinho de Mata Atlântica.

PALADAR
Em uma casa, alguém está comendo bolachas de melado. Em outra, o café da tarde é reforçado. Com bolinhos de banana ou pão de batata com nata e schmier.  Nas noites de verão tem caranguejo. Nas de inverno sopa preta. Em todas as estações têm chope, rollmops e hackepeter. E nada como um Mayerle Boonekamp para ajudar a digerir tudo isso!

VISÃO
Com os olhos fechados, enxergo. Para quem só acredita olhando, esta é a cidade das orquídeas, das bromélias e da florada do jacatirão em novembro. Onde se veem  mangues e sambaquis. Contornada e protegida pelos morros. E, de cima de um mirante, pode-se avistar o mar. Cidade das casas com estilo enxaimel. E também das bicicletas. Para o regozijo de todos os meus sentidos, já sei onde estou. Posso sentir. Estou em Joinville.

5 comentários:

  1. Que lindo o texto.
    Fiquei com saudade da minha(nossa) cidade.
    Bjos.

    ResponderExcluir
    Respostas
    1. Que bom, Fernanda! Quem sabe assim vens nos visitar? Hehe!

      Excluir
  2. Muito bom Amanda, mas como as percepções são múltiplas, e dependem de quem as sentem e do ambiente que se situam, permita-me escrever uma Joinville em cinco sentidos 2:
    - audição: o dia começa com uma carreta da transportadora ao lado fazendo um barulho ensurdecedor e tremendo todo o quarto, como se estivesse de baixo da cama.
    - olfato: o dia começa com um cheirinho de metal queimado da ferramentaria da outra quadra; termina com a fumaça da vizinhança queimando lixo e folhas.
    - tato: onde quer que passe a mão, uma camada diária de poeira e fuligem se deposita sobre os móveis, fruto da terraplanagem de um terreno próximo e da fumaça dos carros e onibus.
    - paladar: recupero este sentido quando consigo fazer alguma coisa a noite para comer ou o velho churras do fim de semana, pois durante a semana a comida a quilo da rua ou do refeitório da empresa me dão náuseas.
    - visão: acho que me tornei daltonico, e assim com uma vaca só consigo ver em torno de casa a cidade em tons de cinza do cimento por falta do verde, ou marrom cor de barro do morro atrás de casa despencando.
    Desculpe o pessimismo, mas é o meu realismo.

    ResponderExcluir

O comentário não representa a opinião do blog; a responsabilidade é do autor da mensagem