terça-feira, 20 de setembro de 2016

Quem usa crianças em propaganda política pode dizer que tem as mãos limpas?

















POR JOSÉ ANTÓNIO BAÇO

Tinha prometido não escrever mais sobre a candidatura de Udo Dohler. Mas é difícil. Fui surpreendido (acho que fomos todos) por um filme em que o candidato aparece rodeado de crianças, a fazer o papel de avozinho carinhoso, atencioso e preocupado com o futuro. Eis um tema que deveria incomodar as tais pessoas de bem. Há muito a dizer sobre a presença de crianças em propaganda – ainda mais propaganda política. E salientaria três pontos que parecem saltar aos olhos: o legal, o publicitário e o ético. 

Quanto ao aspecto legal, não sou jurista e posso errar. No entanto, sei que o uso de crianças em propaganda política – e não só – é proibido nas democracias desenvolvidas. Na Europa ocidental, por exemplo, nem pensar. O Brasil até tem regulamentação, mas com pouca aplicação prática. As muitas zonas cinzentas nas leis e o atraso cultural do país abrem caminho para políticos menos escrupulosos, que não respeitam o óbvio: as crianças são incapazes de compreender o contexto e não podem ser instrumentalizadas na política.

No entanto, mesmo o cidadão comum pode encontrar argumentos nas leis, a começar pela própria Constituição Brasileira, que define trabalho infantil como as tarefas realizadas por crianças ou adolescentes em idade inferior a 16 anos. E mais: o artigo 242 do Código Eleitoral diz que a propaganda não deve “empregar meios publicitários destinados a criar, artificialmente, na opinião pública, estados mentais, emocionais ou passionais”. Alguém tem dúvidas de que esse é o caso no filme do candidato? Mas deixemos as leis para os juristas.

Não é preciso um expert em comunicação para saber que a função das crianças no filme de Udo Dohler é comover e trazer simpatia (criar os tais “estados mentais, emocionais ou passionais” da lei). É coisa de marqueteiro. Em termos técnicos, as crianças servem como “marcador somático”. O quê? É uma teoria desenvolvida pelo neurocientista António Damásio, professor da Universidade do Sul da Califórnia, nos EUA, depois integrada nas técnicas de publicidade (em especial o neuromarketing).

Da forma mais simples possível: os marcadores – armazenados no cérebro – fazem a associação a estímulos anteriores. É por isso que imagens de bebês, filhotes de cães ou gatinhos, por exemplo, fazem tanto sucesso na internet. A maioria das pessoas associa essas imagens a coisas agradáveis. É o mesmo com as crianças. O candidato tira proveito da associação às boas sensações que as imagens de crianças causam nos eleitores. Mas não passa de simples truques dos marqueteiros.

E por fim temos o aspecto que parece ser o mais relevante: a questão ética. Se Udo Dohler não vê impedimentos éticos em se servir de crianças para ganhar eleições, então está o caldo entornado. Quem usa crianças para se beneficiar politicamente não pode, em hipótese alguma, dizer que tem as mãos limpas. Porque não tem. O candidato pode contar com a falta de informação dos eleitores. Mas como homem público não pode negligenciar uma questão que é motivo de preocupação no âmbito do Estatuto da Criança e do Adolescente. O assunto é sério.

Ademais, há muitas perguntas a fazer. E fico a imaginar a dificuldade dos assessores para explicar. As crianças receberam? É trabalho infantil. As crianças não receberam? É exploração infantil. Os pais permitiram? Um político não pode fazer vistas grossas para a irresponsabilidade paternal. E, por fim, a pergunta de um milhão de dólares. De onde vêm as crianças? De uma agência de atores e figurantes? Se for esse o caso, a responsabilidade trabalhista seria da agência. Mas, mesmo assim, o monstrinho da falta de ética ainda estaria a repousar no colo de Udo Dohler.

Legalidade. Publicidade. Ética. Para alguns pode parecer apenas um filme de campanha política. Mas para outros - e espero que a maioria - vai parecer um caso de uso indevido da imagem de crianças. Enfim, é uma ideia infeliz.


É a dança da chuva.



24 comentários:

  1. “trabalho infantil” ?
    Tirem todas as crianças dos comerciais de margarina! Os “juninhos” e “luizinhas” das novelas também estão ilegais!

    “E mais: o artigo 242 do Código Eleitoral diz que a propaganda não deve empregar meios publicitários destinados a criar, artificialmente, na opinião pública, estados mentais, emocionais ou passionais”

    É? E o que dizer da propaganda política com a cena que acusava o(a) adversário(a) de tirar o prato de comida da mesa do pobre, literalmente?

    E aquelas pobres crianças (hoje adultos envergonhados) a cantarem alegremente “Lu-la-la, brilha uma estrela...” no comercial da TV da década de 80?

    Explicaste bem o uso do marketing e o significado de crianças nos comerciais da TV, só faltou coerência e imparcialidade, mas seria esperar demais.

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    1. São pessoas como tu que mantêm o Brasil agarrado ao terceiro mundo.

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    2. Não, são pessoas como tu que mantêm o Brasil agarrado ao terceiro mundo.

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    3. Com muita dificuldade consegui gostar DESTE texto do portuga. Tudo certinho, no lugar certo, mas estou certo de que ele jamais escreveria algo do tipo contra as grávidas do último programa do Lula em 2002. Ali foram criados Estados mentais e emocionais ou não? Haviam crianças de colo ou não?

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    4. Como eu ia escrever um texto sobre algo de 2002 se o blog só existe há cinco anos (é amanhã)? Mas sei que já vivia na Europa, onde os códigos da publicidade limitam o uso de crianças em anúncios publicitários. Elas não podem, em hipótese alguma, aparecer em publicidade que não lhes é especificamente dirigida. Como em qualquer lugar, há marcas que violam a lei. Mas na política seria um atropelo ético inaceitável. De qualquer forma, é caso para pesquisar o que foi feito nesse sentido desde que Lula ganhou as eleições. Aposto que muita coisa mudou...

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  2. O que dizer dessa foto, incansavelmente, usada pelo marketing do PT?

    http://acervopresidencial.institutolula.org/content/uploads/acervo/menino1.jpg

    A esquerda agoniza! Mimimimimiimimi...

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  3. Baço, ouvi falar agora a pouco que o Moro aceitou as denúncias do MPF contra o LULA! Pode isso? O homem mais honesto e, logo abaixo, de Jesus Cristo... ser criminalizado? Meu Deus! E agora? Aonde esse mundo vai parar? Isso é blasfêmia! Corram pras colinas!

    KKKKKKKKKKKKKK... ops... deve ser pecado rir Dele!

    A esquerda agoniza!

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    1. Legal saber que tens acesso às notícias aí onde vives. Sempre defendi a ideia de que informação é um direito de qualquer cidadão, mesmo os apoucados. E sei que a dislexia é uma coisa tramada. Vê bem... estás a comentar uma coisa num texto que nada tem a ver com essa coisa.

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    2. É que este teu texto é tão pífio, que o assunto acaba sendo desviado!

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    3. Ok... aceito que o texto é pífio. Então explica aí se a questão tratada também é pífia...

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    4. Sim, pífia!
      Olha que interessante o que eu achei Baço! No trecho 3:50 do link abaixo, você vai poder assistir algo bem interessante! KKKKKKK

      https://www.youtube.com/watch?v=r1pTFKxi7zw

      A esquerda agoniza!...e é seletiva!

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    5. Ok... então diz qual é o teu ponto de vista. Defende a tua ideia. Mandar links só prova que tens tempo de sobra para ficar a fuçar na internet (até parece coisa de comissionado que passa o dia a coçar o saco). Ideias, argumentos, antíteses... vamulá... desembucha. Aliás, vou mais longe. Que tal saíres do anonimato e escreveres um texto a defender as tuas ideias? O espaço está aberto.

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    6. fala aí, Baço, teus argumentos valem tb pro carlito?
      se posiciona, vai ser com 4 anos de atraso mas nunca é tarde.
      "a verdade é que o carlito..." kkkkkkk

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    7. Meu caro amigo Baço,

      O que quero dizer é muito simples: Crianças vem sendo usadas para aparecerem em propagandas políticas há tempos. Ver um político beijando uma criança ou carregando no colo é uma imagem bem corriqueira. Se isto é certo ou errado? Sim, tenho certeza que é errado! A questão é que você levanta o dedo pra acusar a campanha do Udo, mas,... como você pode ter visto no link que enviei, o Carlito também já usou desse expediente. Então, creio que este teu texto não passa de uma cuspida contra o vento!

      Quanto ao meu "anonimato",...digo que está confortável assim! Obrigado.

      Sobre o tempo que tenho disponível, acredito não ser da conta de ninguém!



      A esquerda agoniza!...e "cospe contra o vento!"

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    8. Anônimo das 06:45: vale para o Carlito também. Mas acho bom dares uma olhada nas normas do Conselho Nacional de Autorregulamentação Publicitária. Talvez esclareça.

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    9. Anônimo das 07:34. 1. Não sou teu amigo. Pessoas que se escondem atrás do anonimato têm um caráter muito específico e certamente não se encaixam no perfil de pessoas que posso considerar amigas. 2. Sim. Acuso Udo. Ele é o prefeito e fez algo eticamente reprovável. "Ah... e o Carlito?". Amigo, se deres uma olhada no blog vais ver que já bati muito no Carlito. Aliás, se bem me lembro fui duro com ele quando, nas eleições passadas, apoiou Kennedy e não o atual prefeito. 3. O tempo disponível faz parecer que alguém te paga para vires aqui encher o saco.

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    10. Não sou pago por ninguém para expor minha opinião aqui!
      Você é pago pra escrever aqui?
      Discordar é encher o saco?

      A esquerda agoniza!

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  4. Já diz o qt vale anônimo não tem coragem de se mostrar

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  5. A pergunta é: quem são as crianças?????

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    1. De uma agência de figurantes e atores, como eu digo no texto. Ou não?

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  6. E para finalizar, eis o que diz o Conar:

    SEÇÃO 11 - CRIANÇAS E JOVENS

    Artigo 37

    3 - Este Código condena a ação de merchandising ou publicidade indireta contratada que empregue crianças, elementos do universo infantil ou outros artifícios com a deliberada finalidade de captar a atenção desse público específico, qualquer que seja o veículo utilizado.
    4 - Nos conteúdos segmentados, criados, produzidos ou programados especificamente para o público infantil, qualquer que seja o veículo utilizado, a publicidade de produtos e serviços destinados exclusivamente a esse público estará restrita aos intervalos e espaços comerciais.
    5 - Para a avaliação da conformidade das ações de merchandising ou publicidade indireta contratada ao disposto nesta Seção, levar-se-á em consideração que:
    a. o público-alvo a que elas são dirigidas seja adulto;
    b. o produto ou serviço não seja anunciado objetivando seu consumo por crianças;
    c. a linguagem, imagens, sons e outros artifícios nelas presentes sejam destituídos da finalidade de despertar a curiosidade ou a atenção das crianças.

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  7. Este comentário foi removido pelo autor.

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