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terça-feira, 3 de maio de 2016

Lula, Janaína... o diploma, o amor e o ódio

POR JOSÉ ANTÓNIO BAÇO

O terceiro mundo não é um lugar. É um estado da mente. E o Brasil é um país que, por suas contradições, acaba por se tornar um case study nesse capítulo: tem gente que quer ser a Suécia, mas defende coisas que empurram o país para o Sudão. Um exemplo recente é a proposta de emenda à Constituição para proibir candidaturas de pessoas que não tenham curso superior. É infrutífero. O planeta está cheio de gente que passou anos nos bancos escolares e não consegue fazer um zero com o fundo de uma garrafa.

Não dá para disfarçar. É uma emenda taylor-made, feita sob medida para um objetivo: impedir que o ex-presidente Luiz Inácio da Silva possa concorrer ao Palácio do Planalto, em 2018. É perda de tempo discutir se a proposta é constitucional (não é) ou se Lula ficará impedido (em se tratando Justiça brasileira tudo pode acontecer). Mas tem gente que aplaude. Os políticos que temem enfrentar Lula nas urnas e os conservadores que, por preconceito de classe, não toleram um torneiro mecânico que ousou chegar à presidência. 

O autor da proposta é o deputado Irajá Abreu (PSD-TO), para quem uma visão acadêmica é capaz de elevar o nível dos pretendentes a cargos públicos. Diz ele que a dificuldade de leitura dos legisladores impede que “atuem de modo efetivo nas suas funções constitucionais”. Certo e errado. Certo porque os legisladores via de regra são fraquinhos. Errado porque nenhum diploma é garantia de qualidade ou de comportamento ético.

E para não ficar no plano acadêmico – não é a função de um texto de blog – vamos a uma comparação prática. De um lado temos o ex-presidente Lula, cognominado “apedeuta” pelos detratores (o tema do diploma é recorrente), e do outro a advogada Janaína Paschoal, que tem um doutorado e nos últimos tempos foi alçada à categoria de heroína pelos que apostam na economia de neurônios.

Lula não tem diploma. E está sempre sob o olhar crítico do "diplomados". Não é difícil encontrar as raízes do preconceito. Apenas 16% dos trabalhadores brasileiros têm curso superior completo. Ter um diploma na parede ainda confere estatuto. Mas é preciso ser muito alheado para não reconhecer em Lula um homem culto, mesmo com os pontapés na língua portuguesa. O ex-presidente tem a cultura de quem viu mundo. De quem precisou tomar importantes decisões. De quem transitou ao mais elevado nível. É uma escola.

Janaína Paschoal tem um doutorado. É um daqueles casos em que nulidades acabam elevadas a celebridades. O discurso teatralizado, a retórica violenta e o estilo mistificador têm o poder de falar aos que rejeitam o pensamento. Eis o perigo: por trás da ameaça de destruição do inimigo (lembram da república da cobra?) ou da salvação futura das crianças (no Senado) subjaz o mais abjeto fascismo. A história ensina que há algo de podre nesse tipo de discurso.

Enfim, os exemplos de Lula e Janaína são apenas uma forma de mostrar que o diploma per si não é sinal de uma “mente superior”, como acreditam muitos brasileiros. Aliás, nem é preciso ir longe para comprovar. As redes sociais, por exemplo, estão cheias de gente com diploma. O problema é que não passam de analfabetos (dis)funcionais a desfilar ignorância pelo ciberespaço. Ah... e não vamos esquecer a caixa de comentários do Chuva Ácida. É um delírio.

Faz sentido uma lei que feche as portas de cargos públicos a pessoas sem diploma? Não. Isso só interessa aos têm pavor de enfrentar Lula em eleições. Seria apenas outro tipo de golpe. A lei traria uma mudança pontual e inessencial. O que o país precisa é de uma reforma polícia ampla e séria. É preciso refundar o sistema. Porque nenhum país, por mais rico que seja, aguenta um Congresso Nacional como este que surgiu das eleições de 2014. Diploma é diploma. Ética é ética. E ambos não andam necessariamente juntos.

É a dança da chuva.



quinta-feira, 21 de abril de 2016

Recatados e do lar

POR CLÓVIS GRUNER

A derrota sofrida pelo governo no domingo dificilmente será revertida no Senado ou no STF: quem acompanha a política sabe que a decisão na Câmara dos Deputados é uma espécie de “aviso prévio”. Depois dela, vem o afastamento provisório até a cassação efetiva do mandato, o que só deve mesmo ocorrer no segundo semestre. Na contra mão de muitos amigos e colegas mais ou menos próximos ao PT, há algum tempo defendo uma saída alternativa ao impeachment, e me agradava particularmente a proposta apresentada pelo filósofo Vladimir Safatle, a de um plebiscito que permitisse aos eleitores escolher uma alternativa à crise: a continuidade do governo até o fim do mandato ou a convocação de eleições gerais.

A razão era óbvia: se o impedimento de Dilma, tal como conduzido pelo parlamento, é intolerável, sustentar um governo virtualmente acabado e sem sustentação, tampouco aparecia como solução. Uma consulta popular plebiscitária asseguraria, ao menos, a legitimidade mínima necessária, tanto para o prosseguimento do mandato, como para uma eventual nova administração. Governo e oposição negligenciaram tal alternativa, e tinham suas próprias razões. Da parte do primeiro, a baixíssima popularidade de Dilma indicava uma provável derrota no plebiscito. A aposta eleitoral, com a possibilidade da candidatura de Lula, também não era certa: candidato, Lula enfrentaria o desgaste da hiper exposição da campanha e da continuidade das investigações da Lava Jato. A isso, o governo preferiu negociar o que tinha pra oferecer, cargos, fundamentalmente.

E a oposição? Desde a derrota em 2014 e há até pouco tempo, a alternativa de novas eleições foi a bandeira erguida especialmente pelo PSDB. Mas isso quando Aécio Neves aparecia como preferência do eleitorado, o que mudou drasticamente depois que o nome do senador mineiro começou a ser incomodamente associado às mesmas investigações e aos mesmos crimes em que estão implicados os petistas. Com o nome de Marina Silva surgindo como alternativa, liderança pesquisas de intenção de votos ao mesmo tempo em que não só Aécio, mas qualquer candidato tucano amargava uma virtual derrota em qualquer cenário sugerido, mais a lista de políticos citados e investigados aumentando, o melhor a fazer foi acelerar o processo de impeachment, atraindo à oposição a base aliada do governo, por razões bastante óbvias.

O resultado da farsa foi o espetáculo grotesco do último domingo: uma sessão presidida por um deputado réu no STF, Eduardo Cunha, em que se votou em nome de tudo – Deus, família, corretores de seguro; e onde não faltou mesmo uma homenagem à memória de um torturador. Mas onde, certamente, a única preocupação com a corrupção era a garantia de que, passando o impeachment, os novos arranjos políticos forjados no processo de transição para o governo Temer trariam como bônus a segurança da impunidade. Em suma, o governo perdeu a votação de domingo porque sua moeda de troca valia menos que a de Temer e Cunha: entre cargos em uma gestão que, virtualmente, acabou, e a possibilidade da impunidade, venceu a segunda. Convenhamos, a escolha não era difícil.

O impeachment foi da Lava Jato – Os arranjos começaram cedo, e as notícias ao longo da semana dão conta que Temer, Cunha e a oposição tem pressa: já na segunda-feira, o espanhol “El Pais” trazia como principal manchete: “Cunha entrega o impeachment e deve receber ‘anistia’ em troca”. As boas notícias prosseguem. Na terça, “O Globo” repercute a entrevista que Gilmar Mendes, ministro do STF e presidente do TSE concedeu ao “Roda Viva”, na segunda à noite. Nela, sugere que Michel Temer poderá ser absolvido no julgamento do TSE agora que Dilma, a cabeça de chapa, está virtualmente deposta. No mesmo dia, a “Gazeta do Povo”, de Curitiba, publica também em manchete, que o impeachment tem como objetivo travar a Lava Jato e blindar Cunha, Temer e Aécio, todos citados em delações premiadas.

Ontem na “Folha”, o vice-presidente da Câmara, o deputado Waldir Maranhão, informa que o julgamento de Eduardo Cunha na Comissão de Ética será limitado a suspeita de que ele mentiu sobre a existência de contas secretas no exterior em depoimento à CPI da Petrobras. Sobre sua participação no esquema da Lava Jato, nada. O concorrente “Estadão” não deixou por menos: tucanos negociam com o Conselho de Ética do senado estratégias para forçar Delcídio do Amaral, ex-líder do governo na casa, a recuar em suas declarações comprometedoras contra Aécio Neves em depoimento ao juiz Sérgio Moro. O objetivo é usar o depoimento de Delcídio no Senado como pretexto para fragilizar as investigações contra Aécio no MPF – isso, claro, no caso de Moro decidir mesmo investigá-lo, o que parece cada vez menos provável. Não sei vocês, mas eu já sinto entrando pela janela do meu apartamento o inconfundível cheiro de orégano.

Em artigo publicado no “New York Times”, o sociólogo brasileiro Celso Rocha de Barros, também colunista da “Folha”, se refere ao impeachment de Dilma não como um “coup”, mas um “cover-up”, ou seja, não um golpe, mas uma estratégia para acobertar e encobrir a enormidade de falcatruas em que estão metidos os políticos brasileiros, inclusive e principalmente os principais líderes da oposição e o ainda vice-presidente Michel Temer. E sugere que o impeachment, longe de ser o anúncio de uma “nova era”, é a maneira pela qual a velha classe política pretende retomar o controle do país – e escapar da cadeia. A estratégia tem tudo para dar certo porque, além de se apoderar dos mecanismos do Estado, o novo governo contará com o silêncio e a conivência dos indignados, que amassaram suas panelas e envergaram o uniforme verde amarelo da CBF não contra a corrupção, mas contra o PT. Restará, no parlamento, uma oposição à esquerda minoritária e fragilizada pela derrota, sem força para fazer frente a um esquema minuciosa e profissionalmente arquitetado para que tudo volte ao que sempre foi.


A melhor metáfora da “nova era” anunciada pelo processo de impeachment foi a matéria publicada pelo site da revista Veja com a possível primeira dama, Marcela Temer. “Bela, recatada e do lar”, Marcela é o contraponto perfeito de Dilma sob a perspectiva de uma cultura política francamente machista, e que nunca tolerou a ideia de estar subordinada a uma mulher – o que ficou ainda mais claro na sessão de domingo, também um espetáculo deplorável de misoginia. Mas a figura bela e recatada de Marcela, que para sorte de Temer é também discreta e do lar, é a imagem projetada e metaforizada do que o futuro governo espera de nós: que voltemos às nossas casas, recatados e discretos, e deixemos a política e a coisa pública a eles, os homens que foram eleitos para isso. A reação à matéria da semanal foi imediata: como um rastilho de pólvora, milhares de mulheres usaram as redes sociais para manifestar, com o devido escracho, seu repúdio a essa “feminização” subordinada e subalterna sugerida pela revista. Nossa postura em relação ao novo governo deve ser a mesma: contestadora, rebelde, agressiva. Temer, Cunha e a quadrilha que eles lideram pretendem governar o país para seu próprio benefício. Seu governo pode até ser, porque amparado na Constituição, legal. Mas será ilegítimo. Cabe a nós lembrar disso, e não permitir que eles governem.

segunda-feira, 28 de março de 2016

O radicalismo está fora de controle

POR JORDI CASTAN

Não votei no Lula, nem na Dilma. Temia que viesse a acontecer o que está acontecendo. Não serve de nada, neste momento, descobrir que tinha razão. Tudo isso era previsível. O que surpreende é o aumento do radicalismo. A disparada da agressividade e da violência. O que assusta é o perto que estamos que saia do controle. O assassinato do vereador Leandro Balcone, em Guarulhos, é um indicador de que podemos estar próximos demais de atingir um ponto sem volta. O risco é que este não seja um ato isolado, que haja uma possibilidade real e imediata que outras execuções possam acontecer e se implante um clima de terror.

Ninguém detém o monopólio da violência, tampouco há uma exclusividade da corrupção. A quantidade de políticos de todas as siglas, estados e níveis envolvidos em corrupção é escandalosa. Só é mais escandalosa a naturalidade com que isso é recebido por parcelas significativas da sociedade ou a idiotia dos partidários de um ou outro grupo, que insistem em querer convencer que os corruptos dos outros são mais corruptos que os seus. Como se a corrupção dos outros justificasse a sua. Há até uma disputa para provar que o Mensalão é maior que o Banestado, ou que o escândalo do BNDES é maior ainda que o do Petrolão, buscando justificar o injustificável. A insistência em querer nos fazer de corruptos a todos é a estratégia do momento, é do ex-Ministro da Justiça a frase: "Até síndico de prédio superfatura capacho". A beatificação da corrupção, a sua universalização.

A quem interessa esta radicalização? Quem a estimula? Quem ganha com ela? A resposta não é simples. Mas com certeza quem tem a sua disposição um “exercito” de militantes dispostos a partir para a violência ganhará com o discurso violento e verborrágico. O ex-presidente Lula declarou nestes dias: “É guerra, é guerra e quem tiver artilharia mais forte ganha". Quem pode contar com hostes agressivas dispostas a partir para o confronto é quem mais interesse tem em estimular a violência radical. O discurso do ódio não tem um único protagonista, mas evidente em quem esta sob fogo cruzado. Frente ao risco de ser presos, a única saída é o ataque raivoso, a busca feroz de nos e eles. Os corruptos acuados partem para o tudo ou nada. Têm pouco a perder. Sun Tsu, o estrategista chinês, escreveu no seu livro “A arte da Guerra” que deve-se evitar deixar o inimigo sem uma via de escape, porque nesse caso lutara até a morte.

Não restam muitas saídas. Todas elas implicam dor e sacrifício. O projeto de poder do PT e dos seus partidos aliados está seriamente ameaçado. A corrupção tem contaminado todos os avanços sociais. O governo passou de uma cleptocracia reconhecida, até o ponto que ex-ministro de Lula descreveu o governo como um “sindicato de ladrões”, o próximo estágio de degradação é a oclocracia, o puro esgoto. Em janeiro o Ministro Chefe da Casa Civil, Jaques Wagner, em um repentino e pouco frequente, ataque de sinceridade, reconheceu que “Quem nunca comeu melado quando come se lambuza”, evidenciando o nível de lambuzagem a que chegamos. A resposta das manifestações do dia 13 foi a opera bufa da nomeação de Lula como ministro. 

A escalada de lado e lado não pressagia nada bom. Quando o povo vai para a rua é como abrir a caixa de Pandora, o resultado é imprevisível. É perigosíssimo que parlamentares aliados do governo afirmem que: "Estamos nessa guerra também, não tenho nada a perder." Pessoas e governos desesperados são levados a cometer erros irreversíveis.

sexta-feira, 18 de março de 2016

A história não nos absolverá *















POR SALVADOR NETO


Vivemos tempos tumultuados, agitados. Tempos em que o ódio vem superando a razão e a tolerância. A crise política chega a temperaturas altíssimas com uma sucessão inimaginável de fatos estapafúrdios em um estado democrático de direito. A investigação da corrupção via Operação Lava Jato, que parecia ser um serviço de limpeza das instituições do país, saiu de um roteiro de descobertas dos cartéis de empreiteiras para seguir um enredo de partidarização da justiça. Um perigo para a nossa jovem democracia.

Quem estuda um pouco de história sabe que a “luta” contra a corrupção foi usada sempre que interesses escusos foram contrariados por governos legitimamente eleitos pelo voto. Foi assim com Getúlio Vargas (1954), e não por acaso já na ocasião o nosso petróleo estava ao fundo da tal luta. Todos sabem como acabou a história. Em seguida, JK teve que suar para disputar a eleição, ganhar e tomar posse. Mesmo assim construiu Brasília, a capital onde dizem, nasceu o “modelo” empreiteiro de fazer política.

A corrupção, ela novamente, ajudou a eleger o udenista Jânio Quadros em 1960 com a sua “vassourinha”, que ia varrer a bandalheira do Brasil. JK foi tachado como o mais corrupto homem público pelos grandes conglomerados de mídia da época. Nada mais atual. Jamais provaram nada contra ele, que teria morte estranha após longo exílio por conta da tão saudosa – ainda bem que para poucos – ditadura militar (1964-1985). Também Jango, que assumiu com a renúncia de Jânio Quadros, sucumbiu aos brados da união entre tradição, família e propriedade contra a corrupção e o tal “comunismo”.

Por incrível que pareça, há quem acredite que no regime militar não houve corrupção. Como saber se a livre manifestação, as liberdades individuais e de reunião, a censura, encobriam o país com o manto do terror, da perseguição a quem pensasse diferente? Sugiro a quem duvide disso estudar... história do Brasil, ou vá neste link para começar a pesquisa. Durante o regime militar foram realizadas obras gigantes como a Transamazônica, Ponte Rio Niterói, Usinas de Itaipu e Tucuruí, entre outras. Quem as construiu? As famosas empreiteiras, praticamente as mesmas que você sabe envolvidas na Lava Jato.

Após a redemocratização, que é bom que se repita, foi conquistada com a luta de muitos brasileiros e brasileiras contra as arbitrariedades e torturas do regime militar – e com a concessão de uma anistia geral até hoje contestada – construímos uma Constituição Federal de 1988. Ela é a lei maior do país, que devolveu aos brasileiros e brasileiras os seus direitos individuais, a cidadania, e direitos que foram negados por séculos ao povo trabalhador. Até hoje essas conquistas ainda são implementadas lentamente, pois são discutidas e aprovadas – ou não – no Congresso Nacional. E lá, o conservadorismo permanece forte, até hoje.

Hoje ao ver o atual quadro de pré-convulsão social provocado por uma ação sincronizada entre parte do MPF, Justiça, Polícia Federal e a grande mídia que já comandou os golpes e tentativas de golpes já citados, tomando por base a “corrupção”, temo pelo futuro do meu país. Como jornalista não posso me furtar a opinar sobre o que vejo, pelo que estudei, e por ver tamanha manipulação midiática que joga irmãos contra irmãos. Quando o maior grupo de mídia do país passa quase 10 horas ao dia divulgando situações somente contra um grupo político, e apenas contra a presidente Dilma e o ex-presidente Lula, não há como disfarçar. O modelo do passado voltou a agir. E sem o menor constrangimento.

Mesmo contra a maré odiosa que só repete o que vê na grande mídia como verdade sem a necessária reflexão, comparação e estudo, é preciso denunciar esses atos que são vendidos como normais. Não, não é normal e tampouco legal levar um ex-presidente sob coerção a um depoimento em um aeroporto sem que ele tenha se negado alguma vez a isto. O ex-presidente não está indiciado, é investigado com toda a força, e até sua prisão preventiva sem qualquer prova já foi pedida. Aos olhos da massa pode ser o máximo. Mas sempre há um detalhe, ele já foi condenado pela mídia.

Não, não é legal, e tampouco natural, que um juiz de primeira instância determine grampos à advogados e seus clientes, à Presidente da República, a Ministros de Estado (todos com foro privilegiado pela CF e Código Penal), os divulgue diretamente à mídia sem o devido processo ao STF. É uma afronta ao estado democrático de direito que conquistamos a duras penas. Atos como esse podem ser a fresta que promove um estado de exceção.

Não, não é natural que enquanto a Câmara dos Deputados é comandada por um denunciado por corrupção, Eduardo Cunha do PMDB - que deveria estar fora do cargo exatamente por isso - o próprio coloca um processo de impeachment da presidente Dilma para tramitar com “urgência” sem qualquer base legal, sem provas, apenas por vingança política e interesses de quem o financiou até aqui. Para lembrar, o processo contra Cunha no Conselho de Ética está paralisado há quase seis meses.

Não, brasileiros e brasileiras, não é legal nem natural que estejamos à beira de uma guerra civil por manipulações midiático-oposicionistas/oposicionistas/judiciais que inflam a massa popular, que emanam uma cortina de fumaça que esconde interesses inconfessáveis pelo poder, pelo nosso petróleo, sem que pelo menos desconfiemos de tudo que se lê, vê, ouve, e claro, compartilha.

Não é razoável que joguemos nossos direitos e garantias fundamentais nas mãos de qualquer pessoa do poder após uma longa luta para tê-los!

Hoje você pode achar legal o espetáculo midiático, a espetacularização dos fatos (?!) veiculados. Mas pense, amanhã podem estar atrás de você, com ou sem provas, com escutas, transcrições pela metade, manipuladas.

Aí você pode pensar: mas depois você se defende. Quem não deve, não teme. Será? É tempo de frear os sentimentos, de pensar muito antes de atacar alguém, um amigo, uma outra pessoa. De acusar sem provas. Você pode estar cometendo uma injustiça gigante, que poderá jamais ser reparada.

E mais: você poderá ser também a vítima, jogando os seus direitos conquistados via democracia, na vala comum que muitos desejam que você jogue. Construir uma sociedade democrática, com todos os vícios e erros que ela tem é muito difícil. Agora, destruir é fácil. Pense nisso. Pense no país. Pense em você. Pense nos seus. Se errarmos mais uma vez, a história não nos absolverá.


É assim nas teias do poder...


Em 16 de outubro de 1953, o jovem advogado Fidel Castro pronunciava a sua autodefesa, após ser preso pelo assalto ao quartel Moncada, em Cuba, – quando tentou derrubar o então presidente e ditador Fulgêncio Batista. “A história me absolverá”, foi a última frase proferida pelo líder da Revolução Cubana e como ficou conhecido o documento que reúne este célebre discurso, que completa 60 anos . Título adapta a frase histórica a esse momento histórico que vivemos.

* Sugiro também a leitura do texto "A culpa é das estrelas?", que escrevi aqui no Chuva há pouco mais de um ano falando sobre essa força propagandista que levou ao nazismo, clique aqui para ler.

terça-feira, 16 de fevereiro de 2016

A “gente cordial” e a caça ao Lula

















POR JOSÉ ANTÓNIO BAÇO

E continua a temporada de caça ao Lula. Implacável. Poderia tentar analisar os fatos (?) que vêm sendo repetidos à exaustão pela comunicação social (e com alguma sofreguidão pela velha mídia mais propensa ao golpe). Mas falar de pedalinhos, canoas de lata ou caixas de bebida é um tema para lá de chato. É assunto para os facebuqueiros e gente educada pelo Whatsapp. 

Fico por um tema específico: o caráter de um certo brasileiro médio que, na falta de um conceito sociológico adequado, passo a chamar “gente cordial”. Por quê? A referência é o conceito de homem cordial. E logo no início vamos falar no equívoco. O senso comum confunde cordial com cordato. E erra. Esse brasileiro nada tem de sensato ou prudente. É gente inculta, revanchista, imoral.

De fato, a coisa corresponde quase a uma inversão do ideário do senso comum. O “cordial” de Sérgio Buarque de Holanda pouco tem a ver com simpatia, cortesia ou generosidade. O conceito vai beber na origem da palavra (cordis, de coração) e remete para outra acepção. É o homem que age com o coração, com a paixão e, quase sempre, deixa a razão de lado. Visto assim, nem parece tão mau. Mas é.

O homem cordial dessa sociologia não gosta das leis, da ética ou da urbanidade. É um ser passional, que odeia e tem sangue nos olhos. O ódio é uma forma de paixão. Essa “gente cordial” - que, se não fosse tacanha, até poderíamos chamar elite - faz do ódio uma expertise. E o anti-lulismo é a mais pura expressão desse ódio irracional, sádico, tacanha. 

Por que odiar Lula? Por ódio de classe, por irracionalidade, por “cordialidade”. Não gostam de Lula porque, ao mudar o Brasil, o ex-presidente lançou confusão no inconsciente social. É sabido que essa “gente cordial” não tem um projeto para a sociedade. Tem apenas um rumo: não ambiciona os privilégios dos ricos… apenas não quer que os pobres tenham privilégios. Precisam de pobres à volta, para criar a sensação de serem seres "diferenciados".

Lula é ofensivo porque veio subverter essa lógica. Por ter rompido séculos de um apartheid social que insistia em perdurar e mantinha as relações sociais engessadas. O Brasil anterior a Lula - aquele a que muitos desejam voltar - era um Brasil onde os papeis eram bem definidos. Cada um sabia, à nascença, qual era o seu destino: rico é rico, pobre é paisagem. 

O ex-presidente é culpado, sim, de reduzir as desigualdades, de promover a inclusão social, de encetar o resgate de uma dívida histórica (as cotas para os negros e os índios, por exemplo), de obter um crescimento nunca visto na história, de transformar o Brasil num player de respeito na economia mundial. É coisa, leitor e leitora.

E há um aspecto ao qual as pessoas com um mínimo de memória e sensibilidade social dão muita importância: o fim da fome. Essa foi a revolução que Lula havia prometido e era a revolução que todos os cidadãos (pelo menos aqueles com dois dedos de testa) esperavam ver realizada. Só um marciano, que não tenha passado os últimos anos no Brasil, pode ser capaz de recusar estes fatos.

No entanto, aquele que é considerado um dos melhores presidentes da história do Brasil é hoje alvo de uma perseguição mesquinha, promovida por homens menores que nada fizeram pelo país, a não ser criar mais uma tirania. E, claro, que contam com o apoio de outros homenzinhos da velha mídia e dos iliteratos das redes sociais (podemos incluir muitos comentadores anônimos deste blog).

Lula é uma pedra do sapato do projeto político da oposição. E não está a ser investigado. Está a ser perseguido. Querem - porque precisam - destruir uma biografia.  Por conta disso, estão a criar um estado de exceção. Triste é que essa “gente cordial” gosta do espetáculo, sem ver os perigos.

É a dança da chuva.

P.S.: Não sei se Lula é culpado ou inocente. Não é minha função saber disso. Mas é evidente que estamos frente a um caso típico em que se escolhe o culpado e depois se procura o crime. E de uma coisa não tenho a menor dúvida: não é forma de tratar um ex-presidente que mudou o Brasil para melhor.


Charge de Renato Aroeira



terça-feira, 22 de dezembro de 2015

Xingar Lula é normal, mas ser xingado dói

POR JOSÉ ANTÓNIO BAÇO
É comum dizer que a internet – em especial as redes sociais – é uma terra sem lei. A lista de crimes praticados todos os dias é longa, mas o pulular de situações torna impossível identificar e punir todos os casos. A calúnia, os insultos e a difamação estão entre as práticas mais comuns e todos os dias esbarramos com pessoas a fazer na esfera virtual o que não fariam na esfera pública.

As redes sociais tornaram-se um autêntico faroeste verbal. E hoje uso um exemplo pessoal para mostrar o comportamento nada cívico e civilizado das pessoas. Um amigo publicou um post no Facebook a falar da aposentadoria da primeira-dama de Goiás, Valéria Perillo, sobre a qual haveria algumas dúvidas. E logo no primeiro comentário, sem que nada apontasse para isso, apareceu um tipo a falar do ex-presidente Lula.

Ou seja, essa pessoa esqueceu totalmente a mulher do governador de Goiás. E entrou de sola, chamando Lula de “bandido”. Fiz um comentário a dizer que isso pode caracterizar crime, uma vez que quem faz esse tipo de acusação deve ter provas. E a resposta veio na forma de apoio de um segundo tipo, que chamou Lula de “safado” e ironizou a ideia de calúnia e difamação.

De propósito, escrevi que não iria "conversar" com este segundo sujeito, porque ele tinha um “jeitão de corrupto”. O que aconteceu? O homem virou bicho. Em tom ameaçador, disse que não admite esse tipo de tratamento. Não é hilário? O cara pode falar o que lhe dá na real gana, mas quando lança os mesmos argumentos contra ele, reage como uma virgem ofendida.

“Não sou moleque para ficar lendo besteira contra a minha pessoa”, esbravejou o sujeito que minutos antes chamava Lula de safado. Ora, ora, ora. Dói quando a ofensa é contra nós. Mas quem fala o que quer ouve o que não quer. O problema é que as pessoas veem nas redes sociais um espaço onde podem ofender, caluniar, difamar. É a lei do cão. Mas haverá um dia em que terão que responder por isso na Justiça. Porque só assim o espaço virtual poderá tornar-se civilizado.


É a dança da chuva.








quarta-feira, 25 de junho de 2014

Atiram na Chauí para acertar Lula

POR JOSÉ ANTÓNIO BAÇO

E de repente Marilena Chauí virou alvo de estimação da direita insipiente (passe a redundância). Tudo porque a filósofa ousou dizer que odeia a tal classe média. Ora, posso até achar excessivamente teatral a forma que ela usa para fazer a afirmação, mas o fato é que em termos de conteúdo teria pouco a discordar. Ah... para todos os efeitos, sou “classe média” e não me sinto ofendido.

Qual é o argumento de Marilena Chauí? A filósofa diz que essa tal classe média “é uma
abominação política porque é fascista, uma abominação ética porque é violenta e uma abominação cognitiva porque é ignorante”. Ela sabe de história e deve ter as suas razões. Aliás, a única coisa que eu talvez questionasse é a definição do objeto, porque prefiro a terminologia mais tradicional que define essas classes médias como “pequena burguesia”.

É fácil aceitar a tese, em especial quando Marilena Chauí traz a discussão para o plano do cognitivo. Porque para a pequena burguesia a ignorância é quase um investimento compulsório. Aliás, eu iria mais longe ao defender a tese de que ela pura e simplesmente rejeita o pensamento. Porque é objetivista, individualista e simplória. E, no caso do Brasil, anda perplexa com as mudanças na estrutura social do país e o surgimento da tal nova classe média.

Para evitar confusões, entendo ser incorreta a expressão "nova classe média". O que houve
nos últimos anos foi o ingresso de novos trabalhadores no mercado. Mas que não podem ser incluídos no pacote da tal classe média, uma vez que as suas visões de mundo são diferentes. No entanto, provocam o horror da pequena burguesia - a histórica e real - que teme perder o monopólio de privilégios mantido por décadas. 

Óbvio que as generalizações não ficam bem. E é claro que há gente da pequena burguesia que consegue ver um palmo à frente do nariz. A pequena burguesia repulsiva é aquela que tem sangue nos olhos e se deixa levar pelo ódio de classe. Aliás, esse ódio provoca-lhes uma certa esquizofrenia, porque não se encaixa nos seus próprios códigos morais. Os caras odeiam ao mesmo tempo em que os seus códigos rejeitam a ideia do ódio. Certo, anônimos?

Mas voltemos a Marilena Chauí. É evidente que ninguém está preocupado com ela pessoalmente. Até porque a maioria não faz a mais pálida ideia de quem seja a filósofa (e filosofia é coisa de fracassados que não conseguiram passar no vestiba de medicina). Encontrar uma alminha que tenha lido pelo menos duas míseras linhas dos escritos da pensadora é tão provável quanto saber os números da próxima Mega-Sena. 

O que interessa, então? O processo é simples: demonizar a professora e fazer com que ela apareça ao lado do ex-presidente Lula, de forma a contagiar a sua imagem. Pura semiótica. A pequena burguesia vive da imagem, não do fato. Mas, cá entre nós, esse argumento até ajuda a justificar a tese da abominação cognitiva defendida por Marilena Chauí: na sua indisfarçável insciência, a pequena burguesia ainda não se deu conta de que não é possível derrubar um ex-presidente. 

Bem ao jeito das redes sociais, o pessoal anda por aí a reproduzir vídeos editados de forma a passar a ideia de que o pensamento de Marilena Chauí representa o PT e também o ex-presidente Lula. E como a coisa não corresponde aos fatos, comete-se uma omissãozinha aqui e outra ali para esconder a história na sua totalidade. Eis um filme a mostrar o que aconteceu no mesmo evento... momentos depois.