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sexta-feira, 18 de março de 2016

A história não nos absolverá *















POR SALVADOR NETO


Vivemos tempos tumultuados, agitados. Tempos em que o ódio vem superando a razão e a tolerância. A crise política chega a temperaturas altíssimas com uma sucessão inimaginável de fatos estapafúrdios em um estado democrático de direito. A investigação da corrupção via Operação Lava Jato, que parecia ser um serviço de limpeza das instituições do país, saiu de um roteiro de descobertas dos cartéis de empreiteiras para seguir um enredo de partidarização da justiça. Um perigo para a nossa jovem democracia.

Quem estuda um pouco de história sabe que a “luta” contra a corrupção foi usada sempre que interesses escusos foram contrariados por governos legitimamente eleitos pelo voto. Foi assim com Getúlio Vargas (1954), e não por acaso já na ocasião o nosso petróleo estava ao fundo da tal luta. Todos sabem como acabou a história. Em seguida, JK teve que suar para disputar a eleição, ganhar e tomar posse. Mesmo assim construiu Brasília, a capital onde dizem, nasceu o “modelo” empreiteiro de fazer política.

A corrupção, ela novamente, ajudou a eleger o udenista Jânio Quadros em 1960 com a sua “vassourinha”, que ia varrer a bandalheira do Brasil. JK foi tachado como o mais corrupto homem público pelos grandes conglomerados de mídia da época. Nada mais atual. Jamais provaram nada contra ele, que teria morte estranha após longo exílio por conta da tão saudosa – ainda bem que para poucos – ditadura militar (1964-1985). Também Jango, que assumiu com a renúncia de Jânio Quadros, sucumbiu aos brados da união entre tradição, família e propriedade contra a corrupção e o tal “comunismo”.

Por incrível que pareça, há quem acredite que no regime militar não houve corrupção. Como saber se a livre manifestação, as liberdades individuais e de reunião, a censura, encobriam o país com o manto do terror, da perseguição a quem pensasse diferente? Sugiro a quem duvide disso estudar... história do Brasil, ou vá neste link para começar a pesquisa. Durante o regime militar foram realizadas obras gigantes como a Transamazônica, Ponte Rio Niterói, Usinas de Itaipu e Tucuruí, entre outras. Quem as construiu? As famosas empreiteiras, praticamente as mesmas que você sabe envolvidas na Lava Jato.

Após a redemocratização, que é bom que se repita, foi conquistada com a luta de muitos brasileiros e brasileiras contra as arbitrariedades e torturas do regime militar – e com a concessão de uma anistia geral até hoje contestada – construímos uma Constituição Federal de 1988. Ela é a lei maior do país, que devolveu aos brasileiros e brasileiras os seus direitos individuais, a cidadania, e direitos que foram negados por séculos ao povo trabalhador. Até hoje essas conquistas ainda são implementadas lentamente, pois são discutidas e aprovadas – ou não – no Congresso Nacional. E lá, o conservadorismo permanece forte, até hoje.

Hoje ao ver o atual quadro de pré-convulsão social provocado por uma ação sincronizada entre parte do MPF, Justiça, Polícia Federal e a grande mídia que já comandou os golpes e tentativas de golpes já citados, tomando por base a “corrupção”, temo pelo futuro do meu país. Como jornalista não posso me furtar a opinar sobre o que vejo, pelo que estudei, e por ver tamanha manipulação midiática que joga irmãos contra irmãos. Quando o maior grupo de mídia do país passa quase 10 horas ao dia divulgando situações somente contra um grupo político, e apenas contra a presidente Dilma e o ex-presidente Lula, não há como disfarçar. O modelo do passado voltou a agir. E sem o menor constrangimento.

Mesmo contra a maré odiosa que só repete o que vê na grande mídia como verdade sem a necessária reflexão, comparação e estudo, é preciso denunciar esses atos que são vendidos como normais. Não, não é normal e tampouco legal levar um ex-presidente sob coerção a um depoimento em um aeroporto sem que ele tenha se negado alguma vez a isto. O ex-presidente não está indiciado, é investigado com toda a força, e até sua prisão preventiva sem qualquer prova já foi pedida. Aos olhos da massa pode ser o máximo. Mas sempre há um detalhe, ele já foi condenado pela mídia.

Não, não é legal, e tampouco natural, que um juiz de primeira instância determine grampos à advogados e seus clientes, à Presidente da República, a Ministros de Estado (todos com foro privilegiado pela CF e Código Penal), os divulgue diretamente à mídia sem o devido processo ao STF. É uma afronta ao estado democrático de direito que conquistamos a duras penas. Atos como esse podem ser a fresta que promove um estado de exceção.

Não, não é natural que enquanto a Câmara dos Deputados é comandada por um denunciado por corrupção, Eduardo Cunha do PMDB - que deveria estar fora do cargo exatamente por isso - o próprio coloca um processo de impeachment da presidente Dilma para tramitar com “urgência” sem qualquer base legal, sem provas, apenas por vingança política e interesses de quem o financiou até aqui. Para lembrar, o processo contra Cunha no Conselho de Ética está paralisado há quase seis meses.

Não, brasileiros e brasileiras, não é legal nem natural que estejamos à beira de uma guerra civil por manipulações midiático-oposicionistas/oposicionistas/judiciais que inflam a massa popular, que emanam uma cortina de fumaça que esconde interesses inconfessáveis pelo poder, pelo nosso petróleo, sem que pelo menos desconfiemos de tudo que se lê, vê, ouve, e claro, compartilha.

Não é razoável que joguemos nossos direitos e garantias fundamentais nas mãos de qualquer pessoa do poder após uma longa luta para tê-los!

Hoje você pode achar legal o espetáculo midiático, a espetacularização dos fatos (?!) veiculados. Mas pense, amanhã podem estar atrás de você, com ou sem provas, com escutas, transcrições pela metade, manipuladas.

Aí você pode pensar: mas depois você se defende. Quem não deve, não teme. Será? É tempo de frear os sentimentos, de pensar muito antes de atacar alguém, um amigo, uma outra pessoa. De acusar sem provas. Você pode estar cometendo uma injustiça gigante, que poderá jamais ser reparada.

E mais: você poderá ser também a vítima, jogando os seus direitos conquistados via democracia, na vala comum que muitos desejam que você jogue. Construir uma sociedade democrática, com todos os vícios e erros que ela tem é muito difícil. Agora, destruir é fácil. Pense nisso. Pense no país. Pense em você. Pense nos seus. Se errarmos mais uma vez, a história não nos absolverá.


É assim nas teias do poder...


Em 16 de outubro de 1953, o jovem advogado Fidel Castro pronunciava a sua autodefesa, após ser preso pelo assalto ao quartel Moncada, em Cuba, – quando tentou derrubar o então presidente e ditador Fulgêncio Batista. “A história me absolverá”, foi a última frase proferida pelo líder da Revolução Cubana e como ficou conhecido o documento que reúne este célebre discurso, que completa 60 anos . Título adapta a frase histórica a esse momento histórico que vivemos.

* Sugiro também a leitura do texto "A culpa é das estrelas?", que escrevi aqui no Chuva há pouco mais de um ano falando sobre essa força propagandista que levou ao nazismo, clique aqui para ler.

terça-feira, 23 de fevereiro de 2016

O escândalo FHC? Não vem ao caso...
















POR JOSÉ ANTÓNIO BAÇO

As declarações da jornalista Mirian Dutra, que teve um romance com o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso, foram o tema quente da semana passada. Mas apesar de aparecer aqui e acolá, o assunto esteve longe de ser manchete na velha mídia. A Globo, que estava diretamente implicada, não podia silenciar e abordou os fatos, claro. Mas sem fazer barulho. O tema passou batido para a maioria das pessoas que se informam pelos meios de comunicação tradicionais.

Foi diferente nas plataformas digitais, onde o caso Miriam Dutra-FHC ainda está na ordem do dia. Mais do que isso, o episódio levou à divulgação de fatos que estão a pôr FHC numa saia justa. A credibilidade do ex-presidente está  abalada, apesar de não haver grandes revelações: a maioria das denúncias é antiga, mas sem consequências. Será que desta vez vai haver resultados diferentes? É provável que não. Os tucanos estão blindadíssimos pela mídia e pela Justiça, mesmo com todas as evidências.

Não é da vida amorosa do ex-presidente que se pretende falar. As entrevistas de Mirian Dutra trazem uma declaração que exige muita atenção, porque revela a face do jornalismo na velha mídia. “Só olhar para o que aconteceu no segundo governo: as privatizações mais selvagens. Não podia dar errado, a Mirian não podia atrapalhar os grandes negócios. Está na hora de quebrar a blindagem desse pessoal. Mas onde estão os jornalistas, que não investigam?”, disse Mirian Dutra.

Onde estão os jornalistas? Ora, no que se relaciona ao núcleo duro da velha imprensa (os títulos que orientam o brasileiro médio) estão todos ocupados na caça ao ex-presidente Lula, que virou alvo depois da tentativa fracassada (agora reacesa) do impeachment de Dilma Rousseff. Em outro caminho, sobra a mídia alternativa, em especial o pessoal dos blogs nacionais, que, apesar das limitações financeiras, tenta fazer o contraditório. Mas as armas são desiguais. A velha imprensa ainda tem um poder econômico que a mídia alternativa sequer sonha ter.


Silêncios, omissões ou informações contaminadas são o resultado da postura de uma mídia que optou por fazer oposição partidária. E as recentes revelações sobre FHC expõem a relação incestuosa entre o tucanato e a mídia. O tema não vem ao caso. E a guerra midiática é desigual e a mídia tradicional está a vencer. Até quando? Não há certezas. Mas pelo menos uma previsão pode ser feita: o jogo vai virar. Porque apesar de haver muita gente a empurrar o Brasil para trás, a tendência é o digital.

E surgiu um fenômeno curioso. Foi divulgado, na semana passada, que o Partido dos Trabalhadores é o que mais atrai militantes jovens. E dá de goleada na oposição. Uma evidência salta à vista. Os jovens não se educam pela velha mídia e a informação vem pelas redes digitais, onde existe o contraditório. É natural, então, que percebam o massacre midiático dos últimos anos e, talvez por um desejo de equidade, optem por se ligar ao partido que é alvo desse ataque.

É a dança da chuva.




 A opinião de Bob Fernandes, numa visão similar à do texto, mas a falar da Justiça.