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quarta-feira, 5 de setembro de 2018

No domingo, um pedaço do futuro ardeu

POR CLÓVIS GRUNER
“O Brasil é um país onde governar é criar desertos. Desertos naturais, no espaço, com a devastação do cerrado, da Amazônia. Destrói-se a natureza e agora está-se destruindo a cultura, criando-se desertos no tempo”. O depoimento do antropólogo Eduardo Viveiros de Castro é uma das imagens que melhor sintetiza o significado do incêndio que, no domingo (02), destruiu boa parte da estrutura física e do acervo do Museu Nacional, onde Viveiros de Castro é professor.

A tragédia, que consumiu um dos mais valiosos patrimônios históricos e culturais da América Latina, além de um acervo riquíssimo de ciências naturais, vinha sendo anunciada há muito tempo. Apesar do corte brutal de verbas, fruto das políticas de austeridade praticadas pelo governo Temer e que impactaram negativamente no orçamento do Museu, o descaso com a instituição vinha de longa data.

Em 2004, matéria da Agência Brasil alertava para o risco de incêndio ante as condições precárias do prédio. Nada foi feito. Mais recentemente, em 2014, uma verba de R$ 20 milhões foi incluída no Orçamento da União para custear, entre outras coisas, a modernização de seus espaços e equipamentos culturais. O governo Dilma, no entanto, contingenciou os recursos, que nunca foram empenhados e repassados à direção do Museu Nacional.

As condições de funcionamento se agravaram sensivelmente, ano após ano. Em 2016, ele chegou a fechar as portas para visitação, cuja frequência também diminuiu sensivelmente, em parte por conta da precariedade das instalações. Acompanhando o estrangulamento financeiro das Universidades públicas, – o Museu é subordinado à UFRJ –, o orçamento caiu para menos da metade nos últimos cinco anos; em 2018, a verba de manutenção foi de R$ 98 mil.

Ignorância e má fé – Desde o domingo, o Museu virou objeto de discursos inflamados e escandalizados. O problema é que parte deles está mais empenhado em espalhar boatos baseados em mentiras e desinformação. Uma dessas vozes foi a do Ministro da Cultura, Sérgio Sá Leitão, que não apenas se mantém no cargo – qualquer governo decente já o teria demitido –, como o usou para desqualificar a UFRJ e fazer jogo político baixo, culpando o reitor da Universidade pelo incêndio.

Entre outras estultices, Sérgio Sá afirmou que a reitoria deveria ter buscado recursos em outras fontes, já que o orçamento público era insuficiente. Nos últimos anos, seis projetos de preservação e recuperação do Museu Nacional foram aprovados pela Lei Rouanet. Mas como os recursos precisam ser captados na iniciativa privada, as verbas não vieram, pois nossos empresários não se importam: dos R$ 17,6 milhões autorizados, a direção do Museu conseguiu captar no mercado, apenas R$ 1,07 milhão.

No primeiro semestre desse ano, um convênio com o BNDES, que o ministro de Temer se jacta de ter intermediado, garantiu ao Museu o repasse de quase R$ 22 milhões. Mas a verba foi contingenciada por conta das restrições do período eleitoral e só seria liberada, parceladamente, depois das eleições de outubro. Ironicamente, uma parte dela seria investida em infraestrutura para a prevenção de incêndios.

Um pequeno cartaz fixado na entrada do “Museo de la Memoria”, em Montevideo, informa aos visitantes: “Más memoria. Más futuro”. A mensagem é clara: sem uma ideia de passado, sem um conhecimento prático do passado possibilitado por instituições como o Museu Nacional, é o nosso horizonte de expectativas que resta vazio. As chamas de domingo destruíram parte de nosso patrimônio passado, mas incineraram também um pedaço do nosso futuro.

terça-feira, 4 de julho de 2017

É gafe atrás de gafe: um governo de "gafiosos"

POR JOSÉ ANTÓNIO BAÇO
A maior tragédia de um país é ser governado por gente medíocre, inculta e focada apenas nos próprios interesses. É o retrato exato do governo de Michel Temer. E é desnecessário falar de economia, política ou finanças, áreas onde os resultados podem ser verificados na primeira pessoa pelos brasileiros.

O tema aqui é a falta de cultura dessa gente. Mas isso importa? Sim, importa muito. As limitações do presidente, um homem que tem o cérebro em algum lugar do passado, e das pessoas no seu entorno impedem uma clara leitura do mundo. Ou seja, Michel Temer e sua gente não estão intelectualmente apetrechados para governar.

É um fato verificável em todos os segmentos, mas que também fica evidente quando se olha para os detalhes. Um dos exemplos é o chorrilho de gafes que vem sendo debitado desde os primeiros dias do seu governo (ilegítimo). Enfim, o atual presidente está à frente de um governo “gafioso” (expressão que traz uma curiosa homofonia).

Sem querer ser freudiano, lembro o conceito de “atos falhos”. É quando o inconsciente e o consciente se baralham e fazem a pessoa dizer algo que não seria suposto dizer. Em política a coisa também é tratada pelo eufemismo “gafe”. Desde que chegou ao poder, Michel Temer e a sua pandilha pariram um sem fim de atos falhos.

O presidente não deixa os créditos por mãos alheias. O seu acervo de bolas-fora é vastíssimo. Disse que o massacre de 56 presos era um “acidente pavoroso”. Desejou que a Paraíba fosse inundada. Disse que os governos precisam ter marido. Mais recentemente, chamou a Rússia de União Soviética, numa viagem em que também confundiu o rei da Noruega com o “rei da Suécia”. E por aí vai...

A sua entourage também é assídua produtora de besteirol. Um ex-ministro disse que antes da lista de Janot estava de olho na “lista de Schindler”. Outro aliado disse que a Justiça do Trabalho nem deveria existir. Um ministro disse que os “homens trabalham mais, por isso não acham tempo para cuidar da saúde”. E até um outro ex-ministro disse que o México é um perigo para os políticos homens “porque descobri aqui que metade das senadoras é mulher”.

E o retrato mais definitivo parece ter sido pintado ontem pelo secretário nacional de Juventude, Assis Filho, que abriu um evento citando “o grande filósofo alemão William Shakespeare”. Nem chega a ser estranho num país onde procuradores confundem Engels com Hegel, mas mostra a pobreza intelectual dos caras que ditam os rumos do Brasil.

O que leva de volta à frase do início. A maior tragédia de um país é ser governado por gente disfuncional, sem expressão política e com critérios éticos muito lassos. Os atos falhos, lapsos ou gafes são apenas a expressão da falta de cultura, entendida aqui num sentido mais lato. Ou seja, um caldo de (in)cultura  machista, classista, anti-intelectualista. Ou apenas pura ignorância mesmo.

É a dança da chuva.

terça-feira, 14 de fevereiro de 2017

Joinville: cultura não interessa, turismo não existe

POR JOSÉ ANTÓNIO BAÇO
Dei uma lida no artigo de Udo Dohler, publicado no AN, no último fim de semana. Texto enfadonho, não prende a atenção do leitor. Aliás, se fosse substituído por uma infografia era capaz de fazer a mensagem – ou a falta dela – chegar mais fácil ao cidadão. O que fica desse emaranhado de “reformas” apresentado no artigo é um enorme nada. Aliás, atrevo-me a dizer que o texto reflete a atual administração: burocrático, de eficiência questionável e sem a mínima imaginação.

Há muito para analisar. Mas vamos ficar por uma “reforma” que salta aos olhos: turismo e cultura sob o mesmo guarda-chuva. Diz o prefeito que “vão trabalhar juntos em projetos voltados à educação cultural, promoção de talentos e estímulo aos potenciais turísticos da cidade”. Para começar, parece haver pouco domínio do léxico: o que será a tal “educação cultural”? Ora, é uma expressão vazia de conteúdo. Significa... nada. Maldita semântica!

Ah... e antes que algum assessor se (re)lembre de usar o argumento de “tem que viver aqui para criticar”, deixo um aviso. Se vão falar de turismo, nada melhor que alguém capaz de vestir a pele de turista. Se vão falar de cultura, é aconselhável dar ouvidos a quem, exatamente por viver em outras latitudes, pode trazer outros contributos para a discussão. Sem provincianismos bacocos, senhores assessores. Até porque vocês não são donos da cidade.

Cultura? Joinville precisa de uma revolução cultural. E vai com décadas de atraso. Mas não se faz revoluções com agendas de eventos. É óbvio que os chamados eventos culturais fazem parte daquilo que genericamente chamamos “cultura”. Mas o conceito não se esgota aí. É preciso mudar o inconsciente social. E o primeiro passo é abandonar a caretice, o conservadorismo e os grilhões que mantêm os horizontes mentais da cidade aprisionados entre Garuva e Barra Velha. O que a Prefeitura pode fazer? Muita coisa. Como? Perguntem aos que governam, porque eles são pagos para isso.

Turismo? A situação é igualmente dramática. Stricto sensu não há turismo. O maior problema é a modéstia das ambições dos administradores da cidade. Em Joinville, o poder público nunca olhou para o setor como uma indústria. Eis a ironia: uma cidade que se orgulha de ser industrial não sabe industriar o turismo. E é um dos setores que mais cresce e gera divisas em todo o mundo. O que a Prefeitura pode fazer? Muita coisa. Como? Perguntem aos que governam, porque eles são pagos para isso.

O que diz a história da cidade? Que em Joinville o poder público nunca entendeu o significado de cultura e nunca se interessou pelo turismo como atividade econômica a sério. A cidade vive mergulhada num círculo vicioso. Afinal, como já dizia Einstein, é estupidez continuar a fazer as mesmas coisas e achar que se vai obter resultados diferentes. Não é uma mudança de organograma que produz mudanças estruturais e estruturantes. Aliás, a solução é até mais simples do que se imagina: basta saber enxergar um palmo adiante do nariz.

Quando a assunto é turismo ou cultura, Joinville é a Terra do Nunca.

É a dança da chuva.  

sexta-feira, 27 de janeiro de 2017

Extinção da FCJ: a política de cima para baixo

POR RODRIGO BORNHOLDT

A extinção da FCJ tem várias implicações. Discorro sobre as que me parecem mais importantes.

A primeira delas é de ordem prática. Para se conseguir recursos federais, a estruturação do setor de cultura numa entidade autônoma facilita a obtenção de verbas. Já por aí, e em especial num governo que se diz tão pragmático, fica difícil compreender a obsessão pela sua extinção. Ora, é fundamental captar verbas que não necessitem passar pelos cofres de toda a mastodôntica estrutura da Prefeitura.

A segunda é de ordem simbólica. Extinguir, fundir ou subjugar uma entidade a outra secretaria ou entidade revela a importância (ou não) que se dê a determinada área. Ora, educação e cultura andam juntas. Onde são valorizadas, diminuem os índices de criminalidade e a atração que muitos jovens sentem pelo mundo proibido das drogas. Quando podem dar vazão à sua criatividade e aos seus impulsos, muitos são efetivamente resgatados através de atividades culturais. A extinção ou subordinação da FCJ a outra estrutura revela a pouca atenção e o descaso com que a Prefeitura trata a área.

A terceira implicação é de ordem política, e confunde-se com a segunda. Mas o que quero destacar aqui é tanto a provável diminuição de verbas para o setor, já que ele perde sua importância, como a inexistência de um órgão com autonomia financeira.

Uma quarta implicação diz respeito à legitimidade para tal ato. A própria democracia brasileira vem sendo questionada, e é necessário aperfeiçoá-la. Ninguém questiona a eleição do atual prefeito, que ocorreu dentro do processo democrático. Mas um ato de tal magnitude, foi ele discutido na eleição? Constava do programa de governo do candidato? Se a resposta for negativa, o mais coerente seria que uma ação desse porte fosse debatida à exaustão com os setores interessados, começando pelo cultural!

A política toda da atual gestão parece pautada por ações lideradas de cima para baixo. É um estilo que já se conhecia e esperava. Voltaremos a isso quando analisarmos as políticas de outros setores da gestão. Com isso, perde a cidade e sua população, no desenvolvimento de modos de criar, fazer e viver autênticos. É isso que gera uma sociedade verdadeiramente pacífica e plural, como a Joinville que queremos!

sexta-feira, 6 de janeiro de 2017

Sem Fundação, sem fundamento


POR RAQUEL MIGLIORINI

O prefeito reeleito de Joinville, Udo Döhler, anunciou seu “novo” secretariado para a gestão 2017/2020. Vou me ater a apenas dois desses nomes: o presidente da Fundação Cultural de Joinville e da Fundação Turística, Raulino Esbiteskoski, e o secretário da Secretaria do Meio Ambiente, Jonas de Medeiros.

O primeiro não tem ligação alguma com a área cultural (nem tampouco com a turística, diga-se de passagem) e, na primeira gestão, não disse a que veio. O segundo é um desconhecido dos joinvilenses. É professor universitário e tem formação em gestão pública, o que é um ponto positivo. Pela complexidade da Secretaria que comandará, será necessário doses de humildade para entender e acatar o que os técnicos da Secretaria do Meio Ambiente disserem sobre  a complexa teia ambiental aonde  Joinville está inserida.

Sou otimista! Vai que ele se encante pelo assunto (como mostra seu perfil  no Linkedin) e resolva tratar o Meio Ambiente com seriedade e não como um balcão de negócios.

A ligação entre os dois está na continuação do projeto do prefeito em extinguir as Fundações.

A base para tais projetos, como ele mesmo disse em entrevista recente no Jornal Notícias do Dia (que descanse em paz), é a Lei Federal n. 13019/2014, que entrará em vigor no final de Janeiro de 2017, após ter sido adiada duas vezes. Essa lei trata das parcerias realizadas entre a Administração Pública e entidades do terceiro setor, antes denominadas ONGs, e previu a substituição dos antigos convênios por termos de colaboração e termos de fomento. 

Ocorre que isso é apenas entre os governos, em todas as esferas, e entidades privadas. Explico: o senhor Udo Döhler disse que fundações não fazem mais sentido pois os repasses do Governo Federal ou Estadual, ou ainda qualquer outra fonte, não poderiam mais ser realizados. Mudou para a iniciativa privada. Nossas fundações são públicas, ligadas ao governo municipal.

Em Fevereiro próximo, a Câmara de Vereadores analisará a fusão das Fundações Cultural e Turística, transformando-as em secretarias. Espero, sinceramente, que a nova Câmara de Vereadores use análise crítica para ver que:

1. A extinção da Fundação Municipal de Meio Ambiente não ajudou em nada. Faltam fiscais nas ruas. Faltam programas de preservação das Unidades de Conservação e Áreas de Preservação Permanentes. Faltam programas de Educação Ambiental modernos e eficientes. Falta monitoramento ambiental.

2. O discurso usado pelo prefeito é baseado em informações falsas. Se quer extinguir, que mostre números, dados suficientes para embasar a idéia. Somente extinção de cargos não é suficiente porque é possível fazer isso sem extinguir fundações. Para quem diz entender de gestão, é preciso e urgente repensar conceitos e reciclar idéias.

terça-feira, 3 de janeiro de 2017

O ND e a imprensa joinvilense na encruzilhada















POR JOSÉ ANTÓNIO BAÇO
A morte de um jornal nunca é boa notícia. E o fechamento do ND - Notícias do Dia Joinville vem deixar a cidade ainda mais depauperada no plano cultural. Mas neste caso a notícia foi recebida com uma certa indiferença e fica a parecer que as pessoas não entenderam o alcance da perda. A discussão limitou-se praticamente às pessoas ligadas aos meios de comunicação... e apenas no dia do anúncio.

Há a visão objetivista do mercado, que traz uma equação simples: não dá lucro, fecha. Mas a questão é mais complexa e merecia uma reflexão de todos os que se preocupam com a cultura na cidade. Sim, jornalismo é parte da cultura. Aliás, por isso nem estou a falar dos responsáveis do poder público, que confundem cultura com agenda de eventos. É importante refletir sobre os fatos que fizeram a cidade chegar a este ponto.

A repercussão do fechamento do ND limitou-se a uns posts nas redes sociais e pouco mais. Quer dizer, as reflexões não passaram de fogachos. No dia seguinte, as pessoas voltaram a cuidar das próprias vidas e o tema desapareceu. Aliás, esse comportamento deveria ser parte central na discussão. A desimportância que se atribui ao fim de um jornal é sintoma de um mal estar na cultura.

Eis a visão do mercado. Para sobreviver, um jornal precisa, em média, de 50% dos recursos provenientes da publicidade (há variações). A sustentabilidade tem um elevado preço. Por mais que os diretores do jornais recusem, é inegável que o anunciante tem o poder sobre o plano editorial. E o pior. Os jornais – os catarinenses, com certeza – não sobrevivem sem a publicidade dos governos. E tornam-se reféns dos políticos.

Mas as verbas publicitárias migraram para outros meios e deixaram muitos jornais de pires na mão. Para os otimistas, a solução poderia vir do aumento de leitores. Mas não. Porque temos a tempestade perfeita. Os jornais, dependentes de empresários e políticos, começaram a mostrar medo dos leitores. E passaram a adaptar as suas linhas editoriais às auscultações feitas pelos seus departamentos de marketing. Ou seja, viraram panfletos.

Eis a tragédia editorial para os jornais com menores recursos. Porque passaram a publicar apenas o que esses “stakeholders” esperam. O projeto passa a ser linear, previsível e incapaz de produzir (é mais que atrair) novos leitores. Lembro de ter lido que 72% dos brasileiros sabem das notícias nas redes sociais. É culpa das novas tecnologias, mas também da fragilidade dos projetos editoriais. A falta de adaptação é a tinta que escreve o epitáfio.

Mas como fica o panorama da imprensa em Joinville? O ND era um concorrente direto do jornal A Notícia. Sendo um challenger, mesmo com menor dimensão, não deixava o líder dormir em berço esplêndido. Lembro de, certa vez, ter ouvido de um responsável do ND que havia um prazer especial em dar um furo no A Notícia. Era uma forma de mostrar que, mesmo com menos recursos, era capaz de fazer o líder levantar a guarda.

O problema é que a vida é ainda mais difícil numa cidade onde o establishment não se interessa por jornais. Para as “elites” da cidade, um jornal tem que ser um panfleto que reproduza a sua forma de vida. Sem marolas. Sem perguntas. Sem contraditório. Se tem coisa que essa gente odeia são as ideias que gerem controvérsia. O que se espera da imprensa é que fique em sintonia com o provincianismo bacoco das suas elites.

Ao longo de décadas o jornalismo joinvilense tem sido feito para introjetar o conservadorismo das elites em toda a sociedade. O jornalismo se deixou moldar pelo conservadorismo local, quando a função é exatamente o contrário. É trazer coisas novas, promover o debate e ajudar os leitores na compreensão dos fenômenos. Enfim, durante décadas a imprensa tem se contentado em ser a voz do dono. Ou dos donos.

É uma encruzilhada de morte. O problema dos jornais joinvilenses não é só o mercado. É também a cultura.

É a dança da chuva.

sexta-feira, 5 de fevereiro de 2016

Até quando cabeças vão rolar por falta de prioridade para cultura, educação e lazer?














POR SALVADOR NETO


J
oinville ficou horrorizada esta semana com a decapitação de um jovem de 16 anos no bairro Jardim Paraíso, comunidade já estigmatizada como lugar de alta violência e tráfico de drogas. Afinal, a polícia ainda não sabe quem cometeu a barbárie, não sabe onde está o corpo, e tampouco se o jovem foi realmente assassinado no bairro. E mais: em que pese o comando do governo Colombo trocar comandantes da polícia civil ou militar, o que não muda é a essência, ou seja, a falta de efetividade na investigação. Se a polícia sabe de gangues, etc, porque não coíbe e prende? Mistérios para um Sherlock Holmes provinciano desvendar!

Mas, para além da alta criminalidade que não vem de hoje na maior cidade catarinense, há aspectos que a elite empresarial, social e política joinvilense não gosta de tocar. Nossa juventude está à mercê dos chefes do crime por pura falta de oportunidades culturais, de lazer, de esportes, de inclusão no mercado de trabalho que lhes garantam uma vida digna, saudável e longe do mundo das drogas, do tráfico, das ruas que engolem esses adolescentes para o dinheiro fácil. A Prefeitura de Joinville – governo Udo Döhler do PMDB cortou recursos para a única festa popular, o carnaval. Preferiu gastar na festa alemã Bierfest, que não deu em nada.

Enquanto a cultura, a educação integral, o lazer e os esportes não forem prioridades para os governantes, a grana gasta em segurança com câmeras, mais soldados, viaturas – e é sempre bom lembrar que é o nosso dinheiro suado que paga tudo – servirão apenas para agradar a elite assustada que mora em áreas centrais, longe da periferia que assiste essas barbáries em frente às suas casas, causar “sensação” de segurança e fonte para imagens para lindos vídeos de propaganda dos “governos” atuantes que temos (??). 

Em mais um lance que exemplifica o que digo, que mais lazer, cultura, educação não são prioridades, o governo Udo Döhler desistiu da construção de um Ponto de Cultura com recursos já garantidos pelo Governo Federal da ordem de R$ 1,2 milhão, que seria construído no bairro Vila Nova, zona oeste da cidade. Irônico é que no mesmo ano de 2015 o vice de Udo, o advogado Rodrigo Coelho que também preside a Fundação Cultural de Joinville, anunciou que a obra era uma “prioridade” do governo do PMDB. Nota-se. E a população também nota. Afinal, prioridade é palavra forte, bonita, mas só da boca para fora.

É lastimável que as lideranças políticas que se sucedem no comanda da cidade continuem a usar as mesmas práticas retóricas, discursos bonitos, e práticas iguais a seus antecessores. Este governo atual se consagra no quesito abandono da cidade, pois carros, ônibus e bicicletas afundam nos buracos das ruas; as praças e parques que ainda existiam razoavelmente cuidados, hoje estão largados ao relento e esquecimento; mobilidade urbana é miragem e outra peça de ficção na propaganda oficial, e paro por aqui, pois faltaria espaço para elencar o atraso em que nos encontramos.

Por tudo isso é que, contrariando os puxa-sacos oficiais e os mal informados, continuo a denunciar – e isso vale não só para Joinville – que ou a sociedade definitivamente muda seu modo de agir na fiscalização, acompanhamento e cobranças de suas lideranças políticas e empresariais (sim, está na hora de deixarem os pobres subirem os degraus na escala social, pagando melhores salários e distribuindo lucros), exigindo investimentos em cultura, esporte e lazer de fato, ou continuaremos a ver cabeças rolando em sacolas, corpos em malas jogados em rios, mortos perfurados com dezenas de tiros em frente às casas.

A violência se combate com educação, cultura e lazer. Sem isso, a barbárie chegará também nas casas da elite, e aí pode ser tarde demais para quem se horroriza pela tv, jornais e rádios. Nossa juventude está literalmente perdendo a cabeça no crime, como vemos em grandes centros, e nós estamos passivos observando o que virá adiante. Que rolem cabeças no poder político via uso do voto popular e participação efetiva do povo na fiscalização, não mais nas ruas da cidade que elegemos para morar, viver e criar filhos e netos.


É assim nas teias do poder...

sexta-feira, 3 de abril de 2015

Incluir ou prender - qual a sua opção?

POR SALVADOR NETO

A semana encerrou com mais um daqueles presentes de grego que nossos impolutos deputados federais entregam à nação: a admissibilidade da PEC 171/93, que reduz a maioridade penal de 18 para 16 anos. Assim fazem os gregos políticos brasileiros. Tentam nos vender que nos entregam uma dádiva, mas na verdade empurram mais um prejuízo a um país sedento de inclusão social, e não segregações e mais prisões. O tema é complexo, demanda muito debate e espaço, e desta vez vou extrapolar um pouco meu texto pela urgência do momento.


Nosso povo brasileiro que pouco lê, pouco busca entender sobre os temas, vota, mas não lembra em quem, e muito menos conhece bem quem seu eleito representa, adora soluções mágicas como esta da redução da maioridade. Sempre duvidei das saídas fáceis para os problemas. Esta saída é na verdade a entrada para o caos da juventude, e com ela, um futuro nada colorido para a nação. Há muitos argumentos contrários a essa sandice de um Congresso conservador, mas vou elencar somente alguns deles:

- No Brasil, os jovens, desde os 12 anos, podem ser responsabilizados por infrações à lei. Todos os crimes e contravenções penais cometidos por esses jovens são chamados de “atos infracionais”.

- Esses jovens respondem processos e, se condenados, recebem punições, chamadas de “medidas socioeducativas”. Atualmente o Brasil tem cerca de 110 mil adolescentes cumprindo medidas socioeducativas.

- A diferença básica entre as sanções de jovens e adultos é que na dos jovens ainda se procura manter a finalidade de reinserção social e educação, motivo pelo qual é importante mantê-las separadas. Por suas características, as sanções aplicadas aos jovens resultam num baixo índice de reincidência quando comparadas às penas aplicadas aos adultos.

- A internação é uma medida socioeducativa que priva o jovem da liberdade. As casas de detenção dos jovens se assemelham a prisões e a taxa média de ocupação das instituições para jovens é de 102%. Tal como ocorre nos processos penais de adultos, os jovens também estão sujeitos a internações provisórias. Ou seja, não existe o “não dá nada”.

- Os 18 anos são critérios de desenvolvimento pleno em muitos outros contextos da vida social. Somente com 18 anos, um jovem pode se alistar no exército; pode trabalhar em condições perigosas e insalubres; pode comprar bebidas e cigarros; pode ter habilitação para dirigir; pode ser jurado. E, apesar de ter a faculdade de votar, o jovem de 16 anos não pode ser votado.

- No que importa ao fenômeno criminal, os jovens com idade entre 16 e 18 anos são responsáveis por menos de 1% do total de crimes cometidos no Brasil. Daqui já se torna óbvio que a exceção não pode pautar a definição da política criminal do país.

- Os crimes mais cometidos por jovens são crimes contra o patrimônio, seguidos pelo crime de tráfico de drogas. Isso representa mais de 70% dos crimes cometidos por eles.

- Crimes contra a pessoa cometidos por jovens, em geral, decorrem de guerra do tráfico de drogas. Há uma coincidência do grupo que comete o crime e o grupo que é vitimizado.
- Quase 20 mil jovens são assassinados todo ano no Brasil. Ou seja, eles são 10 vezes mais vítimas do que homicidas.

- Anualmente, a polícia brasileira mata mais do que jovens de 16 a 18 anos. Todo ano, o trânsito brasileiro mata 24 vezes mais do que jovens de 16 a 18 anos.

- Além disso, há um comum equívoco nas listas dos critérios etários de responsabilização criminal: a nossa responsabilização começa aos 12 anos de idade com as medidas socioeducativas; aos 18 anos, vira pena.

Essa é apenas parte de uma pesquisa do Instituto Tolerância, uma das muitas pesquisas sérias sobre o tema no Brasil. Somos um dos campeões do mundo em número de encarcerados. Que resultado temos? Mais paz, menos violência? Nada disso, continuamos com falhas na inclusão social de nossos jovens e crianças. Não conseguimos avançar em mais cultura, educação, lazer, habitação, entre outros benefícios, na velocidade desejada. Mas isso não quer dizer que perdemos a batalha. Educar e incluir dá trabalho. Mas penso que os brasileiros gostam de trabalhar. Prefiro pensar assim.

Finalizando, na última quarta-feira (1/4) assisti a um dos espetáculos de dança mais belos e emocionantes que vi em minha vida. Cerca de 50 alunos com algum tipo de deficiência intelectual proporcionaram a quase 400 pessoas a beleza que é ver o investimento em educação, saúde e assistência social em crianças, jovens e adultos inundar a sociedade com ótimos resultados. A cada passo dos cadeirantes, movimentos dos pequenos e suas mães, ou o remexer elétrico dos jovens nas músicas alegres, lágrimas brotavam dos olhos de cidadãos e cidadãs.

Creio que muitos ali ainda não conheciam o belíssimo trabalho feito na APAE de Joinville (SC) há 50 anos, completados agora em abril. Há neste projeto uma aposta na inclusão social. Eles poderiam também estar segregados, afastados como já o foi no passado. Abandonados nas ruas, presos em suas casas. Mas a mudança cultural, a aposta no ser humano, indica o acerto do caminho mesmo que ainda com grandes dificuldades de recursos como tudo em nosso belo país. Mas aqueles professores, pais, voluntários, acreditam que cada vida merece empenho, merece amor. Há sensibilidade.


Desistir dos jovens é negligenciar o presente. Desistir dos jovens é desistir do futuro. Desistir das pessoas, qualquer uma delas, é desistir da humanidade. Quanto mais prendermos, mais somos presos em nossas casas. Quanto mais incluirmos, mais livres seremos. Gosto dos pensamentos de Martin Luther King, um dos seres humanos que enfrentou o grito dos intolerantes. Ele dizia que o que o preocupava não era o grito dos maus, mas sim o silêncio dos bons. Eu sou pela inclusão. E você?



segunda-feira, 23 de fevereiro de 2015

Extinguir a Fundação Cultural?

POR JORDI CASTAN



A cada dia que passa fica mais clara a impressão de que o prefeito está perdido no seu labirinto. A proposta de compactar a cultura em um supersecretaria é típica de quem tem uma visão simplória das coisas. Ou pior, é a típica solução que apresentaria quem ainda não entendeu o problema.

Gostaria de lembrar de um texto que postei aqui sobre a reforma política e sugerir a sua leitura novamente. O texto de julho de 2014 fazia uma ligação entre a visão que determinado prefeito e um dos seus secretários tinham sobre a música. Usei uma composição de Schubert como exemplo do risco que representa uma visão parcial da situação. O risco era concreto e a ligação com a nossa realidade local era evidente.

A minha sugestão de leitura acrescentaria alguns pontos, para facilitar a compreensão e contextualizar a situação e o momento atual. A primeira é que o dito prefeito fosse, por exemplo, o de Joinville, a segunda que solicitasse a dos seus secretários mais próximos que apresentasse uma proposta de como reduzir gastos na área de cultura.

Não posso assegurar, mas conhecendo-o, não duvidaria que não tenha recebido sugestões de alguma conhecida empresa de consultoria e que desta constelação de sumidades tenha surgido uma proposta tão estapafúrdia como essa de extinguir a Fundação Cultural e compactar tudo o que cheire ou esteja ligado a cultura  numa secretaria que nem consegue cumprir direito suas obrigações e tem dificuldades até em manter as escolas funcionando e em fornecer a tempo os equipamentos e as instalações necessárias.

Se o governo municipal trata esta reforma administrativa com a mesma celeridade e eficiência com que tem tocado as obras em Joinville, ninguém deve ficar muito preocupado, porque não deve sair tão cedo. 

terça-feira, 6 de agosto de 2013

Reintegração de posse [2]

POR JORDI CASTAN

O post de terça-feira passada tinha como objetivo inicial propor um debate sobre o estado de abandono do patrimônio público. A ideia era falar sobre a forma como é tratado, de forma sistemática, o patrimônio público e o pouco que a sociedade parece preocupada com este descaso. No caso da Cidadela Cultural, havia um componente adicional: o uso a que o imóvel estaria destinado e a forma como o setor cultural, de um lado, e a sociedade em geral, do outro, se relacionavam com o espaço.

O post originou diversas reações e comentários, tanto aqui no blog, como também no Facebook. Tinha muito interesse em acompanhar como o leitor perceberia o tema e quais as implicações que os dois pontos abordados, o patrimônio ou o aspecto cultural, poderiam trazer à tona.

O tema do estado de abandono do patrimônio público tinha inclusive sido abordado pelo Charles Henrique, num post sobre a antiga sede da Prefeitura e a sua grafitada. Eu mesmo tinha preparado um texto sobre o mesmo tema, desde outra perspectiva diferente, e acabei publicando com o título "O essencial é invisível aos olhos".

Graças aos comentários dos leitores, o abandono do patrimônio ganhou corpo no debate, passando da falta de manutenção até a ausência da mais elementar regularização documental, desde as escrituras aos alvarás. A lista cresceu e praticamente nenhum prédio público ficou fora da lista. Nem museus, nem o Centreventos, nem o Mercado Municipal ou a Casa da Cultura se salvaram. O que já é uma prova clara que o abandono é algo inerente ao próprio poder público e que perpassa as diferentes administrações.

É ainda de se imaginar o que deve acontecer com as centenas ou milhares de outros imóveis e bens de propriedade do município. Em que estado se encontram - se é que se encontram. A velha prática de que o que é público não é de ninguém cabe aqui como uma luva.

FISCALIZAR - Destacar aqui também a omissão cúmplice dos vereadores: entre as centenas de pedidos de informação que os nossos legisladores fazem, pelos motivos mais peregrinos, nenhum referente à situação dos prédios e bens públicos, nenhuma palavra sobre ao seu estado de abandono. O legislativo não cumpre a sua função de fiscalizar o executivo e exigir que zele pelo patrimônio dos joinvilenses.

Outro aspecto, porém, acabou me surpreendendo, apesar de já tê-lo previsto no esboço inicial do texto: o aspecto cultural. O hábito de investir em estruturas físicas e não dar a menor atenção ao seu funcionamento, sua manutenção e sua operacionalidade. Como já citei no texto, “tampouco a simples cessão de uso dos diversos espaços a uns e outros parece a melhor solução, porque a soma das partes neste caso é menor que o todo.”  E essa é uma armadilha típica em que é fácil cair. Loteando os diversos espaços da Cidadela para uns e outros, o poder público faz de conta que cumpre o seu papel e na verdade não o faz. A administração opta sempre pela lei do menor esforço, por aquilo que dá menos trabalho e evita fazer o que é melhor. Foge, como o diabo da cruz, de qualquer coisa que represente trabalho ou esforço. E o resultado salta aos olhos.


TEATRO - Maikon K, leitor assíduo do Chuva Ácida, sentiu-se citado, assumiu as mágoas da AJOTE (Associação Joinvilense de Teatro) e reivindicou o direito que esta associação tem de utilizar um galpão na Cidadela para suas apresentações. Particularmente tenho assistido a, no máximo, duas apresentações de teatro no local.
Confesso, sob risco de ser queimado em praça pública, que o teatro não é uma das representações da arte e cultura que mais prezo. 

Mas ver atuar o Borges de Garuva é sempre uma boa experiência. Pessoalmente considero que lotear o espaço da Cidadela sem um projeto de ocupação e utilização da área é um erro. Não é só um erro, é um erro grave. Porque permite inclusive que alguns setores sejam beneficiados em detrimento de outros. 

A Cidadela Cultural deveria ser, como alguns dos leitores, principalmente no Facebook, propuseram: um espaço para promover a cultura, uma incubadora, um nervo de vitalidade cultural, no qual com certeza deverá haver um espaço para o teatro. Também para a dança, para o cinema, para o desenho, a pintura, o grafite, o comic, as tirinhas e charges do Cão Tarado, o Menino Caranguejo, a literatura, o vídeo, a música, desde a erudita passando pela popular. E sem esquecer-se da escultura, da gravura, dos títeres e de todas as formas de representação artística que a criatividade humana tenha desenvolvido ou venha a desenvolver. A Cidadela deve ser o espaço para que esta criatividade prospere e possa fazer de Joinville um polo da economia criativa. Dessa indústria sem chaminés que movimenta milhões em todo o mundo.

ESPECULAÇÃO - Surgiram também informações novas, que acrescentam dados para o debate. Há os que defendem que o espaço seja entregue à especulação imobiliária ou seja convertido num centro etílico-gastronômico. Foi possível saber que há até alguns projetos viáveis para um melhor aproveitamento do espaço. Haveria sempre o risco que a sua função primordial, que seria a de servir como celeiro da cultura e berço criativo, aberto a todos os segmentos culturais, acabasse sendo deturpada.

O debate sobre o uso e o destino da Cidadela Cultural é de todos e para todos. O espaço e sua proposta são nobres demais, importantes demais para que se restrinja o debate ao setor cultural. A cidade, como um todo, tem o direito de se manifestar e de opinar. Mas a maior responsabilidade cabe aos que, se intitulando representantes da cultura, devem liderar o processo de recuperação da Cidadela para que cumpra seu objetivo original.

Solicitar a reintegração de posse, não para se encastelarem nela e sim para que vicejem as manifestações culturais, como um bem maior a que o joinvilense tem direito. Sem esta mobilização e sem um vigoroso processo de reivindicação e valoração do espaço, não é só a Cidadela quem esta em risco. É a própria cultura que está ameaçada. A maior ameaça fica evidenciada pelos parcos recursos previstos no orçamento municipal para a cultura. Sem recursos, não há como fazer uma política cultural de qualidade.


Ao longo da semana, não faltaram os que entram no debate para tumultuar, para desmerecer, para desmoralizar. Eles são importantes para o blog e para os leitores do blog, porque eles cumprem o papel de bobos da corte, os que fazem rir a todos com suas idiotices. 

terça-feira, 30 de julho de 2013

Reintegração de posse

POR JORDI CASTAN

O que deveria ser uma cidadela cultural, acabou se convertendo num cortiço. Quando, na condição de Secretário do Desenvolvimento Econômico, na gestão Luiz Henrique, fui incumbido de negociar com a Antarctica, em São Paulo, a compra do imóvel da antiga fábrica de cerveja na rua XV de Novembro, o objetivo era dotar Joinville de um espaço cultural capaz de reunir, num único local, a maioria das manifestações culturais da cidade.

O estado de abandono e o desvio de função de um espaço tão nobre é o resultado da falta de um projeto concreto de ocupação da Cidadela Cultural e, principalmente, a falta de mobilização do setor cultural. Hoje, o que poderia ter sido um polo gerador de cultura, um centro de referência e local de encontro de todas as tribos que formam o tecido cultural de uma cidade viva, não é mais que um decrépito conjunto de edifícios, galpões e espaços abertos caindo aos pedaços, mal cuidados e que em alguns pontos apresentam risco iminente de ruína.

Não adianta grafitar também os muros da Cidadela, porque não há como ocultar por mais tempo o descaso com o patrimônio de Joinville. Um espaço abandonado e sem dono é um espaço que desperta o desejo e a cobiça de muitos. Nem o ITTRAN deveria estar instalado lá, nem outros serviços que nada têm a ver com cultura. Tampouco a simples cessão de uso dos diversos espaços a uns e outros parece a melhor solução, porque a soma das partes neste caso é menor que o todo.




A solução para a Cidadela passa por uma ampla discussão com a sociedade, não só com os produtores culturais. Passa por retirar do local o ITTRAN e elaborar um projeto de uso, ocupação e viabilidade econômica para o conjunto. Que preserve as suas raízes históricas e culturais. E que possa fazer com que a Cidadela Cultural recupere o seu destino original e se converta num celeiro de atividades culturais, um berçário para a criatividade joinvilense e um local que nos encha de orgulho e não nos envergonhe ainda mais.


Seria bom que tudo isso iniciasse logo, antes que os cupins que mantêm em pé parte das estruturas de madeira decidam deixar de fazê-lo.

quinta-feira, 25 de abril de 2013

As leis acompanham a cultura ou vice-versa?


POR FERNANDA M. POMPERMAIER

Uma das experiências mais difíceis da minha vida foi voltar a trabalhar depois da maternidade. 


A descoberta de si mesma como mãe, esse novo relacionamento, essa sensação de responsabilidade, de cuidar, esse amor sem limites, fazem com que reorganizemos as prioridades. E não estou querendo superestimar a experiência de ser mãe.  
Eu vejo que a maternidade é tratada de forma bastante deslumbrante  na mídia brasileira. Vê-se as propagandas de margarina, de produtos para bebês ou os finais felizes de quase 100% das comédias românticas. Sem contar a forte influência da igreja e a própria tradição passada por gerações. É difícil para muitos encarar com naturalidade as famílias compostas com outros arranjos: 2 pais, 2 mães, pais separados....enfim. Uma realidade diversa e crescente na sociedade. 
É possível visualizar a confusão mental de algumas pessoas quando escutam uma mulher afirmar que não deseja ter filhos, tão forte a lavagem cerebral pela qual passamos todos nas últimas décadas. Acreditamos que para alcançar a felicidade precisamos de papai, mamãe e filhinhos, de preferência 2, um menino e uma menina. 

Eu também comprei esse sonho da felicidade, por determinismo ou não, agora não dá de saber, fiz a escolha de ter um filho. Mas o que a propaganda não te conta é o choque de realidade que vem depois e apesar de todo o deslumbramento inicial, um pensamento recorrente era: por que eu fiz isso com a minha vida?! 
No sentido de que, até poucos dias antes se eu quisesse viajar, eu ia, se quisesse me separar, me separaria, se eu morresse, não tinha problema, ninguém dependia de mim. Claro que tudo isso ainda pode acontecer mas com as devidas adaptações e consequências. 
Não me entendam mal, é óbvio que eu amo a minha filha e não me arrependo. O que me pergunto é: será que noutra cultura eu teria feito a mesma escolha? Não há como saber. 

Com o tempo fui percebendo que eu não deveria encarar a maternidade como um impeditivo para nada. Uma criança é um ser humano em crescimento que merece as melhores condições para crescer de maneira saudável. Eu percebi que não fazia bem para a nossa relação desejar que ela se adaptasse à nossa rotina, mas sim, o contrário, e é por isso que, com ela aos 3 anos, eu ainda não voltei a trabalhar 100% do tempo. Felizmente, eu posso fazer essa escolha hoje de trabalhar apenas 60%, buscá-lá mais cedo do centro de ed.infantil e me oferecer nesse momento só para ela. 

Mas quantas mães/pais tem essa oportunidade ou até o desejo de adaptar sua rotina à criança? É necessário algumas concessões que nem todos estão dispostos a fazer, e apesar de saber que o centro de educação infantil é a melhor opção para a sua educação institucional, eu não abro mão de educar a minha própria filha com os nossos valores. E para isso é preciso tempo, disposição, criar oportunidades para longas e calmas conversas, descobertas e experiências. Sem pressa, sem o stress do dia-a-dia.
A verdade é que a experiência é gratificante mesmo. É felicidade pura, é aprendizado de todos os lados, é crescimento pessoal,  é muito amor. 

A Suécia já entendeu a importância desses momentos e oferece 1 ano e 4 meses de licença parental*, que podem ser divididas 1/2 a 1/2 entre os dois cuidadores. Cada um deve pegar no mínimo 90 dias. Essa é uma característica de muitos países com altos índices de qualidade de vida. E aí, aparece a questão de gênero, amplamente discutida na Suécia desde antes dos anos 70, e a ativa participação do pai. Os homens que hoje são pais aqui, já viram seus pais participando ativamente nas atividades da casa e educação dos filhos. É tudo muito natural para e as empresas/governo compreendem. Ninguém faz cara feia se o homem dia que vai pegar 6 meses de licença. 

Eu não sei se as leis mudam conforme as mudanças culturais ou se a cultura acaba mudando por causa de novas leis. 
Podem ser ambos. 
Mas que mensagem está passando um estado/empresa que oferece 5 dias de licença ao pai quando nasce um bebê e 4 meses, ou em alguns casos 6 meses, de licença para a mãe?

Está dizendo: pai, esse nascimento não tem nada a ver com você. 
Essa experiência é, no máximo, da mãe, e olhe lá, que 6 meses não é tanto assim.

O que é totalmente incompatível com a realidade. Conheço inúmeros homens que esperaram a vida inteira pela experiência de ser pai, e que, infelizmente não tem o amparo das leis, para passar por esse periodo com o mínimo de dignidade.
Incrível que sejamos um país que luta tanto pela família: nos moldes papai, mamãe e filhinho, e não priorizemos essa forma de funcionar da sociedade que oferece à criança o básico, a presença dos pais.

Não é fácil se adaptar ao fim da licença maternidade, mas é diferente quando a criança já tem 1 ano e 4 meses. Fica mais tranquilo educar os filhos quando se trabalha, no máximo, das 8h às 17h. E é muito mais agradável se dedicar à vida profissional quando se sabe que a criança está bem cuidada num centro de educação infantil** de qualidade e próximo de casa. 

Deveríamos poder contar com o suporte do estado para conseguir oferecer melhores experiências diárias às nossas crianças. 

*A licença é paga pelo estado e não pelo empregador.
** Existem na Suécia centros de educação infantil públicos e privados, ambos recebem o mesmo valor do estado por cada criança. Os pais também pagam uma mensalidade que varia conforme o salário dos dois e pode chegar a até no máximo 1250 coroas, o que significa aproximadamente 400 reais. O auxílio econômico do estado recebido pela família é de 1050 coroas para cada criança. Sem distinção entre famílias.

sábado, 9 de fevereiro de 2013

Cachoeira, Dirceu, Diniz, Calheiros... e o povo


POR VANDERSON V. SOARES 

Nos últimos dois anos tenho reparado, frustradamente, a epopeia do poder judiciário 
que o Brasil tem protagonizado.

No ano passado, alguns ministros caíram. Todos acusados de corrupção, pagamento de propina ou desvio de dinheiro público (Casa Civil, Transportes, Agricultura, Turismo e Esportes). Todos foram retirados de seus cargos ou pediram pra sair após o escândalo ter estourado, porém estão livres e felizes por aí.

Ainda no ano passado, Carlinhos Cachoeira, muito bem acompanhado de José Dirceu e Waldomiro Diniz é acusado de receber propina para angariar fundos para a campanha política de um partido. Isso é caso antigo, mas somente ano passado é que o caso ganhou vultuosidade. Respondeu por tudo em liberdade, não disse nada com nada (literalmente) quanto em inquérito e continua feliz, vivendo sua vida tranquilamente como bon vivant.

Cito aqui também o mensalão. “Quando na história desse país” juízes indicados por um presidente condenam acusados de corrupção do mesmo partido de quem os indicou ao cargo, por corrupção e desvio do dinheiro público?! Isso enche a qualquer brasileiro de esperança, mas caímos por terra ao perceber que um dos acusados é empossado como Deputado Federal alguns dias depois, sendo totalmente apoiado por colegas e pela constituição.

E como cereja do bolo, temos o grandioso Renan Calheiros sendo empossado como presidente do Senado. O dito cujo é acusado de peculato, falsidade ideológica e utilização de documento falso. E, repito, foi empossado como presidente do Senado Federal! Um legítimo representante do povo.

O que é mais chocante, indubitavelmente, é o paradigma que está sendo criado e fortalecido no Brasil de que só entra na política quem é ladrão, ímprobo, desonesto, quem não presta e, de fato, há uma generosa parcela de políticos que atestam e comprovam isso. O fato que chamo a atenção é que o jovem de hoje, aquele idealista, sedento por um mundo mais pleno e justo, cheio de anseios pela vida já entra na idade adulta crendo piamente nisso.

A política brasileira, bem como o poder judiciário, perde a passos largos a sua credibilidade diante do povo. Trancafia-se por anos quem rouba um pão para alimentar a família, numa velocidade impressionante de julgamento, enquanto crimes de grande afronta à população enrolam-se por anos até caminhar para a prescrição.

Diante disso tudo, questiono também outro aspecto: o que faz o povo brasileiro ser tão inerte diante dos mais variados escândalos políticos? Muitos gritam em uníssono a questão cultural e, de fato, concordo com isso, mas não tão somente isso. O brasileiro, em sua grande parcela populacional, é aquele cidadão que acorda cedo pra trabalhar, pega um ou dois ônibus pra chegar ao trabalho, sai tarde da empresa, não ganha suficientemente bem, chega em casa cansado, paga altas taxas de impostos e tributos para receber do governo uma educação de baixa qualidade para os filhos, um sistema de saúde falido que não atende a demanda, um sistema previdenciário que aumenta o tempo de contribuição a cada ano, que é deficitário
devido a manobras improdutivas, por uma vida que ele tem que procurar tudo no setor privado, se quer mesmo ser bem atendido.

É um povo que, agora entrando na questão cultural, chega em casa e desliga-se do mundo para assistir novelas que pregam desrespeito ao ser humano, incentivam a vida inconsequente, sem cultura, sem vontade de correr atrás do que se quer. Sempre digo que um dia quero ser um desempregado de novela, que tem empregada, carro do ano, filhos em escolas particulares, e todas as regalias da classe média, mesmo sendo desempregado.

A cada dia que passa me convenço mais firmemente que a educação será a única saída pro nosso Brasil. Não gosto e recrimino quem fala mal do Brasil, mas me indigna ver esse gigante “deitado eternamente em berço esplêndido”, assistindo a escândalos, desvios de dinheiro público, dívida interna, péssima gestão administrativa, políticas sociais que a curto e médio prazo são ótimas, mas a longo apenas aleijam o povo. Dante Alighieri diz, na Divina Comédia, que o pior inferno está reservado para as pessoas indiferentes, àquelas que se omitem. Se isto for verdade, grande parcela do Brasil está a meio caminho de lá, não fosse o
fato de que o brasileiro é condicionado a isso. Ele aprende desde pequeno a não se meter na política, pois é perigoso, é jogo de chacais.

Não é muito agradável escutar que o nosso sistema faz vítimas, mas faz! As pessoas precisam se preocupar com a própria sobrevivência diária, quem dirá se preocupar com quem assume esse ou aquele cargo público. Pagamos altíssimos salários e mordomias aos nossos políticos e é mais que justo que cobremos trabalho e resultados, mas como cobrar se não sabemos como?!

É preciso uma mudança, uma grande mudança, que só se dará através da educação e da cultura.

Vanderson V. Soares é empresario

sábado, 25 de fevereiro de 2012

Cinemark em Joinville

POR JULIANO REINERT


Constantemente ouço pessoas chiarem: “O Cinemark é melhor! Deveria ter Cinemark em Joinville!”. Me pergunto: por quê?

Espere! Deixe-me tentar compreender as razões: com um concorrente, o preço da entrada do cinema seria mais barato, certo? É... isso até é um bom motivo. Mas não penso que o Cinemark, uma exibidora multinacional, viria a Joinville cobrar um preço mais acessível para assistir a um filme na sala escura. E mesmo que cobrasse, há poucos anos tínhamos uma concorrente do GNC – que hoje monopoliza este serviço: o Arco-Íris, no Shopping Cidade das Flores, que fechou as portas por falta de público. Tá que o Arco-Íris deixava muito a desejar. Mas se a preocupação das pessoas era pagar mais barato, não aproveitaram a chance.

Então, se não for isso, é porque teremos sessões de cinema alternativo, e não somente os blockbusters hollywoodianos. Ok. Mas então por que o Ciclo de Cinema da Fundação Cultural de Joinville (que acontecia no Complexo Antarctica) e aqueles promovidos pelo IELUSC e pela UNIVILLE nunca vingaram? Tudo bem que o local para exibição de filmes lá na Antarctica parecia mais uma cozinha (vergonhoso improviso), mas o SESC também promove exibições de filmes em um ambiente excelente. E de graça! E cadê o público?
Se cinema alternativo gratuito não dá público, porque pagar para isso no Cinemark?

Deve haver mais razões para essa necessidade (inexplicável) de muitos joinvilenses (por motivos estapafúrdios) justificarem que a melhoria na qualidade de exibição cinematográfica em Joinville está diretamente ligada à vinda de uma nova grande rede exibidora à cidade.

Circula-se um boato pelos corredores do Cidade das Flores que o cinema de lá, em breve, será reativado. Especulações, apenas.

O fato é que Joinville não tem cultura para o cinema. E, se algum dia quisermos que isso aconteça, é necessário educar as pessoas para respeitarem essa arte. E isso não tem nada a ver com o Cinemark.
Aquele filme joinvilense “As Estrelas Me Mostram Você” não pode ser gravado aqui porque precisaria interditar ruas (!). Nem de grande parcela da população, nem do poder público existe esse respeito com a sétima arte por aqui.

A antiga sede da prefeitura deveria se tornar um estúdio de cinema, colocando Joinville na rota de cidades conhecidas por desenvolver este tipo de trabalho. Não me surpreende que o local esteja abandonado e o projeto não tenha vingado.

O prédio – tombado – do Cine Palácio, hoje, como todos sabem (será que sabem?) é uma igreja. E está alterado, além de, atualmente, não servir em nada para que joinvilenses e turistas o usufruam como patrimônio municipal. Alguém se importa com isso?

É... infelizmente Joinville tem o que merece: a cerimônia do Oscar pela metade, na Globo, depois do Big Brother Brasil.

Juliano Reinert é jornalista, mantém um blog sobre cinema e outro sobre assuntos gerais. É escritor e cinéfilo.