Uma das experiências mais difíceis da minha vida foi voltar a trabalhar depois da maternidade.
A descoberta de si mesma como mãe, esse novo relacionamento, essa sensação de responsabilidade, de cuidar, esse amor sem limites, fazem com que reorganizemos as prioridades. E não estou querendo superestimar a experiência de ser mãe.
Eu vejo que a maternidade é tratada de forma bastante deslumbrante na mídia brasileira. Vê-se as propagandas de margarina, de produtos para bebês ou os finais felizes de quase 100% das comédias românticas. Sem contar a forte influência da igreja e a própria tradição passada por gerações. É difícil para muitos encarar com naturalidade as famílias compostas com outros arranjos: 2 pais, 2 mães, pais separados....enfim. Uma realidade diversa e crescente na sociedade.
É possível visualizar a confusão mental de algumas pessoas quando escutam uma mulher afirmar que não deseja ter filhos, tão forte a lavagem cerebral pela qual passamos todos nas últimas décadas. Acreditamos que para alcançar a felicidade precisamos de papai, mamãe e filhinhos, de preferência 2, um menino e uma menina.
Eu também comprei esse sonho da felicidade, por determinismo ou não, agora não dá de saber, fiz a escolha de ter um filho. Mas o que a propaganda não te conta é o choque de realidade que vem depois e apesar de todo o deslumbramento inicial, um pensamento recorrente era: por que eu fiz isso com a minha vida?!
No sentido de que, até poucos dias antes se eu quisesse viajar, eu ia, se quisesse me separar, me separaria, se eu morresse, não tinha problema, ninguém dependia de mim. Claro que tudo isso ainda pode acontecer mas com as devidas adaptações e consequências.
Não me entendam mal, é óbvio que eu amo a minha filha e não me arrependo. O que me pergunto é: será que noutra cultura eu teria feito a mesma escolha? Não há como saber.
Com o tempo fui percebendo que eu não deveria encarar a maternidade como um impeditivo para nada. Uma criança é um ser humano em crescimento que merece as melhores condições para crescer de maneira saudável. Eu percebi que não fazia bem para a nossa relação desejar que ela se adaptasse à nossa rotina, mas sim, o contrário, e é por isso que, com ela aos 3 anos, eu ainda não voltei a trabalhar 100% do tempo. Felizmente, eu posso fazer essa escolha hoje de trabalhar apenas 60%, buscá-lá mais cedo do centro de ed.infantil e me oferecer nesse momento só para ela.
Mas quantas mães/pais tem essa oportunidade ou até o desejo de adaptar sua rotina à criança? É necessário algumas concessões que nem todos estão dispostos a fazer, e apesar de saber que o centro de educação infantil é a melhor opção para a sua educação institucional, eu não abro mão de educar a minha própria filha com os nossos valores. E para isso é preciso tempo, disposição, criar oportunidades para longas e calmas conversas, descobertas e experiências. Sem pressa, sem o stress do dia-a-dia.
A verdade é que a experiência é gratificante mesmo. É felicidade pura, é aprendizado de todos os lados, é crescimento pessoal, é muito amor.
A Suécia já entendeu a importância desses momentos e oferece 1 ano e 4 meses de licença parental*, que podem ser divididas 1/2 a 1/2 entre os dois cuidadores. Cada um deve pegar no mínimo 90 dias. Essa é uma característica de muitos países com altos índices de qualidade de vida. E aí, aparece a questão de gênero, amplamente discutida na Suécia desde antes dos anos 70, e a ativa participação do pai. Os homens que hoje são pais aqui, já viram seus pais participando ativamente nas atividades da casa e educação dos filhos. É tudo muito natural para e as empresas/governo compreendem. Ninguém faz cara feia se o homem dia que vai pegar 6 meses de licença.
Eu não sei se as leis mudam conforme as mudanças culturais ou se a cultura acaba mudando por causa de novas leis.
Podem ser ambos.
Mas que mensagem está passando um estado/empresa que oferece 5 dias de licença ao pai quando nasce um bebê e 4 meses, ou em alguns casos 6 meses, de licença para a mãe?
Está dizendo: pai, esse nascimento não tem nada a ver com você.
Essa experiência é, no máximo, da mãe, e olhe lá, que 6 meses não é tanto assim.
O que é totalmente incompatível com a realidade. Conheço inúmeros homens que esperaram a vida inteira pela experiência de ser pai, e que, infelizmente não tem o amparo das leis, para passar por esse periodo com o mínimo de dignidade.
Incrível que sejamos um país que luta tanto pela família: nos moldes papai, mamãe e filhinho, e não priorizemos essa forma de funcionar da sociedade que oferece à criança o básico, a presença dos pais.
Não é fácil se adaptar ao fim da licença maternidade, mas é diferente quando a criança já tem 1 ano e 4 meses. Fica mais tranquilo educar os filhos quando se trabalha, no máximo, das 8h às 17h. E é muito mais agradável se dedicar à vida profissional quando se sabe que a criança está bem cuidada num centro de educação infantil** de qualidade e próximo de casa.
Deveríamos poder contar com o suporte do estado para conseguir oferecer melhores experiências diárias às nossas crianças.
*A licença é paga pelo estado e não pelo empregador.
** Existem na Suécia centros de educação infantil públicos e privados, ambos recebem o mesmo valor do estado por cada criança. Os pais também pagam uma mensalidade que varia conforme o salário dos dois e pode chegar a até no máximo 1250 coroas, o que significa aproximadamente 400 reais. O auxílio econômico do estado recebido pela família é de 1050 coroas para cada criança. Sem distinção entre famílias.
A explicação destas leis, deste amparo aos pais e mães não é uma questão cultural apenas, mas passa por uma transformação econômica e de educação da sociedade que gera uma queda na demografia muito grande, que pode inclusive travar ou fazer com que o país retroceda. Por isso, o Estado passa a entender que quanto mais incentivo, apoio financeiro/social a sociedade tiver, maior a chance de terem filhos e perpetuarem a economia do país. Só teremos isto no Brasil após 2030, quando cessar nosso bônus demográfico. Porque quando aperta no "bolso", o Estado resolve agir.
ResponderExcluirAndy
Boa tarde Fernanda.
ResponderExcluirEntendo seu ponto de vista mas não acredito que aumentar o tempo da licença seja a solução.
Argumentar que é o Estado que pagaria essa licença me parece muito simplista, já que o Estado somos nós, e, será do nosso bolso que esse valor sairá.
Saudações
Puxa que sorte sua filha teve... ainda bem que você não realizou aborto, não é? Ainda bem que você contrariou seu discurso protecionista ao aborto. Afinal de contas nunca ninguém está preparado para se ter um filho, então a melhor opção está a porta: descartar uma vida. É mais fácil e ninguém sofre. Aborto é crime, e ponto final. E quem faz é criminoso. Com a graça de Deus sua filha está cumprindo com o maior prazer da vida, qual seja, fazer você e o pai dela felizes. Uma vida não é uma questão de escolha, mesmo que ela ocorra em um momento não oportuno. O que é momento oportuno???
ResponderExcluirAh ia me esquecendo um centro de educação infantil não é uma área de lazer em que se pode deixar uma criança. É uma INSTITUIÇÃO DE ENSINO, um local onde se forma os valores éticos e morais, onde uma criança aprende a respeitar limites sociais. E como tal tem que ser valorizada por isso.
É uma pena que muitas pessoas vêem um Centro de Educação Infantil como um depósito de crianças. Aliás é bem assim que a atual gestão municipal enxerga a situação. Bela idéia que o prefeito Udo teve em ampliar o horário dos CEI´s para os sábados. Ainda bem que não deu certo... Afinal de contas quem vai ficar com as crianças enquanto os pais trabalham no comércio. Quem ganha com isso??? Não sei. Mas sei que quem perde, os filhos. Não me causaria estranheza a proposição de um CEI 24 horas, perfeito né? Todos teriam tempo para um choppinho no final do dia e quem sabe dar uma embalada madrugada a dentro.
Enquanto a sociedade relega a escola o dever da educação continuaremos tendo uma comunidade dominada pela violência. O papel de impor limites, de mostrar o que é certo e a diferença do que é errado é da família. Cabe a escola a formação de conhecimento.
O comentário dos anônimos não costuma primar pelo bom senso e a inteligência, com raras, raríssimas exceções. Poucos, no entanto, alcançaram o seu nível de estupidez.
ExcluirNo mais, bom texto o da Fernanda. Eu tenho um filho de quatro anos e meio, que nasceu junto com meu projeto de doutorado - costumo brincar que o começo do meu doutoramento foi feito entre fontes e fraldas. Agora, é minha mulher quem está a fazer o dela.
Felizmente, temos um bom arranjo e uma rotina que sempre facilitou a condução dos nossos projetos pessoais, profissionais e acadêmicos. Mas, mesmo assim, a chegada de um filho altera profundamente a rotina de qualquer casal. Contar com uma estrutura institucional adequada ajuda bastante, e é isso que falta a muitos pais e mães em um país carente como o Brasil.
Obrigada Clóvis.
ExcluirNão quis ser grosseira (demais), mas minha vontade mesmo foi mandar esse vídeo aqui ó:
http://www.youtube.com/watch?v=-MK1q9fZjeI
Ótimo. Houve um tempo em que o Caetano não era tão mala. Aliás, nas minhas aulas de Contemporânea costumava dizer aos meus alunos que o anos 60 foram a década em que Caetano Veloso não era chato e Roberto Carlos era um rebelde.
ExcluirHaha...eu ainda nao acho ele chato, acho autentico. Num espaco com tanta falsidade e hipocrisia é legal ver quem fala o que pensa.
ExcluirParabéns a quem modera este blog, o meu comentário que enviei ontem não foi publicado. Assim como este também não vai ser. Porque? Blog suspeito? Espaço de discussão?? Me molhei neste blog, não me molho mais....
ResponderExcluirAnonimo,
ResponderExcluirDesculpe a demora em aprovar seu comentario. Ontem foi dia de limpeza coletiva nos espacos comuns do bairro e ficamos ocupados.
Obrigada pela sua estupida e desnecessaria participacao.
Melhor que vc, eu sei muito bem a funcao de um centro de educacao infantil, e nem vou perder tempo discutindo esse tema.
Ja o aborto que nem era tema do post, é uma escolha sim, que só cabe à mulher e deveria ser legalizado. Se vc não faria (imagino que seja uma mulher falando, já que tem uma opiniao tao intensa sobre o assunto, ou um homem com medo do poder da mulher sobre o seu esperma), não importa. O problema é que já acontecem os abortos e mulheres morrem por ser uma pratica clandestina. Se eu tbem nao faria nao vem ao caso. Mas quem quer devia poder fazer.
Nao se molhe. Nao faz falta.
Este comentário foi removido pelo autor.
ResponderExcluirFernanda, muito bom seu post. Acho que o melhor que já li no chuva acida. Infelizmente suas idéias e seus conceitos estão a frente da sociedade brasileira, que ainda é muito machista e religiosa.
ResponderExcluirObrigada, Ângelo. Concordo no machismo e na religiosidade. Sao o motivo dos nossos vagarosos avanços.
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