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terça-feira, 13 de novembro de 2018

Direitos e privilégios: a hora do fim?


POR JORDI CASTAN
Devemos defender os direitos e atacar com veemência os privilégios. O Brasil é um país de privilégios e privilegiados. Um país que durante décadas concentrou favores e vantagens, numa casta privilegiada que continua abocanhando uma porção desproporcional de riqueza e poder. E fez isso às custas da maioria da população, essa mesma que hoje está duramente castigada pela crise e que saiu as ruas para eleger o candidato que melhor soube capitalizar seus desejos e frustrações. Ou seja, aquele que identificou com o perfil necessário para mudar tudo aquilo que precisaria ser mudado.

Os direitos são universais, justos e beneficiam a toda a sociedade. Não há um beneficiário direto. Não pode haver “direitos” só de alguns, nem podem haver direitos injustos, tampouco podemos considerar direitos aqueles que só beneficiam aos que os conquistaram.
O país está na encruzilhada de ter que separar privilégios de direitos. Não dá mais para manter castas de privilegiados às custas da maioria da população. Enquanto os direitos são sagrados e devem ser preservados, os privilégios devem ser extintos imediatamente. O brasileiro não consegue mais manter uma elite de privilegiados cada vez mais privilegiados, cada vez mais ousados e desavergonhados.

O vergonhoso aumento de 16,3% concedido pelo senado aos ministros do STF e a PGR é um privilégio. O aumento do salário mínimo em 1,81% é um direito: podemos até convir que seja pouco, mas é igual para todos. A diferença entre direito e privilegio deve ser a primeira iniciativa do novo governo. O resultado das urnas é a resposta dos sem privilégios aos privilegiados. A lista de privilégios e dos setores da sociedade beneficiados com privilégios vergonhosos e inaceitáveis é extensa é não conhece limites.

Começa, numa lista que não pretende ser completa, nem exaustiva e que tampouco tem ordem ou sequência de valor ou gravidade, com alguns casos. As filhas solteiras dos militares, os funcionários públicos que “trabalham” 6 horas ou menos e recebem por 8 horas. Os deputados e senadores que recebem aposentadoria aos 60 anos de idade. Ou os policiais militares, bombeiros e assemelhados que aposentam em geral com menos de 50 anos de idade e antes são reformados para a patente imediatamente superior.
Privilégios são os anos sabáticos pagos com recursos públicos, são os carros, motoristas, as cotas de combustível e as prestações de contas sem comprovação. Privilégios são o auxilio paletó, receber pagamento adicional por periculosidade exercendo função administrativa. Privilégios são também os cartões corporativos, os engraxates, os almoços gratuitos, o DEMED (Departamento Médico da Câmara) para ex-deputados, os planos de saúde ilimitados fora do SUS, quando custeados com recursos públicos.

São privilegiados os que recebem sem trabalhar, sem assinar o ponto, o sem cumprir horário. São privilégios inaceitáveis motoristas, veículos a disposição e funcionários administrativos para ex-presidentes, mais ainda se estiverem presos e condenados em segunda instância. Tampouco podem ser considerados direitos as férias forenses superiores aos 30 dias por ano, como estabelece a CLT, nem receber salários acima do teto constitucional, por muito que todos estes privilégios sejam legais, amparados por leis, resoluções, normas e tenham amparo legal. São legais, mas são imorais e injustos.
No caso do aumento concedido pela maioria dos senadores aos ministros do STF, que são os magistrados que julgam as 55 mil autoridades de 40 cargos diferentes, entre os que se encontram os senadores que aprovaram os 16,3% de aumento. Em tempo, o foro privilegiado é também um privilégio que não deveria existir.

Para pôr de volta o Brasil nos trilhos da moralidade e da justiça é preciso enfrentar de frente as castas de privilegiados, essas mesmas que estão espalhadas por todos e cada um dos elementos que compõem o tripé republicano. Ou se combatem e se extirpam estes privilégios - e os privilegiados que os defendem e representam - ou a república estará definitivamente perdida. O eleitor votou no Brasil dos direitos e votou também contra o dos privilégios. Responder a este anseio exigirá coragem, firmeza e persistência. E a mobilização para defender privilégios começou antes mesmo que o novo governo assuma.

sábado, 12 de outubro de 2013

As datas e a idiotice

POR FERNANDA M. POMPERMAIER

O dia das crianças está se aproximando e essa é mais uma data que eu só lembro porque tenho muitos amigos brasileiros no facebook. Assim como dia dos pais, das mães, dos namorados, da secretária, do engenheiro, da árvore, do ônibus, da calçada, enfim,...  a lista segue on and on.... 

A pressão comercial nessas datas na Suécia é tão insignificante que chega a ser desprezível, quase inexistente. Não vejo propagandas, não existem outdoors, não se vê cartazes nas lojas... nada que lembre que alguma data importante para o comércio esteja próxima, durante o ano todo. É claro que isso também faz parte de uma política ferrenha do governo de não permitir propaganda de qualquer forma e em qualquer lugar porque enfim, o capitalismo não venceu no mundo todo. Existe além disso, uma influência cultural forte de não consumir o que não é necessário. 

Nas escolas nenhum cartão para os pais e lógico, nenhum apresentação cultural com esse tema. As pouquíssimas datas comemoradas nos centros de educação infantis estão relacionadas: às mudanças de estações: uma festa no verão, outra no outono, o natal, a páscoa e o dia de Santa Luzia (tradição é tradição, não dá de fugir de tudo). Mas de qualquer maneira, o apelo comercial é muito menor e sou grata por isso.

Sentia que no Brasil, eu passava o ano todo comprando presente pra alguém por alguma data que se aproximava, uma idiotice. Fazemos mesmo um big deal desses momentos afirmando que são uma desculpa para lembrar-se de alguém e fazer algo legal para essa pessoa, quando na verdade isso acaba sendo uma grande encheção de linguiça.

A verdade é que como mãe eu não quero nada de flor, chocolate ou perfume, muito menos um dia por ano para ser lembrada. Eu quero licença maternidade de 1 ano. Quero o direito de acompanhar meu filho ao médico sem encarar cara feia de chefe. Quero salário igual ao de um homem na mesma função. Quero vaga num centro de educação infantil público e de qualidade. Quero o direito de amamentar em público sem nenhum marmanjo com síndrome de punheteiro achar que tô usando a mama para o ofício errado. Resumindo, quero respeito e reconhecimento genuíno, que não dura um dia mas o ano todo e atinge à todas da mesma forma.

O mesmo acontece com a infância. Quem precisa de dia da criança quando em Joinville mesmo existem crianças em condições desumanas de vida? Quando os ceis tem listas de espera quilométricas porque não tem vaga para todos? Quando nossos espaços públicos, de parques a calçadas não acolhem a criança? Nossos espaços não são pensados para a vivência da infância. Em boa parte da cidade é impossível ir à escola de bicicleta ou à pé em segurança. É impossível correr num grande gramado, soltar pipa, conhecer diferentes árvores, dormir nas suas sombras,...... a não ser que seu pai trabalhe numa empresa que ofereça uma boa associação, aí a criança pode ter ALGUM direito. Mas essa prática segrega, oferece à criança uma convivência selecionada e isola uma parte da cidade com a qual ela não terá contato, a não ser que seja obrigada. E isso é viver à margem da realidade. Dá quase de processar a prefeitura por negligência. Por deixar de oportunizar aos seus pequenos moradores experiências verdadeiramente participativas e prazeirosas na cidade.
Sem comentar as  restritas oportunidades que terão os pequenos das periferias que se contentarão com os presentes que ganharem nos programas de fim de ano dos funcionários de empresas, uma hipocrisia.

A mudança cultural começa conosco.
Começa em casa tirando o foco do material e oferecendo outras vivências.
Mas continua com o mais importante: envolvendo-se de verdade nos movimentos sociais que podem definitivamente mudar o destino de crianças, mães e mulheres à longo prazo. Nas associações de moradores, nas decisões da política local, nas lutas por vagas, nas denúncias de maus tratos,... inúmeras são as formas de ajudar e eu sei que muita gente já faz muito, mas sempre é bom engrossar o coro e exigir direitos de verdade. Se nós, mulheres e mães não o fizermos, ninguém fará por nós.

quinta-feira, 25 de abril de 2013

As leis acompanham a cultura ou vice-versa?


POR FERNANDA M. POMPERMAIER

Uma das experiências mais difíceis da minha vida foi voltar a trabalhar depois da maternidade. 


A descoberta de si mesma como mãe, esse novo relacionamento, essa sensação de responsabilidade, de cuidar, esse amor sem limites, fazem com que reorganizemos as prioridades. E não estou querendo superestimar a experiência de ser mãe.  
Eu vejo que a maternidade é tratada de forma bastante deslumbrante  na mídia brasileira. Vê-se as propagandas de margarina, de produtos para bebês ou os finais felizes de quase 100% das comédias românticas. Sem contar a forte influência da igreja e a própria tradição passada por gerações. É difícil para muitos encarar com naturalidade as famílias compostas com outros arranjos: 2 pais, 2 mães, pais separados....enfim. Uma realidade diversa e crescente na sociedade. 
É possível visualizar a confusão mental de algumas pessoas quando escutam uma mulher afirmar que não deseja ter filhos, tão forte a lavagem cerebral pela qual passamos todos nas últimas décadas. Acreditamos que para alcançar a felicidade precisamos de papai, mamãe e filhinhos, de preferência 2, um menino e uma menina. 

Eu também comprei esse sonho da felicidade, por determinismo ou não, agora não dá de saber, fiz a escolha de ter um filho. Mas o que a propaganda não te conta é o choque de realidade que vem depois e apesar de todo o deslumbramento inicial, um pensamento recorrente era: por que eu fiz isso com a minha vida?! 
No sentido de que, até poucos dias antes se eu quisesse viajar, eu ia, se quisesse me separar, me separaria, se eu morresse, não tinha problema, ninguém dependia de mim. Claro que tudo isso ainda pode acontecer mas com as devidas adaptações e consequências. 
Não me entendam mal, é óbvio que eu amo a minha filha e não me arrependo. O que me pergunto é: será que noutra cultura eu teria feito a mesma escolha? Não há como saber. 

Com o tempo fui percebendo que eu não deveria encarar a maternidade como um impeditivo para nada. Uma criança é um ser humano em crescimento que merece as melhores condições para crescer de maneira saudável. Eu percebi que não fazia bem para a nossa relação desejar que ela se adaptasse à nossa rotina, mas sim, o contrário, e é por isso que, com ela aos 3 anos, eu ainda não voltei a trabalhar 100% do tempo. Felizmente, eu posso fazer essa escolha hoje de trabalhar apenas 60%, buscá-lá mais cedo do centro de ed.infantil e me oferecer nesse momento só para ela. 

Mas quantas mães/pais tem essa oportunidade ou até o desejo de adaptar sua rotina à criança? É necessário algumas concessões que nem todos estão dispostos a fazer, e apesar de saber que o centro de educação infantil é a melhor opção para a sua educação institucional, eu não abro mão de educar a minha própria filha com os nossos valores. E para isso é preciso tempo, disposição, criar oportunidades para longas e calmas conversas, descobertas e experiências. Sem pressa, sem o stress do dia-a-dia.
A verdade é que a experiência é gratificante mesmo. É felicidade pura, é aprendizado de todos os lados, é crescimento pessoal,  é muito amor. 

A Suécia já entendeu a importância desses momentos e oferece 1 ano e 4 meses de licença parental*, que podem ser divididas 1/2 a 1/2 entre os dois cuidadores. Cada um deve pegar no mínimo 90 dias. Essa é uma característica de muitos países com altos índices de qualidade de vida. E aí, aparece a questão de gênero, amplamente discutida na Suécia desde antes dos anos 70, e a ativa participação do pai. Os homens que hoje são pais aqui, já viram seus pais participando ativamente nas atividades da casa e educação dos filhos. É tudo muito natural para e as empresas/governo compreendem. Ninguém faz cara feia se o homem dia que vai pegar 6 meses de licença. 

Eu não sei se as leis mudam conforme as mudanças culturais ou se a cultura acaba mudando por causa de novas leis. 
Podem ser ambos. 
Mas que mensagem está passando um estado/empresa que oferece 5 dias de licença ao pai quando nasce um bebê e 4 meses, ou em alguns casos 6 meses, de licença para a mãe?

Está dizendo: pai, esse nascimento não tem nada a ver com você. 
Essa experiência é, no máximo, da mãe, e olhe lá, que 6 meses não é tanto assim.

O que é totalmente incompatível com a realidade. Conheço inúmeros homens que esperaram a vida inteira pela experiência de ser pai, e que, infelizmente não tem o amparo das leis, para passar por esse periodo com o mínimo de dignidade.
Incrível que sejamos um país que luta tanto pela família: nos moldes papai, mamãe e filhinho, e não priorizemos essa forma de funcionar da sociedade que oferece à criança o básico, a presença dos pais.

Não é fácil se adaptar ao fim da licença maternidade, mas é diferente quando a criança já tem 1 ano e 4 meses. Fica mais tranquilo educar os filhos quando se trabalha, no máximo, das 8h às 17h. E é muito mais agradável se dedicar à vida profissional quando se sabe que a criança está bem cuidada num centro de educação infantil** de qualidade e próximo de casa. 

Deveríamos poder contar com o suporte do estado para conseguir oferecer melhores experiências diárias às nossas crianças. 

*A licença é paga pelo estado e não pelo empregador.
** Existem na Suécia centros de educação infantil públicos e privados, ambos recebem o mesmo valor do estado por cada criança. Os pais também pagam uma mensalidade que varia conforme o salário dos dois e pode chegar a até no máximo 1250 coroas, o que significa aproximadamente 400 reais. O auxílio econômico do estado recebido pela família é de 1050 coroas para cada criança. Sem distinção entre famílias.

quarta-feira, 25 de janeiro de 2012

Pinheirinho e o conto de fadas da Constituição Federal

POR GUILHERME GASSENFERTH



A ação de desocupação da posse ou invasão de Pinheirinho, em São José dos Campos, fez-me refletir sobre algumas coisas. E embora alguns possam dizer que minha posição política centrista seja simplesmente uma indefinição entre direita e esquerda, afirmo que deste ângulo é possível ter uma visão menos viciada da política, aliando elementos de ambas na análise.

Primeiramente, é preciso dizer que sou a favor da desocupação, não só neste caso, mas no geral. Creio que o direito da propriedade privada é um dos alicerces de nossa democracia. E invasão depõe contra este direito constitucional. Portanto, as famílias que ocuparam devem sair. Sim, isto poderia ter sido feito já no início da ocupação, quando ainda poucos morassem por lá, mas de todo modo, um erro não justifica o outro.

Alguns veículos de mídia questionaram como pode a justiça determinar a desocupação de um imóvel de Naji Nahas, um malfeitor consolidado, com vários crimes na bagagem, inclusive a sonegação de uma pequena fortuna, pela qual pagamos eu e você. Oras, não importa se é do Nahas ou da Madre Teresa, mas todos estão sujeitos à lei, nos seus direitos e deveres. O fato de ele ser um criminoso não significa que seus direitos de cidadão estejam todos cassados. Não é por ter cometido crimes contra o erário que os cometidos por outrem contra seu patrimônio serão perdoados.

Digo ainda que a ordem judicial deve ser cumprida pela Polícia Militar. Se uma juíza deu ordem de desocupação do imóvel, a PM deve fazer desocupar o imóvel. Não acatar a decisão da magistrada seria também incidir em crime.

Mas há algumas reflexões que desejo fazer sobre estes três itens pontuados nos últimos parágrafos.

A Constituição Federal é nossa lei maior, a que está sobre todas as outras. Contudo, um artigo não tem superioridade ou prioridade sobre outro da mesma lei. Já no artigo primeiro, a CF reza que a República brasileira tem como fundamento a cidadania e a dignidade da pessoa humana. A forma como a PM tratou algumas pessoas na invasão foi digna? Para mim, parece que houve novamente abuso de força policial. Quando vejo fotos de crianças sendo presas, ou ainda leio uma denúncia publicada no UOL de que há vítimas, inclusive crianças, parece-me que a PM foi truculenta e atentou contra o primeiro artigo da CF. Da mesma forma que a propriedade deva ser defendida, também deve ser a dignidade.

Por outro lado, a Carta Magna propõe como direitos sociais do brasileiro, entre outros, a moradia. E prevê um salário mínimo que permita o atendimento das necessidades inclusive com moradia. E onde está a polícia e a justiça para fazer valer, com a mesma intensidade e esforço, o direito do José da Silva de ter sua casinha, previsto na mesma Constituição que dá o direito de propriedade ao Naji Nahas? Nunca vi a polícia invadindo um gabinete de um prefeito ou governador e exigindo com balas de borracha o imediato investimento em habitação.

Há ainda que se pensar que a ordem judicial dada à polícia foi de desocupação, não de brutalidade. Há pessoas justificando os abusos da PM sob a questão do cumprimento da decisão. Repito: sou a favor da desocupação, mas jamais a qualquer custo. Esta deveria ter sido feita com o máximo possível de paz e respeito às partes. Porque a grande maioria das famílias que viviam no Pinheirinho só estava ali porque não lhe foi dada a oportunidade de ter sua própria casinha. Então, assim como houve crime por parte das famílias, há também a culpa do Estado em não ter provido habitação. Ou seja, o Estado além de não prover o que é obrigado ainda pune os oprimidos pela falta de moradia com mais repressão.

Deste modo, soa para mim que existem dois Estados. O da Constituição Federal, ideal e ótimo, e o da realidade, que na inviabilidade de integral cumprimento da CF e tendo que optar por beneficiar uns em detrimento de outros, subjuga-se aos interesses do capital. O Nahas roubou dinheiro suficiente pra comprar galinhas para alimentar uma São Paulo. E tá solto. Mas se o José da Silva roubar uma galinha pra dar de comer pros seus filhos, ele apanha da PM e vai pro xilindró. Por que o direito de propriedade do Nahas prevalece ao de moradia e dignidade do José da Silva? Porque o Nahas tem dinheiro, e o José da Silva não.