segunda-feira, 8 de abril de 2013

Fazer planejamento urbano é saber conviver com o diferente

POR CHARLES HENRIQUE VOOS

Principalmente depois da aprovação do Estatuto da Cidade em 2001, momento no qual que se tornou obrigatória a discussão democrática sobre o planejamento urbano das cidades brasileiras, nós presenciamos (mais especificamente em Joinville) as discussões sobre a organização de nossa cidade ficarem mais acaloradas. Com o Plano Diretor, aprovado em 2008, já percebemos isto. Porém, a regulamentação de seus instrumentos escancarou a dificuldade que temos de conviver com quem pensa diferente, independentemente da posição em que os grupos tomam ao longo do processo.

Acompanhamos dois grupos onipresentes em todas as discussões: o poder econômico fortemente organizado (com seus advogados e representantes de classe) de um lado, e de outro profissionais liberais, professores, empresários e estudantes que defendem a abertura do processo conforme rege o Estatuto aprovado em 2001, sem esquecer dos desinteressados (ou os induzidos socialmente a tal comportamento, conforme já falamos aqui no Chuva Ácida).  A cidade de Joinville perde a partir do momento em que estas duas alas não dialogam e se atacam. Chegam ao cúmulo de esquecer o principal objetivo: a cidade de Joinville.

Não estou nem falando do debate judicial para a garantia dos preceitos democráticos (que é direito de todos os cidadãos), mas sim da desqualificação pessoal que toma conta do debate. Artigos em jornais, blogs, revistas, TV, rádios... todos os meios de comunicação possíveis são utilizados na hora de desqualificar o que está acontecendo. E muitos desses meios, para piorar, também fazem questão de tomar partido e ajudar na desqualificação - seja para qual lado for (mas nós sabemos qual o lado preferencial das editorias).

Os "interesses" falam mais alto. A cidade ideal, com essa dificuldade de diálogo, será tomada pela cidade possível. E isto só faz os interesses do planejamento urbano excludente, onde desenvolvimento urbano é trocado pelo crescimento econômico. O debate qualificado precisa acontecer. Mas isso já estou cansado de falar por aqui. A pergunta que fica, ao analisar tudo isso, gira em torno de quem ganha com essa falta de alteridade e diálogo. Diria que ninguém ganha: a cidade não consegue ter discussões democráticas, os cidadãos joinvilenses mostram-se limitados pois não sabem conviver e respeitar que o outro pode pensar diferente (estendamos isso para além do planejamento urbano e veremos que é a base do pensamento coletivo joinvilense), o grande capital não consegue impor os seus interesses (ainda bem!) e o grupo que defende os debates democráticos continuará sendo desqualificado nos espaços da mídia parcial. Se ninguém ganha com esta falta de diálogo, por qual motivo o cenário se mantém?

O único horizonte para além da ocasião existente, sobretudo ao alongamento do processo, é de presenciarmos um aumento do número de desinteressados, principalmente pela falta de resultados. A mobilização popular não é simultânea à morosidade, pelo contrário: eu nunca vi um poder econômico tão articulado e tendencioso nas questões de planejamento urbano como nos últimos anos. É aí que mora a esperança daqueles que querem dominar socialmente e economicamente através do planejamento urbano, pois são menos cabeças para conviver e enfrentar...

Ps: este texto serve, sim, como um mea-culpa.

Um comentário:

  1. Grandes jornadas começam com os primeiros passos

    A retomada da cidadania dar-se-á por mobilização e participação. As duas ações demandam tempo, e tempo é uma riqueza que a sociedade moderna não possui. Perdemos o hábito desde a época da ditadura. Com a omissão da sociedade os oportunistas se instalaram e no decorrer dos últimos trinta anos se fortaleceram e se estruturaram.
    Quando os interesses da coletividade não se manifestam, Os interesses individuais e oportunistas se estabelecem.
    Cabe agora, à sociedade recuperar o tempo perdido. Cabe agora, aos movimentos cidadãos retomar a participação e a fiscalização. Qualquer .... repito: qualquer cargo representativo, precisa ser fiscalizado e cobrado; em todos os segmentos: privado (empresarial, coletivo ou individual) ou público. É desta forma que os interesses dos representados serão defendidos.

    Porém, é importante que se tenha consciência de que não se trata de um embate. Trata-se, isto sim, da arte do debate ...falar, ouvir, refletir, concluir respeitar e aceitar. Entendo que não cabe apontar vencidos ou vencedores. A busca tem que ser pela melhoria do TODO

    Uma vez ouvi a pérola: “todo mundo tem a sua razão. O que atrapalha é a razão dos outros”

    A sociedade é composta por indivíduos, seus segmentos e interesses. Neste universo incluem-se: os empresários, o capital empreendedor, o capital especulativo, o político “Dom Quixote”, o político amarrado, os conservadores minimalistas, os visionários cosmopolitas, os ciclistas, os vendedores de automóveis, a turma do chão da fábrica que já sentiu no bolso um corte de horas extras devido a uma crise européia, os prestadores de confortos “supérfluos” (primeiros a serem cortados nas horas de aperto), os servidores, ... em suma: muita, muita diversidade.

    O recado das urnas foi dado. Isto já é resultado do inconsciente coletivo que busca por a casa em ordem. Prefiro um empresário local que um político de passagem aventureiro e oportunista.
    Há posicionamento e/ou defesa de interesses? Claro. Onde não haveria? Por que não haveria?
    Se um de nós lá estivesse não faria o mesmo? Não nos esforçamos para defender um interesse?
    É o ideal? Não. Atende o princípio da isonomia? Não. Mas é o melhor que nós conseguimos, e o melhor que nossa democracia permitiu.
    Entendo que seja como ser pai. – Sou o melhor pai do mundo? Não. Mas faço aquilo que minha consciência e meu limitado conhecimento entende como o melhor.
    Democracia, isonomia, participação, fiscalização ...... ações que precisam de muita constância, pratica e .... TEMPO
    Oxalá tivéssemos centenas de movimentos populares, defendendo os mais diversos objetivos e pontos de vista. A oportunidade da apreciação das diferenças resulta em crescimento. E é a constância desta mobilização que trará o resultado pretendido. Exigir o equilíbrio perfeito ... justo e democrático, pode soar utópico agora. Mas são os primeiros passos para atingi-lo. O resultado, muito provavelmente não será o ideal, mas será o que for conquistado com a participação dos que se dispuserem a participar, somar e debater.
    A cidade nunca mais será como em 1980.
    A cidade já não é como eu a conheci em 2006.
    A cidade quer crescer.
    Experimente dizer a um adolescente que ele não poderá dirigir no centro, ou para a nova classe média que não poderá adquirir carro ao trocar de imóvel, ou a qualquer cidadão que seu imóvel não irá valorizar. Não dá, né?
    A população vai diminuir? Impossível. Viveremos numa bucólica Joinville? Pouco provável.
    Cabe então organizar este inevitável crescimento. Dialogar, ouvir, falar, manifestar, defender, ceder, aceitar, e ter em mente que todo o esforço foi feito para dar uma direção a cidade .... mas sabendo de antemão que não será o nosso resultado ideal. Será o melhor que nossa mobilização conseguir.

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