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segunda-feira, 2 de setembro de 2024

Palácio das Orquídeas deixa Adriano Silva numa saia justa

POR JOSÉ ANTÓNIO BAÇO

Adriano Silva tem um abacaxi para descascar. A denúncia do uso indevido de verbas da educação, aplicadas num projeto de turismo, abre uma rachadura na imagem de bom gestor que ele tenta projetar. Pode até nem haver consequências legais, mas a sua credibilidade deve sofrer algum abalo. A denúncia feita pelo advogado Rodrigo Bornholdt, candidato a prefeito pelo PSB, deixou Adriano Silva numa saia justa. 

Que tal relembrar a sequência do escândalo do Palácio das Orquídeas? O caso começou com Bornholdt a fazer a denúncia. Adriano foi a uma rádio acusá-lo de fake news. Rodrigo fez um “react” nas redes sociais e mostrou o contrato da Prefeitura para provar as afirmações. E fechou com um desafio a Adriano: “fica aí o teu direito de resposta para esclarecer de onde está vindo o dinheiro do suposto Palácio das Orquídeas”. A bola está com Adriano. 

As implicações administrativas e políticas são relevantes, claro, mas o escândalo traz algo novo. É que depois de chegar à prefeitura quase por obra de Nossa Senhora do Acaso, o atual prefeito teve uma vida muito fácil. Ninguém peitou. Adriano Silva navegou sempre em águas calmas, sem oposição. Os bolsonaristas (que têm muito em comum com o prefeito) alinharam alegremente. A oposição mais à esquerda não foi além de pequenas troças nas redes sociais.

Eis a novidade. Este é o primeiro chacoalhão a sério sofrido pelo atual prefeito. Não dá para dizer que vai causar mossa na sua imagem, claro. Até porque a imprensa, sempre muito meiguinha, deve permanecer no seu “rigor mortis”. Quer dizer que a pendenga só pode prosperar nas redes sociais. E se os outros candidatos pegarem carona na denúncia. Então, é possível que a coisa escale e que surjam outros fatos. 

Enfim, é só os opositores fazerem oposição. É certo que o atual prefeito nada de braçada nas redes sociais. Nem tanto por talento, mas porque sempre esteve sozinho na piscina. Mas o chato de governar pelo Instagram é que isso cria um mundo virtual e dá a ilusão de que Joinville é uma Shangri-La. A diatribe do Palácio das Orquídeas mostra uma nova face do jogo: o prefeito sendo obrigado a descer ao mundo real, onde estão as pessoas de carne e osso, para se explicar. E aí o jogo é outro. 

 Ah... mas não dá para chamar de escândalo. Dá sim. Tudo o que aponte para mau uso de dinheiro da educação é sempre um escândalo. E este episódio mostra que nem tudo são flores para Adriano Silva. A imagem dessa Joinville-Shangri-La criada no Instagram está a ser abalroada por um choque de realidade. Bem-vindo ao mundo real, prefeito. Mas fica a constatação: não existe filtro de Instagram para maquiar a realidade.

É a dança da chuva.

Rodrigo Bornholdt fez a denúncia, Adriano Silva ainda não apresentou uma explicação.


sexta-feira, 27 de janeiro de 2017

Extinção da FCJ: a política de cima para baixo

POR RODRIGO BORNHOLDT

A extinção da FCJ tem várias implicações. Discorro sobre as que me parecem mais importantes.

A primeira delas é de ordem prática. Para se conseguir recursos federais, a estruturação do setor de cultura numa entidade autônoma facilita a obtenção de verbas. Já por aí, e em especial num governo que se diz tão pragmático, fica difícil compreender a obsessão pela sua extinção. Ora, é fundamental captar verbas que não necessitem passar pelos cofres de toda a mastodôntica estrutura da Prefeitura.

A segunda é de ordem simbólica. Extinguir, fundir ou subjugar uma entidade a outra secretaria ou entidade revela a importância (ou não) que se dê a determinada área. Ora, educação e cultura andam juntas. Onde são valorizadas, diminuem os índices de criminalidade e a atração que muitos jovens sentem pelo mundo proibido das drogas. Quando podem dar vazão à sua criatividade e aos seus impulsos, muitos são efetivamente resgatados através de atividades culturais. A extinção ou subordinação da FCJ a outra estrutura revela a pouca atenção e o descaso com que a Prefeitura trata a área.

A terceira implicação é de ordem política, e confunde-se com a segunda. Mas o que quero destacar aqui é tanto a provável diminuição de verbas para o setor, já que ele perde sua importância, como a inexistência de um órgão com autonomia financeira.

Uma quarta implicação diz respeito à legitimidade para tal ato. A própria democracia brasileira vem sendo questionada, e é necessário aperfeiçoá-la. Ninguém questiona a eleição do atual prefeito, que ocorreu dentro do processo democrático. Mas um ato de tal magnitude, foi ele discutido na eleição? Constava do programa de governo do candidato? Se a resposta for negativa, o mais coerente seria que uma ação desse porte fosse debatida à exaustão com os setores interessados, começando pelo cultural!

A política toda da atual gestão parece pautada por ações lideradas de cima para baixo. É um estilo que já se conhecia e esperava. Voltaremos a isso quando analisarmos as políticas de outros setores da gestão. Com isso, perde a cidade e sua população, no desenvolvimento de modos de criar, fazer e viver autênticos. É isso que gera uma sociedade verdadeiramente pacífica e plural, como a Joinville que queremos!

sexta-feira, 30 de setembro de 2016

Eleições em Joinville: um candidato, um livro











POR JOSÉ ANTÓNIO BAÇO

Falta pouquíssimo tempo os eleitores joinvilenses irem às urnas. Os candidatos a prefeito estão a viver um período de maior calma. Como ele vão aproveitar esse tempo? Ora, atrevo-me a sugerir a leitura de alguns livros que, no meu modesto entendimento, podem proporcionar momentos de descanso, aprendizado e até de reflexão. E lembrei-me de alguns títulos interessantes para indicar a cada um dos candidatos.

UDO DOHLER
A peste – Albert Camus

A história se desenrola em Oran, uma cidade onde o que importa são os negócios e as relações humanas recebem pouca importância. Um dia ratos invadem a cidade para morrer, num prenúncio de que algo de muito mau está por vir. A população entra em estado de negação e as se negam a reconhecer a epidemia. Até que as consequências se tornam avassaladoras. Parece apenas a história de uma epidemia, mas o autor Albert Camus explicou, tempos depois, ser uma alegoria dos regimes totalitários. A época em que se passa a ação – o livro foi escrito durante a Segunda Guerra – não é despicienda.

MARCO TEBALDI
The Strange Case of Dr. Jekyll and Mr. Hyde – Robert Louis Stevenson

A hipocrisia é um dos temas de fundo do livro. Ou seja, um embate entre o lado “sujo” e o lado “limpo” de um homem: o Dr. Jekill, que vive entre duas personalidades. De um lado, o homem que se autorreferencia como alguém de conduta exemplar. Do outro, uma personalidade de escrúpulos duvidosos, que não se coíbe em cometer vilanias. Há uma poção (talvez uma representação metafórica do poder) que produz essa transmutação.

RODRIGO BORNHOLDT
Cândido  – Voltaire

O livro narra a história de Cândido, um jovem que vive pelos ensinamentos do seu mentor, o professor Pangloss, um filósofo dogmático e otimista. Por mais desgraças que visse, o velho mentor dizia sempre “tudo vai pelo melhor no melhor dos mundos possíveis”. Por seu lado, quando começa a perceber que o mundo produz muitas desilusões, Cândido começa a se desgostar com a realidade e passa a usar um novo lema de conduta: “devemos cultivar o nosso jardim”.

IVAN ROCHA
As aventuras de Huckleberry Finn – Mark Twain

O livro narra a história de um jovem que se sentia um outsider na sociedade em que vivia. Um dia Huck decide abandonar essa sociedade e empreende uma fuga (que aqui pode ter um valor metafórico). Na jornada encontra Jim, um escravo que também busca a liberdade e juntos partem para uma vida de aventuras. É uma história que fala sobre dilemas éticos e morais, tendo como pano de fundo um ambiente de violência civilizacional.

DR. XUXO
Leite Derramado – Chico Buarque

É a história de um homem, já velho e prostrado numa cama de hospital, que faz um monólogo acerca de uma saga familiar. O pano de fundo é a decadência social e econômica, em meio a um ambiente marcado por preconceitos, corrupção e machismo, para citar apenas estas distopias da sociedade brasileira. O que mais chama a atenção no livro é a narrativa por vezes aleatória, outras circular e sempre cheia de recomeços.

CARLITO MERSS
O Marinheiro de Perdeu as Graças do Mar – Yukio Mishima

Quem quiser encarar o livro como um simples romance vai encontrar uma história de erotismo, poesia e sacrifício. Mas Yukio Mishima é mais que isso. A história pode também ser uma metáfora do homem que deixa o seu habitat natural (o mar) para viver em outro (terra firme). Mas nesse ambiente os valores são outros e não tarda até que o marinheiro seja julgado e perca a grandeza, a glória e o brilho. Afinal, como alerta o próprio autor, “a glória, como vós sabeis, é uma coisa amarga”.

DARCI DE MATOS
Vinhas da Ira – John Steinbeck

Vinhas da Ira narra a trajetória de uma família pobre de agricultores, num processo de migração de um estado para outro. Durante muito tempo tinham vivido como meeiros numa propriedade agrícola, mas a vida foi ficando cada vez mais difícil e viram-se obrigados a procurar um novo lugar para viver. A revela uma sociedade onde as pessoas trabalham duro e são mal remuneradas. O livro faz uma crítica política (e incomodou muitos políticos).

quinta-feira, 9 de junho de 2016

Da publicidade da Prefeitura de Joinville

POR RODRIGO BORNHOLDT*

Discute-se há tempos sobre o sentido e os limites da publicidade oficial dos entes estatais.

Segundo a Constituição, a publicidade de atos, obras, programas, serviços e campanhas deve ter caráter educativo, informativo ou de orientação social, não podendo caracterizar-se aí a promoção social ou política da pessoa dos governantes (art. 37, par. 1o ). Para além do evidente componente jurídico, essa diretriz dá uma orientação política e ética extremamente relevante.

A ideia é, inicialmente, suprimir a publicidade pessoal, no estilo Odorico Paraguaçu (o imaginário prefeito de Sucupira, no inesquecível seriado “O Bem Amado”, de Dias Gomes), em que os governantes aproveitam-se das verbas estatais para a autopromoção. Mas o sentido desse preceito constitucional vai mais além. Quer-se que os recursos a serem gastos com publicidade sejam apenas os estritamente necessários.

Pergunta-se: será que duas páginas inteiras num jornal de grande circulação, em dias seguidos, segue a moderação e o caráter informativo solicitados pela Constituição? Aqui só resta o caráter informativo a ser avaliado. Pois de orientação social não se trata. Nem de uma campanha, como, por exemplo, de combate ao zika vírus. Não! Então, qual é o caráter informativo perseguido? Tratava-se de algumas obras, em variadas regiões da cidade e sobre variados temas. Está claro: a informação que se quis passar é sobre o conjunto da obra da gestão (bastante pobre, por sinal) que ora se encerra.

Quer-se reforçar a imagem do prefeito-candidato! Será que esse sentido informativo é o perseguido pela Constituição? Será que encerra ele aquilo que se persegue numa divulgação que deve ser impessoal? O sentido informativo que a Constituição determina é o de orientação para a comunidade de algo relevante, e não para a avaliação da gestão. Para isso haverá a propaganda eleitoral daqui a alguns meses.

Relevante é, por exemplo, a inauguração de um grande equipamento esportivo, uma obra viária, a aquisição de um equipamento específico que aprimorará os serviços de um hospital ou posto de saúde. Mas isso só deve ser perseguido quando a mídia, por si só, não der destaque à realização. Ora, tudo é muito diferente nessas páginas inteiras, com o conjunto da obra, em que o dinheiro do contribuinte foi rigorosamente desperdiçado.

A gravidade disso tudo só aumenta quando se trata de uma gestão que se diz austera. Que deixa de nomear secretários adequados por suposta economia; que não paga os premiados nos editais de apoio à cultura; que deixa as calçadas da cidade em estado calamitoso; em que pessoas morrem em buracos nas ruas por falta de conservação; em que os proprietários de patrimônio considerado histórico continuam sem poder usufruir das vantagens proporcionadas por uma lei que não é aplicada! Isso pra não voltar a falar das questões atinentes à saúde e aos cortes de vagas e diminuição de horários nos CEIs. Às vezes, é difícil acreditar que estamos vivendo na ordeira Joinville!

Ao que consta, cerca de 15 milhões de reais serão gastos em publicidade nesse ano. É preciso tanto dinheiro para essa área? Notadamente quando as redes sociais se mostram tão vigorosas e eficazes, é necessário ainda gastar toda essa dinheirama nos veículos tradicionais, como rádios, tevês e jornais?

Reconheço haver dúvidas quanto à possibilidade de questionamento jurídico dessa farra de gastos, embora uma análise mais aprofundada da Constituição concluirá por sua total inconveniência. Mas não tenho dúvidas de que, sob o aspecto político e de moralidade pública, é ela de uma gravidade sem precedentes, em especial nesses tempos de suposta austeridade!

*Rodrigo Bornholdt, Doutor em Direito e advogado em Joinville