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sexta-feira, 3 de abril de 2015

Incluir ou prender - qual a sua opção?

POR SALVADOR NETO

A semana encerrou com mais um daqueles presentes de grego que nossos impolutos deputados federais entregam à nação: a admissibilidade da PEC 171/93, que reduz a maioridade penal de 18 para 16 anos. Assim fazem os gregos políticos brasileiros. Tentam nos vender que nos entregam uma dádiva, mas na verdade empurram mais um prejuízo a um país sedento de inclusão social, e não segregações e mais prisões. O tema é complexo, demanda muito debate e espaço, e desta vez vou extrapolar um pouco meu texto pela urgência do momento.


Nosso povo brasileiro que pouco lê, pouco busca entender sobre os temas, vota, mas não lembra em quem, e muito menos conhece bem quem seu eleito representa, adora soluções mágicas como esta da redução da maioridade. Sempre duvidei das saídas fáceis para os problemas. Esta saída é na verdade a entrada para o caos da juventude, e com ela, um futuro nada colorido para a nação. Há muitos argumentos contrários a essa sandice de um Congresso conservador, mas vou elencar somente alguns deles:

- No Brasil, os jovens, desde os 12 anos, podem ser responsabilizados por infrações à lei. Todos os crimes e contravenções penais cometidos por esses jovens são chamados de “atos infracionais”.

- Esses jovens respondem processos e, se condenados, recebem punições, chamadas de “medidas socioeducativas”. Atualmente o Brasil tem cerca de 110 mil adolescentes cumprindo medidas socioeducativas.

- A diferença básica entre as sanções de jovens e adultos é que na dos jovens ainda se procura manter a finalidade de reinserção social e educação, motivo pelo qual é importante mantê-las separadas. Por suas características, as sanções aplicadas aos jovens resultam num baixo índice de reincidência quando comparadas às penas aplicadas aos adultos.

- A internação é uma medida socioeducativa que priva o jovem da liberdade. As casas de detenção dos jovens se assemelham a prisões e a taxa média de ocupação das instituições para jovens é de 102%. Tal como ocorre nos processos penais de adultos, os jovens também estão sujeitos a internações provisórias. Ou seja, não existe o “não dá nada”.

- Os 18 anos são critérios de desenvolvimento pleno em muitos outros contextos da vida social. Somente com 18 anos, um jovem pode se alistar no exército; pode trabalhar em condições perigosas e insalubres; pode comprar bebidas e cigarros; pode ter habilitação para dirigir; pode ser jurado. E, apesar de ter a faculdade de votar, o jovem de 16 anos não pode ser votado.

- No que importa ao fenômeno criminal, os jovens com idade entre 16 e 18 anos são responsáveis por menos de 1% do total de crimes cometidos no Brasil. Daqui já se torna óbvio que a exceção não pode pautar a definição da política criminal do país.

- Os crimes mais cometidos por jovens são crimes contra o patrimônio, seguidos pelo crime de tráfico de drogas. Isso representa mais de 70% dos crimes cometidos por eles.

- Crimes contra a pessoa cometidos por jovens, em geral, decorrem de guerra do tráfico de drogas. Há uma coincidência do grupo que comete o crime e o grupo que é vitimizado.
- Quase 20 mil jovens são assassinados todo ano no Brasil. Ou seja, eles são 10 vezes mais vítimas do que homicidas.

- Anualmente, a polícia brasileira mata mais do que jovens de 16 a 18 anos. Todo ano, o trânsito brasileiro mata 24 vezes mais do que jovens de 16 a 18 anos.

- Além disso, há um comum equívoco nas listas dos critérios etários de responsabilização criminal: a nossa responsabilização começa aos 12 anos de idade com as medidas socioeducativas; aos 18 anos, vira pena.

Essa é apenas parte de uma pesquisa do Instituto Tolerância, uma das muitas pesquisas sérias sobre o tema no Brasil. Somos um dos campeões do mundo em número de encarcerados. Que resultado temos? Mais paz, menos violência? Nada disso, continuamos com falhas na inclusão social de nossos jovens e crianças. Não conseguimos avançar em mais cultura, educação, lazer, habitação, entre outros benefícios, na velocidade desejada. Mas isso não quer dizer que perdemos a batalha. Educar e incluir dá trabalho. Mas penso que os brasileiros gostam de trabalhar. Prefiro pensar assim.

Finalizando, na última quarta-feira (1/4) assisti a um dos espetáculos de dança mais belos e emocionantes que vi em minha vida. Cerca de 50 alunos com algum tipo de deficiência intelectual proporcionaram a quase 400 pessoas a beleza que é ver o investimento em educação, saúde e assistência social em crianças, jovens e adultos inundar a sociedade com ótimos resultados. A cada passo dos cadeirantes, movimentos dos pequenos e suas mães, ou o remexer elétrico dos jovens nas músicas alegres, lágrimas brotavam dos olhos de cidadãos e cidadãs.

Creio que muitos ali ainda não conheciam o belíssimo trabalho feito na APAE de Joinville (SC) há 50 anos, completados agora em abril. Há neste projeto uma aposta na inclusão social. Eles poderiam também estar segregados, afastados como já o foi no passado. Abandonados nas ruas, presos em suas casas. Mas a mudança cultural, a aposta no ser humano, indica o acerto do caminho mesmo que ainda com grandes dificuldades de recursos como tudo em nosso belo país. Mas aqueles professores, pais, voluntários, acreditam que cada vida merece empenho, merece amor. Há sensibilidade.


Desistir dos jovens é negligenciar o presente. Desistir dos jovens é desistir do futuro. Desistir das pessoas, qualquer uma delas, é desistir da humanidade. Quanto mais prendermos, mais somos presos em nossas casas. Quanto mais incluirmos, mais livres seremos. Gosto dos pensamentos de Martin Luther King, um dos seres humanos que enfrentou o grito dos intolerantes. Ele dizia que o que o preocupava não era o grito dos maus, mas sim o silêncio dos bons. Eu sou pela inclusão. E você?