terça-feira, 31 de maio de 2016

A escola sem partido ensina até dedo-durismo


POR JOSÉ ANTÓNIO BAÇO 

O aparecimento da tal “escola sem partido” (em minúsculas) deve ser um dos episódios mais sombrios da história recente do Brasil. E olhem que o páreo é duro, porque nos últimos tempos o país tem caminhado a galope para o obscurantismo. Os conservadores alegam a existência de uma suposta “doutrinação ideológica” de esquerda nas escolas. E o que propõem em substituição? Ora, uma doutrinação ideológica da direita mais atrasada.

Os conservadores vivem um transe que os leva rejeitar tudo o que aponte para a razão, para as luzes, para o esclarecimento (por iliteracia política, confundem pensamento racional com “esquerda”). Não vamos esquecer que os modelos de ensino atuais são, em grande medida, herdeiros do ideário do Iluminismo, que, no seu momento original, falava no uso da razão para fazer evoluir a vida das pessoas. “Tem coragem para fazer uso da tua própria razão”, disse Kant.

Há muita gente a rejeitar a proposta de “escola sem partido”, sob o argumento de que é uma tentativa de impor o pensamento único. Discordo. O que está em jogo é a simples rejeição do pensamento. Ou, passe o trocadilho, a tentativa impor um único pensamento: atacar o que consideram ser a tal doutrinação de esquerda. Mas não estamos a falar da esquerda corporificada num conjunto de ideias. A esquerda dos conservadores é apenas um monstro criado pelas suas mentes supersticiosas.

O “escola sem partido” tem um site muito completo. Não é preciso aprofundar a navegação porque as coisas saltam aos olhos. Há uma rubrica chamada “flagrando o doutrinador” que, com quase duas dezenas de “ensinamentos”, estimula o espírito delator dos estudantes. Ou seja, ensina a ser dedo-duro. Mas quem pode criticar algo que está em plena sintonia com a realidade brasileira? A delação é premiada e os delatores viram heróis nacionais. Faz sentido. É quase um ensinamento de carreira.

Mas não estamos a falar de dedos-duros quaisquer. O site tem outro link chamado “planeje sua denúncia”, onde ensina uns truquezinhos que permitem aos alunos denunciar professores com método. E o mais importante: em segurança e sem correr riscos de passar por um acareamento. “Esperem, se necessário, até sair da escola ou da faculdade. Não há pressa”, ensina o site. O dedo-durismo é um prato que se come frio. Enfim, a “escola sem partido” parece propor uma versão tupiniquim da Caça às Bruxas.

Mas o ponto alto do site é mesmo o filme apresentado como o “tema musical da educação brasileira” (no final do texto). E qual é a música? Uma paródia de “A Banda”, de Chico Buarque (ironia das ironias). Mas a coisa fica ainda mais emocionante. Porque o argumento é de autoria do grande pedagogo Danilo Gentili. O refrão é suficiente para mostrar o que se passa pela cabeça desses grandes intelectuais: “estava à toa na classe o professor me chamou, pra me lobotomizar, me transformar num robô”.

A coisa continua, com frases que servem apenas para ironizar – e rejeitar – nomes como Marilena Chauí, Mikhail Bakunin, Michel Foucault, Paulo Freire ou o próprio Chico Buarque, que não levou nada de direitos autorais (“o autor da paródia se isenta de qualquer remuneração sobre os direitos autorais da mesma”, explica o texto). Enfim, é um daqueles casos em que só cabe uma definição: é a ignorância petulante em ação. O problema é que muita gente leva a sério.

O CASO FROTA  - A desgraça nunca acaba. Eis uma prova factual – e cabal – da rejeição do pensamento no Brasil. Em que sociedade civilizada Alexandre Frota poderia ser considerado conselheiro para a área da Educação? É uma descarada tentativa de doutrinação. Só que a doutrina é o que há de mais atrasado.


É a dança da chuva.


25 comentários:

  1. Confundem “pensamento racional com esquerda?”

    Primeiro: o que se transmite nas aulas de história (que de história não tem nada!), sociologia e filosofia é a mais sem-vergonha das doutrinações ideológicas. Vejamos: dizem que os EUA é “imperialista”; que o capitalismo é o responsável por todo o mal existente na Terra (esquecendo o que ocorreu nos países socialistas/comunistas, e que o capitalismo só existe em sua plenitude nos países democráticos); chamam homicidas (como Che-Guevara) de heróis; desprezam a religião, mas adotam outra, cuja bíblia é O Capital de Marx (com várias interpretações equivocadas); são hipócritas em salas de aula – rechaçam o capitalismo com os seus Iphones no bolso.

    Segundo: Você tem razão sobre confundir “pensamento racional” com “esquerda”, porque tem que ser uma ameba para associar racionalidade com doutrina. A esquerda não tem nada de racional, muito pelo contrário: é passional, religiosa, contraditória.

    Eu manteria Marilena Chauí como uma autora de bibliografias obscuras, tipo: “como deveres de casa, solicito a leitura de Chauí para retrocedermos aos anos 60 e entendermos o porquê de tanto ódio esquerdista contra o desenvolvimento de nações livres, democráticas e capitalistas – e para divertimento com as contradições da autora”. Manteria também Mikhail Bakunin, Michel Foucault e até o Paulo Freire (Chico Buarque? Você deve estar brincando!), mas acrescentaria Ludwig von Mises, Milton Friedman e demonizado Adam Smith.

    As salas de aula no Brasil estão submersas na ideologia esquerdista, repetida diversas vezes pela formação dessa ideologia burra já nos campis universitários por professores marxistas com seus Hondas CRVs e Volkswagens Jettas e seus filhos estudando nos colégios das melhores famílias; não tem nada a ver com ideologia de gênero ou a manutenção das disciplinas de filosofia e sociologia. Na escola a esquerda tenta implantar na cabeça das crianças e adolescentes que os problemas sociais que elas vivenciam não derivam da falta de políticas governamentais voltadas para o bem-estar social com liberdade e transparência, mas da própria sociedade.

    ResponderExcluir
    Respostas
    1. Porque anônimo? Porque escola sem partido defendida por essas pessoas anonimas não pode nominar as pessoas que estão patrocinando a morte do avanço científico. Paranóicos, morrem de medo de sair de sua zona de conforto, ou quem sabe de seus armários. Querem voltar a morar em árvores? Sai da obscuridade, anônimo, pare de ficar rotulando o que sua falta de raciocínio e crescimento pessoal tem mêdo de encarar: a evolução.

      Excluir
    2. Existe um projeto em vigor que tem como objetivo alterar as ementas do MEC. Este projeto praticamente exclui acontecimentos históricos importantes ocorridos na Europa e que são intrínsecos a formação da cultura brasileira, e no lugar inclui obscuridades da África e América Latina, isso tudo só na história! O mesmo projeto também visa alteração semelhante na literatura, na geografia, nas artes e na cultura em geral. Os esquerdistas falam em mais filosofia, mas querem excluir fatos importantes e autores da Grécia Antiga e incluir relatos de pajés indígenas e religiosidades da África. Um absurdo! Isso sim é voltar a viver em árvores.

      Recentemente alunos esquerdistas secundaristas do RJ que invadiram várias escolas pedem “mais sociologia e filosofia em detrimento da matemática e do português”, nas palavras da malta: "São disciplinas que nos fazem pensar no dia a dia, no que é necessário pra (SIC) gente tomar as ruas hoje contra os governos que atacam a educação. A gente não vai aprender isso na matemática e no português".
      Isto é evolução? Já saem do ensino médio sem interpretar um texto ou fazer uma conta de porcentagem... O que vão aprender na “sociologia e filosofia”?

      Excluir
    3. Anonimo, por favor, forneça linques que sustentem o seu argumento. Onde podemos ler a tal "ementa do MEC"?

      Excluir
    4. Quando ignorância e desonestidade caminham juntos, como é o caso do anônimo das 11:53, é difícil argumentar. Mas vou tentar mesmo assim. Sucintamente, pra não perder muito do meu o tempo com mau caráter desinformado e preguiçoso.

      Sobre um "projeto em vigor que tem como objetivo alterar as ementas do MEC", trata-se, na verdade, de uma primiera proposta de implantação da BNCC, Base Nacional Curricular Comum, apresentada por uma comissão nomeada pelo MEC e que foi duramente criticada - repito, pra evitar confusão: duramente criticada - pela comunidade de historiadores. Inclusive com uma carta incisiva da ANPUH, a Associação Nacional de História, cobrando, entre outras coisas, um posicionamento mais transparente do Ministério em relação à forma com foi formulado tal documento.

      O resultado é que a versão inicial, que não é um projeto, como diz o comentário, tem sido objeto de amplo debate e revisão, justamente porque nós, historiadores (ou a esmagadora maioria entre nós, incluindo aí africanistas e latinistas) não concordamos com a formatação do documento e com a maneira como ele concebe o ensino de História.

      Por outro lado, a versão da BNCC - que não é um projeto de alteração de ementa, porque obviamente o anônimo não sabe o que é um projeto nem, tampouco, uma ementa - acerta justamente ao criticar a concepção eurocentrista de história, propondo que ao se ensinar o passado, se dê atenção a outras temporalidades que não apenas a europeia. E nisso, aliás, se inspira justamente em propostas curriculares em vigor na própria Europa, hoje um dos principais centros de pesquisa e ensino de História da África e Ásia, por exemplo. O equívoco, principalmente, está na forma como propõe isso, ao deslocar a concepção de História de um eurocentrismo exagerado para um "terceiro mundismo" igualmente exagerado e equivocado. Acerta na intenção, erra na forma como propõe o acerto. Por isso os historiadores, ao contrário do que diz o desinformado e desonesto comentarista, criticaram tão duramente a proposta e estão há meses propondo um sem número de alterações.

      Sobre a ocupação nas escolas do Rio (e São Paulo, Rio Grande do Sul, Ceará, Paraná, etc...), não há muito o que dizer. Quando um comentarista silencia sobre as condições precárias de funcionamento das escolas ocupadas (algumas com paredes forradas com latão) e sobre o desvio de verbas públicas destinadas à merenda, usadas para enriquecimento ilícito de políticos, mas ataca os secundaristas que ocupam as escolas exigindo melhores condições de ensino, isso diz o suficiente sobre o tipo de gente com quem estamos a lidar.

      Excluir
    5. O que é uma ementa escolar, ou ementa disciplinar orientada pelo MEC?

      Alguém pode responder?

      Excluir
    6. "Ementa escolar" não existe. Muito menos "ementa orientada pelo MEC". Ementas são disciplinares, e fornecem em linhas gerais o conteúdo a ser ministrado em uma disciplina.

      Algumas são mais genéricas, outras menos. Na universidade, mais especificamente, as ementas de disciplinas obrigatórias delimitam mais claramente o que o professor deve ensinar, e o programa a ser apresentado deve obedecer essas diretrizes. Se a disciplina é optativa, a ementa é bem genérica, porque normalmente as optativas são disciplinas onde os professores ministram conteúdos diversos, quase sempre relacionados à pesquisas desenvolvidas fora da sala de aula.

      Excluir
    7. Parabéns, Clóvis Gruner! Ótimas elucidações! Pena que para fascistas nenhum argumento os remove de suas demências. Mas, fazemos a nossa parte.

      Excluir
  2. Meu, se fosse meu aluno tomavas pau. E ias dizer que era doutrinação de esquerda. Não. É apenas rejeição aos clichês fáceis de quem não lê, não estuda e não sabe fazer um zero com o fundo de uma garrafa.

    ResponderExcluir
  3. Eu gostaria que o anônimo ali de cima desse uma, ao menos uma evidência do que diz. Ele não tem, obviamente. Porque o discurso da doutrinação é isso: uma soma de clichês, adicionados a alguma paranoia da Guerra Fria (lembra? Aquela que acabou nos anos 1980), uma porção de desinformação, algum mau caratismo (sempre) e a completa rejeição à cidadania. E isso vindo de uma população que lê, em média, três livros por ano.

    ResponderExcluir
    Respostas
    1. Sugiro ler a ementa nos livros do MEC.

      Excluir
    2. Eu gostaria de saber qual escola é essa que o anônimo descreveu. Quando eu tiver filhos vão estudar nela!

      Excluir
    3. "Ementa nos livros do MEC"? Cara, sua ignorância é tanta que você nem sabe do que está a falar. Aliás, nem sabe que ao sugerir que eu leia "a ementa nos livros do MEC" comete uma estultice, porque isso não existe. Mas tudo bem, porque você acabou de deixar claro que nem sabe o que significa "ementa".

      E se ignora o básico do que acontece em sala de aula - se não sabe o que significa uma "ementa", certamente tampouco sabe para que ela serve - não tem condições de opinar sobre educação e ensino. Em outras palavras: confirma o que eu disse e o que o Zé afirma no texto. Obrigado.

      Excluir
    4. "Eu gostaria de saber qual escola é essa que o anônimo descreveu. Quando eu tiver filhos vão estudar nela!"

      Nossa, estou surpreso aqui...

      Excluir
    5. "ementa nos livros do MEC" AHUAHUHAUAUHAUHAUAHUAHAHUAHUHAUAUHAUHAUAHUAHAHUAHUHAUAUHAUHAUAHUAHAHUAHUHAUAUHAUHAUAHUAHAHUAHUHAUAUHAUHAUAHUAHAHUAHUHAUAUHAUHAUAHUAHAHUAHUHAUAUHAUHAUAHUAHAHUAHUHAUAUHAUHAUAHUAHAHUAHUHAUAUHAUHAUAHUAHAHUAHUHAUAUHAUHAUAHUAHAHUAHUHAUAUHAUHAUAHUAHAHUAHUHAUAUHAUHAUAHUAHAHUAHUHAUAUHAUHAUAHUAHAHUAHUHAUAUHAUHAUAHUAHAHUAHUHAUAUHAUHAUAHUAHAHUAHUHAUAUHAUHAUAHUAHAHUAHUHAUAUHAUHAUAHUAHAHUAHUHAUAUHAUHAUAHUAHAHUAHUHAUAUHAUHAUAHUAHAHUAHUHAUAUHAUHAUAHUAHAHUAHUHAUAUHAUHAUAHUAHAHUAHUHAUAUHAUHAUAHUAHAHUAHUHAUAUHAUHAUAHUAHAHUAHUHAUAUHAUHAUAHUAHAHUAHUHAUAUHAUHAUAHUAHAHUAHUHAUAUHAUHAUAHUAHAHUAHUHAUAUHAUHAUAHUAHAHUAHUHAUAUHAUHAUAHUAHAHUAHUHAUAUHAUHAUAHUAHAHUAHUHAUAUHAUHAUAHUAHAHUAHUHAUAUHAUHAUAHUAHAHUAHUHAUAUHAUHAUAHUAHAHUAHUHAUAUHAUHAUAHUAHAHUAHUHAUAUHAUHAUAHUAHAHUAHUHAUAUHAUHAUAHUAHAHUAHUHAUAUHAUHAUAHUAHAHUAHUHAUAUHAUHAUAHUAHAHUAHUHAUAUHAUHAUAHUAHAHUAHUHAUAUHAUHAUAHUAHAHUAHUHAUAUHAUHAUAHUAH

      Excluir
    6. Da última vez que tive uma ementa em mãos, pedi "bacalhau à lagareiro".

      Excluir
    7. Olha, eu tô rindo aqui, mas é desse nome Zorak. Espero que tenhas adotado de algum puzzle ou personagem de video-game da década de 90.

      Excluir
    8. É isso mesmo, mas não fui eu quem adotei (diretamente). Apelido não são a gente que adota, são os amigos que nos colocam. Esse pegou e eu adotei.

      Isso é motivo para piada? Não vejo o porquê!

      Excluir
  4. Sobre as propostas do Alexandre Frota: http://www.boatos.org/politica-2/8486.html

    É boato, mas eu não duvido que ele realmente pense assim.
    Uma proposta virada em retrocessos.

    ResponderExcluir
  5. "...em 1991 foi a vez da União Soviética composta de 15 estados, deixar de existir. Além das reformas iniciadas por Gorbachev terem aberto espaço para que grupos interessados em mudanças se manifestassem de maneira mais incisiva, as deficiências econômicas soviéticas provocaram crises de abastecimento e protestos populares.... A própria Rússia, assim como as republicas que se libertaram da União Soviética, tornou-se uma economia baseada em princípios liberais de mercado." História Texto&Contexto - PNLD 2012/13/14 - Ministério da Educação. Ajudem-me a encontrar a tal doutrinação marxista.

    ResponderExcluir
  6. Trecho da p.262, do mesmo manual de doutrinação imposto pelo ministério da educação marxista..."A globalização é um fenômeno tão antigo quanto os estados, e o seu desenvolvimento está associado às políticas definidas por eles... A evolução da UE e a criação de outro blocos econômicos regionais alimentam o ponto de vista segundo o qual a globalização tropeça na tendência de regionalização da economia mundial" Magnoli, Demétrio. Estado nacional e espaço mundial: Moderna, 1997.

    ResponderExcluir
  7. Muito interessante:

    https://www.youtube.com/watch?v=i3kjwrG1Y5c

    ResponderExcluir

O comentário não representa a opinião do blog; a responsabilidade é do autor da mensagem