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terça-feira, 2 de agosto de 2016

Letícia Sabatella e o infeliz encontro com o Sr. Nada

POR JOSÉ ANTÓNIO BAÇO

Puta. Puta. Você é puta”.

Mesmo que imaginasse mil formas de cometer uma estupidez, nunca passaria pela cabeça chamar Letícia Sabatella de puta. Nem ela e nem outra mulher qualquer. Mas, como todos assistimos – e lamentamos –, em Curitiba houve um homem que, sem qualquer pudor, partiu para a agressão verbal, aos grito de "puta". Quem teria topete para fazer uma coisa dessas? Ora, só alguém com um péssimo caráter ou mesmo ausência total dele.

Depois do episódio, começaram a surgir os links. A história do sujeito e da sua família veio logo à tona. E com fatos deploráveis. Mas não é o que interessa aqui. Quem teve a curiosidade de dar uma passada no perfil de Facebook do sujeito viu que ele aparece ao lado de uma menina, presumivelmente sua filha. E muitos, como eu, terão perguntado: será que ele nunca a imaginou a crescer e um dia a ser tratada como ele tratou Letícia Sabatella?

Mas não foi apenas o tal homem. Uma récua de senhoras histéricas se esgoelava a gritar tolices como “ladra, aproveitadora”, “acabou a mamata”, “cria vergonha” e o indefectível “nossa bandeira jamais será vermelha”. Ouch! Tantas bestas em tão pouco espaço. Quem olha para as imagens pode tirar uma conclusão: essas pessoas imaginam estar a fazer uma espécie de “justiçamento”. É a justiça do fáscio. A justiça do Sr. e da Sra. Nada.

Quem são o Sr. e Sra. Nada? Ora, gente que antes vivia isolada a remoer os seus ódios e as suas intolerâncias, mas sem formas de expressão coletiva. As hienas só sabem atacar em grupo. E a onda de reacionarismo que tomou conta do Brasil veio criar o palco perfeito para esses delírios fascistas. Wilhelm Reich diz que o fascismo é “a expressão da estrutura irracional do caráter do homem médio”. É o retrato das ruas. Gente enlouquecida vestida de amarelo.

Desnecessário lembrar os perigos do fascismo. O ideário fascista é o húmus que fez brotarem exércitos de sras. e srs. Nada pelo Brasil. E não se deixem distrair, leitoras e leitores. Esses exércitos são monstros sem cabeça que só entendem a linguagem do obscurantismo, da intolerância e do ódio. A vítima mais recente foi Letícia Sabatella, mas qualquer pessoa que tenha um QI maior que o de um chimpanzé é um alvo potencial. É a ascensão do Sr. Nada.


É a dança da chuva.


terça-feira, 14 de junho de 2016

Escola sem partido, um crime de lesa-inteligência


POR JOSÉ ANTÓNIO BAÇO

É impressionante o tantão de gente que puxa o Brasil para o atraso. Parece que há um certo prazer em sabotar o país. E nem é preciso ir longe para constatar. A obtusidade fez ninho na Câmara de Vereadores de Joinville (ok... não é de agora), onde está em discussão a ideia de implantar a tal “escola sem partido”. Uau! Agora já se tenta impor a ignorância por decretos. Ou seja, usar a "legalidade" para cometer um crime de lesa-inteligência.

É difícil imaginar as razões que levam a ver mérito numa proposta tão retrógrada. Mas  a vereadora-pastora Léia encontra virtudes e, segundo o site da CVJ, até fez da “escola sem partido” uma bandeira do seu mandato. Aliás, antes de prosseguir permito-me um parêntese. As palavras “vereadora” e “pastora” numa mesma frase provocam comichões. Tudo remete para rebanhos e para a velha expressão “curral eleitoral”.

Parece ser uma questão de fé na iliteracia. A proposta parte de uma visão canhestra do ensino, em que o professor é visto como o inimigo capaz de fazer a cabeça dos estudantes. E o que propõe a tal “escola sem partido”? Ora, uma doutrinação reversa na qual a doutrina passa pela transformação dos estudantes em autômatos abúlicos. Ortogênese dos corpos dóceis, diria Foucault. Parem de brincar com coisas sérias, senhores vereadores.

A vereadora-pastora Léia propõe, em texto no site da CVJ, evitar que os estudantes sejam influenciados (ou doutrinados) em temas mais candentes. “Questões políticas, religiosas e ideológicas são muitos pessoais e familiares. Esse tipo de educação doutrinária pertence aos pais. As crianças e adolescentes têm o direito de ter suas ideias e suas ideologias e não ser influenciados nisso nas escolas”, afirmou.

Errado, pastora. Aliás, como diria Chaves, “dá zero para ela”. Chaves... o outro, porque não quero ser acusado de doutrinação bolivariana. Podemos até deixar a religião de barato, uma vez que a sua essência é ser doutrinária. Mas no plano familiar o prosélito defendido pela vereadora não se aplica aos temas da “política” e “ideologia”. Porque estes obrigam ao embate de ideias. É esse um dos muito papéis da escola.

A vereadora-pastora e seus sequazes demonstram um entendimento canhestro dos processos de subjetivação. Ou seja, esse pessoal acredita que o sujeito, no seu processo de construção, é um receptáculo vazio, pronto a ser preenchido com ideias que lhe são impostas de fora. Isso é besteira. A subjetividade resulta de um processo negocial. Para isso são necessários interlocutores capazes de produzir dissensos, antíteses, oposições.

Mais debate, melhores cidadãos. Mas é exatamente isso o que se propõe retirar com o decreto. Aliás, o nome “escola sem partido” é um slogan político inserido numa velha estratégia: apontar um mal inexistente e depois apresentar a "solução". É capaz de convencer os que pensam em slow motion, mas qualquer pessoa com dois dedinhos de testa sabe que slogans não fazem programas educacionais.

Nem vale a pena discutir a questão pedagógica (os especialistas têm feito um bom trabalho), porque o atraso é evidente. O ideário escondido por trás do slogan “escola sem partido” é obscurantista. Aceitá-lo é um erro grosseiro. E que põe o Brasil a andar na contramão da civilização. Por fim, há um fator incontornável: a educação é coisa séria demais para ser deixada nas mãos de vereadores cuja literacia é questionável.


É a dança da chuva.


terça-feira, 31 de maio de 2016

A escola sem partido ensina até dedo-durismo


POR JOSÉ ANTÓNIO BAÇO 

O aparecimento da tal “escola sem partido” (em minúsculas) deve ser um dos episódios mais sombrios da história recente do Brasil. E olhem que o páreo é duro, porque nos últimos tempos o país tem caminhado a galope para o obscurantismo. Os conservadores alegam a existência de uma suposta “doutrinação ideológica” de esquerda nas escolas. E o que propõem em substituição? Ora, uma doutrinação ideológica da direita mais atrasada.

Os conservadores vivem um transe que os leva rejeitar tudo o que aponte para a razão, para as luzes, para o esclarecimento (por iliteracia política, confundem pensamento racional com “esquerda”). Não vamos esquecer que os modelos de ensino atuais são, em grande medida, herdeiros do ideário do Iluminismo, que, no seu momento original, falava no uso da razão para fazer evoluir a vida das pessoas. “Tem coragem para fazer uso da tua própria razão”, disse Kant.

Há muita gente a rejeitar a proposta de “escola sem partido”, sob o argumento de que é uma tentativa de impor o pensamento único. Discordo. O que está em jogo é a simples rejeição do pensamento. Ou, passe o trocadilho, a tentativa impor um único pensamento: atacar o que consideram ser a tal doutrinação de esquerda. Mas não estamos a falar da esquerda corporificada num conjunto de ideias. A esquerda dos conservadores é apenas um monstro criado pelas suas mentes supersticiosas.

O “escola sem partido” tem um site muito completo. Não é preciso aprofundar a navegação porque as coisas saltam aos olhos. Há uma rubrica chamada “flagrando o doutrinador” que, com quase duas dezenas de “ensinamentos”, estimula o espírito delator dos estudantes. Ou seja, ensina a ser dedo-duro. Mas quem pode criticar algo que está em plena sintonia com a realidade brasileira? A delação é premiada e os delatores viram heróis nacionais. Faz sentido. É quase um ensinamento de carreira.

Mas não estamos a falar de dedos-duros quaisquer. O site tem outro link chamado “planeje sua denúncia”, onde ensina uns truquezinhos que permitem aos alunos denunciar professores com método. E o mais importante: em segurança e sem correr riscos de passar por um acareamento. “Esperem, se necessário, até sair da escola ou da faculdade. Não há pressa”, ensina o site. O dedo-durismo é um prato que se come frio. Enfim, a “escola sem partido” parece propor uma versão tupiniquim da Caça às Bruxas.

Mas o ponto alto do site é mesmo o filme apresentado como o “tema musical da educação brasileira” (no final do texto). E qual é a música? Uma paródia de “A Banda”, de Chico Buarque (ironia das ironias). Mas a coisa fica ainda mais emocionante. Porque o argumento é de autoria do grande pedagogo Danilo Gentili. O refrão é suficiente para mostrar o que se passa pela cabeça desses grandes intelectuais: “estava à toa na classe o professor me chamou, pra me lobotomizar, me transformar num robô”.

A coisa continua, com frases que servem apenas para ironizar – e rejeitar – nomes como Marilena Chauí, Mikhail Bakunin, Michel Foucault, Paulo Freire ou o próprio Chico Buarque, que não levou nada de direitos autorais (“o autor da paródia se isenta de qualquer remuneração sobre os direitos autorais da mesma”, explica o texto). Enfim, é um daqueles casos em que só cabe uma definição: é a ignorância petulante em ação. O problema é que muita gente leva a sério.

O CASO FROTA  - A desgraça nunca acaba. Eis uma prova factual – e cabal – da rejeição do pensamento no Brasil. Em que sociedade civilizada Alexandre Frota poderia ser considerado conselheiro para a área da Educação? É uma descarada tentativa de doutrinação. Só que a doutrina é o que há de mais atrasado.


É a dança da chuva.