quarta-feira, 23 de outubro de 2013

Carta a alguns anônimos (e a alguns não anônimos também)

POR CLÓVIS GRUNER

No começo estranhei o silêncio. Em todo caso, ponderei: diante de tão flagrante expressão de discriminação e preconceito, até o mais clichê entre os anônimos (e alguns não anônimos também) deve ter-se rendido ante às evidências. Mas no emblemático terceiro dia, eles ressuscitaram. Surgidos de suas catacumbas e sem subir aos céus, logo começaram a pipocar os comentários ao meu texto e ao do Felipe sobre o episódio envolvendo o vice-presidente da ABRH/SC, Pedro Luiz Pereira, e sua infeliz declaração ao jornalista Claudio Loetz, de “A Notícia”.

Animados pela coragem dos primeiros, a tropa de choque anônima (e de alguns não anônimos também) não tardou, e à medida que ela avançava, descia o nível dos comentários. E como o anti-petismo agora é modinha, obviamente não faltou quem regurgitasse a ladainha de uma inexistente ameaça à liberdade de imprensa, num loop argumentativo que, sabe-se deus como e sem nem mesmo mencionar a nota que gerou a controvérsia, terminou no presidente do PT, o deputado Rui Falcão.

Escoimados os comentários anônimos (e alguns não anônimos também), sobrou pouco. Basicamente, a maioria acusou a mim e ao Felipe de responsabilizar fonte e jornalista por cumprirem seu papel, o de informar. Em outras palavras, o problema não está no meio ou na mensagem, mas em seu referente: as práticas discriminatórias levadas a cabo por empregadores e seus profissionais de RH. Nós poderíamos denunciar a “realidade” ou nos resignarmos a ela, tanto faz. Mas jamais acusarmos quem tratou apenas de “expressá-la”. Sobre isso, permitam-me esclarecer:

1-) Nossos textos não pretenderam negar a tal “realidade”. Aliás, pensei ter sido suficientemente claro sobre isso neste trecho: "Se já sabíamos que todos são iguais, mas uns são mais iguais que outros, a declaração de Pedro Luiz Pereira pinta em tons mais berrantes esta realidade. Não se trata (...) de convivermos com o fato de que algumas funções de destaque dentro dos organogramas empresariais sejam de acesso exclusivo aos homens brancos (e adultos); o vice-presidente da ABRH nos diz, com todas as letras, que dependendo do empregador a simples aspiração a um posto de trabalho, independente do cargo, é exclusiva de homens brancos e adultos.”

2-) Por outro lado, tanto o vice-presidente da ABRH como  o jornalista Claudio Loetz não estão isentos de responsabilidade no episódio. Não se assume uma função de importância na hierarquia de uma entidade que congrega profissionais de Recursos Humanos, para continuar a tratar naturalmente o que não é natural. Continuo a afirmar que Pedro Luiz Pereira tem a obrigação de questionar uma prática discriminatória ao invés de simplesmente constatá-la. O mesmo vale para Loetz: justamente porque o conheço e sei de sua competência e seriedade profissionais, me senti e me sinto muito à vontade para dizer de novo o que afirmei no texto original: um repórter precisa ser um bom inquiridor e, como tal, fazer falar sua fonte lá onde ela pretendeu, consciente ou inconscientemente, silenciar. Se o jornalista não faz isso, é direito do leitor cobrá-lo. Simples assim.

Fosse só isso, e a questão seria apenas de ordem cognitiva. Mas uma segunda linha de argumentação de alguns anônimos (e de alguns não anônimos também) insistiu que o problema não é a discriminação contra negros e mulheres – a tal “realidade”. O problema de verdade é que somos, eu e Felipe – alguns julgam que são todos os colaboradores do blog –, “politicamente corretos”. Não, eu não confundi as coisas nem você entendeu mal: para alguns anônimos (e alguns não anônimos também) o problema não são as políticas discriminatórias (sejam elas racistas, machistas, homofóbicas, geracionais, etc...) no interior das empresas e seus RHs; não é a constatação de que negros e mulheres são alijados do mercado de trabalho por sua condição étnica e de gênero; que apesar das sete mil vagas ociosas, alguns empregadores e seus profissionais de RH continuam a preterir negros e mulheres e a preferir homens brancos, independente do cargo e da função, da qualificação ou competência. Não, nada disso é um problema porque, segundo alguns anônimos (e alguns não anônimos também) nada disso realmente existe: é tudo coisa da patrulha “politicamente correta”.

O fato é que alguns desceram tão baixo em seus padrões éticos que o simples gesto de solidariedade e indignação – em alguns casos, menos que o mínimo necessário – com quem quer que seja – e especialmente se o objeto da solidariedade pertencer às chamadas “minorias” – é achincalhado em nome de alguma coisa tão vaga e ambivalente como o “politicamente incorreto”. Nesse caso, não se trata de um problema simplesmente cognitivo. Ele é ético e político. E é, sobretudo, um problema de caráter.  

40 comentários:

  1. Acho que o autor confundiu políticas discriminatórias com a livre expressão da imprensa.

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    1. Qual autor? Eu (autor do texto), o vice-presidente da ABRH (autor do comentário) ou o jornalista (autor e responsável pela coluna)?

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  2. Seguindo o raciocínio do Clóvis:

    O jornalista deve omitir uma informação ou alterá-la com eufemismos, transformando o “natural” desconfortável em algo inócuo ou abominável.

    Esse tipo de atitude vai de encontro com o objetivo da imprensa que é o de informar com o mínimo de interatividade, seja do inquiridor, seja do editor.

    Em tempo o significado de Politicamente Correto: “suposta política que consiste em tornar a linguagem neutra em termos de discriminação e evitar que possa ser ofensiva para certas pessoas ou grupos sociais, como a linguagem e o imaginário racista ou sexista.”

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    1. Dá pra acreditar que alguém tem coragem de comentar uma asneira dessa?

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    2. Asneira foi a tua postagem “O racismo e o machismo inegáveis de cada dia” ao criticar uma notícia estampada numa tira de jornal, ao invés de investigar a raiz do problema.

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    3. "O jornalista deve omitir uma informação ou alterá-la com eufemismos, transformando o “natural” desconfortável em algo inócuo ou abominável."

      Sério? Foi isso que você entendeu depois de dois textos? Cara, eu tenho pena de você.

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  3. Para começar acho que o anonimato deveria ser utilizado para proteção contra uma possível perseguição, creio que o blog não tenha este objetivo de perseguir os anônimos. Grupos como o Anonimous se utilizaram desta prática e incentivaram muitos a utilizar máscaras e o anonimato para promover o caos e a baderna, principalmente nas manifestações de 20 de junho. Sendo quase uma manipulação de massa invisível. O que é ruim para o Brasil.
    Lembrando a constituição brasileira Art.5 - IV - é livre a manifestação do pensamento, sendo VEDADO o anonimato;
    Sobre o artigo de Jornal que foi publicado, é extremamente preocupante ver um dos lideres das RH de SC, falar com naturalidade que a discriminação nas RHs e nas empresas existe e é aceita. Fazendo com que milhares de psicólogos rasguem seu diploma, pois estão fazendo o que a sociedade impõe em vez do que é certo, (semelhante a cura gay aprovada pela comissão dos direitos humanos do Feliciano).
    Se o vice-presidente da ABRH-SC acha isto normal, imagina o que se faz em diversas RHs aqui de Joinville.
    Esta semana fui abordado por duas pessoas a noite na frente do shopping Mueller, na diferença de 5 minutos, os dois pediam dinheiro, um trabalhador avulso mal vestido e de fora da cidade o outro se identificou como ex-presidiário. Os dois eram brancos, homens, de 25 a 35 anos, magros, pareciam aptos para o trabalho. Eu me pergunto o que uma RH ou uma empresa faria se estes 2 pedissem emprego lá. Eu duvido que eles seriam contratados.

    Quem acha a discriminação normal, precisa urgente de um choque de realidade... Em vez de reclamar do preço do PS4, vai reclamar do que realmente importa.

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    1. “...falar com naturalidade que a discriminação nas RHs e nas empresas existe e é aceita.”
      Quem disse que ele falou com naturalidade?

      “...o vice-presidente da ABRH-SC acha isto normal,...”
      Que disse que ele acha isso normal?

      São interpretações suas sobre uma nota de jornal. O sujeito é o presidente da ABHR, não é um deus! É responsabilidade dele, como presidente, apresentar a realidade, mesmo que essa soe inconveniente aos ouvidos de alguns. Ele seria um boçal se fizesse o contrário.

      A mulher e o negro não devem se ofender com a declaração, sobretudo quando supostamente mostra-se verdadeira, mas se indignar com a realidade, não apenas dos RH’s, mas dos empregadores. E para que isso aconteça é necessário o debate, e para que haja um debate tem de haver uma fonte, é aí que entra a imprensa.

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    2. Se o vice-presidente da ABRH-SC não pensa assim como eu falei, então é problema do texto. Quando ele pega um dado estatístico e mostra para o público algum objetivo ele tem, se é para fazer propaganda ou se é para chocar o público, pelo que entendi do texto, se tem o primeiro objetivo e não o segundo... quando se fala em 7mil vagas no título do texto, evidencia bem isto. Em nenhum momento do texto ele indica que está chocado ou incomodado com esta situação e o jornalista sequer questiona esta informação.
      Um dos principais jornais de Joinvillle fazendo uma reportagem rasa sobre este assunto é conivente com a realidade, portanto aceita o que é constatado. Permitindo notícias como esta, sem nenhuma retratação, perde-se a representatividade dos discriminados. Se tornando mais um meio das elites e (não é atoa que eles estão cobrando pelo acesso do portal de internet).
      Me incomoda ver pessoas acharem normal situações como esta e a visível manipulação de informações pela imprensa.

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  4. No imaginário do Clóvis e do Felipe, o presidente da ABRH mostrou uma informação supostamente conhecida pela sociedade joinvilense sobre a predileção das empresas pelos homens brancos com idade de 25 a 35 anos, mas de modo irresponsável que, de alguma forma, pode ofender os negros, as mulheres, os mais jovens e os mais velhos.

    Pois bem, o mais surpreendente nessa história toda é que o Clóvis e o Felipe ainda não entenderam que o presidente da ABRH não cometeu nenhum ato falho, nem o jornalista um lapso. É óbvio que ambos sabiam o que estavam fazendo quando um deu a declaração e o outro se responsabilizou pela publicação: apresentar à sociedade uma realidade desconfortável, causar indignação, instigar a discussão e o debate sobre o preconceito.

    Estão vendo porque o Politicamente Correto é perigoso e pode cegar, sobretudo aqueles que se acham os donos da verdade e costumam subestimar a inteligência alheia?

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    1. "Falta amor no mundo, mas também falta interpretação de texto."

      Leonardo Sakamoto, falando desse tipo de comentário.

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    2. Ok, Felipe, então “desenhe”, quero saber qual o seu problema com presidente da ABRH, o jornalista, o jornal, os excluídos. Vamos lá, tente enxugar tudo isso num único parágrafo.

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    3. Calma Marcos, o Felipe é assim mesmo.

      Não é ele que tem que desenhar para nós. Somos nós que temos que desenhar nossos comentários para ele entender.

      A citação do Sakamoto aplicasse ao próprio citante.

      E olha que eu apoiei e apoio o pensamento do Felipe no último post.

      Mas é notório que ele é desprovido de alguma capacidade cognitiva. Isso é um fato.

      NelsonJoi@bol.com.br

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    4. Marcos, respeito de verdade sua tentativa de permanecer de pé. Mas ela tem um problema: o que exatamente eu escrevi que o levou a acreditar que interpretei como um ato falho seja a declaração, seja o texto do jornalista? Toda a minha argumentação se sustenta justamente no contrário: o episódio é grave justamente porque eles sabiam o que estavam fazendo.

      Mas como eu disse, respeito sua tentativa de permanecer de pé. Pena que não deu certo.

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    5. Então você concorda que a frase do presidente da ABRH sobre o "perfil ideal" deveria ser ao menos omitida.

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    6. Omitida? Por que? Não, eu gostaria que o jornalista tivesse feito algo bem simples: perguntado "por que"? E que o vice-presidente da ABRH o respondesse.

      Entendeu agora ou vai continuar insistindo na sua interpretação esquizofrênica?

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  5. Alto lá!
    Modinha não, "modona"!
    Nada que dure mais do que dois mandatos pode ser considerado "modinha".

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  6. Só o fato de o Clóvis ter que publicar uma errata já me deixa contente. Fora o Jordi e as moças, o resto daqui não se salva mesmo...

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    1. Errata? Cara, tem certeza que você sabe o que significa uma errata?

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  7. Já frequentei bastante o Blog. Mas aguentar a ignorância latente do Felipe tentando imitar o Baço e o Clóvis (ainda dá época em que este só comentava) me fez ficar afastado daqui. Pelo que vi hoje, Felipe está ainda pior. Tchau!!!

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  8. Este Blog está se tornando o Blog do grossinho alucinado que fugiu da faculdade. Tá chato demais.

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    1. Simples: segue o exemplo do cara que batucou dois minutos antes de você. Tchau.

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  9. A idiotice e a falta de interpretação de texto tem água e sombra fresca sob o anonimato. Se o Chuva Ácida impedir isso, a necessidade cartas abertas como essa do Clóvis tende a diminuir bastante.

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    1. Rubens, eu já defendi o direito aos anônimos de serem anônimos. Hoje, oscilo: às vezes mantenho minha posição original, mas há momentos em que me convenço que permitir o anonimato é acabar afugentando leitores realmente interessados em dialogar com o blog, que devem se sentir desconfortáveis com o baixo nível dos comentários, que não acrescentam absolutamente nada.

      Quer dizer, pra manter o privilégio de uma meia dúzia de ignorantes de não se expor, estamos a arriscar perder leitores que podem realmente ter um interesse em discutir, formar e confrontar opiniões, o que não é, obviamente, o caso da maioria dos anônimos (e de alguns não anônimos também).

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    2. Também perdi o interesse de debater e discutir neste espaço. Com todo o Respeito ao meu amigo Jordi a quem prestigiei, esse pseudo blog já era.

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    3. olha, eu sou leitor da bagaça. Eu nem sempre concordo com o Gruner e com o Felipe. Mas olha, tá um saco acompanhar os comentários francos dos anônimos. Eu defendo o anonimato, mas nesse contexto ele é usado para esconder a ignorância e ataques aos princípios fundamentais dos direitos humanos. Por isso, seria importante vetar a publicação no anonimato. Abraço. Maikon K

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    4. É verdade. O Felipe mesmo é o mestre da ignorância, mas ao menos não esconde a cara.

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  10. Opinião e interpretação são iguais a bunda: cada um tem a sua.
    Não fui convencido pela argumentação de vocês, assim como vocês não foram pela minha.
    A discussão se torna um saco quando alguém fica insistindo que a sua teoria é A fodona.
    Bora pro próximo assunto.

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    1. Concordo contigo Diego.
      Ninguém é obrigado a concordar com o que os blogueiros escrevem. E vice versa.
      Chico

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    2. Eu também concordo: ninguém tem de concordar com ninguém. Agora, não custa fazer um esforcinho pra pelo menos tentar entender o texto. Porque se eu escrevo "alhos" e o cara insiste em dizer que escrevi "bugalhos" - seja por dificuldade de entendimento ou simples má fé -, fica bem difícil travar qualquer tipo de discussão.

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  11. Vocês não tem vergonha de colocar o nome de vocês nessa discussão ridícula não?
    E a comédia é que não deve ter um negro sequer no meio desse papo.
    Que bando de tanso, meu senhor. égua...
    Falem dos beagles agora...

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  12. Penso que o que causou confusão nos textos do Clóvis e do Felipe, está relacionado a declaração do presidente da ABRH e a publicação desta pelo jornalista. Afinal, para esses autores, qual o causador da indignação: a verdade que está por trás da declaração da ABRH, simplesmente a declaração (porque, afinal de contas a verdade todos nós conhecemos) ou ambas?

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  13. E eu que achei que este blog duraria até a próxima eleição...

    Melancólico este fim...

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    1. Pois é, Mãe Diná, às vezes a gente erra uma previsão ou outra.

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