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segunda-feira, 14 de dezembro de 2015

Corrupção não é só coisa de Brasília


JORDI CASTAN
Depois desta sobre-exposição aos escândalos de corrupção que assolam o país de um extremo ao outro, a sensação é a de que estamos imunizados. Ou seja, de que não há nada mais que possa nos surpreender. Que a corrupção está restrita a Brasília, ao Governo Federal, ao Congresso Nacional, à Petrobras, à Hemobras, ao BNDES. Enfim, a uma lista que não para de crescer a cada dia, mas que não é coisa daqui. Que nem em Santa Catarina e muito menos em Joinville estas coisas acontecem.

Aqui estamos tão longe dessa malfadada corrupção que o último prefeito a se eleger, se vangloriava na campanha que tinha as mãos limpas, como se esse fosse o seu diferencial. Indiretamente a mensagem que os seus marqueteiros lançaram era a de que os seus concorrentes não seriam tão honestos assim. Assim que implicitamente devemos pressupor que haja corrupção também por estes lados.

Em Santa Catarina, um ou outro prefeito tem sido investigado por corrupção e algum até tem perdido o cargo. Falando do prefeito. O prefeito tem reconhecido que há casos de corrupção no seu governo, e tem feito acusações imprecisas a funcionários públicos, sem citar nomes e sem apresentar provas concretas, numa situação que é no mínimo estranha. Se houver corrupção e a Prefeitura pagava mais caro antes que agora, esta informação deve ser divulgada. Aliás, recursos para isso não faltam. Se não houver provas concretas o prefeito faria melhor em ficar calado.

A área da saúde é uma das que mais verbas administra e já teve, em outra gestão, até secretario municipal preso por corrupção. Será que agora estamos a salvo? Que fora dos problemas que o MPSC acompanha de perto, está tudo certo na saúde? Sendo um tema que o prefeito conhece tão bem, é de imaginar que não haja problema, que não faltem remédios e que os preços praticados sejam menores que os praticados com anterioridade. Licitações mais transparentes, pagamentos em dia e seriedade ajudam a baixar preços e a reduzir o risco de corrupção.

Qual seria o resultado de uma investigação no Legislativo? Se tomarmos como referência alguns  municípios importantes do litoral, as investigações realizadas resultaram em vários vereadores presos, casualmente todos os casos de corrupção denunciados estão ligados a mudanças de zoneamento, projetos de urbanização e mudanças de legislação para beneficiar a uns e outros em prejuízo de maioria. Temas estes que em Joinville são sensíveis e merecem um acompanhamento criterioso, não seja que algum vereador conhecido acabe tendo o seu nome ligado a algum escândalo.  Casualidade? Parece-me que não seja casualidade. Não é estranho tampouco que haja até uma mancomunação entre o Legislativo e Executivo quando se trata da tramitação e aprovação deste tipo de projetos.

No nível local não há grandes empreiteiras do calibre das envolvidas nos escândalos da Lava Jato, do Petrolão, da Transposição do Rio São Francisco ou dos que ainda estão por eclodir. Mas não deixa de ser curioso que a maior parte das obras públicas sejam costumeiramente vencidas, também em Joinville, pelas mesmas empreiteiras de sempre. Exatamente as mesmas que entra governo, sai governo seguem sendo as principais prestadoras de serviços no município. Se a isso se acrescenta a péssima qualidade das obras públicas, o incumprimento de prazos e o acréscimo habitual dos valores dos contratos, fica a impressão para o cidadão médio que a corrupção pode não ser algo tão alheio ao seu quotidiano.

Seria bom para Joinville se houvesse mais transparência, mais luz, água e sabão para limpar toda a sujeira a que parece que não estamos tão imunes assim. Joinville ganharia muito com isso. E se Joinville ganha, todos ganhamos.

sexta-feira, 21 de novembro de 2014

A visita da velha senhora

POR CLÓVIS GRUNER

Em novembro de 1831, logo após a renúncia do imperador Pedro I, o senado brasileiro votou e aprovou lei que proibia o tráfico negreiro no Brasil. Ela determinava principalmente duas coisas: que a partir daquela data todos os negros que entrassem no país, trazidos da África para serem vendidos como escravos seriam livres. Além disso, estabelecia ainda penas severas para quem participasse do contrabando. Seu efeito foi tão ridiculamente inócuo, que em setembro de 1850 foi promulgada a Lei Eusébio de Queirós, que legislava sobre basicamente a mesma coisa.

No espaço de quase duas décadas entre ambas, o tráfico vicejou: há vários estudos a mostrar que o número de negros ingressos ilegalmente no Brasil nos anos posteriores à primeira legislação, aumentou sensivelmente – estima-se que algo em torno de 700 mil. Não é demais dizer o óbvio: os agentes do mercado negreiro só continuaram a operar impunemente durante anos, porque contavam com a frouxidão da lei, ou seja, com a conivência do Estado, que deliberadamente tolerou práticas que o próprio Estado apontava como ilegais e, portanto, criminosas. Não se sabe exatamente qual a extensão, mas é certo que os lucros foram amplos e gerais, embora certamente não irrestritos.

Recorro a este episódio para dizer o que também deveria ser óbvio, mas não é: diferente do que se lê naqueles depoimentos eivados de uma indignação muitíssimo seletiva, a corrupção é um mal que atravessa nossa história. E não apenas a mais recente: não faltam estudos a mostrar que o trato suspeito com a coisa pública remonta ao período colonial. Por caminhos interpretativos distintos, dois de nossos maiores historiadores, Raymundo Faoro e Sérgio Buarque de Holanda, ofereceram sobre o tema conclusões bastante próximas. A corrupção, afirmaram, é uma das heranças de nossa colonização ibérica, fruto de uma relação patrimonialista entre Estado e sociedade ou, nos termos de Sérgio Buarque, de nossa incapacidade de separarmos as esferas e os interesses públicos e privados, tendendo a tratar os primeiros como extensão dos segundos.

UMA HERANÇA COM MUITOS HERDEIROS – Histórica, a corrupção contaminou Império e República, desde a Primeira, e não poupou os 20 anos de ditadura, apesar da pataquada sobre o tal fusquinha que um dos marechais mandou o irmão devolver. Para os corruptos, aliás, aqueles foram anos de bonança: com os meios de comunicação silenciados pela conivência ou censura, pode-se prender, torturar, matar e fazer desaparecer sem contestação. E superfaturar ou desviar verbas milionárias em obras como a ponte Rio–Niterói, que custou 11 vezes o orçamento original, e a Rodovia Transamazônica, construídas pelos empreiteiros e empreiteiras que frequentam agora as páginas policiais. Em uma das edições de 1981, a revista “Times” informava que empresas europeias deram, às autoridades brasileiras, 140 milhões de dólares em propinas e suborno para garantirem sua participação nas obras da usina de Itaipu. A confortar corruptos de todas as espécies e em todas as épocas, a certeza da impunidade.

No dia seguinte ao segundo turno, meu colega de blog, Jordi Castan, publicou um texto fazendo um balanço, entre analítico e apaixonado, da reeleição de Dilma. Sem esconder sua decepção, ele dizia em uma passagem: “Os próximos capítulos desta história estão ainda por ser escritos. Fala-se de impeachment, e já houve no Brasil presidente “impichado” por muito menos”. E concluía: “Mas aqueles eram outros tempos. Hoje o nível de tolerância – ou deveríamos dizer de conivência do eleitor com a corrupção, a roubalheira e a falta de ética – é muito menos estrito.”

Ele estava a ser irônico, suponho. O ex-presidente e hoje senador Fernando Collor não foi “impichado” por ser corrupto (e ele era), mas porque já havia exercido o papel que lhe cabia naquele contexto, impedir a eleição de Lula, e por isso podia ser dispensado. Os milhares que pediram o impeachment, eu entre eles, deram um lastro de legitimidade social a uma movimentação política cujo roteiro seria o mesmo sem ou apesar das ruas, mas que certamente foi bem melhor ter sido escrito com elas. O mais importante, no entanto: se o nível de conivência ou tolerância com a corrupção hoje é outro, e eu acredito que sim, não é porque somos mais, mas certamente porque somos menos tolerantes e coniventes com ela.

CORRUPÇÃO E DEMOCRACIA – Neste sentido, o “evento Petrobras” é emblemático. Primeiro porque, diferente do chamado Mensalão, não será possível tecer sobre ele uma narrativa monofônica já que as tentativas esbarram em evidências históricas que as contradizem: em 1989, o jornalista Ricardo Boechat ganhou um Prêmio Esso por denunciar os esquemas de corrupção na empresa. Em 1997, Paulo Francis fez o mesmo no Manhattan Connection. Nada foi investigado por nenhum dos governos da época. Responsáveis pela Operação Lava Jato afirmam que o esquema só agora desbaratado funcionava há pelo menos 15 anos; e as informações criminosamente vazadas para servir a interesses eleitorais durante a campanha, começam a respingar fora do governo: entre outras coisas, à medida que as investigações avançam, surgem dados comprometedores sobre as relações algo promíscuas entre empreiteiras e políticos da oposição.

Tudo isso é lamentável? Certamente sim. Por outro lado, também é parte e resultado de nosso amadurecimento democrático, e é fundamental não perdermos isso de vista. Não, não estamos mais tolerantes com a corrupção; nem tampouco vivemos hoje um estado de coisas inédito nem pior do que há anos ou mesmo décadas atrás. Pode parecer contraditório, mas a crise que atravessamos talvez nos traga, ao final, benefícios: é possível – mas não é certo – que saíamos dela melhores, mais críticos e exigentes, menos e não mais coniventes com a corrupção. É possível – mas não é certo – que ao final da crise sejamos uma sociedade mais madura e mais democrática.

Mas a condição para que isso ocorra é, justamente, reconhecer a importância da trajetória construída ao longo das últimas três décadas, desde o fim da ditadura. Renunciar a este percurso é retroceder ao autoritarismo, este sim, conivente com a corrupção, disposto a premiar corruptos com a impunidade, quando não com vantajosas promoções hierárquicas. Mas a democracia é imperfeita e precária, retrucarão alguns. E não podia ser diferente: é da natureza das democracias que elas sejam precárias, porque esta é a condição para evitarmos sua estagnação e a fazermos avançar, para melhorá-la e aprofundá-la. Indignar-se com a corrupção e exigir um Estado e governos honestos, reivindicar uma política ética e que respeite a coisa pública: tudo isso é necessário e fundamental. Mas isso só se faz nos limites da democracia. E sempre para ampliá-los.  

quarta-feira, 21 de maio de 2014

Udo Dohler no AN: o prefeito em seu labirinto

POR JORDI CASTAN

O impacto da entrevista concedida pelo prefeito Udo Dohler ao jornal "A Notícia" tem sido maior que o esperado. Dificilmente poderia haver pior momento e a mensagem tem sido recebida pelos leitores do jornal com preocupação. É bom lembrar que uma boa parte do eleitorado natural do prefeito é composta por leitores do maior jornal de Joinville. Os marqueteiros políticos e os bombeiros de plantão tiveram que agir depressa para evitar que o desgaste fosse maior. Mas o estrago já foi feito.

Por que a entrevista repercutiu tão mal entre o joinvilense? Primeiro porque o eleitor está começando a ficar preocupado com o dia a dia da cidade. Nada parece andar e o proposto choque de gestão continua sem chegar ao cidadão. Os que deveriam ser os pontos fortes da gestão Udo não são visíveis. E o tempo passa: praticamente um terço da gestão já se foi e não há sinais no horizonte que prevejam mudanças a curto prazo.

Corrupção – O prefeito diz que há corrupção na sua gestão. É bom lembrar que quando uma fiscal da Seinfra foi detida pela Polícia Federal por corrupção, o prefeito já usou este discurso, mas nada foi feito que mostrasse uma vontade de mudança. Agora volta a falar de corrupção, mas não dá nomes, não diz em que setores e não apresenta alternativas concretas para combatê-la. Lembrando ainda que recentemente veio à luz uma denúncia envolvendo a licitação em andamento da manutenção da iluminação pública e que envolvia um super-secretário municipal.

O tema tem levantado ainda mais dúvidas sobre a imagem de um candidato que fez durante a campanha da honestidade o seu diferencial, quando todos sabemos que honestidade para um homem público deve ser um pré-requisito e não um diferencial. O resultado é descrédito sobre a sua verdadeira vontade de resolver o problema e a animosidade dos funcionários públicos honestos, que se veem colocados na vala comum dos corruptos.

Gestão – Definitivamente a gestão municipal patina, patina e não sai do lugar. Sem entrar na discussão das diferenças entre a administração pública e a praticada pela iniciativa privada, o fato é que ambas têm as suas diferenças, mas também seus pontos em comum: a busca da eficiência, os princípios da economicidade e da eficácia, unidos à planificação, controle e a gestão devem ser comuns a ambas. Na administração pública só pode ser feito o que a lei permite, na iniciativa privada o que a lei não proíbe está permitido. Está aí uma grande diferença, não é perceptível ainda a diferença entre uma gestão política e a gestão com uma visão empresarial. Transcorreu tempo suficiente para que as diferenças pudessem ser percebidas pela sociedade. Sem choque de gestão toda a proposta apresentada pelo prefeito na sua campanha é posta em cheque e o custo político é evidente.

Política – Quando eleito o prefeito teve a oportunidade e o crédito para poder fazer uma gestão diferente; para isso precisava tomar algumas decisões que evidenciassem a vontade de fazer um governo técnico e que se diferenciasse das gestões anteriores. Não o fez e optou por uma abordagem mais política. Um empresário que tenha administrado uma empresa com um faturamento superior aos R$ 100 milhões tem melhores condições de entender e administrar uma cidade com um orçamento 10 vezes maior. Saberá ler um balanço e tomar decisões baseadas em critérios técnicos e administrativos.

O problema é quando alguém tenta compatibilizar este perfil com um perfil político. O resultado é que mesmo com uma maioria absoluta na Câmara de Vereadores, o prefeito ainda não está satisfeito e preferiria um legislativo mais submisso e obediente, sem compreender o papel de cada um dos poderes no modelo republicano. Como político, Udo tem ainda muito por aprender. Os seis mandatos como presidente da ACIJ e os quase 20 anos à frente do Sindicato da Indústria Têxtil não proporcionaram o aprendizado político de que tanto precisa neste momento.

Foto: A Notícia
Clientelismo – Por favor, que alguém explique com urgência ao prefeito o que é clientelismo. Porque afirmar que há clientelismo e que esse é um entrave à gestão municipal - em especial vindo dele - parece um contrassenso. A impressão que ficou depois da entrevista é que o clientelismo pernicioso é o dos outros; quando o clientelismo tem como objetivo atender as demandas dos amigos do rei ou dos apoiadores da campanha, além de ser normal, deve ser visto exclusivamente de defender o que é bom para Joinville.

O prefeito parece atolado no tempo em que na ACIJ se dizia em voz alta que “o que é bom para ACIJ é bom para Joinville”. Nos dias de hoje a frase deveria ter outra sintaxe: “o que é bom para Joinville é bom para a ACIJ”, pois assim a frase ganharia um significado e repercussão muito diferentes. É provável, contudo, que o prefeito não tenha deixado ainda de pensar como presidente da ACIJ.

Democracia e participação popular –  O perfil do prefeito Udo Dohler não é e nunca tem sido o de um democrata; pois é conhecido pelo seu perfil autoritário. A frase que melhor o define é a de que é alguém que ouve, mas não escuta. Acostumado a mandar e a ser obedecido, não faz parte do seu quotidiano escutar, reconsiderar, lidar com vozes e opiniões dissonantes ou simplesmente distintas das suas. Quem o conhece melhor sabe o quanto de esforço pessoal deve representar para o prefeito ter de lidar com minorias que, como parte do processo democrático e utilizando-se dos espaços de participação democrática, discordem da sua visão da cidade e do mundo.

Há duas possibilidades: a primeira é que o desgaste político continue aumentando e a sociedade como um todo pague o preço da teimosia ou então que se produza uma mudança radical na forma de ver e entender o papel da sociedade organizada na tomada de decisão. A segunda parece improvável e deveremos ter até o final do mandato uma fase conturbada. O curioso disso tudo é que boa parte dos eleitores do Udo votou nele acreditando nessa imagem de turrão, no seu perfil autoritário, pois imaginavam que Joinville precisava de um prefeito com este perfil. Assim, o futuro das cidades como Joinville, que não podem ser administradas mais no grito ou na vontade, vão precisar de administradores que reúnam ao mesmo tempo a capacidade política de negociar com o conjunto da sociedade e integrá-la num projeto de cidade e capacidade de administrar uma máquina complexa com milhares de funcionários e orçamentos bilionários.

Judicialização - O Prefeito Udo Döhler apontou a “judicialização” como a causa do que chama de problema da tramitação da LOT. Disse ainda que, além de terem refeito tudo ao longo de 2013, estavam em contato permanente com o Ministério Público, a fim de não cometer nenhum descuido. Tais declarações são de causar espanto. O verdadeiro problema não é a “judicialização”, mas, ao contrário, o atropelo implícito ao planejamento do IPPUJ para execução – em rito sumário – de audiências públicas para debater tema fundamental para a vida dos cidadãos, verdadeira maratona de eventos em dias consecutivos e com duração, pasmem, de meras duas horas cada uma.
Foto A Notícia

Essa pretensão provocou reação dos munícipes, que não tiveram outra opção senão recorrer – por meio de oito associações de moradores – ao Ministério Público. Deste receberam apoio, sob a forma de recomendações para que o IPPUJ atue em consonância com a lei, propiciando aos cidadãos, com a devida antecedência, elementos necessários para que formem convicção abalizada sobre as implicações das propostas da nova LOT sobre suas vidas social, econômica e patrimonial.

O prefeito inverte, assim, a ordem das coisas: não foi a Prefeitura/IPPUJ que se coordenou ativamente com o Ministério Público, a fim de não cometer erros. Foi a partir de um erro que estava, sabe-se lá por que razões, prestes a ser cometido pelo IPPUJ, que o Ministério Público, a pedido de alguns moradores de Joinville, devolveu o assunto aos trilhos, determinando ao Poder Executivo que atue da forma que se espera do administrador público. Ou seja, agindo com transparência e cumprindo o que determina a lei aplicável ao assunto.

E se o Prefeito está insatisfeito com a velocidade de tramitação da LOT, só precisaria comandar seus subordinados do IPPUJ para que ajam nesses termos. Afinal, o cidadão está apenas se defendendo contra a incompetência de uma entidade que se tem mostrado incapaz de cumprir seu papel, abdicando de discussões educativas, abertas e cristalinas com a população, em nome do verdadeiro rolo compressor que até este momento tentou passar sobre pessoas cujo conhecimento sobre o tema beira a inocência. A judicialização é hoje o caminho encontrado pela sociedade para se proteger das arbitrariedades e da falta de participação democrática.

Em resumo, a entrevista do prefeito não foi um tiro no pé. Foi uma rajada. No pé, na perna, no joelho e nas costas. A pergunta que fica é se o prefeito sabia o que ia encontrar? Pessoas próximas a ele asseguram que foi avisado. O próprio ex-prefeito Carlito afirma que o avisou. O prefeito como sempre ouviu, mas não escutou.


Reprodução A Notícia

quinta-feira, 13 de março de 2014

Mãos de Copperfield acabam com a ilusão das "mãos limpas" de Udo


POR CHARLES HENRIQUE VOOS


A gestão Udo Dohler pode ter mãos limpas, como poucos pregam, mas está claro que tem mãos de Copperfield, em alusão ao famoso ilusionista norte-americano (foto).

Esta afirmação foi feita pelo juiz Roberto Lepper ao agora ex-secretário da saúde, Armando Dias Pereira Jr., por este último tirar pessoas da lista de espera de consultas médicas sem justificativa prévia, caracterizando possível improbidade administrativa. 

Como um belo show de mágica, as pessoas necessitadas de um médico ficaram sem entender nada, em três atos de grande audácia, típicos dos grandes espetáculos da Broadway: descumprimentos de determinação para regularizar o atendimento de consultas em ortopedia e outra para regularizar as filas de endocrinologia, sem contar a prestação de informações falsas, "maquiadas" para tentar enganar a justiça, no intuito de esconder descumprimentos judiciais anteriores à desta semana. Armando foi exonerado do cargo e agora vai responder processo.

Por mais que eu confie na capacidade técnica de várias pessoas que atuam dentro da Prefeitura (em cargos de comissão ou não), é muito triste acompanharmos a secretaria de saúde envolvida, mais uma vez, com escândalos e irregularidades. Já foi assim na gestão Tebaldi e Norival Silva. E é revoltante saber sobre uma das pastas mais importantes para a população sofrer com péssimas gestões, justamente o que o prefeito Udo Dohler mais diz entender, segundo sua trajetória empresarial.

Enfim, a mágica das "mãos limpas" não seduz mais. Parece aquele truque repetido, o qual convence alguns mas não empolga ninguém. A cidade que tem uma manifestação a cada cinco dias dá sinais de algo não estar bem. LOT, problemas com enchentes, obras recém-inauguradas com péssima qualidade ou com acabamentos faltantes, secretário com problemas na justiça, reforma administrativa que não reforma nada e transporte coletivo sem licitação são apenas alguns dos problemas. 

As "mãos limpas" do "não há segredo; há trabalho", agora são "mãos de Copperfield", do "trabalho com segredo". 

terça-feira, 21 de janeiro de 2014

Um fiasco

POR FABIANA A. VIEIRA

Estou acompanhando pela imprensa e pelas manifestações de alguns amigos o andamento do concurso público realizado pela Câmara de Vereadores de Joinville no último domingo. E o que li até agora foi uma série de fiascos.

Primeiro, a informação de que o número de vagas destinadas para pessoas com deficiência física não preenche o estipulado em lei – fato que levou o Comde a pedir  o cancelamento da prova dias antes, mas o pedido foi indeferido. Não é de hoje que a Câmara parece estar um pouco alheia às pessoas com deficiência física. Esses dias mesmo os vereadores aprovaram o rebaixamento das calçadas, lembram? Teve até vereador que subiu na mureta de proteção do plenário, e quase saiu na pancadaria com o presidente do Conselho. Vale sempre lembrar que o rebaixamento das calçadas prejudica a locomoção de todos os pedestres, mas em especial os cadeirantes e as pessoas com deficiência física e/ou visual.

Ok, de certo modo eu até acho que a responsabilidade para delimitar o número de vagas aos deficientes num concurso não compete à Câmara, e sim ao Ibam, responsável pela realização da prova, mas alguém deve ter olhado esse contrato e conferido que o número não estava correto. Certo? Depois do pedido de cancelamento, teve uma decisão na Justiça determinando que ninguém fosse nomeado até que a ação movida fosse julgada. Ou seja, já começou estressante.

Segundo, pela denúncia de plágio a outro concurso realizado em 2009, pelo Cespe, aqui da UNB. Parece que o problema foi na prova para os cargos de jornalista e relações públicas. Mais de 20 questões foram retiradas de outra prova, quando o contrato exigia ineditismo. Agora o caso está sendo investigado pelo Ministério Público e comprometeu, inclusive, a divulgação do gabarito na segunda-feira.

Daí o pessoal começa a levantar suspeita sobre a forma de contratação com o Ibam, pois não houve licitação para a realização da prova. Pelo que li na imprensa, o presidente da Câmara não quis falar sobre o assunto. Mas deveria. Deveria dizer por que não houve licitação. Se isso é legal, que diga. Se houve erro, que assuma. Se não houve, esclareça.

Mas fiasco, fiasco mesmo foi o post que deixaram para a Simone Schramm no perfil do Facebook. Ali uma suposta apoiadora do PMDB pede publicamente para que a secretária da SDR interceda junto ao presidente da Câmara, João Carlos, uma vaga para sua filha, já que – como ela diz “o resultado do concurso tem cartas marcadas”. Ou seja, a corrupção é feia, mas se conseguir um carguinho, a gente finge que não vê.

Em tempo. Nos dias de hoje, onde há um apelo geral pela transparência, pelo combate à corrupção, pela moralidade na política, é preciso zelar por um fato como esse na maior cidade de Santa Catarina. A realização de um concurso público deve ser algo sério. Que não gere qualquer tipo de dúvida e totalmente transparente. Envolve o sentimento de milhares de pessoas (neste caso, sete mil candidatos) que se prepararam para a prova e que talvez tenham perdido uma bela manhã de domingo.

É lamentável, mas o fiasco foi grande!

terça-feira, 31 de dezembro de 2013

Concessões e permissões

POR JORDI CASTAN


A nossa é uma sociedade de mazelas, de jogos ganhados no tapetão, em que o que está escrito não costuma valer. A mudança das regras do jogo depois do jogo iniciado, ou o que é ainda pior, depois do jogo jogado são uma constante.

Joinville algum dia devera criar vergonha e fazer uma licitação para o transporte coletivo. Ainda que haja muita gente que acredite que licitação bem feita em Joinville seja um mito. Os motivos vão desde a falta de vontade, licitações bem feitas dão muito trabalho, a inépcia ou o excesso de doutores em procrastinação.

A licitação do transporte público em Joinville é emblemática, mas se soma a outras como a do lixo, do estacionamento rotativo ou dos serviços funerários, para citar outras conhecidas.

Sem querer aqui questionar a lisura do processo licitatório, pois tanto o TCE (Tribunal de Contas do Estado) como o MPSC (Ministério Público de Santa Catarina) têm estado atentos e feito suas recomendações para impedir os absurdos mais gritantes. Não podemos aqui citar nenhuma ação firme dos partidos de oposição ou da imprensa, que na maioria dos casos parece cooptada o bem atendida nos seus pleitos e não demonstra interesse em investigar ou denunciar os casos de direcionamento ou de licitações que são feitas visando una única empresa interessada.

Uma das práticas a que é preciso estar atento são as licitações que preveem a sua renovação por outro período igual ao previsto no contrato. Uma empresa que participe de uma licitação de duração de 20 anos, renováveis por outros 20, fará seus estudos econômicos e todo o seu projeto de viabilidade para os primeiros 20 anos. Este é o período que estará garantido pelo contrato. Contar com os outros 20 anos seria o que o colono, sabiamente chama: "contar com o ovo no cu da galinha", uma prática que nenhum administrador serio seguiria. A menos que estejamos frente a uma licitação com qualquer órgão público, porque é muito mais fácil renovar um contrato que vencer uma licitação honesta. Há uma predisposição dos interessados em que fique como está. Porque uma simples assinatura ou um parecer favorável permitira que a concessão ou a permissão seja renovada por outros 20 anos.

O prefeito insiste em que na sua gestão a corrupção tem diminuído, mas continua sem apresentar provas. Os chineses, com a sua sabedoria milenar, dizem que os discursos não cozinham o arroz. O prefeito poderia determinar que as licitações feitas pela sua administração não previssem renovação. Se o fizesse conseguiria três resultados de uma única tacada. O primeiro contribuiria a reduzir, de verdade, a corrupção na sua administração. O segundo diminuiria os brindes natalinos e agrados que os responsáveis de determinados setores recebem nestas datas. E, terceiro, teria algum fato concreto para mostrar, quando fosse perguntado, sobre as suas ações concretas para reduzir a corrupção - e aqui no Chuva Ácida teremos prazer em poder mencionar um fato relevante. Reduzir ou vetar os aditivos aos contratos públicos seria outra medida que prefeito poderia tomar, mas esta também é outra história.

Se não ficou suficientemente explícito porque as licitações que preveem renovação pelo mesmo tempo do contrato, estimulam a corrupção, posso fazer um desenho. Mas antes de pedir um desenho, lembre como tem sido a renovação das licitações mais representativas. As de Joinville já as conhecemos, mas a mesma lógica é valida a nível estadual ou federal.

terça-feira, 17 de dezembro de 2013

Há menos corrupção em Joinville?

POR JORDI CASTAN

No meu post de semana passada, A corrupção nossa de cada dia,  neste mesmo espaço o tema era a percepção da corrupção. Como o brasileiro percebia a corrupção e o desempenho do Brasil em comparação com outros países. As conclusões não eram as melhores: o Brasil não esta bem e o brasileiro percebe.

Quase que no mesmo dia, o prefeito Udo Dohler declarou, na ACIJ, que a corrupção na Prefeitura Municipal de Joinville era menor no seu governo. A afirmação foi notícia e se o prefeito, além da sua percepção, apresentasse dados concretos, deveríamos parabenizar a atual gestão municipal.

O problema é que o prefeito parece estar se referindo à sua percepção ou expressando unicamente sua opinião. E aí a afirmação muda de figura e perde força.

O único caso noticiado pela imprensa de corrupção na Prefeitura Municipal de Joinville foi a detenção em flagrante de uma fiscal da Seinfra. É bom lembrar que a ação foi resultado da denúncia do empresário que estava sendo achacado. A detenção e a ação da Polícia Federal não foi o resultado de nenhuma auditoria interna da prefeitura, assim que não seria correto agora que alguém do governo quisesse se promover às custas de uma denúncia e da ação da polícia.

Fica devendo o prefeito Udo Dohler. Dizer com dados e mostrando casos concretos onde reduziu a corrupção? Em que setores? Que processos? Quais os funcionários envolvidos que foram identificados e eventualmente punidos? Porque confundir a sua percepção com a realidade é perigoso. Seria o equivalente a confundir realidade e fantasia.

Ao afirmar que a corrupção diminuiu, também afirma não só que ela continua existindo, afirma que antes havia mais. A infeliz afirmação joga na vala comum muitos funcionários probos, que, com motivo, querem saber em que setores, que secretarias, que fundações ou que institutos se escondem os corruptos. Se agora há menos que antes, então faltou dizer o que foi feito. Quem foi demitido, quem sofreu processo disciplinar ou foi remanejado. A sensação que acaba prevalecendo é que a afirmação do prefeito é vazia, uma frase retórica e que sem provas e dados concretos é só uma frase de efeito.

Outra opção é a de que, existindo mesmo corrupção na administração municipal, os corruptos foram identificados e medidas foram tomadas, mas a sujeira foi colocada em baixo do tapete e ninguém ficou sabendo. Qualquer uma das opções não é nada boa para Joinville e projeta mais sombras que luzes sobre uma administração que assumiu com imagem de honesta e moralista e que ainda esta devendo respostas concretas nesse quesito.

A corrupção diminuiu? Conte mais senhor prefeito, todos gostaríamos de saber. Quem? Quando. Onde? Quanto? Mais que gostar de saber, temos o direito de saber.

terça-feira, 10 de dezembro de 2013

A corrupção nossa de cada dia.

POR JORDI CASTAN

A organização Transparência Internacional  divulgou, há poucos dias, o índice de percepção da corrupção em 177 países. O Brasil que em 2012 tinha 43 pontos de 100 possíveis piorou um pouco e nesta edição caiu para 42 pontos. E entre os 177 países pesquisados, o Brasil caiu da 69 posição em 2012 para a 72 em 2013.  O Brasil em 2001 ocupava o 46 lugar da lista e somava 40 pontos. Em 12 anos não conseguimos que o Brasil chegasse a 50 pontos de um total de 100 e passamos de 46 lugar ao 72. Uma situação que deveria preocupar muito mais do que preocupa.A corrupção é um câncer que esta aumentando em todo o mundo, mais de dois terços dos países pesquisados não chegam aos 50 pontos no índice de transparência.

Há com tudo bons exemplos que merecem ser analisados. Fora os campeões que alcançam entre 100 – 90 pontos – Dinamarca e Nova Zelândia, ambos com 91 pontos, um grupo de países se situa entre os 89 – 80 pontos – Finlândia, Suécia, Noruega, Singapura, Suíça, Holanda, Austrália, Canadá e Luxemburgo. No outro extremo da lista com entre 9 – 0 pontos – Somália, Coreia do Norte e Afeganistão.

Entre os países que estão mostrando bons resultados e que tem feito do combate a corrupção uma questão de Estado, gostaria de citar o caso de Ruanda, país que por trabalho acompanho de perto desde já faz mais de um ano. Ruanda é um país pouco conhecido, encravado no coração da África equatorial, com uma população de 11,6 milhões de habitantes, um índice de alfabetismo de 71%, uma renda per capita de US$ 1.400 e um PIB que cresceu no último ano 8,8%. O governo converteu o combate à corrupção em uma questão de estado e hoje Ruanda, com 53 pontos é o 4 país com o menor índice de corrupção em toda África e o 49º no mundo. Aparece na frente inclusive de África do Sul e fica atrás só de Botsuana, Cabo Verde e Seychelles.

Como se combate a corrupção em Ruanda? Primeiro aplicando o conceito de tolerância zero para os casos de corrupção, segundo julgando e condenando a prisão os corruptos e os corruptores. Mas principalmente mostrando o quanto a corrupção destrói os valores do país e o elevado custo econômico e social que a corrupção tem para a sociedade. A corrupção se combate primeiro em nível local. É nos municípios é pequenas comunidades rurais em que é mais fácil iniciar o combate a corrupção. Outro dos êxitos do governo ruandês no combate a corrupção é a melhoria dos serviços públicos, com serviços públicos mais eficientes há menos espaço para corrupção. “Quando os corruptos são identificados e punidos serve de modelo para outros” declarou no seu discurso na semana nacional contra a corrupção.

Aqui no Brasil continua o debate sobre se o mensalão existiu, sobre se os condenados na justiça devem ou não ser presos. A Copa do Mundo de 2014 reúne uma longa lista de situações potencialmente passiveis de corrupção, orçamentos em aumento e maá qualidade de obras públicas, que precisam ser reformadas pouco tempo depois de inauguradas, são alguns dos caos mais flagrantes. Casos de corrupção são divulgados pela imprensa com assustadora frequência e poucos chegam a ser condenados, quando o são, ninguém lembra que o dinheiro público desviado deveria ser devolvido. Pode ser que seja por essas e outras razões que em quanto o Brasil cada ano vai perdendo possições no índice elaborado pela Transparência Internacional, outros países, que tem menos possibilidades que o nosso, encaram o combate à corrupção, como o que deve ser, o combate a um câncer que destrói o país e os seus valores.

quinta-feira, 21 de novembro de 2013

O Mensalão, a memória e o esquecimento

POR CLÓVIS GRUNER
  
Alguns eventos precisam acontecer; outros, precisam não ter acontecido. Eleito pela primeira vez em 1994, FHC chegou ao governo como principal protagonista de um projeto de “20 anos de poder”, nas palavras do então ministro Sérgio Motta. A um ano da eleição de 1998, no entanto, um dilema: como manter-se duas décadas no poder sem um candidato forte para substituir o presidente? Os tucanos enfrentavam o mesmo problema do PT anos depois, porque cometeram exatamente o mesmo equívoco, apostar todas as suas fichas em um único carisma.

A solução encontrada por “Sérjão”, uma espécie de José Dirceu do governo tucano, foi simples. Como a Constituição de 1988 não previa a reeleição, FHC comprou parte do Congresso e aprovou a emenda da reeleição. Em bom português, ao mudar a Constituição em seu benefício, deu um golpe branco que custou aos cofres públicos milhares, talvez milhões de reais. Os detalhes, como em todo caso de corrupção, são sórdidos. Estima-se que foram comprados cerca de 150 parlamentares, pagos em dólares. “O pessoal votava a favor e na saída do plenário já tinha gente esperando para acertar o pagamento junto a doleiros. Não tinha erro”, confidenciou recentemente a um jornalista um dos deputados beneficiados com o “mercado da reeleição”. O resultado da farra? Nenhum. Com maioria no Parlamento, FHC conseguiu barrar a instalação de uma CPI. O procurador Geraldo Brindeiro – não por acaso chamado à época de “Engavetador Geral da República” – encarregou-se de enterrar a denúncia. Sérgio Motta morreu em 1998, poucos meses antes de ver seu chef-d'œuvre concluído, com a reeleição de FHC no final daquele ano, em primeiro turno.

Do roteiro acima, a maioria se lembra apenas da reeleição, como se ela tivesse acontecido em clima de normalidade. O esquecimento, como a lembrança, não é natural. Desde 1997 e ao longo dos anos seguintes, houve um esforço conjunto, orquestrado pelas lideranças tucanas e seus aliados – fora os demos, basicamente os mesmos que hoje apoiam o PT, incluindo José Sarney –, além obviamente dos meios de comunicação, para condenar ao limbo o episódio. Não nego ao governo tucano seus méritos. Esse é um deles: FHC e seus asseclas construíram um “não evento”. Claro, as tentativas de produzir o olvido, por eficientes que sejam, só conseguem resultados provisórios. Há sempre um espírito de porco disposto a lembrar que uma mentira contada mil vezes não se torna uma verdade, mas apenas uma mentira contada mil vezes.

"EU VEJO PESSOAS CORRUPTAS" – Tudo muito diferente de outra narrativa, protagonizada também por um governo envolvido em denúncias e práticas de corrupção. Desde o nome, “Mensalão”, quase toda a trama foi tecida de maneira a produzir um evento que precisava ter acontecido. Um dos pontos altos veio na semana passada, com as primeiras prisões dos condenados. Não me sinto particularmente comovido ao ver presos José Dirceu e José Genoíno: se todo aprisionamento é em si absurdo e violento, esse não deveria me deixar mais ou menos indignado. Por outro lado, não se trata de uma prisão qualquer, e que ela tenha ocorrido no simbólico 15 de novembro e sob os holofotes da chamada grande mídia, é apenas um dos elementos do espetáculo.

Não se trata de uma prisão comum porque Dirceu e Genoíno não são prisioneiros comuns: gostemos deles ou não, ambos são figuras emblemáticas na trajetória da esquerda brasileira e particularmente do PT. Não sei a extensão da responsabilidade de ambos e do PT no processo em que foram condenados – e, pessoalmente, penso que a verdade está em algum lugar intermediário entre o discurso de ódio da direita e a defesa exasperada dos governistas. Mas é notório que o STF e particularmente Joaquim Barbosa, serviram particularmente neste episódio a interesses que não necessariamente os da justiça.

Fosse assim, junto com Dirceu e Genoíno ou mesmo antes deles, outros já teriam sido punidos. Fernando Henrique Cardoso usou dinheiro público para salvar da falência o banco onde seu filho era sócio-diretor. Paulo Maluf está na lista de procurados da Interpol. Eduardo Azeredo, do PSDB, deu início em Minas, e com o mesmo Marcos Valério, ao esquema que condenou Dirceu e Genoíno. Demóstenes Torres, ex-senador Democrata, e seu cúmplice Carlinhos Cachoeira, enriqueceram fazendo da política uma extensão do crime organizado. José Serra, Geraldo Alckmin e Gilberto Kassab impediram que nos últimos anos quase meio milhão de reais entrassem nos cofres do estado de São Paulo. Estão todos livres e, suspeito, continuarão exatamente assim.

QUEM CONTROLA O PRESENTETodo mundo tem o direito de aplaudir a prisão dos dois Zés do PT, mas daí a acreditar que se está a combater a corrupção vai uma distância: nunca se prendeu corruptos nesse país, e o reality show dirigido pelo Ministro Barbosa mantém a tradição. Ao prender Dirceu e Genoíno, não se pretendeu dar uma “lição aos corruptos”, como afirmou outro ministro do STF, fazendo coro à capa de uma revista semanal. O alvo era outro, o PT. Mas com que propósito?

Tenho dúvidas se os fins são exatamente eleitorais. Em 2006, ano em que explodiu o escândalo, o máximo que a oposição conseguiu foi levar a eleição para o segundo turno, e amargou o vexame de ver Geraldo Alckmin ganhar menos votos do que no primeiro. No ano passado, e apesar do providencial ajuste na agenda do STF para fazer coincidir o julgamento com a campanha eleitoral, o PT conseguiu eleger Fernando Haddad, o que parecia ainda mais improvável que a eleição de Dilma Rousseff. E embora seja muito cedo para prognósticos seguros, pesquisas indicam que ela mantém hoje larga vantagem sobre seus virtuais opositores.

Na falta de um projeto para o país, a oposição pode continuar a apostar no discurso moralizante, embora ele já não convença muita gente vindo de onde vem. Particularmente, acho que o propósito é outro. Em uma passagem emblemática de “1984”, de George Orwell, o personagem O'Brien afirma, a um impotente Winston Smith, que “quem controla o passado, controla o futuro; quem controla o presente, controla o passado”. O que está em jogo não são apenas as eleições presidenciais, mas qual interpretação sobre os acontecimentos políticos passados e coevos prevalecerá. Na “novilingua” forjada pela oposição e por parte da mídia nativa, seus colunistas e blogueiros, a urgência não é moral a nenhum deles interessa combater a corrupção e os corruptos, nenhum deles está preocupado com a coisa pública –, mas narrativa. Fazer o acontecimento e produzir o não acontecido. E ao menos por enquanto, quem continua a escrever a história são os vencedores.

domingo, 15 de setembro de 2013

Compra de votos: a ponta do iceberg

POR FABIANA A. VIEIRA



Imagine que você mora em um residencial e seja candidato a síndico. Quer ter a representação de seus vizinhos para decidir e encaminhar o interesse de todos. São várias as motivações para alguém sair do conforto da vida privada e optar por se incomodar com a vida dos outros. Vaidade, orgulho, sede de empoderamento, prestígio social, carreirismo ou mesmo uma autêntica filantropia de fazer o bem, melhorar a sociedade e fazer a vida ter um sentido prazeroso pela gentileza que gera gentileza.

Você terá a autorização concedida por todos para de todos cobrar uma pequena quantia mensal e investir na manutenção e no conforto da sua moradia coletiva.

Mas na eleição você não tem o apoio da maioria. Então você faz os cálculos e decide comprar os apoios que lhe faltam. Ou seja, uma mísera quantia que corrompe o sistema eletivo fazendo com que o interesse do eleitor saia da cabeça e fique no bolso.  Neste caso, você - o candidato - deixa de ser uma liderança consentida e legítima e passa a ser uma caricatura. Uma mentira que ampara-se na sua própria ânsia pela representação e suas prerrogativas. Abandona o sentido todo de um sistema que, por delegação, deveria produzir decisões legítimas e reconhecidas.

O eleito pelo voto comprado é um representante sem-vergonha. Sem vergonha de admitir que não teve apoio honesto suficiente e que recorreu  a corrupção do sistema eleitoral para atingir seus objetivos. Corrupto e corrompido são elos de uma mesma corrente que produz uma adulteração terminal na representação fazendo que os representantes não tenham vínculo com os representados e esses não se sintam contemplados com as decisões soberanas dos falsos representantes.

Ora, esse história poderia ser utilizada para ilustrar o fundamento das recentes mobilizações contra a classe política, sua corrupção endógena, suas mordomias extravagantes, seu clientelismo e sua revelia ao sentimento popular, como sugere o vocalista Dinho, da Capital Inicial, ao cantar a música “Saquear Brasília” durante o Rock in Rio:  “Eles mentem e não sentem nada, Eles mentem na sua cara”.

A política vem perdendo irremediavelmente o vínculo com a vontade e o sentimento das pessoas. Isso é perigoso para a democracia e produz uma classe política “profissionalizada” com sede de continuísmo e disposta a qualquer negócio para alimentar seus próprios interesses.

Essa historinha também pode ser identificada em Joinville na recente denúncia de que um vereador, que surgiu do nada, teria comprado votos para se eleger com uma votação surpreendente. Um vereador novato que na primeira semana de mandato disse que seu projeto era ser prefeito.

Isso tudo ainda vai ser investigado e provavelmente não vai dar em nada. A corrupção tem uma habilidade fantástica de não produzir provas. Mas que acontece todo mundo sabe que acontece. É a tal da "carrada de barro", da cesta básica, dos envelopes com cinquentinha ou mesmo da compra de lideranças comunitárias transformados em cabos eleitorais. Na verdade é só a compra disfarçada, um verdadeiro suborno, de uma influência na comunidade.

O resultado disso tudo só pode ser a falência da política e decisões cada vez mais distantes do que a sociedade precisa.

É por isso que ou muda-se a política ou a política afunda e todos vão brigar com todos. Um condomínio que ninguém limpa o corredor ou paga a conta da luz da porta da entrada ou a energia do portão da garagem.  Um prédio que desmorona  e a maioria em casa, vidrados na televisão e reclamando de tudo.

O problema é que quem muda o marco legal da política são os políticos. E eles não querem mudar as regras que produziram seus prazeres. Esse círculo vicioso precisa ser quebrado pela vontade e mobilização popular, de forma  a resgatarmos a legitimidade das decisões coletivas e o primado do interesse comum.

A bobagem de um vereador comprando votos para se eleger  pode ser a ponta do iceberg de um sistema falido.  A sociedade consciente não suporta mais isso.

terça-feira, 27 de agosto de 2013

Tolerância zero com a corrupção

POR JORDI CASTAN

Não há prefeito que, na última década, não tenha visto a sua gestão manchada por algum caso de corrupção. A sensação do joinvilense é de que a corrupção está enquistada em alguns setores do serviço público municipal. Quando algum caso vê a luz, logo se converte em notícia e ocupa as manchetes. Não são poucos os que asseguram que o caso já era conhecido, que é uma constante em outros setores e departamentos, que esta ou aquela empresa foi achacada, que fulano ou sicrano pagou para obter uma determinada licença ou alvará.

Na última eleição, Udo Dohler se apresentou como o candidato das mãos limpas e fez da honestidade e da capacidade de gestão o mote da sua campanha eleitoral. Eis a hora de provar que a tolerância zero com a corrupção não era só um bordão. Agora é hora de mostrar que era para valer, pois os fatos chegaram antes do que o prefeito poderia imaginar.

A prisão em flagrante de Gislaine dos Santos Machado Afonso, fiscal da Seinfra, por receber dinheiro para liberar um alvará, foi a notícia da semana, com direito a vídeo, transcrição de conversas e fotocópia dos bilhetes de R$ 100 e R$ 50 encontrados com ela. A operação policial, conduzida pela Polícia Federal, não deixou espaço para muitas dúvidas.

Os próximos passos permitirão identificar se há ou não verdadeira vontade de combater a corrupção. Se acreditamos nas próprias gravações divulgadas, não parece que a fiscal Gislaine tenha atuado sozinha. Há fortes evidencias que pode haver mais gente envolvida no setor da fiscalização. A primeira resposta do secretário Romualdo França foi política e protocolar: será aberto um inquérito administrativo-disciplinar, com a funcionária podendo até perder o cargo e ser demitida.

É bom lembrar que é obrigatório nestes casos que seja aberto um inquérito, até para evitar que se possa cometer qualquer injustiça. Até aí nenhuma novidade. O prefeito Udo Dohler tem a oportunidade de fazer uma devassa tanto no setor de fiscalização, como na Unidade de Aprovação de Projetos da Seinfra. Poderia até estender a ação para os outros órgãos e fundações que, pelo perfil e atuação, se assemelham à própria secretária.

Não devem temer nada os funcionários honestos, que existem e não são poucos. Mas permitiria mostrar à população que há um verdadeiro compromisso contra a corrupção. É importante ir além dos discursos e das ações pirotécnicas. Quem deve se preocupar são aqueles que não tenham cometido atos em desacordo com a lei, a ética e a moral.

Um administrador com a experiência do prefeito deveria ter tomado providências para perseguir os corruptos que estejam encastelados na sua administração. No serviço público, os salários de todos os funcionários são conhecidos. E é aconselhável ficar atento quando há funcionários que, recebendo salários iguais, apresentam evidências de riqueza, aumento de patrimônio e bens incompatíveis com o seu salário.

Particularmente carros esportivos, segunda residência, viagens e festas deveriam levantar as suspeitas dos seus superiores. É praxe comum nas empresas procurar identificar este tipo de situações. Compradores e fiscais são alguns dos que correm maiores riscos. No poder público não parece haver ne preocupação com esses casos e não há uma política sistêmica para identificar casos suspeitos e investigá-los. A prática comum hoje é que os corruptos sejam identificados por denúncias, mas não como resultado de um processo interno de moralização do serviço público.



Uma administração honesta interessa a todos e, principalmente, aos bons funcionários que correm o risco de ver seus nomes colocados lado a lado com os de corruptos e corruptores. A atuação da administração neste caso servirá de parâmetro para saber o quanto de verdade havia ou há no seu discurso de campanha. Pode agir como sendo um caso isolado e colocar uma pá de cal, contando que logo seja esquecido. Ou pode fazer deste caso uma oportunidade para fazer o serviço público melhor, mais eficaz e mais transparente. Estabelecendo prazos para atender cada procedimento e implantando ferramentas de gestão pública modernas e ágeis. Nessa mesma empreitada ajudaria se a prefeitura de uma vez por todas adotasse padrões de qualidade como, por exemplo, as normas ISO ou equivalentes, seria o mínimo que se poderia esperar de quem se elegeu vendendo a imagem de um administrador experiente e capaz.