Mostrando postagens com marcador clientelismo. Mostrar todas as postagens
Mostrando postagens com marcador clientelismo. Mostrar todas as postagens

quarta-feira, 21 de maio de 2014

Udo Dohler no AN: o prefeito em seu labirinto

POR JORDI CASTAN

O impacto da entrevista concedida pelo prefeito Udo Dohler ao jornal "A Notícia" tem sido maior que o esperado. Dificilmente poderia haver pior momento e a mensagem tem sido recebida pelos leitores do jornal com preocupação. É bom lembrar que uma boa parte do eleitorado natural do prefeito é composta por leitores do maior jornal de Joinville. Os marqueteiros políticos e os bombeiros de plantão tiveram que agir depressa para evitar que o desgaste fosse maior. Mas o estrago já foi feito.

Por que a entrevista repercutiu tão mal entre o joinvilense? Primeiro porque o eleitor está começando a ficar preocupado com o dia a dia da cidade. Nada parece andar e o proposto choque de gestão continua sem chegar ao cidadão. Os que deveriam ser os pontos fortes da gestão Udo não são visíveis. E o tempo passa: praticamente um terço da gestão já se foi e não há sinais no horizonte que prevejam mudanças a curto prazo.

Corrupção – O prefeito diz que há corrupção na sua gestão. É bom lembrar que quando uma fiscal da Seinfra foi detida pela Polícia Federal por corrupção, o prefeito já usou este discurso, mas nada foi feito que mostrasse uma vontade de mudança. Agora volta a falar de corrupção, mas não dá nomes, não diz em que setores e não apresenta alternativas concretas para combatê-la. Lembrando ainda que recentemente veio à luz uma denúncia envolvendo a licitação em andamento da manutenção da iluminação pública e que envolvia um super-secretário municipal.

O tema tem levantado ainda mais dúvidas sobre a imagem de um candidato que fez durante a campanha da honestidade o seu diferencial, quando todos sabemos que honestidade para um homem público deve ser um pré-requisito e não um diferencial. O resultado é descrédito sobre a sua verdadeira vontade de resolver o problema e a animosidade dos funcionários públicos honestos, que se veem colocados na vala comum dos corruptos.

Gestão – Definitivamente a gestão municipal patina, patina e não sai do lugar. Sem entrar na discussão das diferenças entre a administração pública e a praticada pela iniciativa privada, o fato é que ambas têm as suas diferenças, mas também seus pontos em comum: a busca da eficiência, os princípios da economicidade e da eficácia, unidos à planificação, controle e a gestão devem ser comuns a ambas. Na administração pública só pode ser feito o que a lei permite, na iniciativa privada o que a lei não proíbe está permitido. Está aí uma grande diferença, não é perceptível ainda a diferença entre uma gestão política e a gestão com uma visão empresarial. Transcorreu tempo suficiente para que as diferenças pudessem ser percebidas pela sociedade. Sem choque de gestão toda a proposta apresentada pelo prefeito na sua campanha é posta em cheque e o custo político é evidente.

Política – Quando eleito o prefeito teve a oportunidade e o crédito para poder fazer uma gestão diferente; para isso precisava tomar algumas decisões que evidenciassem a vontade de fazer um governo técnico e que se diferenciasse das gestões anteriores. Não o fez e optou por uma abordagem mais política. Um empresário que tenha administrado uma empresa com um faturamento superior aos R$ 100 milhões tem melhores condições de entender e administrar uma cidade com um orçamento 10 vezes maior. Saberá ler um balanço e tomar decisões baseadas em critérios técnicos e administrativos.

O problema é quando alguém tenta compatibilizar este perfil com um perfil político. O resultado é que mesmo com uma maioria absoluta na Câmara de Vereadores, o prefeito ainda não está satisfeito e preferiria um legislativo mais submisso e obediente, sem compreender o papel de cada um dos poderes no modelo republicano. Como político, Udo tem ainda muito por aprender. Os seis mandatos como presidente da ACIJ e os quase 20 anos à frente do Sindicato da Indústria Têxtil não proporcionaram o aprendizado político de que tanto precisa neste momento.

Foto: A Notícia
Clientelismo – Por favor, que alguém explique com urgência ao prefeito o que é clientelismo. Porque afirmar que há clientelismo e que esse é um entrave à gestão municipal - em especial vindo dele - parece um contrassenso. A impressão que ficou depois da entrevista é que o clientelismo pernicioso é o dos outros; quando o clientelismo tem como objetivo atender as demandas dos amigos do rei ou dos apoiadores da campanha, além de ser normal, deve ser visto exclusivamente de defender o que é bom para Joinville.

O prefeito parece atolado no tempo em que na ACIJ se dizia em voz alta que “o que é bom para ACIJ é bom para Joinville”. Nos dias de hoje a frase deveria ter outra sintaxe: “o que é bom para Joinville é bom para a ACIJ”, pois assim a frase ganharia um significado e repercussão muito diferentes. É provável, contudo, que o prefeito não tenha deixado ainda de pensar como presidente da ACIJ.

Democracia e participação popular –  O perfil do prefeito Udo Dohler não é e nunca tem sido o de um democrata; pois é conhecido pelo seu perfil autoritário. A frase que melhor o define é a de que é alguém que ouve, mas não escuta. Acostumado a mandar e a ser obedecido, não faz parte do seu quotidiano escutar, reconsiderar, lidar com vozes e opiniões dissonantes ou simplesmente distintas das suas. Quem o conhece melhor sabe o quanto de esforço pessoal deve representar para o prefeito ter de lidar com minorias que, como parte do processo democrático e utilizando-se dos espaços de participação democrática, discordem da sua visão da cidade e do mundo.

Há duas possibilidades: a primeira é que o desgaste político continue aumentando e a sociedade como um todo pague o preço da teimosia ou então que se produza uma mudança radical na forma de ver e entender o papel da sociedade organizada na tomada de decisão. A segunda parece improvável e deveremos ter até o final do mandato uma fase conturbada. O curioso disso tudo é que boa parte dos eleitores do Udo votou nele acreditando nessa imagem de turrão, no seu perfil autoritário, pois imaginavam que Joinville precisava de um prefeito com este perfil. Assim, o futuro das cidades como Joinville, que não podem ser administradas mais no grito ou na vontade, vão precisar de administradores que reúnam ao mesmo tempo a capacidade política de negociar com o conjunto da sociedade e integrá-la num projeto de cidade e capacidade de administrar uma máquina complexa com milhares de funcionários e orçamentos bilionários.

Judicialização - O Prefeito Udo Döhler apontou a “judicialização” como a causa do que chama de problema da tramitação da LOT. Disse ainda que, além de terem refeito tudo ao longo de 2013, estavam em contato permanente com o Ministério Público, a fim de não cometer nenhum descuido. Tais declarações são de causar espanto. O verdadeiro problema não é a “judicialização”, mas, ao contrário, o atropelo implícito ao planejamento do IPPUJ para execução – em rito sumário – de audiências públicas para debater tema fundamental para a vida dos cidadãos, verdadeira maratona de eventos em dias consecutivos e com duração, pasmem, de meras duas horas cada uma.
Foto A Notícia

Essa pretensão provocou reação dos munícipes, que não tiveram outra opção senão recorrer – por meio de oito associações de moradores – ao Ministério Público. Deste receberam apoio, sob a forma de recomendações para que o IPPUJ atue em consonância com a lei, propiciando aos cidadãos, com a devida antecedência, elementos necessários para que formem convicção abalizada sobre as implicações das propostas da nova LOT sobre suas vidas social, econômica e patrimonial.

O prefeito inverte, assim, a ordem das coisas: não foi a Prefeitura/IPPUJ que se coordenou ativamente com o Ministério Público, a fim de não cometer erros. Foi a partir de um erro que estava, sabe-se lá por que razões, prestes a ser cometido pelo IPPUJ, que o Ministério Público, a pedido de alguns moradores de Joinville, devolveu o assunto aos trilhos, determinando ao Poder Executivo que atue da forma que se espera do administrador público. Ou seja, agindo com transparência e cumprindo o que determina a lei aplicável ao assunto.

E se o Prefeito está insatisfeito com a velocidade de tramitação da LOT, só precisaria comandar seus subordinados do IPPUJ para que ajam nesses termos. Afinal, o cidadão está apenas se defendendo contra a incompetência de uma entidade que se tem mostrado incapaz de cumprir seu papel, abdicando de discussões educativas, abertas e cristalinas com a população, em nome do verdadeiro rolo compressor que até este momento tentou passar sobre pessoas cujo conhecimento sobre o tema beira a inocência. A judicialização é hoje o caminho encontrado pela sociedade para se proteger das arbitrariedades e da falta de participação democrática.

Em resumo, a entrevista do prefeito não foi um tiro no pé. Foi uma rajada. No pé, na perna, no joelho e nas costas. A pergunta que fica é se o prefeito sabia o que ia encontrar? Pessoas próximas a ele asseguram que foi avisado. O próprio ex-prefeito Carlito afirma que o avisou. O prefeito como sempre ouviu, mas não escutou.


Reprodução A Notícia