POR SALVADOR NETO
A moda agora é ler rápido, textos curtos, não pensar, pesquisar no google e
outras ferramentas, tudo em uma espécie de fast food intelectual. O resultado?
Uma sociedade crescentemente mal informada, mal formada, e por consequência,
facilmente arrebanhada por ferramentas de marketing.
Bom, você deve estar questionando,
quando ele vai falar sobre o tema do artigo! Calma.
Esta semana estive em uma
escola estadual da zona oeste de Joinville (SC), a convite de um professor
amigo. Falei, e interagi, com cerca de 120 alunos do ensino médio. Na grande
maioria haviam saído do trabalho e ali estavam para estudar.
Aos
questionamentos que sempre faço, para ilustrar a fala, sobre quem tem celulares
inteligentes, tablets, notebooks, e outros, também a grande maioria afirma os
ter. Quando pergunto quantos gostam de ler livros, físicos, ou até digitais, a
resposta também amplamente majoritária: não lemos.
No jogo que tracei em nossa conversa – três
turmas individualmente, e depois as três mais uma em um auditório – falava sobre
o jornalismo, a profissão, a importância da formação profissional para ocupar e
compreender o seu espaço no mundo. Com minhas obras "Gente Nossa" e "Na Teia da
Mídia", provocava-os a entender o processo que é ter poder sobre o que se pensa,
e não pensar somente sobre o que a grande mídia espalha por todos os meios
disponíveis.
Ao final, arrematava que ou eles estudam, lendo muito e muitas
obras importantes, e também jornais e blogs alternativos de notícias, ou eles e
mais jovens que virão depois deles, até filhos deles mesmos, se tornarão operários
digitais.
Não trabalharão mais
em fábricas sujas, engraxados, empoeirados talvez, mas ganharão o mesmo tocando
telinhas mágicas, arrastando dedos por sobre tablets. E comprando tudo a um
toque. Sem pensar, sem tocar o que compra. Simples massa de manobra, modernas,
equipados com tecnologia de ponta. Mas apenas operários a serviço do poder.
Em quase todas as palestras que faço em
escolas, faculdades, entidades de classe e outros, tenho abordado o tema da
comunicação e literatura em tempos digitais. Minha experiência ao longo do
tempo tem mostrado que a quantidade/qualidade da leitura dos jovens tem caído muito.
Com a curiosidade aguçada – afinal,
operários digitais? – ilustrei o futuro com base neste cenário de avanço
geométrico do digital, da tecnologia.
Afirmei: neste caminho vocês não passarão
de operários digitais, idênticos aos operários criados pela Revolução
Industrial, de chão de fábrica, que por falta de oportunidade, estudo e condições
de vida, ficavam somente no pesado, depois apertando botões de maquinas, robôs,
até se tornarem obsoletos ao meio capitalista que vivemos.
Claro, tudo isso causou um debate
acalorado. Questionaram-me sobre o impeachment da Dilma. Respondi. Burrice e
luta pelo poder. Mas tem de mudar tudo que está aí! Respondi: mudar o que? Não sabemos!
Respondi. Mudar o combate à corrupção após décadas de roubo escondido por
ditaduras e elites arraigadas ao dinheiro do Estado?
Falta comida, falta
oportunidade de estudo a vocês? Não. Afirmei que é preciso pensar, pensar e se
informar, ler, ler, ler, mas não posts curtíssimos. Ler, ler muito, mas não 170
toques de WhatsApp e se achar informado adequadamente. Ler, ler, mas obras que
fazem queimar neurônios, como "O Tempo e o Vento", "Cem Anos de Solidão", "Os
Miseráveis", "Grande Sertão Veredas", "Vidas Secas"... Claro que não foi a maioria, mas uma amostra significativa não soube dizer, afinal, o que devia mudar. Pensam como as mensagens bombardeadas pelo concentrado poder da mídia em poucas famílias brasileiras, desejam.
Constato, ao longo de vários anos e
palestras que fiz, esse avanço da tecnologia sendo vendida como o Santo Graal
da humanidade, a libertação dos povos mais longínquos pelo acesso fácil aos
smartfones, televisões, tablets, redes sociais, e muito mais que virá.
O poder,
econômico, entrelaçado ao de estado, conduz nossa sociedade a um corredor que
nos conduz apenas para um fim: o consumo sem questionar, seja ele de produtos,
ideias, ideologias ou culturas. Produzem-se ao longo de alguns anos já milhões de
operários digitais. E por outro lado, promovem a redução gradativa dos formadores de boas
cabeças pensantes. Professores, filósofos, educadores.
Eles nos querem simples operários
digitais para nos mobilizar por causas que são somente deles, os poderosos. Nos
empoderam de produtos mágicos que nos comunicam (?) instantaneamente, falseando
em nossa mente que somos seres de primeira grandeza. Não. Somos consumidores de
primeira grandeza. Sem pensar. Sem questionar.
Apenas, digitar, clicar,
comprar, inclusive ideias absurdas, burras, inconsequentes, como pedir a volta
da ditadura militar, a demonização de pessoas por pensarem diferente, serem
diferentes. Ou promovemos um retorno à luz do pensar, ou vamos inexoravelmente,
como os bois que vão ao matadouro, para o corredor da morte como seres humanos. Pensemos, pois.
É assim, nas teias do poder....