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sexta-feira, 13 de setembro de 2024

A angústia do candidato na hora do TikTok

POR JOSÉ ANTÓNIO BAÇO

O TikTok revolucionou a linguagem dos conteúdos digitais. No início, a rede era vista apenas como entretenimento rápido e banal. As marcas, muito focadas na própria seriedade, relutaram em aderir ao estilo da plataforma. Mas o que parecia passageiro acabou por se consolidar como linguagem dominante: vídeos curtos, rápidos e descomplicados. Tudo de forma a capturar a atenção em poucos segundos. Se não for assim, o vídeo pode morrer à nascença.

Se foi difícil para as marcas, pior ainda para os políticos na atual campanha para as prefeituras. Tem muita gente aos trambolhões nessa adaptação aos meios digitais. Há quem ainda resista à linguagem “titokiana”, com a paúra de que uma fala leve e efêmera não combina com a seriedade que desejam transmitir. Ou, parafraseando Belchior, tem muito político “angustiado na hora do TikTok ”. Mas não adianta. Essa relutância não vai evitar o inevitável.

A linguagem do digital desafia a tradição política, muito marcada por uma comunicação formal e controlada. Porque pede leveza, proximidade e, acima de tudo, autenticidade. Há uma mito: só por ser político o sujeito acha que tem que empostar a voz e falar sério. Não há tempo para issso. Para ter uma ideia, plataformas como o YouTube e o TikTok, por exemplo, adaptaram os seus algoritmos para priorizar conteúdos que engajam os usuários nos primeiros segundos. 

As marcas descobriram que não faz sentido recusar a forma. E que o desafio está em dominar a linguagem. Na política, quem conseguir o equilíbrio entre a informalidade do TikTok e a seriedade de suas propostas têm uma vantagem considerável. A atenção do eleitor é um bem escasso. Muito escasso. É o que se chama "economia da atenção". É um processo de segundos. A velocidade com que a informação é consumida pede uma comunicação capaz de criar conexões rápidas e eficazes. 

Quem está no mercado do digital consegue identificar essas evoluções. Mas há estudos. A Microsoft relata que o tempo médio de atenção dos usuários da internet caiu de 12 segundos (em 2000) para cerca de 8 segundos (em 2015). Um estudo do HubSpot sobre marketing digital indicou que a maioria dos usuários decide se vai continuar assistindo um vídeo nos primeiros 3 segundos. Esses segundos iniciais são fundamentais para atrair e manter o espectador.

O sucesso nas eleições não vem apenas das propostas, mas da embalagem. Ou seja, a capacidade de explicar as ideias de forma acessível, criativa e, acima de tudo, relevante para o público. Aliás, isso faz lembrar outro poeta, um certo Luís de Camões, quando escreveu “mudam-se os tempos, mudam-se as vontades, muda-se o ser, muda-se a confiança, todo o mundo é composto de mudança”. Tudo muda.

Enfim, este é o desafio. O que antes era considerado adequado ou eficaz em campanhas políticas ou das marcas – uma abordagem mais formal, controlada e tradicional – hoje precisa ser adaptado a novos formatos, como a linguagem do TikTok, que privilegia a rapidez, a autenticidade e a leveza. Ou seja, é preciso alinhar com as vontades dos eleitores e entender o novo inconsciente social.

É a dança da chuva.



sexta-feira, 31 de março de 2017

Xingamentos são sempre sexistas



POR CECÍLIA SANTOS
Faz tempo que me intriga o fato de nunca (que eu me lembre) ter visto o comentário de alguma mulher nos posts do blog, com exceção daqueles das colegas que nele escrevem. Mas entre os comentaristas, há alguns anônimos que invariavelmente aparecem para desopilar o fígado com comentários agressivos, geralmente sem conexão com o texto.

Acontece que o ataque dessas criaturas que vivem na sombra diferem bastante a depender do gênero do autor ou autora do dia. No caso dos autores, os ataques têm mais a ver com posicionamento político. Já nós, autoras, ouvimos agressões associadas a nosso sexo.

Outro dia um anônimo deixou um comentário em um post meu dizendo que sou mal amada e solteirona. Ele sequer mencionava o assunto do post. Ora, essa ideia de que feministas não têm um macho pra chamar de seu (os caras realmente se acham a última bolacha do pacote) é realmente surrada e obtusa. Mas não deixa de ser um desaforo que um sujeito claramente intelectualmente inferior a mim tente me silenciar por meio de uma intimidação tão tosca.

Esse episódio me fez lembrar de todas as vezes em que nós mulheres somos silenciadas nas mais diversas situações: na família, no trabalho, na academia. Quando tentamos nos impor, alguém diz que estamos na TPM ou que não fizemos sexo na noite passada. Em restaurantes e bares, é até engraçado, os garçons sempre acham que devem se dirigir a um homem na mesa. E já ouvi de amigas que nenhum garçom atendia um grupo de mulheres em mesas de bares. Mas vejam só, onde já se viu essas mulheres saírem de casa para se divertir sem a presença de um macho protetor? Onde elas pensam que estão? No século XXI?

Vejam que a maioria dos xingamentos têm um sentido completamente diferente em suas formas feminina e masculina: vagabundo ou vadio é quem não gosta do trabalho, mas vagabunda ou vadia é quem tem uma vida sexual livre. Cachorro é alguém sem caráter, mas cachorra tem o mesmo sentido de vagabunda, assim como piranha, vaca e galinha. Cobra, por exemplo, só se usa para se referir a mulheres.

Histéricas e loucas são as mulheres. Um homem louco é aventureiro. É um dos recursos mais comuns para silenciar as mulheres.

Até quando o xingamento é dirigido a um homem, botam outra mulher no meio. É o caso de filho da puta e suas variantes, como se o problema do sujeito fosse a mãe. E tem também os xingamentos associados à parceira do sujeito, como no caso de corno. Xingamentos homofóbicos referem-se a comportamentos tipicamente femininos.

Na época do impeachment, fiquei chocada com imagens de pessoas acompanhadas de crianças e mandando uma senhora de mais de 60 anos de idade, que foi eleita em um processo democrático, “tomar no cu” (cu não tem acento, ok?). Nessas horas os moralistas deixam de lado o pudor. Um primo no dia da eleição usou o Facebook para chamar a presidente reeleita de vaca. Poxa, ainda que não se importe a mínima com as outras mulheres, ele tem filha, mãe e irmã.

É tão difícil assim perceber que essas atitudes mantêm a sociedade como um lugar inseguro para as mulheres e que a violência cotidiana começa a ser construída simbolicamente através da linguagem?