segunda-feira, 28 de janeiro de 2013

Resta a tristeza


POR FELIPE SILVEIRA

Não tinha como escrever sobre outra coisa nesta segunda-feira senão sobre a tragédia deste fim de semana em Santa Maria, no Rio Grande do Sul, que vitimou fatalmente, pelo menos, 231 pessoas, sobretudo jovens. Nossa tragédia social é diária, mas essa, desse tamanho, tão próxima da nossa vida, não pode ser esquecida ou tratada de maneira leviana. E por isso é tão difícil escrever esse texto.

Falo de proximidade porque no momento da tragédia eu mesmo estava numa balada, aproveitando a noite, feliz da vida. Por isso, no momento que eu acordei e vi as notícias, não pude não pensar em como seria se tivesse acontecido comigo e com meus amigos na noite anterior. E acho que esse pensamento passou pela cabeça de muita gente. E, claro, não dá pra não pensar nos nossos pais, nos nossos irmãos, primos, amigos...

Como disse uma pessoa que eu admiro muito em uma rede social, a tragédia não pode ser tratada como exemplo, pois algo assim jamais deveria ter acontecido. Porém, ela nos faz pensar e tirar lições.

A primeira delas é em relação à infraestrutura. Eu, sinceramente, não imagino que isso possa acontecer em certos lugares do mundo, mais avançados neste quesito. Não dá para aceitar que locais como boates, ginásios estádios, escolas ou qualquer um que reúna mais de dez pessoas não tenha um planejamento para uma ação organizada no caso de uma tragédia, como um incêndio ou a ação de um atirador, como já ocorreu no Brasil e nos Estados Unidos. Nessa linha, dou parabéns ao prefeito Udo Döhler, que já iniciou uma ação de fiscalização no município.

É fundamental, neste momento, que todo o Brasil se volte para trabalhar na prevenção deste tipo de situação. O momento é de tristeza, mas também é de trabalho. E isso, diferente de tragédias como enchentes e desabamentos, depende muito mais da iniciativa privada do que do poder público. Hoje cedo ainda um amigo que trabalha com grandes eventos em Joinville comentou que muitos dos espaços utilizados em festas não contam com saídas de emergências adequadas.

Outra reflexão trazida pela tragédia é sobre o repugnante reflexo da nossa sociedade nas redes sociais, nos espaços de comentários. Desde o início do dia eu soube, pela revolta dos meus amigos, que havia muita gente fazendo piada sobre a tragédia. Ainda bem que ninguém que eu conheço fez isso. Acabava a amizade, se fosse uma, por ali mesmo. E não preciso nem explicar a razão.

Outra coisa muito triste são os comentários dos fanáticos religiosos que comentam em matérias dos portais de notícia que “se as vítimas estivessem em uma igreja isso não teria acontecido”. Neste momento, eu, que sou cristão, tenho a maior vergonha do mundo. Não só por ser cristão, mas também por ser humano e saber que outro pode dizer uma coisa dessa. Assim como também não consigo acreditar nessa gente que compartilha e retuita as fotos dos corpos carbonizados.

A terceira coisa que me chama a atenção é o sensacionalismo dos jornais. Sobre isso, porém, eu não vou me alongar porque, particularmente, não considerei dessa forma a cobertura que acompanhei. Soube, porém, de relatos de outras coberturas. Uma tragédia dessa dimensão não precisa que a cobertura induza o espectador a chorar ou ficar indignado. Ela já é grande demais e fez isso com todo o Brasil hoje.

Para finalizar, só quero dizer desejar força aos amigos e às famílias, principalmente aos pais das vítimas. Para muitos os próximos dias e meses não serão fáceis, mas para eles o resto da vida será muito difícil. Para todos nós, neste momento, resta a tristeza.

9 comentários:

  1. Fe, isso me fez relembrar minha indignação no show do Paul em Fpolis. Apenas 1 saída para cerca de 40 mil pessoas. Levamos 2 horas para deixar o local. Ontem, vi um especialista falar que, numa situação ideal, a evacuação dessa qtidade deve ser em 8 minutos.

    Infelizmente, muitas vezes, só aprendemos dessa maneira triste. :(


    Juliana Maul

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  2. Condição Insegura + Ato inseguro = Acidente

    Técnicos, tecnólogos e engenheiros de segurança estão cumprindo seu oficío todos os dias para que acidentes de qualquer dimensão não ocorram.

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  3. Excelente texto!
    Concordo plenamente com tudo!
    Parabéns!

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  4. Os fanáticos religiosos estão enganados, já desabaram tetos de templos com pessoas dentro. Só não lembro em que data.

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  5. Engraçado foi ler no twitter de alguém (não me recordo) que em Joinville, ao contrário do que seu amigo (bem informado, da área) lhe falou, graças ao ótimo trabalho de fiscalização dos bombeiros voluntários isso nunca aconteceu. Nunca aconteceu por que ninguém tentou acender um sinalizador em um ambiente fechado e lotado, a fiscalização tá lá todo sábado a noite para ver se as portas estão abertas?

    Em bares como o Bovary, onde só há uma escadaria para sair, como faz no momento de desespero? Acho que as pessoas tem que ter cautela na hora de fazer comentários envolvendo uma tragédia dessas, porque não dá pra querer passar uma falsa sensação de segurança, talvez até com motivação política.

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    1. Eu ja vi fogos de artificio em garrafas de whisky nas baladas de Joinville.

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  6. A gente deveria ter a cultura de fazer certo, não aprender com as tragédias e infelizmente muitas vezes, também não se aprende nem com elas.
    E a culpa não está só de um lado. Deveríamos cobrar mais!

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  7. Passando por aqui, vi o teu texto, Felipe. Parabéns. Concordo que se pudermos tirar algo de positivo em uma tragédia, que seja a lição - e as providências - para que não permitamos que se repita, ou que, pelo menos, caso ocorra novamente, tenha consequências menos trágicas.
    Em relação a isso, me pergunto: Quem concede alvará de funcionamento e aprova os projetos e instalação de equipamentos de segurança, sem o quê a casa simplesmente não estaria funcionando? O poder público, certamente. Com isso não estou relativizando a responsabilidade dos proprietários, mas, arrisco dizer, o poder público foi no mínimo conivente! Assim, caberia um processo contra os responsáveis pelas autorizações. Se isso ocorresse, certamente haveria mais responsabilidade, pra dizer o mínimo, na concessão das permissões de funcionamento desses estabelecimentos. Tragédias podem ser úteis, quando aprendemos com elas. Nós, infelizmente, temos dificuldades com isso.

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  8. Tão chocante quanto a tragédia são os milhares de comentários vindos de todas as partes do Brasil massacrando os moradores do SUL.
    Muitas piadas cretinas e total falta de compaixão pelo próximo.
    Eles acham que somos soberbos, dizem que não ajudamos quando acontece algo no Norte e Nordeste, sem palavras..
    Fiquei muito triste ao ler certos comentários e sentir o quão grande é este regionalismo absurdo.
    Andreia Züge

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