terça-feira, 28 de abril de 2015

Não precisamos de Luciano Huck


POR FELIPE CARDOSO

Os programas da televisão aberta brasileira são ruins, isso é um ponto inegável, e é só observarmos a perda de audiência das emissoras para constatar que o telespectador tupiniquim está ficando cada vez mais crítico.

Enquanto as novelas tentam inserir visões revolucionárias em seus roteiros para atrair a atenção do público, os seriados e as séries estrangeiras vêm ganhando, a cada dia, mais fãs e espectadores brasileiros.

Poderia citar vários fatores que levaram a essa grande mudança. O acesso à internet e as promoções dos canais por assinatura contribuíram para a transformação desse quadro, por exemplo.

Mas acredito que o ponto principal esteja mesmo no desgaste dos programas. O brasileiro já está ficando cansado com a falta de imparcialidade e, principalmente, de profissionalismo do jornalismo “tradicional” brasileiro e vem buscando, cada vez mais, mídias alternativas para se informar. E as novelas demoraram e estão demorando muito para se atualizar e trazer uma visão completamente diferente de teledramaturgia ao seu público. Ou seja, os brasileiros já perceberam que as emissoras abertas não querem mudar de verdade, por isso estão migrando.

Um ponto em que observo e que chama muito a atenção, além dos programas sensacionalistas – que contribuem para a construção e o aumento do medo e desespero -, são os programas de auditório. Celso Portiolli, Gugu, Geraldo, Eliana, Luciano Huck, Regina Casé, Ratinho… Além de oferecerem quadros copiados do exterior, têm em comum a necessidade de se utilizar da população pobre para ganhar audiência e, automaticamente, patrocinadores, ou seja, verba, grana, dimdim, bufunfa, cascalhos…

Só que essa fórmula só dava certo quando as pessoas não tinham acesso ou não buscavam outros meios de entretenimento. Então era meio que obrigatório você assistir televisão e ver a história do pobre, bem pobre, conhecer a sua casa, as suas dificuldades e depois vê-lo se humilhar no palco para conseguir uma reforma no carro ou na casa, ou apenas para voltar a sua terra natal e, de alguma forma, alegrar-se com isso e ir trabalhar no dia seguinte.

Só que hoje, com muito mais informações que antes, com grupos muito mais organizados e buscando uma melhor politização e formação, esses programas não atraem tanto assim, mas os diretores parecem não notar isso e continuam optando em manter o mesmo formato antigo.

E falando politicamente sobre, tanto a esquerda, quanto a direita já estão cansadas desses programas. A primeira por fazer uma análise crítica sobre a representação desses programas na vida das pessoas e a segunda por acreditar na tese da meritocracia.

Não é de hoje que se aproveitam da tragédia alheia para lucrar, mas as pessoas estão se conscientizando que algum dia poderá ser a tragédia delas exposta para milhões de brasileiros e, depois de usada, descartada. Pois na modernidade é assim: o tempo está cada vez mais curto e não sobra espaço para uma só história. Quanto mais desgraça tiver, melhor é. E a comunicação tem se aproveitado disso.

Como uma mistura de urubu com sanguessuga eles ficam procurando pela desgraça para usar, sugar e descartar.

JOINVILLE

Um exemplo recente foi o caso do menino que agradeceu ao juiz que deixou a mãe, uma presa em estado terminal, passar os últimos dias em casa. Em uma matéria muito bem escrita, o jornalista Roelton Maciel relatou o fato e, preservando a imagem da criança, mostrou o agradecimento na íntegra (veja aqui: http://anoticia.clicrbs.com.br/sc/noticia/2015/04/veja-como-um-menino-agradeceu-ao-juiz-que-deixou-a-mae-uma-presa-em-estado-terminal-passar-os-ultimos-dias-em-casa-4739772.html).

Tanto o papel do juiz, quanto o do jornalista foram feitos da maneira correta, preservando os envolvidos e propagando a humanização. Mas o que vimos após a repercussão da notícia, foi o vício que a imprensa brasileira tem com a tragédia.

Por ser um caso raro, infelizmente, a notícia se espalhou rapidamente e os abutres começaram a procurar a carne fresca para comer e depois jogar fora.

Emissoras de TV foram na casa do menino para entrevista-lo, colocando a tarja ou deixando a tela escura, para não aparecer, outras mostraram fotos também escondendo o rosto.

Para que? Não bastava apenas informar? Será mesmo que há a necessidade de explorar a fundo a vida de cada personagem? Qual é, realmente, a função de um jornalista?

Parece que o mosquito do ego cansou dos publicitários e está começando a picar jornalistas.

De agora em diante ninguém mais se importa com a vida e a história desse menino, a não ser que no futuro, não se tenha mais pauta, então façam outra matéria sobre o caso, para ganhar um pouco mais de audiência e aumentar a tiragem. Pois é isso o que realmente importa para alguns veículos, mas não para todos os jornalistas.

Precisamos, urgentemente, de uma democratização dos veículos de comunicação, isso é imprescindível, mas também precisamos formar mais jornalistas humanos, que saibam honrar seus compromissos de maneira séria, sabendo que o seu papel não é ser protagonista de cada matéria ou programa.

Ou isso, ou morreremos todos os comunicadores abraçados, afundando no mesmo barco.

Observação: a foto que ilustra o texto é do quadro “Jornal Jornal” do programa “Hermes e Renato”. Nesse episódio eles contam a vida de um menino que enfrenta duras dificuldades até chegar a escola (assista aqui: https://www.youtube.com/watch?v=B6Vyhtvpp4k).

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