segunda-feira, 12 de março de 2012

Marxismo prêt-à-porter


POR JOSÉ ANTÓNIO BAÇO

Quando estive em Joinville nas férias, fui almoçar com uma amiga dos tempos de estudante. E ela contou uma história interessante. Quando entrou para a faculdade, tentou se enturmar com um pessoal de esquerda que estava sempre a discutir política. Era Marx para cá, Marx para lá, Marx para acolá.

E a coitada, na ingenuidade dos seus 18 aninhos, achou que seria aceita pelo grupo se começasse a ler a obra do velho barbudo. Não deu outra. Ela se atracou com o primeiro volume de “O Capital” (acho que aquela edição tinha oito volumes) e tentou entender qual era a onda do tal Karl Marx.

O resultado, segundo ela, é que acabou em lágrimas e se sentindo a pessoa mais burra do mundo. Pensou mesmo em deixar a faculdade por não se considerar à altura dos colegas de turma. Por mais que lesse e relesse, ela não conseguia entender patavina do que estava no livro.

Ah... o leitor e a leitora devem estar a perguntar a razão desta história. É apenas para introduzir uma rápida reflexão sobre essa molecada que anda por aí, hoje em dia, a se autodenominar “marxista” e a falar em revolução. O exemplo dessa minha amiga serve para mostrar que a coisa não é tão simples quanto a gurizada pensa.

Primeiro vamos ao óbvio: uma condição incontornável para um marxista é ter lido Marx. Mas não é com a leitura de panfletinhos e opúsculos que se chega lá. Aliás, entender a obra do velho barbudo é como construir diques de cimento com uma colher de chá. Dá trabalho. E não basta ler. É preciso debater, formalizar pensamento, ser escrutinado.

O problema, hoje em dia, é que a gurizada é mais voluntariosa que informada. E embarca numa espécie de marxismo prêt-à-porter, uma versão gugudadá do pensamento de Marx. Não surpreende que comecem a meter o pé pelas mãos, como defender ditadores norte-coreanos ou comemorar uma inexistente “revolução grega”, entre outras esquisitices.

Deixo um conselho. Usem o lema de Marx: “de omnibus dubitandum” (duvida de tudo). E comecem por duvidar de vocês próprios e do vosso marxismo. Esse deve ser um exercício diário. Porque tão chatos quanto os antimarxistas são os marxistas de orelha de livro.
Para finalizar: olhem para o dicionário e vão ver que lá que a palavra “educação” aparece antes de “revolução”. Simples assim.

3 comentários:

  1. Escreveu muito bem... Também já vivi esta situação e ainda vivo... Gostei muito de ter citado que Marx falou em educação antes de revolução. Eu daqui, simples professora, sei o quanto tenho que ler Marx para realizar minha pesquisa de avaliação num processo discursivo e dialógico, incluindo a Formação Social da Mente, proposta por Vigotsky, grande seguidor de Marx na área educativa. Segredo... Na minha época de "esquerdismo inconsequente" cheguei a namorar um professor só porque ele tinha a coleção "O Capital"... Por isso digo que entendo a situação. Ah... Amei o "simples assim". Grande José Antònio Baço.

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  2. Acho que voce está muito distante da molecada...

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  3. Concordo. E complemento.

    Antes de erguer qualquer bandeira é fundamental saber onde quer chegar e ter consciência dos meios que está utilizando.

    De fato, duvidar de tudo é muito importante, principalmente daquilo que vai aos extremos, como a luta incrível "Mobilização da sociedade joinvilense" contra o aumento do número de vereadores.

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