POR SALVADOR NETO
Em 1981 o jornalista e escritor
Ignácio de Loyola Brandão lançou o romance Não
verás país nenhum, uma obra mais atual que nunca. A história conta sobre um
lugar onde tudo era controlado pelo Esquema, um tipo de governo totalitário do
futuro. O cenário é de águas poluídas, avanço do deserto, doenças estranhas,
miséria crescente, comidas artificiais com aditivos químicos que injetam tranquilidade
direto no sangue, urina reciclada para beber (para os menos privilegiados), o
nordeste do país vendido para transnacionais, aquecimento solar...
Passados 35 anos dessa
surpreendente antevisão do que poderia vir a ser o país – e porque não o mundo?
– em que viveríamos, proporcionada por Loyola, vemos com olhar complacente que
nos encaminhamos para esse fim. Após o pretenso fim da guerra fria – acabou mesmo?
– nos deparamos hoje com ameaças de bomba de hidrogênio pela Coréia da Norte,
guerras sem fim no Oriente Médio que causam um êxodo de populações inteiras,
todas fugindo da insanidade humana, que só aumenta. Catástrofes ambientais como
a de Mariana (MG) se sucedem aqui e acolá, acabando com a fauna, a flora, e com
o homem que não pode mais beber a água limpa, cuidar do seu gado e das suas plantações,
e sequer casa pode ter.
Não vou me alongar nos exemplos que
temos, pois faltariam linhas e espaço para tantos desastres socioambientais.
Mas é claro que avançamos para ter esse mundo do Souza, de Loyola, batendo à
nossa porta. O que temos feito para evitar que o Esquema continue a nos pilhar,
controlar, envolver e aceitar suas imposições? Quase nada. Souza precisou de um
buraco em sua mão para sair da inércia. Em Joinville mais de 600 mil pessoas
caem em buracos todos os dias nas ruas, e acreditam que não podem fazer nada
para reverter tal abandono. Quantos buracos em ruas, calçadas, precisaremos ter
a frente dos olhos para contrapor esse esquema perverso que empurra a cidade em
que moramos para ser a cidade do romance de Loyola?
"BOM SENSO" - O esquema do governo atual da
Prefeitura de Joinville tem feito muito mal aos cidadãos que acreditam em um
lugar adequado para se viver. Com muita publicidade, propaganda em meios de comunicação
de massa, tenta impor uma cidade moderna, perfeita, que não existe na prática. A
receita oferecida, um empresário com fama de bom gestor construída na mídia ao
longo de muitos anos, se mostra um parco arrazoado de boas intenções, mas sem
verdade e sem indicações claras para atacar os problemas. Andar pela cidade
mostra isso. A última ação, o aumento “bom senso” na tarifa de transporte
coletivo, abusivo, mostra o lado para o qual o Esquema atua. E não é o da
maioria da população.
A maioria da população está
enfrentando os buracos que já fazem parte da geografia da cidade, pois proliferam
tal quais os mosquitos da dengue. Continuam a buscar remédios que também
continuam a faltar na rede publica de saúde, assim como leitos para que seus
doentes sejam bem tratados. Somente nesta gestão de Udo Döhler a saúde já teve três
secretários, cujos afastamentos se deram pela ameaça da Justiça à porta.
Mobilidade urbana continua a mesma imobilidade, com avanços rápidos para a paralisação
da cidade, pois obras de vulto só existem nas entrevistas, promessas. Vagas
para as crianças nas creches? Eles resolvem facilmente: cortam o turno integral
de pais carentes e – vupt! – lá aparecem mais vagas... Os pais e as crianças?
Ah... se virem por aí.
Para piorar, enquanto a incompetência
na gestão só cresce e joga a cidade para trás, o Prefeito segue um receituário
proposto por algum Goebbels de plantão. Cria histórias para que o povo esqueça
as anteriores. É o caso do bordão de campanha – não falta dinheiro, falta
gestão -, que tentam esconder agora com Biervilles (qual foi o prejuízo?),
cortes de gastos (?), apontando o dedo para a corrupção que grassava na
Prefeitura (onde, quando, quanto, quem, valores?), sem mostrar dados concretos.
A mais nova é que as prioridades são educação, saúde e salários. Novidade? Não é
mais que a obrigação determinada na Constituição Federal. Esse Esquema não é
novo, mas continuou na gestão atual, e já vem de muitos anos na cidade.
PODER PELO PODER - Como enfrentar isso? Bem, comecemos
por participar mais da política. Comparecer à Câmara e ver o que e como votam
nossos vereadores em casos como aumentos, etc. Ver se fiscalizam a Prefeitura,
ou somente dizem amém a tudo que vem de lá. E usar o voto, a ferramenta da democracia
que sempre pode pelo menos oxigenar a gestão pública. Com consciência, participação
e fiscalização. Sim gente, é no legislativo que se legitimam muitas das ações do executivo. E olhem que o atual governo Udo tem maioria absoluta.
E, claro, é preciso prestar muita atenção nos nomes
que virão este ano para concorrer à Prefeitura. Há muitos, ou quase todos, que
gostam do mesmo que o atual alcaide: o poder pelo poder. Uma cidade como
Joinville precisa de um Prefeito que tenha de fato liderança, que inspire e
motive a população, que mostre trabalho, intensidade, propostas e ações que
engajem as pessoas a crer em um futuro melhor. Precisamos nos empoderar da
cidade, ou não veremos cidade nenhuma para nossos filhos e netos. Pessimista,
catastrófico? Não, apenas realista. Ignácio de Loyola Brandão anteviu em sua
obra muito do que vemos hoje. Nós podemos mudar.
Finalizando, completo um ano de participação
neste coletivo Chuva Ácida agradecendo aos colegas do blog, aos leitores de
todas as semanas, aos comentaristas e a todos os que apoiam um jornalismo
independente. Sigamos em frente, obrigado!
É assim nas teias do poder...