segunda-feira, 29 de junho de 2015

O imigrante em Joinville


POR LILIAN VEGINI BAPTISTA

Ao passar pelo curso de graduação em História, tive a oportunidade de ressignificar algumas coisas como a imigração em Joinville. Nasci em uma cidade pequena no interior do Paraná, e por volta dos oito anos de idade vim para Joinville com minha família. Lembro dos trabalhos da escola que pediam para contar a história da cidade, e o que aparecia era a história dos príncipes, as casas construídas por e para alemães e a barca Colon como símbolo da imigração, além das festividades catarinenses em destaque que mostravam-se de perfil alemão. Passei anos com essa visão de cidade alemã, sem espaço para a diversidade.

Na faculdade, ao estudar história de Santa Catarina, tive uma visão bem diferente daquela que os tempos de escola me proporcionaram. Não podemos negar que os imigrantes alemães tiveram participação fundamental na fundação da cidade, em 1851, mas também não podemos deixar de lado os outros grupos que vieram de diferentes partes da Europa e os próprios brasileiros que sequer são citados. Existiam campanhas de colonização que tinham como objetivo atrair pessoas para povoar a região e prometiam uma vida melhor, até mesmo um pedaço do “paraíso”. Depois de enfrentarem uma viagem difícil que oferecia riscos de vida e péssimas condições de higiene, os imigrantes desembarcaram e encontraram um lugar bem diferente do que aquele paraíso que estavam esperando, pois o local apresentava um manguezal e apenas um galpão para acolher todos os imigrantes recém chegados.

Assim, aos poucos a ideia romantizada da formação de Joinville foi sendo desconstruída e meu interesse pelo tema foi aumentando. Em 2013 realizei um projeto de iniciação científica pela universidade e pude pesquisar um pouco mais sobre imigração. A pesquisa tinha como objetivo entender possíveis representações formadas sobre a imigração a partir da análise do acervo do Museu Nacional de Imigração e Colonização (MNIC) e da aplicação de 60 formulários aos visitantes do museu. Apesar de ser uma pesquisa pequena, nos fornece pontos importantes a serem repensados. Do total de entrevistados, 38,3% responderam que esse imigrante é o alemão, 30% disseram que ele é o imigrante de classe alta/rico/da elite, 11,6% afirmaram que é o trabalhador, 5% falaram que se trata tanto do imigrante rico quanto do pobre e 15% optaram por outras classificações.

Dos entrevistados que nasceram e moram em Joinville, 70% deles disseram que o imigrante representado no MNIC é o imigrante alemão. A partir deste resultado podemos perceber que os próprios joinvilenses tem participação nesta manutenção do “status alemão” da cidade.  Esta participação é um pouco preocupante e contraditória se pensarmos nos movimentos que acontecem na cidade atualmente, como o Movimento Negro Maria Laura, o Clube Kenia e as escolas de samba de Joinville. Desta forma, parece existir uma divisão entre a conservação do imaginário alemão pensado inicialmente para Joinville e a afirmação multicultural e étnica da cidade.

Voltando aos imigrantes, “a condição de imigrante se acopla, assim, à de estrangeiro. Isso significa se sentir e ser considerado como diferente. O grau de estranhamento depende de muitas variáveis: o lugar de onde veio, as razões da imigração, a situação de viajar em família ou só" (Oliveira, 2002, p.12) e acrescento também a recepção do lugar para que se vai. Sabemos que as viagens enfrentadas e a recepção dos imigrantes no século XIX não foram nada fáceis, e podemos visualizar este cenário em repetição nos últimos anos.

Santa Catarina tem recebido diversos grupos vindos da região do Haiti e de Senegal, mas será que essa recepção é diferente daquela do século XIX? Estes imigrantes mostram-se parecidos com aqueles, pois também se lançam ao trabalho para conquistar o mínimo necessário para a sobrevivência. Acredito que nenhum deles tenha abandonado “a segurança” de seu país, de suas casas e famílias com a intenção de “roubar empregos” de brasileiros, mas sim de buscar oportunidades para melhorar suas condições de vida.

Fico me perguntando qual o motivo para tanta hostilidade, quase uma aversão a estes grupos recém chegados. Ao ouvir tamanha indignação daqueles que tiveram seus “empregos roubados” por haitianos, fico imaginando como gostariam de ser recebidos em um país estranho, com costumes e língua diferentes daqueles ao que está habituado ainda mais na condição de ter que lutar para sobreviver. Acho que a resposta é meio óbvia, não!?

Posicionar-se contra a vida de grupos estrangeiros para o país, em especial ao sul, não é somente colaborar com a manutenção do status alemão (que não passa de status, pois a diversidade está por todos os lados) mas também é posicionar-se contra a vida humana. Pode soar um tanto exagerado, mas é desta forma que tenho visto o preconceito e a indiferença com estas pessoas.

Cabe a cada um pensar que Joinville quer construir, pois a cidade é uma construção de cada membro participante. Lembrando que não vejo problema em defender determinada cultura, mas sim em não respeitar o espaço que é direito de cada um, em não respeitar aquilo e aqueles que são “diferentes”.

Para quem quiser ler e saber um pouco mais sobre a pesquisa “Imigração: representações com base no Museu Nacional de Imigração e Colonização, de Joinville” a partir da página 103 no link:  http://univille.edu.br/community/novoportal/VirtualDisk.html?action=readFile&file=Caderno_PIBIC_2014-web.pdf&current=%2FPesquisa%2FCadernos_de_IC

E outro texto “Que imigrante é esse? representações do imigrante em um museu de Joinville/SC” no link:  https://www.academia.edu/12862380/Que_imigrante_%C3%A9_esse_representa%C3%A7%C3%B5es_do_imigrante_em_um_museu_de_Joinville_SC

Lilian Vegini Baptista
lilivegini@hotmail.com

Um comentário:

  1. O curso de História não ensina que Imigrante significa “aquele que Imigrou”, portanto, o estrangeiro? Ora, se perguntar para qualquer pessoa com o ensino médio “quem foram os imigrantes que colonizaram Joinville”, obviamente a resposta será “os alemães”. Embora houvessem antes deles os suíços e após eles, os noruegueses e franceses. Os negros não vieram imigrados à Joinville na época.

    Quanto a suposta hostilidade contra os atuais imigrantes haitianos e senegaleses, pelo menos em SC, estás exagerando. Convenhamos que os imigrantes alemães e outros, até pelo tempo de chegada deles, geraram mais dividendos a cidade e, consequentemente, deixaram raízes mais profundas do que os recentes imigrantes. Além disso, o número de imigrantes europeus na época também foi maior. A Joinville atual é uma cidade de Migrantes que foi colonizada por Imigrantes europeus e, mais tarde e em menor número, Migrantes de origem africana que se estabeleceram principalmente no sul e sudeste do município.

    Deixemos os mi, mi, mi, mis de lado, porque além de enfadonho, esse assunto pouco agrega as ditas “minorias” que não são tão minorias assim.

    Que tal fazer um texto sobre a cultura africana em Joinville sem levantar supostas “questões xenofóbicas teutônicas”?

    Eduardo, Jlle

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