terça-feira, 2 de dezembro de 2014

Salvem o centro de Joinville

POR CHARLES HENRIQUE VOOS

O centro de uma cidade, pelo menos na teoria, é aquele espaço dentro de um território que concentra toda a expressão de uma sociedade. É a área que converge as melhores e piores coisas, e tem a capacidade de manter e criare os maiores laços interativos da comunidade. É no centro que a potencialização da vida se faz mais evidente. E, segundo os preceitos mais modernos de urbanismo, o centro das cidades do século XXI deve ser a artéria condutora da cidade (em seu sentido absoluto) para todos os bairros, todas as ruas, todas as casas, todos os cidadãos. Ou seja, o centro é o espaço mais democrático, que reúne vazio e plenitude, concomitantemente. Em Joinville a essência do centro se perdeu, por alguns motivos que nos cabe elencar.

Por mais que o centro de Joinville tenha mudado sua forma, sempre representou um papel importante na história da cidade, desde quando a sua atual área foi escolhida para os primeiros lotes dos imigrantes advindos da barca Colon. Seja ele um pouco mais voltado para o Rio Cachoeira (como aconteceu até 1910) ou em direção à antiga Estação Ferroviária (até meados de 1970), nunca presenciamos um esfacelamento da representação coletiva como a que o centro possui atualmente. A especulação imobiliária provocada pelo boom industrial das ultimas décadas, aliada à sonegação dos políticos locais, levou o centro ao atual estado de abandono, tristeza e sem alma.

O espraiamento urbano que abrigou os loteamentos de baixa qualidade da cidade após a rápida industrialização da cidade consiste no início do problema. Ao invés de criar uma periferia conectada com o que de melhor já existia (e criar novas situações a partir de tal perfil urbano), o processo determinou o que o brilhante geógrafo Milton Santos chamou de "exílio": pessoas vivendo em periferias isoladas da realidade dinâmica da cidade, desprovidas das melhores infraestruturas e longínquas do centro da cidade com a menor oferta possível do transporte coletivo. Os anos se passaram, os bairros se multiplicaram e cada vez menos as pessoas vão ao centro e convivem entre si nos seus espaços segregados, ou, quando acessam ao centro, utilizam seus piores espaços.

Sob outro prisma, os políticos locais, que não conseguiram controlar o crescimento da cidade para as áreas periféricas (por "n" motivos que frequentemente escrevemos aqui no blog), viram seus orçamentos irem ralo abaixo para criar e manter as infraestruturas das novas áreas, ou investir de forma muito consistente nas áreas da vetorização da especulação imobiliária  para moradias de alto padrão (as quais seguiram a mesma lógica e se distanciaram do centro da cidade). Ao invés de promoverem uma cidade compacta e densa, gestores locais criaram um monstro que detonou aquilo que era bom e conteve as potencialidades perante os desafios da urbanização acelerada de décadas atrás.

O resultado é o mais desastroso possível. A falta de cuidado e zelo pelas principais áreas da cidade torna o centro um palco das vulnerabilidades sociais e espaços públicos deteriorados, seja pela falta de manutenção (como a Praça da Bandeira, a Praça Dario Salles, Praça Nereu Ramos) pelo desprezo (as flores sumiram das ruas centrais) ou pelo erro nas ações (como o fracassado projeto de revitalização da Rua das Palmeiras). E aí, no fim das contas, resta ao pobre usar estes espaços residuais, os quais são marcados pelo baixo nível de serviço e interatividade social e, aos mais ricos, os espaços gourmets, chiques, cool e autosegregados.

Cada um usa o espaço urbano da forma que lhe é possível. O nosso centro, de democrático e acessível para todos, se tornou um espaço que repele o melhor de uma cidade, ao mandar para as periferias as propriedades intrínsecas da desigualdade e concentrar para perto de si aqueles que podem pagar por um uso diferenciado do que lhe é comum. Precisamos salvar o centro e torná-lo um espaço igual para todos. O bonde está passando e não podemos perdê-lo e nem esperar o próximo, pois este tem como destino final a gentrificação.

11 comentários:

  1. A tendência é que o centro das cidades se esvazie e se transforme numa área de serviços. Já é assim nas grandes cidades do mundo, como Londres e Melbourne, ou Filadélfia e São Paulo. A diferença é que as duas últimas, embora também possuam amplos subúrbios, descuidaram das suas zonas centrais.

    No caso de Joinville, por ser uma cidade muito espalhada, priorizou-se o investimento em indústria e comércio nos subúrbios, inclusive serviços de transporte em massa que contornam o centro da cidade.

    Ou se investe para que o centro torne-se realmente um espaço de convivência ou veremos a ZC de Joinville virar aquilo que se tornou em SP. Acontece que investimentos em reurbanização demandam muitos recursos e não demora muito para a esquerdalha acusar qualquer poder público (exceto os governados pelos partidos de esquerda) de investimentos desnecessários e “higienização”, como anos acusaram o Kassab e Alkmin de fazerem na Cracolândia, mas que eximem Haddad de qualquer acusação.

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    1. Cara, o centro de Joinville vai ser a mesma merda que qualquer outra cidade do Brasil. é uma fossa social.

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  2. Gostaria que você explicasse melhor o fracasso na revitalização da Rua das Palmeiras...Não entendi...

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    1. foi feito na gestão do Carlito, da qual ele saiu por não concordar com os métodos. Ups, mas ele também saiu da gestão do Udo, por discordar....e saiu da Sociesc, por não compactuar....são tantos eufismos para dizer que o cara simplesmente não se cria em lugar nenhum e tudo que os outros fazem é ruim

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  3. Também não entendi o "fracasso" na revitalização da Rua das Palmeiras. Acho que a intervenção ficou bonita e racional. O que falta é revitalizar todo o resto do centro. Uma andorinha só, não faz verão.
    Restaurar os magníficos prédios antigos, que hoje viraram lojas de 1,99. Fechar toda a area central para veículos. Reformular e definir o tipo de comércio no local (alô CDL), promover bolsões de estacionamento no entorno para possibilitar acesso confortável (não só de bicicleta)
    Tem muitas coisas que podem ser feitas, algumas simples e baratas, outras mais caras sem dúvida.
    O que não pode é continuarmos a assistir essa total falta de respeito ao nosso Patrimônio Histórico, parte dele já irremediavelmente perdido, por fraqueza, inoperância e desleixo dos órgãos responsáveis (ippuj?)
    Nossa área central é lindíssima. Tem prédios magníficos, que restaurados não só demonstrariam nossa fibra, mas também nossa inteligência.
    Quanto à afirmação do anônimo das 20:56, eu discordo. Não é qualquer outra cidade do Brasil que tem uma merda de centro. Muitas, mas muitas mesmo, poderiam nos dar exemplo.

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  4. O "fracasso" na revitalização da Rua das Palmeiras, na cabeça do egresso sociourbanista, deve-se ao pensamento curto dele, e seus parceiros, terem como "sucesso" de revitalização, a imagem desta rua cheia de barzinhos para poderem tomar cerveja conversar sobre a Revolução Russa.

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  5. Na hora em que o centro for revitalizado ele vai virar centro de encontro para descolados, ricos, bonitos e cheirosos, e os pobres irão para onde???

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    1. Deixe ver se entendi direito. A proposta é deixar cair aos pedaços para que os pobres tenham um local para frequentar, é isso?

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    2. É, porque pobre não pode fazer parte desse "mundinho descolado, rico, bonito e cheiroso". O pobre tem que se contentar com o centro feio, sujo e decrépito porque é mais a cara dele, sabe...

      (patético!)

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    3. Não é uma pergunta preconceituosa, é lógica. Se ali no parque do lado da Antártica for aberto um bar legal para gente cheirosa, os maconheiros que hoje lá ocupam vão pra onde????

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  6. Solução, transferir o Panágua para Araquari e passar uma rodovia no meio.

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