sábado, 11 de maio de 2013

E pra que serve, afinal, a história?



POR CLÓVIS GRUNER

O convite para escrever no Chuva Ácida, agora como colaborador fixo, não apenas reforça o vínculo com uma cidade que, talvez, nunca venha a ser apenas um retrato na parede. Ele me coloca uma vez mais diante da tarefa de pensar sobre o lugar de Joinville em minha trajetória. Já me ocupei disto em outras ocasiões. Aqui mesmo, em minha primeira colaboração com o blog, indagava em outra ocasião sobre uma incômoda tendência ao provincianismo, a reafirmar alguns lugares comuns sobre a cidade. Considerava-a, então, modelar da “modernização conservadora” que, reconheça-se, é característica intrínseca a muitas das cidades brasileiras que viram sua economia e população crescerem principalmente a partir dos anos 50 do último século.

Na época, apesar da visão pouco otimista sobre a cidade, a maioria dos comentários preferiu questionar minha crítica a certa interpretação da história local, o que pareceu soar para muitos como uma verdadeira heresia. Afinal, me achava no direito de colocar em questão alguns dos cânones historiográficos locais, como se o passado fosse coisa com a qual se pudesse mexer. Justo eu, que não possuo outras credenciais além de ser...  joinvilense e historiador. Quase um ano e meio depois, não vejo razão para desdizer nada do que escrevi.

OLHAR O PASSADO – Há poucos dias, o Jordi Castan ironizava aqui as promessas de futuro para Joinville. Contrastado o seu texto com a pequena série assinada pelo Charles Henrique, a propor do presente um diagnóstico nada complacente, a conclusão é desanimadora. Nestas horas, quando presente e futuro parecem não oferecer maiores ou melhores alternativas, olhar pelo retrovisor poderia ser uma estratégia: auscultar o passado pode nos ajudar a entender não apenas o que somos, mas principalmente como nos tornamos o que somos.

O problema é que Joinville é refém do seu passado. A cidade possui um Arquivo Histórico que já foi referência nacional e conta com um acervo documental invejável, além de um curso de graduação em História que completa 45 anos de atividades. Nas últimas duas décadas inúmeras dissertações e teses têm escrito a contrapelo sua trajetória, inclusive derrubando alguns de seus muitos mitos historiográficos – e cito, a título de exemplo, a excelente e inovadora pesquisa de Denize da Silva, defendida em 2004 no Programa de Pós-Graduação da UFPR, que colocou abaixo a versão de que não houve trabalho escravo na Colônia Dona Francisca.

Apesar disso, sempre que se fala sobre a história local prevalece quase sempre uma única versão, emblematicamente sintetizada na frase do historiador Apolinário Ternes em artigo publicado no dia 9 de março deste ano em caderno especial de A Notícia: “A vocação de Joinville é a de cidade industrial. O que disseram a mais tem a força apenas da retórica.” Dito de outro modo: nada do que se disse, diz ou dirá que contradiga esta alegada “vocação”, tem legitimidade histórica. O destino da cidade, a pautar-se pela afirmação de seu historiador oficial, já estava escrito desde sua fundação em 1851. Contradizer esta visão teleológica é nada mais que um esforço meramente retórico.

ESCREVER UMA OUTRA HISTÓRIA – Mas o passado, apesar de Apolinário Ternes, é sempre conflituoso. E no caso de Joinville, o que falta é assumir no presente este conflito. Seria simples e cômodo afirmar como natural a aceitação de uma leitura sempre a mesma da história. Simples, cômodo e enganoso. Porque se por um lado é verdade que o respaldo, inclusive midiático, desta versão oficial contribui para reproduzi-la e perpetuá-la até a banalização, também o é que os esforços para a desconstruir têm sido limitados. Até mesmo iniciativas interessantes e que renderam, algumas delas, bons frutos, foram sepultadas. 

Há alguns anos a professora Sandra Guedes foi responsável por organizar, no âmbito do curso de História da Univille, encontros onde pesquisadores de graduação e pós-graduação apresentavam resultados de suas pesquisas – eu mesmo, à época mestrando, participei duas ou três vezes do evento, apresentado fragmentos do que viria a ser minha dissertação. A coisa toda ficou no caminho lá pela quinta ou sexta edição, salvo engano. Em 2007, o Arquivo Histórico lançou o primeiro volume da Revista do Arquivo Histórico de Joinville. Primeiro, único e último, porque há seis anos espera-se pelo segundo. E não se pode nem mesmo culpar os altos custos de impressão, porque não são poucas as revistas acadêmicas, algumas muitíssimo bem conceituadas, que optaram por publicar apenas versões on-line, mantendo assim sua periodicidade e mesmo aumentando seu poder de inserção junto ao público leitor. Dos trabalhos acadêmicos, poucos são os que perfizeram a trajetória das bancas de defesa às prateleiras das livrarias e, mesmo estes, caem em relativo ostracismo, vítimas de uma política pouco agressiva de divulgação e distribuição da editora da Univille, responsável pela publicação da maioria deles.

Sim, sei que a tal cultural local, provinciana e conservadora, é uma das responsáveis pelo relativo marasmo histórico e historiográfico. Mas, como disse, tal constatação é, além de simples e cômoda, enganosa. Porque há outros meios – e se não há, trata-se também de inventá-los – além dos formais para se intervir no espaço público, que é onde efetivamente interessa que a história e os historiadores estejam presentes e atuantes. O problema não é apenas uma cidade centenária e seus mais de 500 mil habitantes terem com seu passado uma relação conformista, aceitando como verdade o que é apenas uma versão – e como toda versão, de força também retórica. O problema maior reside, a meu ver, na incapacidade crônica de contradizê-la, de desconstruir a verdade que ela não apenas insinua, mas pretende afirmar e impor; de mostrar, enfim, sua fragilidade, opondo a ela outras interpretações possíveis dos muitos passados que habitam a história joinvilense.

Como historiador, acredito que uma das funções do ofício que escolhi é nos educar para a descontinuidade. Historiadores prestam um desserviço ao presente quando insistem em escrever uma narrativa que estabelece um continuum entre o hoje e o ontem, entre o que somos e o que um dia já fomos. Indagado certa vez sobre a quem interessa a história, o filósofo francês Michel Foucault respondeu que ela interessa, sobretudo, ao poder. Apenas uma história capaz de nos libertar do fardo do passado cumpre uma função ética e política fundamental: mostrar que o que somos no presente não é natural, não é algo dado, mas uma construção. E se nosso presente não é a realização de uma vocação, o futuro pode ser indisciplinado na medida em que nossos desejos e nossa vontade o quiserem. Não é buscando no passado uma origem e uma identidade fixas e únicas, mas nos afastando dele, estabelecendo nossa distância e diferença, que Joinville talvez encontre um caminho para construir um futuro capaz de arrancá-la de sua incômoda zona de conforto. E a história terá valido a pena, porque não serviu apenas ao poder e aos poderosos.

28 comentários:

  1. Não acredito que este chato de galocha (porque é de Joinville e todo joinvilense que se preze tem uma galocha) está integrando o CA. Mais um que não aceita ideias diferentes das suas, esse é amiguinho do Zé. Além de marrento! Fazer o quê né? Bem-vindo, e é claro que também vou lê-lo.

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    1. Apenas para que fique claro, Anônimo. O Clóvis é meu amigo, sim. E de longa data. Mas a ideia do convite para entrar no coletivo foi dos outros integrantes (acho que começou com o Felipe Silveira). E na hora de votar eu me abstive (para não dar azo a leituras como a tua). Mesmo assim, a decisão do convite aconteceu por unanimidade. E não tenho a dúvida de que ganhamos em qualidade.

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    2. blablablá... pode vir o papa escrever aqui, ou até o seu Karl que vou continuar com a mesma opinião, seu entojado! Ou vcs não percebem que só o que dizem parece ser a verdade, ninguém pode discordar. Esse é o problema do blog, com exceção (reduzida, mas não total) do Jordi. Falo dos geram mais discussões.

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    3. Eu sou chato, sim, Anônimo. Às vezes mais do que eu mesmo aguento. Agora, não precisa ir muito longe: basta fuçar outras postagens aqui mesmo no blog pra sacar que eu aceito, sim, ideias diferentes da minha. Preferencialmentes e elas são inteligentes e vêm com assinatura.

      E obrigado pelas boas vindas e pela leitura.

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    4. Anônimo, tu és mesmo tolinho. Isso de "vcs não percebem que só o que dizem parece ser a verdade" é uma besteirinha. Ora, pessoas que leram mais que dois livros desconfiam do conceito de "verdade".

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    5. Feliz aniversário Baço, rsrsrs

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  2. " mostrar que o que somos no presente não é natural, não é algo dado, mas uma construção" - Isso mata a charada! Imagina desconstruir vocações e méritos, por reprodução e dominação social? História, historiografia, percursos, prosopografia... Joinville como objeto seria uma ótima tese.

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    1. Icaro, tem muita coisa escrita sobre Joinville além da produção de caráter mais, diríamos, "canônico". É uma pena que boa parte desta produção não chega ao público, confinada nas estantes das instituições acadêmicas e de pesquisa.

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    2. Clóvis, existe alguma biblioteca online? Sei que várias universidades disponibilizam as teses e dissertações nas versões digitais. Vou procurar algo, pois o assunto muito me interessa. Abs

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    3. Tem, sim, Ícaro. Tanto a UFPR quanto a UFSC - onde a maior parte da produção mais recente foi defendida - disponibilizam versões on-line das dissertações e teses. Eu também tenho uma boa parte da historiografia local em PDF e, caso, lhe interesse, posso enviar a você por mail.

      Alguns dos links:

      UFPR: http://www.humanas.ufpr.br/portal/historiapos/banco-de-dissertacoes-e-teses/?lang=pt

      UFSC: http://ppghistoria.ufsc.br/

      UDESC: http://www.faed.udesc.br/?id=28

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  3. Certeza absoluta o blogue ganhou.. Já li e reli varias Vezes, parabéns CLÓVIS GRUNER..
    Seu texto esta 100% Informativo e Esclarecedor, muito obrigado e continue nos informando e atualizando sempre os anônimos de plantão, procurem o que fazer de útil e produtivo para nossa cidade , e parem de ficar fuçando o que vcs. não entendem com a capacidade intelectual limitada e conservadora, RECICLEM os seus conhecimentos...

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    1. Obrigado Rebeca. Também achei bacana o convite do blog e espero estar à altura da tarefa.

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  4. Acho ótimo a presença do historiador Clóvis Gruner entre os articulistas deste blog. Sem dúvida, estimulará muitas polêmicas e problematizações sobre a cidade de Joinville o que, afinal de contas, é o objetivo deste espaço. Concordo plenamente com as críticas a uma versão oficial da história de Joinville. Eu também, em todas as vezes que tive oportunidade, manifestei minhas críticas a esta visão bastante difundida nestas terras. Contudo, dizer que Joinville é uma cidade provinciana e conservadora não seria a invenção de um novo lugar comum sobre o cotidiano vivido em experimentado neste município? Não seria um novo determinismo que serviria para explicar qualquer coisa? Penso eu que, embora ainda sejam difundidas visões épicas sobre o passado da cidade e que possamos perceber numerosas manifestações de seduções nostálgicas por um passado imaginado e, muitas vezes, fantasioso, ainda seja possível encontrar diversas maneiras criativas e críticas de se apropriar do passado da cidade. Talvez abandonando os lugares comuns, possamos encontrar os lugares praticados pelos habitantes de Joinville que, de maneira astuta reinventam maneiras ler e interpretar o passado. Outra observação é que o segundo número da Revista do Arquivo Histórico de Joinville já foi lançado em 2010 e que o terceiro número, pelas últimas informações que tive, deve ser lançado ainda este semestre... Abraços caro amigo historiador. Sou seu leitor e um dos seus fãs.

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    1. Olá, Diego. Concordo com suas considerações: chamar Jville. de provinciana já é quase um lugar comum a que recorrem muitos - eu, inclusive - para muitas vezes economizar um debate mais atento e cuidadoso sobre a cidade.

      Não acho, apesar de considerar a cidade em muitos aspectos extremamente conservadora (e provinciana) que se possa defini-la tão somente por estas características. Há experiências recentes, principalmente no campo artístico (e penso, por exemplo, nos grupos de teatro atuantes na cidade; nas recentes produções cinematográficas; na poesia do Caco de Oliveira, etc...) a desenhar uma outra cidade.

      Acho, no entanto, que o provincianismo e conservadorismo, se não definem a cidade, contribuem para travar algumas mudanças necessárias, atrasar e inviabilizar outras. É o que acho, por exemplo, em relação à produção historiográfica: há muita coisa escrita nos últimos anos (inclusive sua dissertação) que mereciam e precisam ser lidas, e não são. Há uma espécie de "conspiração" a reproduzir um incômodo silêncio acerca da produção historiográfica que não aquela consagrada como oficial.

      No mais, não sabia do segundo número da RAHJ; falha minha, desculpe.

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    2. Como disse antes, sou seu fã. A leitura da tua dissertação, antes mesmo de virar livro, foi um marco importante em minha formação enquanto historiador e um grande estímulo para pensar a cidade de uma forma diferente. Tentei fazer isso na minha dissertação, ao problematizar as maneiras como a cidade de Joinville, no tempo presente, estava lidando com o seu passado. Certamente, muito do que escrevi não foi tão original, mas concordo com você quando diz que a minha dissertação assim como outras destas novas leituras sobre a cidade deveriam ser mais lidas por aqueles que aqui vivem. Este ano vou tentar publicar a minha dissertação em livro, quem sabe consigo alcançar mais alguns poucos leitores... hehehehehe...

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  5. Há muito tempo os cursos de História (não só em Joinville, mas no Brasil) mantiveram a ementa, mas adicionaram, em quase todas as disciplinas, uma perspectiva que infelizmente sem mantém até hoje: O Marxismo Desvairado. É mais ou menos assim: Pré-História, sob a perspectiva marxista; Idade Média, sob a perspectiva marxista; Idade Contemporânea, sob a perspectiva marxista, e por aí vai. Isso não está intrínseco na ementa, mas radicado no idealismo quase doentio dos catedráticos. Não sei ao certo quando o marxismo se enraizou nos cursos de Humanas (acho que nas décadas de 60 e 70 no século passado), mas creio que é no Brasil que ele ainda se mantém firme o forte, sobretudo nos departamentos de História, escondido e empoeirado. Para os historiadores é “chic” ser marxista, eles se acham mais intelectualizados porque leram as obras do Karl, além disso a Esquerda está na moda e parece que essa linha política virou pré-requisito para os que lecionam a disciplina. Óbvio que História não foi o único curso a se levar pelos devaneios marxistas, Geografia, Ciências Sociais, Filosofia entre outros também concorreram, mas esses últimos conseguiram se atualizar/reciclar. Vejam bem, o problema não está no marxismo, mas na ideologia cega de quem ministra as disciplinas que faz minar qualquer perspectiva do graduando. Quantos castos entraram para o curso de História com a inocência de, mais tarde, conquistar especialização em Povos Pré-Colombianos, em Antropologia, em Arqueologia (ou na história de Joinville!), mas tiveram seus sonhos apagados pela parcialidade política de seus mestres? Quantos graduados de História frustraram-se na política ou se transformaram em professores repetidores desprovidos de crítica porque só sabiam discutir sob a ótica marxista? Se o autor se formou no curso de História da Universidade da Região de Joinville, sabe que muitos dos seus colegas graduandos iam para a faculdade somente para “comer merenda” ou “beber na fonte”. Então, antes de culpar a nefasta sociedade provinciana de Joinville, que tal o autor fazer uma autocrítica sobre o tipo de profissional formado nos cursos de História?

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    1. Olá Anônimo 11 de maio de 2013 -21:46.

      Estou de cara com as suas considerações sobre a formação marxista que a UNIVILLE realiza no Departamento de História. Eu estudei no Departamento citado e me formei com uma leitura muito especial e única do marxismo.
      Eu tenho vido na minha memória a professora Raquel S.Thiago utilizando o materialismo histórico nas aulas de História de Santa Catarina. A professora Sandra Guedes costumava lecionar introdução aos estudos da História com olhar único do marxismo. A Janine usava a aula de Teoria da História para pregar o marxismo desvairado. O mesmo era feito pelo Piva, pelo Afonso, a Dúnia dos Anjos até usava a poesia para pregar o marxismo.....

      Mas na época eu fui inocente e não percebi essas coisas. Muito obrigado anônimo por mostrar a luz.

      Maikon K

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    2. Não tenho a paciência do Maikon: alguém que ainda acredita que os cursos de História pregam o marxismo desvairado é, na melhor das hipóteses, desinformado. Alguém que publica isso sem nem mesmo corar as bochechas, é na melhor das hipóteses um estúpido.

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  6. Concordo em parte com o Anônimo das 21:46. Eu e minha filha, então com 13 anos, assistimos um programa na Discovery (ou National Geographic, não lembro) sobre figuras históricas que mudaram o rumo dos acontecimentos. Naquele episódio o programa apresentava a biografia de Ernesto Che Guevara. Nem prestamos atenção no conteúdo do programa, pois minha filha prontamente começou a descrever sobre o militante, aonde nasceu, sua profissão, os acontecimentos em Cuba, sua participação com Fidel Castro até sua morte na Bolívia. Eu estava escutando atônito e orgulhoso pelas aulas que ela estava ministrando enquanto a série passava na TV. Como ela estava interessada em mostrar seus conhecimentos de História, comecei também a instigá-la:
    - E o que você aprendeu sobre o Mikhail Gorbachev e desmantelamento da URSS?
    -Acho que ainda a gente não teve essa aula.
    -E Margaret Thatcher, Ronald Reagan… Já ouviu falar deles? E a guerra nas Malvinas, isso foi recente.
    -Acho que não. Não lembro.
    -E Juscelino Kubitschek, esse você tem que saber quem foi.
    Ele demorou pra responder.
    Isso me deixou bastante intrigado. Como uma aluna aplicada da 7ª série desconhece ou não se lembra de figuras e acontecimentos tão importantes que marcaram época? Pois bem, na reunião de pais e mestres que aconteceu dois meses após nossa conversa fui questionar os professores de História e Geografia sobre o desempenho da aluna deles que tirava notas altas, mas que não se lembrava desses acontecimentos históricos. A professora de Geografia prontamente tirou o dela da reta, disse que a História é um complemento. Mostrou-me o conteúdo que estava transmitindo aos alunos e ficou por isso mesmo. Já o professor de História era uma figura, um rapaz de vinte e poucos anos, cabelão, vestia embaixo do jaleco fechado uma camisa branca com o busto do Fidel Castro com a palavra “VIVA”. Hahahahahaha. Eu não estava acreditando naquela cena. Solicitei a ele o programa das aulas e ele enrolou, enrolou e nada. Enfim, esperei minha filha terminar o ano letivo e a transferi de colégio. A questão é que eu não gostaria que minha filha fosse educada por um professor conservador, idem para outro de faz alusão ao comunismo em pleno século XXI. Cadê a parcialidade dos educadores?

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  7. Correção: cadê a INparcialidade dos educadores?

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  8. Dieter, vamos por partes, como diria Jack:
    1-) Você fez bem em transferir sua filha de escola se não estava contente com o que estavam a ensina-la. Faria o mesmo com meu filho.
    2-) A pautar-se pela sua descrição, sua filha tinha um professor de História ruim. Professores, e não apenas os de História, não são imparciais, eles fazem escolhas e seu trabalho é, em grande medida, informado por elas. Mas as escolhas, sejam elas teóricas, ideológicas, políticas, etc..., não devem servir de pretexto para a negligência profissional.
    3-) Há historiadores marxistas, assim como há historiadores de matrizes teóricas as mais diversas: foucaultianos, elisianos, bourdeulianos, arendtianos. Enfim, há quem prefira Marx e os marxianos, mas há quem leia e adote orientações teóricas outras.
    Afirmar, como afirmou o anônimo logo acima, que os cursos de História pregam o "marxismo desvairado" é uma daquelas tolices típicas de quem nunca passou perto da porta de uma sala de aula de um curso universitário e fica por aí a falar do que desconhece, muito provavelmente reproduzindo bobagens que leu em blogs de "formadores de opinião" que, igualmente, desconhecem o que falam e afirmam besteiras que serão repetidas por seus leitores, ignorantes uns e outros.
    Eu sou historiador e, acredite, Marx já não dita a matriz curricular dos cursos de História há muito tempo. Um exemplo? O medievalista mais lido nas graduações brasileiras é um francês chamado Jacques Le Goff, católico e conservador. Ele pertence a uma das correntes historiográficas mais influentes da última metade do século XX, inclusive no Brasil, a "escola" dos Annales, criticada por muitos marxistas justamente por sua postura teórica não marxista.
    4-) Por que, no fim das contas, todo mundo dá pitaco em História e se preocupa tão pouco com as Engenharias, por exemplo, faculdades onde a curto, médio e longo prazo os interesses e orientações políticos e partidários podem pesar tanto ou mais que nas chamadas ciências humanas? A resposta é simples: todo mundo acha que entende alguma coisa de História - até o Anônimo das 21:46, um beócio no assunto -, mas ninguém se arrisca a dar pitaco em conversa de engenheiro.

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  9. As 16;25 o Clovis tasca: " alguem que publica ... é na melhor das hipoteses um estúpido". Isso é que eu chamo de polidez historica.

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    1. Há quem merece polidez, e há quem merece ser chamado de estúpido. Pode chamar isso de "coerência histórica".

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    2. Menos Batista, menos.

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  10. Eu aprendi muito sobre "História", mas não foi em bancos de escolas porque o que ensinavam ali eram cópias de livros antigos e sem atualizações. E o papel aceita qualquer escrito...
    Aprendi ouvindo com as pessoas que participaram efetivamente do evento. Um exemplo é sobre o que aconteceu na Alemanha. Americanos e judeus contam a sua história e isso vai para os livros. Não estou aqui a defender o Reich, muito pelo contrário!! Até hoje os alemães são lembrados disto, mas ninguém fala do holocausto provocado pelos americanos no Japão, que até hoje sofrem consequências do ataque.
    Historiadores procurem conversar com pessoas que lá estiveram e sejam rápidos, porque o tempo destas pessoas é breve por aqui. Por incrível que parece há muitas pessoas para lhes falar.
    Outra: Será que algum livro de História vai fazer justiça com a Palestina?
    É o que eu digo, papel pode ser violado por uma caneta e não há borracha que apague as letras.

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    1. A bibliografia sobre a 2a Guerra Mundial é extensa e nosso problema (nosso, dos brasileiros) interessados no tema é que o mercado editorial daqui mal e porcamente toca o volume de material publicado sobre o assunto, e sob diversos pontos de vista - há desde os que defendem os ataques contra Hiroshima e Nagasaki, até os que criticam veementemente a ação americana. Pode-se dizer o mesmo sobre a Palestina.

      Mas se o acesso a historiografia é restrito, há outros meios e fontes que, principalmente no que tange ao ensino de História nas escolas básicas - fundamental e médio - tem servido como referências interessantes para se problematizar estes temas. Tanto o cinema quanto as histórias em quadrinhos já produziram coisas interessantíssimas a respeito e, no segundo caso, penso sobretudo em "Gen", uma graphic novel belíssima escrita sob o ponto de vista japonês, escrita e ilustrada por Keiji Nakazawa, e o trabalho de Joe Sacco sobre a Palestina, imprescindível.

      Pode-se objetar que não se tratam de trabalhos historiográficos e que não tem o mesmo valor científico. Eu concordo em partes: se não são textos historiográficos, nem por isso são menos valiosos no que testemunham sobre eventos passados. Quanto à validade científica, bom, quem disse que história é uma ciência, não é mesmo?

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