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Étienne de la Boétie |
POR JOSÉ ANTÓNIO BAÇO
Um dia destes citei, algures por aí, o livro “Discurso da Servidão
Voluntária”, de Étienne de la Boétie. E hoje vou retomar o tema, mas numa
variação da abordagem. Na sua análise, desenvolvida no século 16, o filósofo francês
mostrava a sua inquietação frente a um fato: pessoas que, de forma espontânea,
estão dispostas a abrir mão da própria liberdade.
La Boétie fala de uma realidade concreta. Ou seja, de pessoas que abrem mão
do livre arbítrio em favor de um tirano. É a partir desse ponto que me permito
fazer uma extrapolação, saltando para o plano abstrato das ideias: pessoas que
abrem mão da liberdade de pensar pela própria cabeça e se deixam tiranizar pela repetição uma arenga ideológica qualquer (ideologia no sentido
atribuído por Marx – de deformação).
NANISMO INTELECTUAL - A servidão
voluntária é para gente que, por razões de classe ou por simples abulia
política, se recusa ao motu proprio. Gente que prefere repetir o tatibitate de nanicos
intelectuais (tipo Reinaldo Azevedo, Rodrigo Constantino ou o astrólogo Olavo
de Carvalho) ou de projetos editoriais que sequer se preocupam em disfarçar os
seus objetivos políticos.
Na semana passada pude acompanhar a repercussão, nas redes sociais, de
matérias de dois meios de comunicação, a Veja e o Estadão, publicados quase em
simultâneo, sobre a prisão do ex-diretor da Petrobras, Paulo Roberto da Costa,
na Operação Lava Jato. E antes de continuar é importante lembrar que nem o
jornal e nem a revistona têm sido meigos com o governo de Dilma Rousseff.
UM FATO, DUAS LEITURAS - O título do
jornal atém-se ao fatos (“PF prende ex-diretor da Petrobrás citado na Operação Lava Jato”) e apenas
depois acrescenta que o homem chefiou uma das principais diretorias da
Petrobras. Já o título da revistona procura a jugular de Dilma Rousseff
(“Preso, ex-diretor da Petrobras é ‘caixa-preta’ da estatal”). E vai fundo
nessa linha ao dizer que o homem fez uma doação para o PT nas eleições de 2010.
A
matéria do Estadão mantém a sobriedade. O jornal dedica a maior parte do texto
a falar da operação policial, mas sem esquecer de falar na Petrobras na parte
final do texto. Para a revistona, o fato do dia parece não interessar. É apenas
o argumento para pôr o tema Pasadena novamente na agenda. E dedica apenas um simples
parágrafo no final do texto para falar da operação policial.
LEITOR QUE NÃO LÊ - É interessante como um mesmo
fato pode gerar alinhamentos de textos tão díspares. Mas isso interessa aos
leitores da revistona? Não. Porque eles se alimentam de restos de informação. E
fazem associações simplórias: “homem preso – Petrobras – Governo Federal – Dilma
Rousseff – PT – todos culpados”. Nada mais interessa.
E havia ainda a cereja no topo do bolo. A Polícia Federal apreendeu 700 mil
reais e 200 mil dólares em notas. Não demorou para muitos fazerem a ligação ao
PT, claro. Nem se preocuparam em saber se o homem estava a ser
preso pela associação a um doleiro. É a lógica dos intelectualmente servis: nem
tentaram imaginar a hipótese de doleiros terem muitos dólares e reais.
De volta ao princípio: no Brasil destes dias, o discurso da servidão
voluntária é o discurso dos que se limitam a repetir, adestradamente, um
discurso para lá de manjado.
Em tempo: não adianta tentar discutir Pasadena comigo. 1. Porque não é o
tema deste texto. 2. Porque não entendo nadinha dessa coisa de put option (e
nem a maioria de vocês).
Os links das matérias, que deveriam ser estudadas nos cursos de jornalismo: