terça-feira, 8 de abril de 2014

Fetiche, objeto e mercadoria

POR CHARLES HENRIQUE VOOS

Até o futebol americano feminino tem que ser "sexy"
O julgamento do caso Victoria Schier, a pesquisa do IPEA sobre o estupro e comportamento feminino, e a notícia recente de que ocorrem, em Joinville, quatro estupros por semana, chamaram-me muito a atenção nas últimas semanas. É notório que a questão de gênero no Brasil necessita ser debatida, visando uma equidade entre homens e mulheres.

Apesar do tema ser corriqueiramente tratado aqui no Chuva Ácida, sob vários aspectos, o assunto nunca cessa, pois o cenário ainda é desanimador. Há alguns meses tenho reparado com maior cuidado o jeito que a mídia trata a mulher, bem como o comportamento da sociedade nesta questão.

Ao passar pela BR-101 no Norte do Estado (caminho que percorro toda semana), verifiquei os outdoors espalhados pelas margens da rodovia. A quantidade de mulheres seminuas, em poses dignas dos melhores programas pornográficos da TV, exibindo um sexy appeal chega até a ser constrangedor. O mesmo ocorre nos comerciais de automóveis ou nos programas de auditório, com muitas, mas muitas mulheres exibindo seus corpos, produzindo na sociedade em geral (homens e mulheres) uma imagem fetichizada sobre o que é o corpo feminino: um reduto de satisfação e prazer a qualquer momento para uns, e modelo de perfeição impossível para outros (é só ver as capas das revistas).

Em consequência disto, a mulher vira um objeto. Objeto manipulável pela mídia, pela indústria do consumo e também pelas entrelinhas das relações de gênero. Mesmo que o IPEA relate um erro na pesquisa, ainda é assustador saber que 26% dos entrevistados culpam as mulheres pelo estupro. A culpa por este pensamento não deve ser dirigido somente às pessoas de maneira geral, mas também a quem as leva pensar assim O corpo da mulher é dela, e não deve se submeter à manipulação de nada e nem ninguém.

Por fim, o fetiche que virou objeto é uma boa mercadoria porque está impregnada na cabeça das pessoas. As marcas que se utilizam deste artifício usam e abusam do fetiche (à la Marx), colocando a mulher como um objeto a bel-prazer de quem puder consumir não somente o produto, mas também a ideia platônica de conquista da mulher perfeita, fechando, desta maneira, o ciclo.

Não é à toa que estupros sejam cada vez mais denunciados ou evidentes. Não é à toa que muitos culpam a mulher estuprada por “mostrar demais”. Não é à toa que as relações de gênero sejam iguais às de consumo, onde prevalece aquele que tem o poder de consumir os melhores objetos, e os mais apetitosos para seus fetiches. Se a mulher “mostra demais”, e é um “bom produto” que atende “o meu fetiche”, a culpa é dela que fez a “propaganda”, como nas centenas de outdoors, canais de TV, revistas, internet, etc.

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