POR CHARLES HENRIQUE VOOS
Independente da vitória de Dilma ou Aécio, nós, brasileiros, não temos o que comemorar. Convivemos nos últimos três meses com o pior extrato possível de nossa democracia, materializada na corrida presidencial. O que já estava ruim no primeiro turno descambou para o patético e mediocredade no segundo. A sétima eleição para presidente após a redemocratização só evidencia que ainda estamos longe de um debate democrático sensato, inclusivo e igualitário.
Em primeiro lugar, não tivemos uma campanha eleitoral justa. Partidos menores, por mais que alguns destes sejam fruto da incapacidade nacional na questão da reforma política, deveriam participar de forma igual aos demais, sem exclusão ou tratamento diferenciado. Não foi isso que vimos na mídia, a qual se deu ao luxo de criar regras estranhas e nada coerentes com o que se diz democrático, priorizando os três porquinhos que lideravam todas as pesquisas.
Pesquisas estas que, contudo, precisam imediatamente de novos preceitos metodológicos diante dos erros abissais cometidos. A regionalidade é um fator variável na hora de analisarmos o comportamento eleitoral do brasileiro, mas oa levantamentos feitos pareciam se esquecer disto. Não há como fazer pesquisa eleitoral sem essa premissa.
Presenciamos, também, o perigo que é o atual sistema de financiamento de campanhas. Conforme o que já é debatido há muito tempo, a democracia corre perigo pois ela é altamente dependente dos altos investimentos privados para a potencialização do sucesso eleitoral de um candidato. Sendo assim, as empresas que mais necessitam de ações governamentais são as que mais investem na esperança de obter favores políticos em licitações, concorrências públicas e políticas setoriais e de subsídios. Consequentemente, as campanhas mais poderosas são as que mais permeiam os debates e as rodas de conversas dos eleitores comuns.
No primeiro turno, medimos a qualidade da campanha eleitoral pela zoeira virtual. As propostas perderam lugar para as brincadeiras, comparações e o sarro tirado com os candidatos porque, estes, esqueceram dentro dos escritórios dos marqueteiros as propostas de melhoria do Brasil. Temas importantes como mobilidade urbana (estopim das manifestações de 2013), combate à desigualdade, saúde, saneamento e segurança pública quase não foram pautadas. O sistema de debates, engessado, arcaico e repetitivo foi o principal responsável, em conjunto ao horário eleitoral gratuito, o qual serviu mais como palco para piadas do Tiririca do que apresentação de idéias.
Sofremos com o aparelho excretor, com a homofobia, com o preconceito e o ódio. Nadamos contra o respeito pela opinião alheia, por mais que ela fosse contrária a nossa. Partimos para uma agressão social gratuita. Ataques pessoais entre amigos infestaram nossas relações sociais, como se fosse um crime pensar diferente. O conservadorismo da ditadura rondou o imaginário de muitos. O desconhecimento sobre comunismo, socialismo e os programas de transferência de renda também. Nossa capital virou Havana e nosso pior inimigo era o bolivarianismo. Esquecemos do que era melhor para o país em troca de uma cegueira combinada à ilusão. Deixamos Everaldos serem estrelas e Marinas marinarem em um espectro de comoção nacional. A ideologia deu lugar ao individualismo e "liberdade de expressão". Ao invés de debates, tínhamos massacres.
E no meio disso tudo um acidente aéreo que abalou todas as estruturas e fez a "nova política" ruir na incoerência retrógrada de sua nova líder. Eduardo Campos mal morreu e já foi esquecido como se sua trajetória política fosse transferida para um patamar de herói de BBB. O "não vamos desistir do Brasil" foi esquecido no segundo turno.
Tudo aquilo que circulava pela internet foi transferido aos ataques de Dilma e Aécio, que pareciam crianças que se xingam mutuamente só pra ver quem fica sem respostas. A miséria foi tamanha que o tribunal eleitoral foi obrigado a intervir.
Agora estamos perto da decisão. Todos querem ganhar mas nos esquecemos da vergonha alheia que foi todo o processo. Saímos derrotados, sem exceções. Enquanto essa oportunidade de discutirmos o que de fato queremos, maior a chance de não sabermos o que cobrarmos lá na frente e repetirmos o pastoreio de ovelhas de junho do ano passado.
Ainda bem que vai acabar e, no dia sefuinte, poderemos tomar consciência e construir um processo totalmente diferente ao presente, olhando para trás, sem repetir de erros, e um futuro construído organicamente pelas lutas nossas de cada dia.