quarta-feira, 26 de fevereiro de 2014

Os idiotas pelo nome


JOSÉ ANTÓNIO BAÇO
Sou a favor de conviver com pessoas que pensam diferente. O dissenso é sempre mais instrutivo que o consenso, porque obriga a considerar o interlocutor. Nunca me importei  de partilhar espaços de discussão com quem pensa diferente. Mas há limites. O problema é que há por aí muita gente que não simplesmente não pensa.

Tem uns caras que, pela falta de leitura e incapacidade de sistematizar pensamento, simplesmente limitam-se a repetir slogans mal-amanhados. E aí não há diálogo possível. Porque o embate entre argumentos articulados e clichês papagueados é uma injustiça para quem se dá ao trabalho de pensar.
Pergunto. É possível debater quando as pessoas usam este tipo de “discurso”?

-       Vai para Cuba.
-       Bandido bom é bandido morto.
-       Bolsa Presidiário: é você quem paga.
-       Vai para a Coréia do Norte.
-       É de esquerda, mas usa iPhone.
-       Ficou com com pena? Adota um.
-       Esquerda caviar.
-       Escreve um texto sobre a Venezuela (esse é um adiantado mental que infesta os comentários aos meus textos).
-       Acorda, Brasil.
-       Agora tem até Bolsa Prostituta.
-       Esquerda burra é pleonasmo.
-       É de esquerda porque é um fracassado.

Há muito tempo estabeleci uma regra pessoal. Só vou a debate com interlocutores que respeito e que se esforçaram tanto quanto eu para formalizar pensamento (e isso, garanto, significa ler muito, comer mundo, procurar a dialética dos fatos o tempo todo). Mesmo assim ainda era capaz de admitir o convívio com opositores. Só que encheu o saco.

Qual o objetivo deste texto? Nenhum. É apenas para dizer que a partir de agora passo a chamar os idiotas pelo nome: idiotas.

segunda-feira, 24 de fevereiro de 2014

Se o problema não é a falta de dinheiro, só pode ser a falta de gestão

POR JORDI CASTAN

Estamos tão acostumados a escutar a ladainha, acompanhada do choro das carpideiras profissionais, que acabamos acreditando que na administração pública nada funciona por que há sempre falta de recursos. Mas quando sobram recursos e as coisas tampouco funcionam é hora de analisar com maior critério o porquê desta incompetência contumaz.

No caso de Joinville, um caso interessante é o da iluminação pública. O excesso de recursos levou a administração anterior a “jogar dinheiro fora” (como é fácil mal gastar quando o dinheiro não é nosso). Foi feita a troca de todas as luminárias dos maiores eixos viários da cidade e de jogar no lixo as luminárias que até aquela data estavam funcionando perfeitamente. A troca de luminárias por outras de maior consumo não melhorou a eficiência energética, mas tentar explicar isso para um administrador público é como arar no mar. Havia dinheiro na conta da COSIP, então vamos gastar.

O jornal A Notícia, na coluna do jornalista Jefferson Saavedra, informou recentemente sobre os recursos arrecadados pela COSIP. “A COSIP tem trazido boa receita para a Prefeitura de Joinville. No ano passado, a contribuição cobrada na conta de luz passou de R$ 21,9 milhões para R$ 23,9 milhões. Dá e sobra para bancar a iluminação pública, despesa que fechou em R$ 16,3 milhões no ano passado (inclui manutenção)".

Como contribuição a Cosip não pode ser usada para outro fim que aquele a que está destinada. Mas qual é o objetivo de arrecadar R$ 5.600.000 mais do necessário em 2013? Numa situação que deve se repetir também em 2014. São recursos que saem do bolso do joinvilense e que acabam ou parados numa conta ou servindo para projetos dispendiosos como o da troca de luminárias na administração anterior.

Seria bom ver os recursos da Cosip direcionados a reduzir o custo da iluminação pública, a troca de luminárias por outras com leds, sem que isso represente desperdício de dinheiro público como frequentemente acontece. Excesso de dinheiro na conta não sempre é uma boa notícia para o contribuinte. O objetivo deve ser o de buscar uma COSIP justa e uma iluminação pública eficiente e econômica. A administração municipal não só erra ao não reduzir o valor da COSIP, erra também ao não promover uma política de redução energética que busque a eficiência.

Aliás a, ACIJ, entidade empresarial que o prefeito presidiu meia dúzia de vezes, tem feito da redução do consumo de energia e da melhoria da eficiência energética uma das suas bandeiras.  Quando se trata de economizar dinheiro dos empresários e de reduzir os custos para as indústrias o esforço vale a pena. Mas se o dinheiro for do contribuinte não há a mesma preocupação.

Uma vez evidenciado que no caso da COSIP há excesso de recursos e o serviço de iluminação pública e manutenção é terceirizado, a lógica deveria fazer deste um dos melhores serviços prestados ao joinvilense. Os dados da ouvidoria provam que não. Que este serviço é o campeão em reclamações.  “As luzes apagadas em postes em Joinville estão no topo das reclamações que chegam por meio da Ouvidoria da Prefeitura. Dos 12.518 pedidos feitos nos últimos sete meses, 11,2% foram sobre troca de lâmpadas queimadas ou estragadas.”



Voltamos ao início. Se nesse caso não há como alegar falta de recursos, a única justificativa lógica deve ser a da falta de competência. Portanto, se o caso é de incompetência, isso se resolve com gestão. Aliás, a gestão não era o mote da campanha? Logo aparecerão os comentários dos anônimos de sempre a dizer que ainda não deu tempo, que as criticas são extemporâneas. Que o homem precisa de mais tempo. Que as críticas viraram pessoais e outros chavões.  Oremos ao padroeiro dos incompetentes que parecem vicejar as margens do Cachoeira e entra governo sai governo permanecem firmemente agarrados as tetas do poder.

sábado, 22 de fevereiro de 2014

A onda


POR MURILO CLETO

Existe um erro categórico na pressuposição de que os movimentos contra o que se consideram injustiças venham exclusivamente da esquerda. Mas é verdade, por outro lado, que ondas conservadoras só tenham aparecido em momentos de significativa transformação social, como a que se consolida desde a última década no Brasil. 

Em 2011, o país atingiu o menor índice de desigualdade social da história. Entre 2001 e 2011, o crescimento real da renda dos 10% mais pobres foi de 91,2%, ao passo que entre os mais ricos a ascensão foi de 16%. Desde 2003, a economia brasileira cresceu 40,7%; enquanto o PIB, 27,7%. O resultado? Uma melhoria considerável da situação dos domicílios. Em 10 anos, o Bolsa Família tirou 36 milhões de pessoas da extrema pobreza.

Levando em consideração que o pior índice de igualdade social no país foi registrado em 1989, o avanço desde a instituição do Plano Real é mais do que surpreendente. No último ano do governo Sarney, a inflação acumulada chegou a 1764,86%, enquanto os 10% mais ricos do país detinham mais de 50% de toda a renda e metade do população dividia 10,56% dela. Mas se engana quem acredita que descende apenas da catastrófica gestão de Sarney este panorama assustador: como se sabe, o Brasil que primeiro fez crescer o bolo pra depois dividir esqueceu de completar a tarefa e, em 1976, o índice foi quase tão ruim quanto às vésperas da primeira eleição em quase 30 anos depois do regime militar.

O papel do Estado tem sido vital nesta atual guinada. Somente o Programa Bolsa Família é responsável por 13% desta redução da desigualdade, somada a 22% de outros repasses, incluindo aposentadorias e pensões. Apesar disso, mais da metade desta evolução na economia está atrelada à renda do trabalho, sobretudo o formal, que simplesmente dobrou desde 2004.

Apesar de ganhar ainda, em média, 40% menos, a população negra do país dobrou o crescimento da renda em relação aos brancos entre 2007 e 2010. Em 2001, 56% dos negros tinham geladeira em casa; em 2010, já eram 97%. Durante a última década, o acesso de negros à internet decuplicou. Em 10 anos, graças a política de cotas, triplicou o número de negros na Universidade. Entre 2002 e 2011, a renda das mulheres aumentou 68%, bem mais que o índice masculino referente ao mesmo período, de 43,1%, ainda que o desnível de gênero continue gritante. 

NOSTALGIA CONSERVADORA - Enquanto isso, uma onda tem tomado conta do país. É a que torce o nariz pra esse bolo que cresce e começa a se dividir ainda dentro no forno. Mais do que nunca, os veículos de comunicação estão tomados por uma reação nervosa diante disso. Inconformado com as políticas públicas do governo Lula, Diogo Mainardi deixou a Veja pra figurar entre os mais ilustres comentaristas da direita sofisticada no Manhattan Connection, exibido pelo GNT; Reinaldo Azevedo, outro ícone da rejeição a este movimento também migrou para a Folha de S. Paulo e a sua popularidade cresceu progressivamente; Rachel Sheherazade foi recentemente levada para a badalada seção Tendências e Debates do mesmo jornal para fazer um pout pourri sobre Cuba e o Primeiro Comando da Capital, passando pela Copa do Mundo e o Estatuto da Criança e do Adolescente, para justificar o seu posicionamento de "compreensão" diante dos "justiceiros" que amarraram um "marginalzinho" de 15 anos num poste do Flamengo; Lobão deixou de vociferar apenas no Twitter para ocupar as páginas da revista Veja e, dentre outras patacoadas, dizer que reclamam de tortura nos anos de chumbo aqueles que tiveram "umas unhazinhas arrancadas"; Demétrio Magnoli trilha o mesmo caminho quando se refere aos anos de chumbo como "ditabranda" e milita pelo fim da política de cotas.

Infelizmente, a onda não está somente nos jornais. Em Brasília, Aloysio Nunes quase aproveitou a esteira conservadora pra conseguir emenda na Constituição pela redução da maioridade penal. Nada menos que 93% dos paulistanos estão com ele, ainda que, nas estatísticas, os jovens sejam, na verdade, as maiores vítimas da violência. Somente em 2010, foram mortos 8.600 jovens no país. Em 2012, mais de 12.000 crianças foram vítimas de maus-tratos. Entre os adolescentes em conflito com a lei, apenas 8,4% cometeram homicídios. Na Fundação Casa, somente 0,9% deles estiveram envolvidos com latrocínio. Dos favoráveis à redução proposta por Nunes, 9% ainda defendem que a maioridade penal seja de 12 anos. No Congresso, tramitam 34 projetos que propõem mudanças na legislação sobre o aborto. 31 deles defendem o recrudescimento das políticas públicas sobre a autonomia da mulher na prática abortiva. É lá também que hoje um projeto de lei "antiterrorismo" figura entre as prioridades de uma lavra que se aproveita do clima de comoção nacional diante do descontrole do Estado frente às manifestações e criminaliza movimentos populares com critérios evasivos de jurisdição.

A onda não está somente em Brasília. Nas ruas, caseiros são espancados até a morte por serem confundidos com ladrões de celular e suspeitos de pequenos furtos amarrados em postes, assim como deficientes mentais pretos e pobres; professores de ensino superior ridicularizam passageiros que usam bermuda nos aeroportos; cobradores são chamados de "pretos safados" nos ônibus; "rolezinhos" nos shoppings são sumariamente proibidos, apesar da inexistente correlação alarmante entre a presença de seu integrantes nos espaços de consumo e quaisquer delitos; PMs praticam indiscriminadamente a tortura sobre os morros, enquanto comentaristas de portal exigem ainda mais violência contra bandidos

Enquanto a renda é redistribuída e recolorida, e o acesso a bens antes exclusivos de uma elite muito bem marcada torna-se cada vez maior, não parece muita novidade a onda reacionária que tem ocupado cada vez mais espaço nas ruas, aeroportos e jornais. No primeiro ano de Allende no Palácio La Moneda, no Chile, o aumento dos salários em relação ao custo de vida no ano anterior foi de 120%, em consonância com a triplicação na construção de casas populares, enquanto o boicote dos jornais era descarado e omitia escândalos de corrupção de governos e agremiações simpatizantes. 

Às vésperas de março, no Estado de S. Paulo, o general Carmelo Regis trouxe a solução para o incômodo manifestado pela onda a partir da última década de mudanças no Brasil: "As Forças Armadas continuam sendo a instituição de maior credibilidade no País, e isso se deve não apenas à eficiência, à noção de responsabilidade, ao trato da coisa pública, mas, sobretudo, aos valores morais que são cultivados em todos os seus escalões. A honestidade, a probidade, a disciplina e o empenho no cumprimento da missão são algumas virtudes que norteiam as Forças Armadas e que deveriam também ser exercidas pelos diversos mandatários dos governos de nosso país. O que, infelizmente, não ocorre." O Itaú já incluiu o evento no calendário. 

Desejo a todos uma ótima década de 60.

* Murilo Cleto é licenciado em História, especialista em História Cultural e mestre em Ciências Humanas pela Universidade Tuiuti do Paraná. Atua como coordenador municipal de cultura e professor do colégio Objetivo e do curso de História das Faculdades Integradas de Itararé-SP. Escreve para o blog Desafinado.

sexta-feira, 21 de fevereiro de 2014

RUDOCOP


Mudar de canal não muda nada

Quino, genial.
POR FELIPE SILVEIRA

É comum, ao criticarmos a imprensa ou a mídia, ouvir a sugestão “troque de canal”. Ela é válida, sem dúvida, mas não resolve nada. A imprensa – e a mídia – vai continuar sendo ruim, muitas vezes fazendo um desserviço à sociedade e tantas outras vezes ganhando dinheiro e poder com isso.

Mudar de canal ajuda, pois você está tirando audiência de quem faz errado pra dar pra quem está fazendo certo, supostamente. O problema é que nem sempre é assim. Os jornais do meio-dia, por exemplo, costumam ser inspirados naquele que tem mais audiência, mas com pitadas mais “populares”, o que também dá audiência. De olho nesse “ibope” popular, o primeiro copia esses concorrentes. E a coisa vai ficando cada vez mais ruim. Sorteios, concursos, matérias cada vez menos informativas,  nunca reflexivas, que visam estimular o consumo e dar status de celebridades aos apresentadores.

Mudar de canal não vai mudar a maneira com que a coisa é feita, e essa maneira tem reflexos na sociedade – e, assim, na vida de todos, inclusive daquele incomodado que mudou de canal. É por isso que as TVs e rádios são concessões públicas.

Vários fatores podem influenciar uma possível mudança na maneira como o jornalismo e a programação de TVs e rádios são feitos. Um público mais exigente – e isso tem a ver com a educação de modo geral – vai cobrar mais qualidade, que deve ser oferecida por profissionais mais preparados – e isso tem a ver com mais acesso aos cursos de comunicação, que devem ser melhores do que são atualmente. Esses profissionais precisam ser unidos, para cobrar e conquistar melhores condições de trabalho (salário, carga horária, diminuição da pressão a qual estão submetidos, tempo e segurança pra produzir melhor etc). E, claro, uma mudança na legislação para cobrar que as empresas ofereçam, de fato, um serviço público, e que não sirvam como peça de manobra de interesses políticos e financeiros.

Além disso, o que considero mais importante é a crítica. Mais do que um direito, criticar é um dever. Isso tem a ver, claro, com a questão do “público mais exigente”, mas não somente, porque essa também é uma questão de tempo. A crítica vai além. Entendo que é uma cobrança constante por mais qualidade, que deve ser estimulada interna e externamente. Às vezes é injusta, às vezes é dura e pode até desanimar. Mas isso acontece, em parte, porque estamos acostumados a evitá-la.

Jornalistas e profissionais da comunicação em geral devem estar abertos a ela, até porque parte do seu trabalho é criticar, direta ou indiretamente. Lidar de maneira inteligente com ela só ajuda a aumentar a qualidade do trabalho, mas para isso é preciso lidar com ela e estimulá-la. Lembrando que lidar de maneira inteligente também pode ser refutá-la.

Mudar de canal não é a solução.