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quarta-feira, 3 de outubro de 2012

Afastamento remunerado e o princípio da isonomia



 POR AMANDA WERNER

Tratar igualmente os iguais e desigualmente os desiguais, na medida de suas desigualdades. Eis o princípio da isonomia.

Nas eleições atuais, somente em Joinville temos 29 candidatos a vereador que são servidores públicos. Nestes dados, foram incluídos servidores públicos em geral e policiais civis e militares. Parece pouco? Comecemos novamente.

No Estado de Santa Catarina, somam-se 1874 servidores públicos candidatos, que disputam o cargo.

Em todo o Brasil, o total de servidores públicos pleiteando cargos políticos neste ano, corresponde a 53.249. Os dados são do TSE.

Por força de lei, os servidores públicos devem desincompatibilizar-se de suas funções públicas com alguma antecedência. O prazo de desincompatibilização varia de acordo com o cargo pretendido – presidente, governador, vereador, deputado, e também, de acordo com o cargo ocupado  se é servidor público em geral, ou se é autoridade, por exemplo. Para facilitar, vamos nos ater somente a quem pleiteia o cargo de vereador e pode ser considerado servidor público em geral.

O objetivo da lei, ao exigir a desincompatibilização, é o de impedir que o servidor público candidato faça uso da administração pública em proveito próprio. Evitar o chamado “uso da máquina”. É uma forma de dar cumprimento ao princípio da isonomia, ou igualdade, como preferirem. Assim, tenta-se dar aos candidatos o mesmo ponto de partida. Oportunidades iguais.

Ok. E já é um ônus imenso. E o cargo vacante? Muitas vezes, tem que se colocar alguém no lugar. Paga-se em dobro. Ou ainda, o cargo fica desocupado e onerando todo o serviço público. Aumentam-se as filas. O serviço fica atrasado.

Mas, como se isso não fosse suficiente, o servidor público continua recebendo remuneração, mesmo afastado do trabalho. Nesse caso, não me parece que o princípio da isonomia foi mantido.

Ora, para o candidato a vereador que trabalha em empresa privada  não há nenhuma lei dispondo sobre a tal licença. Ou seja, o funcionário de empresa privada não tem este direito. Além de arriscar perder o emprego, tem que se bancar.

Os servidores públicos candidatos estão sendo financiados por nós. Por toda a sociedade.

O pior de tudo, é que percebe-se que em grande parte das vezes, o candidato a vereador sabe que não tem a mínima condição de ser eleito. O único objetivo destes, me parece que é o de se alinharem à um partido político, uma coligação.

Ser “de um lado” , para os candidatos-servidores não-eleitos, passa a ser um pré-requisito para galgarem cargos dentro da administração pública, já que foram aliados políticos durante as eleições. Quando os tais cargos são conseguidos, e existe a presença dessas figuras na administração pública, nem sempre é exigido delas, o desempenho  com qualidade que se espera de um servidor público, que tem o dever da probidade, da impessoalidade e da eficiência. Pois o agente deixa de ser público, para ser político.

E quando não foi o seu partido que ganhou, não se esforçam para desempenhar a suas funções, muitas vezes como forma de “sabotar” a oposição. Entre servidores político-partidários opostos, há um acordo tácito: não me incomoda, que eu não te incomodo quando for a tua vez.  

E quando há servidores empenhados nas suas funções, e propõem mudanças, ficam travados, e os que travam, quando instigados ao trabalho, defendem-se dizendo que estão sendo perseguidos politicamente. Desta forma, ciclicamente, sempre os mesmos ocupam os cargos em comissão. E tudo “está como dantes no quartel d’Abrantes”.

Estes são sintomas de que nossas leis podem estar defasadas e devem ser revistas. Quem sabe a implantação de planos de cargos e salários na administração pública? Talvez fosse uma forma mais honesta do servidor buscar a ascensão profissional.

Significa que o servidor público não pode se candidatar? Não. Significa que ele não deveria receber durante o período do afastamento.

O servidor público é público. O nome já diz tudo. E está lá para servir a sociedade. E não para se auto-beneficiar por meio de mecanismos e brechas na lei.

quarta-feira, 20 de junho de 2012

Sob a proteção de Deus






POR AMANDA WERNER

“Em nome da Santíssima Trindade”. Assim iniciava a Constituição do Império de 1824, a primeira constituição brasileira. A religião oficial era a católica apostólica romana. O culto de outras religiões até era permitido, desde que de forma privada e sem  manifestações externas ao templo.

Oito constituições depois, muita coisa mudou. O Estado foi apartado da Igreja e não somente a liberdade religiosa foi consagrada, como também o caráter  laico do Estado.  Porém, a separação entre Igreja e Estado não foi suficiente para eliminar das notas de reais(R$) a expressão: "Deus seja louvado". Ou, ainda, do texto constitucional a parte do preâmbulo que expressa: "Sob a proteção de Deus".

Ora, dizer que o Estado é laico significa dizer que o Estado não é religioso. Também não é ateu. O Estado é neutro.

Em um julgamento ocorrido no Supremo, no ano de 2003, já foi declarado que a invocação da proteção de Deus não tem forca normativa. Significa que nunca poderá ser judicialmente exigida. Até porque, convenhamos, não há como exigir obrigações da divindade solicitada.

Você pode argumentar que não faz diferença nenhuma para você. Que invocar a proteção de Deus no preâmbulo da Constituição só traz vibrações positivas, coisas do bem, e, ademais, como não especifica nenhum Deus, não causa nenhum tipo de discriminação para qualquer religião.

Será? Há poucos meses, a Assembleia Legislativa do Estado de Goiás alterou o seu regimento. Agora é obrigatória a leitura de um trecho bíblico no início da sessões ordinárias. Não, mas não veja como imposição. Afinal, o parlamentar tem o direito de escolher qual trecho bíblico será proferido.

Com frequência, tem-se observado tentativas de intervenções religiosas no Estado. Prova disso são os argumentos religiosos utilizados contra o aborto, a eutanásia e, mais recentemente, o aborto de fetos anencéfalos.

Há ainda as “bancadas” religiosas no Congresso(qualquer semelhança com a nossa câmara é mera coincidência) que, pela sua maioria, acabam por impor o seu ponto de vista a toda uma sociedade, em detrimento do Estado e, por que não, da lei.

Embora não pareça fazer mal algum,  a simples citação da proteção de Deus no preâmbulo pode até não aludir nenhuma religião específica. Mas deixa claro que o Estado apoia algumas religiões: as que acreditam em um só Deus. Exclui do apoio do Estado as religiões politeístas e os ateus, o que contraria expressamente o princípio da isonomia, que afirma que todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza.

Concepções morais religiosas devem ser colocadas à parte na condução do Estado. Não significa dizer que as autoridades religiosas não devem ser ouvidas.  Estamos em um Estado laico, porém, fundado na democracia. Mas o Direito não deve se submeter à religião.

 Afinal, “dai a César o que é de César e a Deus o que é de Deus”.