sexta-feira, 24 de fevereiro de 2017

A história não tem vagina?

POR JOSÉ ANTÓNIO BAÇO
Há uma coisa importante sobre as palavras: elas são históricas, dependem das vontades humanas. E por isso muitas acabam distorcidas, outras interditadas. Numa sociedade historicamente dominada pelo macho e pelos moralismos, é fatal que certas palavras tenham desaparecido dos discursos na esfera pública. Muitas viram palavrão ou a sua pronúncia acaba considerada ofensiva.

Faz algum tempo, li um texto sobre um estudo que concluiu: a medicina fala pouco na vagina. Era uma reportagem interessante, mas o que chamou à atenção foi a reação dos leitores no site do jornal. Eram todos homens... e estavam todos indignados com o texto. Diziam que não era coisa de jornal sério. Dá o que pensar. Não é à toa que os sujeitos acharam estranho. Afinal, se a medicina fala pouco sobre a vagina, a imprensa fala ainda menos... considera tabu.

O apagamento da palavra vagina é coisa das sociedades machistas e moralistas, que sempre andaram muito preocupadas em negar o prazer às mulheres. Aliás, não pense que a clitoridectomia é coisa imaginada apenas por povos bárbaros africanos. Os puritanos que colonizaram os Estados Unidos também propunham o uso de substâncias químicas no clitóris para impedir que as mulheres tivessem prazeres solitários.

O fato é que a vagina tem história. Uma história que parece assustar os homens. Aliás, houve um tempo (em Homero e depois dele) em que se acreditava que os homens andavam arredados do processo de concepção. Havia a crença de que as mulheres eram engravidadas por seres microscópicos que se moviam ao vento e entravam no organismo feminino para a fertilização. Hoje a gente ri.

Heródoto narra que as mulheres egípcias embarcavam em canoas e mostravam as partes íntimas aos povos das margens do Nilo em sinal de chiste. Durante muito tempo, as mulheres somalis mostravam a vagina quando queriam ofender alguém. E já escrevi aqui mesmo sobre a imperatriz Wu Hu, que obrigava os convidados a darem lambidelas nas suas partes baixas.

Nem sempre a vagina foi tratada com tantos pruridos, como hoje em dia nas sociedades moralistas. É mesmo demonizada, uma coisa que vem desde os tempos da Inquisição. Aliás, em tempos mais recentes a ciência estabeleceu uma relação entre a histeria e a vagina. No final do século 19 e início do século 20, muitos médicos aderiram à técnica de masturbar as suas pacientes para curar a doença.

E vem da Itália um dos registros históricos mais curiosos. Quando foi deposto, Mussolini acabou preso pelos inimigos, que o executaram ao lado de Clara Petacci, a sua amante. O requinte da vingança foi pendurar o corpo dos dois numa praça de Milão. Mas como Clara estava de saias, os executores amarram as suas vestes, para que as suas partes íntimas não fossem vistas. Temiam os executores que a visão da vagina de Clara Petacci desviasse as atenções do povo para o que realmente importava: a morte de Mussolini.

O fato é que se fala muito no pênis, ao mesmo tempo em que há um grande silêncio sobre a vagina. É como se fosse um palavrão, uma coisa ofensiva. Aliás, qualquer um de nós, homens que têm internet, está farto de receber aqueles e-mails manhosos com a proposta de “enlarge your penis”. Mas duvido que alguém tenha recebido algum de “fit your vagina”. É ou não, leitor e leitora?

Uma história sem vagina é incapaz de gerar frutos.

É a dança da chuva.

9 comentários:

  1. Vagina, perereca, perseguida, prexeca, priquita, xana, xota, xoxota..mas prefiro chamar de buceta (inha) e penso q a mulherada também. Eita coisa boa!!

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  2. Ah, é! Em tempos de caça às bruxas, quando textos de Monteiro Lobato deveriam parar na fogueira, cantigas de ninar não são recomendadas por incitar maus-tratos aos animais e plantas ou marchinhas de carnaval têm as palavras pinceladas nas frases para que se destaque um tal significado subliminar, chamar a vagina de buceta é uma heresia. Xoxota então, nem pensar! É “vagina” em homenagem às feministas e feministos do CA! Tal qual nós, machistas-direitistas-opressores, sempre referimos nosso órgão genital por "pênis" ao invés de caralho, rola, pinto, pica...

    A buce... (ops!) vagina não tem um destaque merecido na história? Em que planeta o Baço vive?

    Eduardo, Jlle

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    1. Eduardo, eu estou a falar de um estudo e da imprensa. Não do puteiro vagabundo que frequentas.

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  3. Td que falamos demais se torna ridículo.
    Td que conhecemos demais perde o encanto, e td que é sagrado convém certo mistério.
    Quem sabe não seria este o real motivo do órgão sexual feminino estar escondido na história humana.

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  4. Bom feriado a todos!

    A esquerda agoniza!

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  5. "Aliás, qualquer um de nós, homens que têm internet, está farto de receber aqueles e-mails manhosos com a proposta de “enlarge your penis".

    Se recebes emails deste tipo, é pq teu histórico de buscas no google está te denunciando, Baço.

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  6. Este espaço democrático de idéias está se superando....KKKK

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