segunda-feira, 22 de janeiro de 2018

Sérgio Cabral e o canibal que come a própria carne

POR JOSÉ ANTÓNIO BAÇO
A transferência do ex-governador Sérgio Cabral, algemado, com os tornozelos presos por correntes e exposto aos cliques dos fotógrafos, foi um espetáculo repugnante. E que fique claro: não se trata de defender o ex-governador (a sua culpa ou inocência é atribuição da Justiça), mas sim de abordar um episódio indigno e que, visto de fora, empurra o Brasil para o estatuto de uma republiqueta das bananas.

É preciso também lançar um olhar para a reação dos indivíduos. É inquietante ver pessoas que, movidas por um moralismo revanchista, até comemoraram essa exposição medieval do ex-governador. “É bandido e bandido tem que estar algemando mesmo”, escreveu nas redes sociais uma apoiadora de Aécio Neves. É como se a sociedade voltasse aos tempos em que se humilhava publicamente as pessoas com piche e penas.

O ressurgimento da palavra “medieval” não é obra do acaso. Afinal, houve tempos em que as execuções públicas funcionavam como entretenimento para as populações. O que mudou? Apenas o lugar. As praças, espaço público de outros tempos, apenas foram substituídas pelas redes sociais. Mas o tempo passou. E se antes um ser humano podia ser exibido com troféu, hoje isso é apenas barbárie. 

O contrassenso que salta aos olhos. Os que embarcam nessa febre punitivista são os mesmos que vivem a reclamar um país moderno. Cegos pelo moralismo e pelo desejo de vingança, nem percebem que é exatamente este tipo de atitude que empurra o Brasil para o terceiro mundo. Ou alguém duvida que esse episódio jamais seria possível numa democracia madura?

Há uma clara sede de vingança. E o argumento é o dente por dente. Como salientou Barthes, é uma questão de “iludir os valores qualitativos, em opor aos processos em transformação a estática das igualdades (olho por olho, efeito por causa, mercadoria por dinheiro, vintém por vintém, etc.)”. Quer dizer, se ele roubou ou desviou dinheiro da saúde, da educação ou do saneamento básico, então merece ser degradado desta maneira. 

Tornar a transferência de um preso num espetáculo para massas famintas de vingança é um perigo. Já disse alguém que se começamos a usar a lógica do olho por olho, o risco é que um dia acabem todos cegos. Mas infelizmente o aviso parece não convencer os conservadores (reacionários) brasileiros. É que eles são como o canibal que come a própria carne e acha que está a se alimentar.

É a dança da chuva.


PS1: Se o ex-governador pegar 342 anos de cadeia, para mim é igual ao litro. Se os crimes forem inequivocamente comprovados, nada mais justo que ele pague por isso.


PS2: Segundo a lei “só é lícito o uso de algemas em casos de resistência e de fundado receio de fuga ou de perigo à integridade física própria ou alheia, por parte do preso ou de terceiros, justificada a excepcionalidade por escrito, sob pena de responsabilidade disciplinar, civil e penal do agente ou da autoridade e de nulidade da prisão ou do ato processual a que se refere, sem prejuízo da responsabilidade civil do Estado”.

4 comentários:

  1. O autor acha “medieval” o uso de algemas em condenados. Estranho, pois nos EEUU e na progressista Europa esse expediente é comum. Aqui; no caso de Cabral, o “receio de fuga” atende a necessidade.
    Mas sabemos o que Baço está mais preocupado com o que virá a acondecer com a deidade, caso ela seja condenada pelo TRF4. “Dane-se o Cabralzinho que F*** o Estado do RJ (com ajuda do então governo petista)!”

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  2. Num país onde a Ministra do Trabalho está com processo na Justiça Trabalhista. Diretor do DETRAN está com a carteira de motorista caçada, ninguém mais liga se o detento está ou não algemado!!!!

    Nunca deixamos de ser a Republiqueta das Bananas!!!!

    Como brincou Stallone quando veio filmar por aqui, "Você pode explodir o país e eles vão te dizer: Obrigado e aqui está um macaco".

    É a dança das bananas!!!

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