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sexta-feira, 22 de abril de 2016

Nos fios da teia #6















POR SALVADOR NETO

Feriadão, tudo calmaria... só que não! Vamos tecer alguns fios de acontecimentos dos últimos dias, afinal o que não faltam são piadas prontas, traições, pesquisas... Leia:

Linda, recatada e do lar – No esforço midiático para derrubar Dilma, a mulher durona, eis que a revista Não Veja publica matéria (??) sobre a mulher do vice Michel Temer, Marcela. Apostando na atual insanidade coletiva que mistura tudo, criou é milhares de reações das mulheres em memes dos mais variados nas redes sociais. Tiro no pé? Coitada da Marcela.

Do bar, do lar, onde quiser – A Não Veja e a coitada da Marcela receberam de volta um troco inteligente. Mulheres enviaram fotos com as mais variadas poses dando um chega prá lá no machismo gritante da matéria, escrita por uma mulher. Afinal elas podem ser o que quiserem,  ou não? Bolsonaro e muitos mais acham que não.

O Messias – Na votação da admissibilidade do impeachment, eis que surge ele, o arauto da violência. Bolsonaro, para alguns o melhor nome para presidir o Brasil (arghh) cuspiu apoios a ditadura, tortura, torturadores. Olhando as redes sociais, muitas mulheres apoiam o messias... como entender?

Para qual lado? – Afinal, de que lado estariam as mulheres? Seriam mais Marcelas, recatadas, lindas, do lar, dóceis? Ou mais Dilmas, guerrilheiras, corajosas, enfrentando o machismo nosso de cada dia? Discussão difícil, para sociólogo nenhum botar defeito. E jornalista também! Aceitamos opiniões.

Cai ou não cai? – Creio que a força econômica com raízes que vem do estrangeiro, derrubaram o governo Dilma. Há esforços, grandes até, mas será muito difícil reverter o quadro de traições que começaram há quase um ano com Michel Temer (PMDB), com a força do limpo Eduardo Cunha (PMDB). O Senado vai aceitar, julgar e cassar Dilma. Não sem luta, o que vai agravar ainda mais a crise econômica.

Acabou a corrupção - A massa que brada em redes sociais, entidades empresariais, clubes e nas ruas foi ao êxtase com a aprovação do impeachment na Câmara. Acreditam que acabaram com a corrupção. Só esqueceram de combinar com os master chefs do golpe que ficarão mandando no país: Michel Temer e Eduardo Cunha, ambos do PMDB. Presidente e Vice, que tal? O Brasil merece.


Acabou a Corrupção 2 - Além da dupla Temer/Cunha, não esqueçam, há os 367 deputados que aprovaram a abertura do processo contra Dilma. Eles vão apoiar a permanência de Cunha na presidência da Câmara, com resultado de não cassação dele no Conselho de Ética, e assim todos se salvam. Pelo menos por lá. E como já disse o Moro, em dezembro a Lava Jato acaba. Deixando toda a sujeira debaixo do tapete.

Estado mínimo – Quem apoia a processo golpista/parlamentar e não é da classe média/alta mais tradicional, não consegue enxergar o novo governo que estão desenhando Michel Temer e seus aliados de sempre, do PSDB com Aécio, DEM e outros. Políticas sociais sumirão, ministérios para mulheres, negros, minorias, idem. O estado mínimo está chegando. O choro será grande logo ali na frente, a hora que a miopia politica passar.

Estado mínimo 2 - O canto da sereia de controle fiscal, corte de gastos (o Estado gasta muito, etc) vai levar boa parte da população a crer que é a melhor saída para a economia voltar a crescer. Engano. Onde há Estado forte, há economia forte e direitos adquiridos são preservados. Onde ele é desmontado, desmontam-se as proteções aos menos favorecidos. A história ensina. Leia meu artigo "Já chega de pontes que nos levam ao o passado" que publiquei aqui dias atrás.



Na aldeia – Por Joinville, após as mudanças partidárias permitidas até 2 de abril passado, as alianças surgem e nomes também. Configura-se disputa abaixo da linha da cintura entre Udo Döhler (PMDB) e Darci de Matos (PSD), com Tebaldi (PSDB), Xuxo (PP), Carlito (PT) correndo por fora. As rejeições estão altíssimas.

Na aldeia 2 – No segundo pelotão estão Ivan Rocha (PSOL), Valmir Santhiago Jr (REDE) e outros menores para fazer legenda e eleger vereadores, de olho em 2018. Ainda podem pintar na corrida eleitoral Rodrigo Bornholdt (PDT) e Patricio Destro (PSB). Há desespero pelos lados da Prefeitura com tantos opositores, existentes, e os novos que vem por aí.

Na aldeia 3 – Os jacarés do rio Cachoeira, até eles, já sabem que pesquisas eleitorais agora servem só para fazer marola. Números de certo instituto ligado a um jornal regional dizem que Udo está na frente. Só se for da Prefeitura, dizem as garças que andam ao lado dos jacarés. Esqueceram de ir aos bairros, perguntaram somente aos nomeados.

Traições – Assim como Dilma em Brasília, a traição ronda o governo Udo. A coisa começa dentro do seu partido o PMDB. Ex-aliados por apelos do falecido líder LHS, Cleonir Branco e Alexandre Fernandes, ex-presidentes da sigla, não participarão da campanha. Pior que isso é ver que a lista de vereadores está reduzida, e fraca. Nada está tão ruim que não possa piorar. O PSB pode abandonar também.

Mãos limpas – A oposição a Udo Döhler já sabe que o lema mãos limpas vai ser o alicerce da campanha do peemedebista. É só o que há, por enquanto, para usar na tentativa de reeleição. Não há obras, nem gestão, nem remédios, nem asfalto, nem inovações. As pedras do rio Quiriri também sabem que pode surgir algo que bote tudo a perder neste alicerce. Veremos.


É assim, os fios da teia nas teias do poder...

segunda-feira, 18 de abril de 2016

Ontem o mundo viu o show da Xuxa



POR JOSÉ ANTÓNIO BAÇO

Não há muito a dizer sobre o sórdido espetáculo da noite passada. Rendido a um grupo de crápulas, o país deixou de lado qualquer espécie de escrúpulo. Não é difícil vaticinar o pior para o futuro. Mas o texto de hoje não vai falar sobre isso. A ideia é dar uma amostra da imagem que o Brasil está a passar para o mundo. Porque a pantomima não passou despercebida aos olhos da imprensa internacional.

No espanhol El País, a correspondente María Martins é quem traz a referência ao show da Xuxa e à patetice das declarações de voto. “Os deputados defenderam o impeachment de Rousseff pelos mais diversos motivos: "para minha esposa Paula", "para minha filha que vai nascer e minha sobrinha Helena", "meu neto Gabriel ", "a tia que cuidou de mim desde pequeno" "para minha família e meu estado " , "Deus" , " pelos militares [ golpe ] de 64, "pelos evangélicos ", "pelo aniversário da minha cidade", "pela defesa do petróleo", "agricultor", "pelo café " e até mesmo "pelos corretores de seguros no Brasil ".

E lembra que os reais motivos para a votação foram esquecidos. “Para trás ficaram as manobras fiscais, o verdadeiro motivo para abrir o processo, completamente esquecidas pelos nobres deputados. Exaltados ante o microfone, exprimiram até o último segundo de glória que, para muitos o plenário oferecia pela primeira e, quem sabe, última vez . Os parlamentares fizeram lembrar os telespectadores de Xuxa, que usavam a participação ao vivo no programa para sempre cumprimentar mãe, marido, amante, primo, neto, vizinho, amigos e até o goleiro".

O show da Xuxa também não passou despercebido ao francês Liberation, que publicou um texto chamado “Brasil : entre crianças, bugigangas religiosas e camisas de futebol, o dia incomum dos deputados”. O jornal fala em declamações, “por vezes tendendo à postura teatral, muitas vezes aproveitam a oportunidade de tomar o tempo e holofotes, ao vivo na televisão, para enviar mensagens pessoais, dando pouca relevância às operações fiscais formalmente imputadas Rousseff”.

O Libé prossegue e narra que “além das múltiplas invocações a Deus e a Jesus , havia também se opondo à liberdade sexual e outros reivindicando o oposto.  Palavras duras também foram dirigidas contra o controverso presidente Eduardo Cunha, considerado o eixo do processo de impeachment , e teve que, sem pestanejar, ouvir insultos como 'bandido', 'ralé', 'corruptos'".

Em texto no jornal português Público, o analista Manuel Carvalho não tem meias medidas. E descreve aquilo a que chama uma turba perigosa e sem escrúpulos. Durante três penosas horas, a Câmara dos Deputados em Brasília dedicou-se a debater a destituição da presidente Dilma Rousseff e transformou-se nesse lugar estranho onde subsiste o pior que há no Brasil: a política", escreveu.

O jornalista é implacável. “O deplorável ambiente de comício, a inacreditável facilidade com que se trocavam insultos, a essência do Estado laico a ser torpedeada por persistentes clamores evangélicos, o deboche egocêntrico que levou uns a citar os filhos e outros os lugarejos de origem (sempre deu para saber que no Maranhão existe uma Itapecuru) foram apenas mais uma prova de que o Brasil está entregue a uma horda de predadores a quem não se pode confiar uma chave de casa, quanto mais o destino de uma Presidente eleita. Entre as intervenções dos 25 partidos e as dos líderes das bancadas do Governo e da minoria, raramente se falou no que estava em causa”.


É a dança da chuva.

sexta-feira, 15 de abril de 2016

Um impedimento só não faz verão















POR SALVADOR NETO

Os brasileiros e brasileiras sofrem com uma crise econômica dura, amplificada pela crise política acelerada após a derrota do PSDB e aliados com seu candidato (?!) Aécio Neves. Ele perdeu para uma mulher, ex-guerrilheira, e isso deixou feridas não cicatrizadas. No Brasil a coisa é assim, dissimulada, mas é fato. Ele não admitiu a derrota para uma mulher. Simples assim. De lá para cá, sofrem os trabalhadores e trabalhadoras com esta briga sem fim, que acreditam na história da carochinha: se Dilma cair, tudo vai melhorar, vai mudar. É claro que não!

Já escrevi aqui no Chuva Ácida sobre o tema. Mas agora, quando deve acontecer a votação do impedimento da presidente Dilma Rousseff (ou seria impeachment, ou impitiman?) no final de semana, um processo que nasceu pelas mãos de Eduardo Cunha (PMDB) que tentou chantagear o governo e o PT para que não abrissem um processo contra ele na Comissão de Ética por... lavagem de dinheiro, corrupção, e outras coisas mais, é preciso gravar isso novamente. Afinal, há provas contra Cunha, contundentes, dinheiro na Suíça, mas o processo dele não anda. Mas contra a Presidente anda acelerado, insano, sem provas. A acusação não tem provas. E ponto.

Cunha, o corrupto, alia-se ao vice-presidente Michel Temer, ambos do PMDB, e conspiraram para derrubar o governo. Para isso contam com apoios em todos os partidos. Temer também já foi citado na Lava Jato. Não é segredo que a larga maioria dos deputados federais é investigada nos mais diversos tipos de processos, e com a aproximação da Lava Jato dos seus corruptores, partiram para o tudo ou nada.

Cid Gomes, que foi ministro relâmpago da Educação, disse tudo em discurso na Câmara dos Deputados em março de 2015. Ali havia 300 a 400 deputados achacadores. Todos, pelo que vemos hoje, filhos do... Cunha! E apadrinhados por Temer, que já se vê Presidente.


Com forte e histórico apoio dos grandes grupos de comunicação do pais, das entidades empresariais que financiam movimentos contra o governo, de parte da Policia Federal e MPF, e até da OAB – mais uma vez manchando a sua história – a população foi bombardeada com informações (??) dirigidas, de má fé editadas, tentando fazer crer que a presidente é criminosa. Não encontraram nada concreto, verdadeiro, e criaram as pedaladas, etc. Tudo historinha para inglês ver, e para enganar brasileiros que não acompanham a politica, não conhecem a história. E enganaram.

Escrevo antes da provável votação do processo de impedimento da Presidente, e sinto pena da nossa gente porque vamos cair, em caso de aprovação, nas mãos dos mais corruptos da nossa política. Temer, o traidor geral da República, e seu quase vice Eduardo Cunha. Uma dobradinha que vai entregar o resto do que temos no Brasil, além dos direitos dos trabalhadores e trabalhadoras tão duramente conquistados.

Mas o povo não consegue enxergar o objetivo final. Talvez até tenha que passar por isso para um novo aprendizado. O possível impedimento de Dilma não vai resolver os problemas do país. Quem vai mandar são os mesmos deputados achacadores, sob o comando dos grandes chefes.


Portanto minha gente, não haverá ganhadores entre nós aqui na planície. Há pessoas até bem intencionadas, chateadíssimas com a corrupção, a crise, mas sinto informar: um impedimento só não vai trazer o verão de volta. E tem um agravante: rasgarão a Constituição Federal, interrompendo um mandato conquistado no voto. E isso é grave para a nossa jovem democracia.

A saída é mudança total do sistema politico brasileiro, impedindo essa engrenagem nociva de financiamento de políticos por parte de empresas e empresários que transformou a nobre política na política de negócios. E eleições, no voto, pois é assim que se faz nas democracias, voto popular.


Não há Presidente e governo que resistam ao sistema atual, corrompido, velho, velhaco, falido. E a crise econômica não vai mudar com a derrubada de Dilma gente. Não se enganem. Impedidos ficaremos nós ainda mais com a possível chegada da dupla Temer-Cunha ao Planalto. E será tarde para chorar o leite derramado. Anotem e confiram.


É assim nas teias do poder...

quinta-feira, 7 de abril de 2016

Gesto político, retórica jurídica

POR CLÓVIS GRUNER

Não eram poucos os que achavam, há até poucos dias, que o impeachment de Dilma Rousseff era certo. A corroborar com essa percepção, a disposição manifesta do presidente da Câmara dos Deputados, o deputado Eduardo Cunha, réu no STF, em não apenas acelerar o rito parlamentar, mas conduzi-lo de forma a facilitar a decisão favorável pela abertura do processo e seu encaminhamento ao Senado. Nos últimos dias, no entanto, uma sequência de eventos deixou incomodado quem é favorável ao impeachment, e tinha pressa em votá-lo. Destaco dois.

O primeiro foi a decisão do ministro do STF, Marco Aurélio Mello, de dar prosseguimento ao pedido de impeachment do vice-presidente Michel Temer, decisão que contraria os planos do PMDB e da oposição, que já articulava com o vice um eventual futuro governo: em entrevista à Folha, José Serra defendeu que Temer deveria montar um “governo extraordinário” para contornar a crise. Ciente da possibilidade de que o futuro presidente talvez não seja Temer, mas Cunha, voltou atrás: o impeachment, disse mais recentemente, não é suficiente para resolver a crise.

No começo dessa semana, o Advogado Geral da União, José Eduardo Cardozo, foi ao Congresso apresentar, diante da Comissão Especial, a defesa do governo. Ex-ministro da Justiça, onde teve atuação medíocre, Cardozo fez agora a lição de casa, e ao longo de aproximadamente uma hora e meia tratou de desconstruir os argumentos da acusação, assinada por Hélio Bicudo, Miguel Reale Jr. e a jurista neopentecostal Janaína Paschoal. E acusou Eduardo Cunha do crime de desvio de função, ao usar seu mandato e condição de presidente da Câmara, para vendetas contra o governo.

O paciente ainda respira – Se tomados isoladamente, os dois eventos já bastam para fragilizar a hipótese do impeachment. Mas não é só. As tentativas de associar o governo Dilma às investigações da Lava Jato, ligação que a rigor nunca existiu, se mostram cada vez mais ineficientes. Além disso, as manifestações dos dias 18 e 31 de março sinalizam que, mesmo fragilizado, o governo ainda respira, e que o impeachment está longe de ser unanimidade: mesmo entre vozes que discordam de que está em curso um golpe de Estado, cara ao governo e aos governistas, não são poucos a apontar o caráter viciado e desvirtuado do processo.

Talvez isso nos ajude a entender a insistência com que alguns veículos de comunicação, formadores de opinião e juristas vem ocupando espaços privilegiados na tentativa de deslocar a discussão para o campo jurídico, mais árido e, por isso, também impenetrável para uma parcela expressiva da população. A intenção é fazer crer que o que está em curso é um problema legal quando, na verdade, se trata de uma disputa eminentemente política. A própria denúncia não escapa a isso: o corpo principal do documento, um calhamaço de 65 páginas, é um arrazoado dos discursos pró-impeachment de entidades como o MBL e o Vem Pra Rua e, não por acaso, seus respectivos dirigentes, Kim Kataguiri e Rogério Chequer, são signatários do documento.

Nele, entre outras coisas, lê-se que a “motivação e o conceito de julgamento dos juízes [os deputados federais] no processo de impeachment são exclusivamente políticos, apesar do sólido respaldo jurídico demonstrado nesta denúncia”, contrariando o preceito legal segundo o qual, o impeachment é um rito político e jurídico. O festival de atrocidades prossegue: a “natureza preponderantemente política do processo de impeachment”, diz o documento a certa altura, “permite que os parlamentares, inclusive, levem em consideração ilícitos que venham a ser desvendados, após a apresentação da denúncia, sem necessidade de aditamento”, o que é falso, mas serve como mote para que sejam incluídos, como “provas”, entre outras coisas, que Dilma entregou o país a “um ex-Presidente, que precisa explicar à nação sua riqueza acumulada”. O viés político é ainda mais gritante quando seus autores apelam à pesquisa realizada pela Folha de São Paulo e ao número de assinaturas “colhidas pela plataforma www.proimpeachment.com”, a dar testemunho, ambos, que o impedimento é incontornável.

A política do espetáculo – Publicado no final dos anos de 1960, “A sociedade do espetáculo”, de Guy Debord, chamava a atenção para o papel desempenhado pelas imagens na espetacularização da vida pública. Para o pensador francês, das relações interpessoais à política, tudo foi espetacularizado e tornado mercadoria. Contraponto crítico à visão algo apocalíptica de Debord, o intelectual norte americano Henry Jenkins defende, no que chama de “cultura da convergência”, um olhar às novas mídias, especialmente as digitais, atento à sua dinâmica participativa e interativa. Para Jenkins, a informação deixou de ser monopólio de alguns poucos veículos; ela circula e é consumida por públicos distintos e em plataformas midiáticas as mais diversas.

As duas perspectivas, me parece, convergem e podem fornecer uma interessante chave de leitura para nosso processo político. Em linhas gerais, meu argumento é que a denúncia contra Dilma se apresenta como um discurso político porque seus autores sabem que, em tempos onde as mídias alternativas reproduzem e compartilham gestos políticos, configurando seus sentidos, é preciso falar a língua das multidões virtuais. Se o processo é político, e se Dilma será julgada não pelo que estabelece a Constituição, mas com base no número de assinaturas de uma plataforma virtual, não há incoerência em tentar emprestar algum grau de legitimidade jurídica a um gesto que é, sabemos, político.

Ao mesmo tempo, tal legitimidade é importante porque ajuda a encobrir os muitos vícios do processo. A começar pelo fato de que 31 dos deputados que julgarão Dilma Rousseff são investigados por corrupção, e um deles, Eduardo Cunha, que como presidente da Câmara conduz o processo, é réu no STF. A luta, portanto, não é pela normalidade constitucional, mas pela sobrevivência política. Além disso, as pedaladas fiscais – único argumento jurídico da denúncia – não são suficientes para justificar o impeachment, entre outras coisas, porque mesmo entre juristas está longe de existir consenso sobre serem elas, de fato, um crime de responsabilidade tal como previsto na Constituição.

Ainda sem respostas – Frágil, mas não inteiramente descartada, a tese do impeachment só se justifica e sustenta, portanto, politicamente. A mim, parece cada vez mais claro que a permanência ou não de Dilma à frente do governo independe de argumentos jurídicos, porque o que está em curso é um embate político e partidário. Ciente do que está em disputa, o governo joga com o que tem, negociando no varejo cargos em troca de votos, na tentativa de recompor uma base “aliada” (as aspas são fundamentais aqui) depois de ter sido abandonado pelo PMDB, sócio no condomínio da governabilidade ao longo da última década.

Se a farsa do impeachment não resolve a crise, a verdade é que tampouco a continuidade do governo Dilma oferece solução a ela. Especialmente porque, se permanecer no Palácio do Planalto, o PT governará em condições ainda mais frágeis, tendo de enfrentar um descontentamento popular que não dá sinais de recrudescer a curto prazo, um congresso e uma oposição ainda mais hostis e ressentidos com uma eventual derrota, e tendo de pagar a fatura da governabilidade cedendo à pressões de partidos como PP e PRB, de um fisiologismo ainda mais escancarado e vergonhoso que o do PMDB.


Na prática, e salvo alguma mudança abrupta de rumo, o governo Dilma acabou, independente se o mandato se encerra agora ou em 2018. Aqueles que, como eu, são contrários ao impeachment, resta saber se vamos sustentar, em nome de uma difusa e genérica defesa da democracia e do Estado de direito, um governo agonizante, ou ao menos estamos dispostos a pensar em alternativas que, no limite constitucional e sem ferir de morte nossa frágil democracia, apontem algum caminho possível que não o da mera continuidade. Uma coisa me parece certa: dessa vez, a saída não é a conciliação. Não é mais possível superar a crise sem traumas.

terça-feira, 29 de março de 2016

É golpe, sim senhor!



POR JOSÉ ANTÓNIO BAÇO

Há um movimento que tenta dar um ar de legitimidade ao golpe. Os articuladores do impeachment já entenderam que Dilma Rousseff não vai renunciar – o que faria o golpe parecer legítimo – e agora tentam construir uma narrativa própria. A intenção é criar um discurso que inocente a palavra “golpe”. Não adianta. Golpe é golpe. Quem adere ao golpe é golpista. E golpistas odeiam a democracia.

Nos últimos dias, surgiu uma meia dúzia de juristas pingados a defender a tese de que impeachment sem crime não é golpe. Traduzindo o palavrório: é conversa para boi dormir. Por mais gente togada que apareça a dizer o contrário, golpe é golpe. Essa gente quer esculhambar o estado de direito. A construção da tal narrativa em juridiquês só tem um objetivo: dar um álibi moral para os sacripantas cívicos. “Não é golpe, é legal”, dirão aliviados.

A “gente de bem” que adere ao golpe vive numa espécie de terceiro mundo mental. Não importa se o impeachment está a ser articulado pela pandilha Temer-Cunha-Aécio-Serra, políticos de caráter duvidoso (para ser simpático) e sobre os quais recaem indícios mais que suficientes para serem investigados. Mas se for para apear Dilma Rousseff do poder, os adesistas do golpe não se importam de chafurdar na mesma lama. É o grau zero da moralidade.

Os golpistas se esforçam por construir uma narrativa auto-indulgente. Mas é gato escondido com o rabo de fora. Não dá para disfarçar, apesar da ajuda sentenciosa de velha imprensa nacional. Em sentido contrário, no exterior a comunicação social despertou para o tema e denuncia a existência de golpe. A palavra começa a aparecer cada vez com maior frequência nas manchetes dos jornais. A opinião pública mundial também começa a acompanhar essa tendência.

E, por fim, que tal um exercício de imaginação? Se Dilma Rousseff for impedida, como será o dia seguinte? Os políticos articuladores do golpe, por terem uma agenda própria, já sabem o que vão fazer. Tremei, incautos! Mas e a tal “gente de bem” que se deixou manipular e aderiu à narrativa golpista? Terá noção do que aconteceria no dia a seguir ao golpe? Pensem. Porque se pensarem vão perceber que a agulha da bússola não está a apontar para o Norte.


É a dança da chuva.

A imprensa internacional chama o golpe de golpe