quinta-feira, 2 de julho de 2015

Bom dia, Sudão







POR JOSÉ ANTÓNIO BAÇO


UM ENQUADRAMENTO – A idade penal em Portugal é 16 anos. Há uma tendência na sociedade – políticos, juristas, militantes das causas civis – no sentido do aumento para 18 anos. A proposta tem a curta oposição de alguns democratas cristãos (?), que pretendem reduzir para 14 anos. No entanto, é um tema que não desperta discussões e passa praticamente despercebido pela maioria da população.

Por que usar o exemplo de Portugal? Porque é um dos poucos países da Europa onde os conservadores conseguiram impor a redução. Há uma salvaguarda. Um regime especial prevê a separação dos delinquentes jovens, entre os 16 e 21 anos, dos demais reclusos. A preocupação é evitar que a prisão se transforme numa “escola do crime”. Mas por que o tema não mobiliza a sociedade? Porque daí não vem grande mal ao mundo.

Há muitas respostas possíveis, mas vou pôr o foco numa delas. Um adolescente português com 16 anos de idade já tem pelo menos 10 anos de escolaridade. Em Portugal, a escolaridade é obrigatória até ao 12º ano (segundo grau no Brasil), o que implica numa permanência na escola até aos 18 anos. Os jovens são protegidos pelo Estado, que é obrigado a prover o direito à educação. É apenas um fator, mas faz enorme diferença.

Primeiro veio a educação e a proteção, o que tornou a punição quase desnecessária. Isso explica o fato de ser um não-assunto das sociedades mais desenvolvidas.

BANDOLEIROS DO SUDÃO – No Brasil é o contrário. Em vez de falar em educação, opta-se pela punição. Mais do que isso, opta-se por uma vingança contra um alvo que, para complicar, é um alvo errado, como denunciam as estatísticas. Mas não interessa debater a redução da idade penal. O tema foi esquadrinhado nos últimos meses e os argumentos foram levados à exaustão. A questão é apodrecimento moral do Brasil.

O país caminha perigosamente para o obscurantismo e parece determinado a se tornar um enorme Sudão. O vergonhoso processo de aprovação, conduzido por Eduardo Cunha e coadjuvado por um bando de deputados mercadores (num dia dizem uma coisa e poucas horas depois recusam a própria palavra), é exemplo claro disso. O Congresso Nacional parece ter se tornado uma terra de bandoleiros da ética.

A incipiente democracia brasileira está cada vez mais insipiente. Em nenhuma sociedade desenvolvida – e estou a falar de democracias mais maduras – o povo admitiria que um dos seus máximos representantes protagonizasse golpes contra democracia, como faz Eduardo Cunha, com desassombro. O pior? É contar com o apoio da populaça, que embarca alegre no conto do vigário (no caso pastor) e do discurso fácil do ódio.

Eis o fato: no que se refere à democracia, em apenas seis meses o atual Congresso Nacional conseguiu fazer o país retroceder a níveis inimaginados até pelos mais pessimistas. É mau demais. O fascismo espreita.


É a dança da chuva.

12 comentários:

  1. Na última década a violência no Brasil só fez aumentar. Dizem que falta educação de base, e eles têm razão, pois enquanto o governo federal se vangloria dos números maquiados do IDEB, o Brasil é rebaixado a cada ano no comparativo com outros países.

    Ou seja, o que era para ser minimizado com a redistribuição de recursos da educação para Estados e Municípios nos últimos 12 anos, não ocorreu. A população deveria, então, esperar mais uma década para que a política da “Pátria Educadora” (que diminui os recursos da educação) dê resultado, enquanto a ela continua a mercê de criminosos protegidos pelo ECA?

    Interessante que os defensores da manutenção da maioridade em 18 anos dizem que os crimes cometidos por jovens menores não passam de 1%. Mentira! Primeiro porque o governo não tem dados estatísticos oficiais, segundo, porque levantamentos semelhantes em países como EUA, Grã-Bretanha e Uruguai apontam que os crimes cometidos nessa faixa etária variam de 16% a 18%. Ontem, num ato de desespero, o ministro da justiça disse que se a diminuição for aprovada, cerca de 30 a 40 mil jovens com idades inferiores a 18 anos poderão adentrar nos presídios. Por si só esse montante é bem mais do que o 1%.

    Dizem os defensores da manutenção de 18 anos que o assunto precisa de mais tempo para ser discutido. Bobagem! A proposta está para ser votada desde o início da década de 90. Teve tempo suficiente para discussões.

    A aprovação da diminuição para crimes hediondos deveria ser apoiada pela maioria dos brasileiros, e é! Segundo várias pesquisas, 9 em cada 10 brasileiros apoiam esta medida.

    Dizem os defensores que a diminuição da maioridade colocará os jovens na “escola do crime”. Pergunto: alguém que estupra, mata, esquarteja ou sequestra, independente da idade, vai aprender mais o quê na prisão? Ao invés de correr o risco de mandar um homicida para o reformatório por seis meses (dependendo da situação da instituição), é preferível adiar o retorno de alguém que não está apto a voltar à sociedade, encarcerando-o por 12, 15 anos.

    As condições dos presídios brasileiros são ruins, mas isso não é problema da população, pois ela já paga impostos para a construção e manutenção. Os delinquentes sabem do inferno que os espera caso cometam esses tipos de crimes, então as chances de eles puxarem o gatilho ou desferirem as facadas vão diminuir consideravelmente.

    O Estado brasileiro não tem mais condições de proteger a população. A população está desesperada, ela não quer resultados para a próxima década, ela quer resultado para hoje. A diminuição da maioridade é primeiro passo de uma série de medidas a serem aprovadas, entre elas o aumento do tempo de internação para jovens infratores e o aumento da pena para o aliciamento de menores.

    Eduardo, Jlle

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  2. Pelo jeito Baço os que caem no conto do Pastor o fazem livres de quaisquer pudores, simplesmente omitindo dados e estatísticas, e o pior: assim como aquele decrépito comentarista da TV catarinense da escola Datena, discursam trajados de cuecas furadas, sujas e cagadas. E são os mesmos que vomitam nas redes diariamente pelo Estado mínimo, isto que é o pior...

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    1. O Estado é o culpado por isso.
      Ou é o Estado ou é gente como você!

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    2. A Venezuela tem um Estado máximo. Esse exemplo lhe faz sentir melhor, Gilberto?

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    3. Islandia, Suécia, Dinamarca também tem Estado máximo, qual é o problema cara pálida? Serem recortes de Felicianos e Bolsonaros é um elogio prá vcs...

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    4. Ah, mas estamos mais próximos da Venezuela do que dos países nórdicos. E eu não estou me referindo a proximidade geográfica.

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  3. Às vezes me pergunto se o Eduardo existe de verdade ou se é só um monte de recortes do Bolsonaro e do Feliciano.

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    1. É, eu temo as pessoas “bondosas” como você, pois o inferno está cheio delas.

      Eduardo, Jlle

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    2. A parte boa é que teremos a eternidade pra dialogar e debater no inferno, quem sabe talvez cheguemos até a um meio termo.

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  4. Não esquecemos do princípio da isonomia. Se um jovem pode votar e escolher os seus representantes como um adulto, porque não pode responder pelos seus crimes como um adulto?

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    1. Por causa de três sílabas mi mi mi.

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    2. Isso aí! Concordo, Voto somente aos 18 e de preferencia facultativo para todos.

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