terça-feira, 6 de agosto de 2013

Reintegração de posse [2]

POR JORDI CASTAN

O post de terça-feira passada tinha como objetivo inicial propor um debate sobre o estado de abandono do patrimônio público. A ideia era falar sobre a forma como é tratado, de forma sistemática, o patrimônio público e o pouco que a sociedade parece preocupada com este descaso. No caso da Cidadela Cultural, havia um componente adicional: o uso a que o imóvel estaria destinado e a forma como o setor cultural, de um lado, e a sociedade em geral, do outro, se relacionavam com o espaço.

O post originou diversas reações e comentários, tanto aqui no blog, como também no Facebook. Tinha muito interesse em acompanhar como o leitor perceberia o tema e quais as implicações que os dois pontos abordados, o patrimônio ou o aspecto cultural, poderiam trazer à tona.

O tema do estado de abandono do patrimônio público tinha inclusive sido abordado pelo Charles Henrique, num post sobre a antiga sede da Prefeitura e a sua grafitada. Eu mesmo tinha preparado um texto sobre o mesmo tema, desde outra perspectiva diferente, e acabei publicando com o título "O essencial é invisível aos olhos".

Graças aos comentários dos leitores, o abandono do patrimônio ganhou corpo no debate, passando da falta de manutenção até a ausência da mais elementar regularização documental, desde as escrituras aos alvarás. A lista cresceu e praticamente nenhum prédio público ficou fora da lista. Nem museus, nem o Centreventos, nem o Mercado Municipal ou a Casa da Cultura se salvaram. O que já é uma prova clara que o abandono é algo inerente ao próprio poder público e que perpassa as diferentes administrações.

É ainda de se imaginar o que deve acontecer com as centenas ou milhares de outros imóveis e bens de propriedade do município. Em que estado se encontram - se é que se encontram. A velha prática de que o que é público não é de ninguém cabe aqui como uma luva.

FISCALIZAR - Destacar aqui também a omissão cúmplice dos vereadores: entre as centenas de pedidos de informação que os nossos legisladores fazem, pelos motivos mais peregrinos, nenhum referente à situação dos prédios e bens públicos, nenhuma palavra sobre ao seu estado de abandono. O legislativo não cumpre a sua função de fiscalizar o executivo e exigir que zele pelo patrimônio dos joinvilenses.

Outro aspecto, porém, acabou me surpreendendo, apesar de já tê-lo previsto no esboço inicial do texto: o aspecto cultural. O hábito de investir em estruturas físicas e não dar a menor atenção ao seu funcionamento, sua manutenção e sua operacionalidade. Como já citei no texto, “tampouco a simples cessão de uso dos diversos espaços a uns e outros parece a melhor solução, porque a soma das partes neste caso é menor que o todo.”  E essa é uma armadilha típica em que é fácil cair. Loteando os diversos espaços da Cidadela para uns e outros, o poder público faz de conta que cumpre o seu papel e na verdade não o faz. A administração opta sempre pela lei do menor esforço, por aquilo que dá menos trabalho e evita fazer o que é melhor. Foge, como o diabo da cruz, de qualquer coisa que represente trabalho ou esforço. E o resultado salta aos olhos.


TEATRO - Maikon K, leitor assíduo do Chuva Ácida, sentiu-se citado, assumiu as mágoas da AJOTE (Associação Joinvilense de Teatro) e reivindicou o direito que esta associação tem de utilizar um galpão na Cidadela para suas apresentações. Particularmente tenho assistido a, no máximo, duas apresentações de teatro no local.
Confesso, sob risco de ser queimado em praça pública, que o teatro não é uma das representações da arte e cultura que mais prezo. 

Mas ver atuar o Borges de Garuva é sempre uma boa experiência. Pessoalmente considero que lotear o espaço da Cidadela sem um projeto de ocupação e utilização da área é um erro. Não é só um erro, é um erro grave. Porque permite inclusive que alguns setores sejam beneficiados em detrimento de outros. 

A Cidadela Cultural deveria ser, como alguns dos leitores, principalmente no Facebook, propuseram: um espaço para promover a cultura, uma incubadora, um nervo de vitalidade cultural, no qual com certeza deverá haver um espaço para o teatro. Também para a dança, para o cinema, para o desenho, a pintura, o grafite, o comic, as tirinhas e charges do Cão Tarado, o Menino Caranguejo, a literatura, o vídeo, a música, desde a erudita passando pela popular. E sem esquecer-se da escultura, da gravura, dos títeres e de todas as formas de representação artística que a criatividade humana tenha desenvolvido ou venha a desenvolver. A Cidadela deve ser o espaço para que esta criatividade prospere e possa fazer de Joinville um polo da economia criativa. Dessa indústria sem chaminés que movimenta milhões em todo o mundo.

ESPECULAÇÃO - Surgiram também informações novas, que acrescentam dados para o debate. Há os que defendem que o espaço seja entregue à especulação imobiliária ou seja convertido num centro etílico-gastronômico. Foi possível saber que há até alguns projetos viáveis para um melhor aproveitamento do espaço. Haveria sempre o risco que a sua função primordial, que seria a de servir como celeiro da cultura e berço criativo, aberto a todos os segmentos culturais, acabasse sendo deturpada.

O debate sobre o uso e o destino da Cidadela Cultural é de todos e para todos. O espaço e sua proposta são nobres demais, importantes demais para que se restrinja o debate ao setor cultural. A cidade, como um todo, tem o direito de se manifestar e de opinar. Mas a maior responsabilidade cabe aos que, se intitulando representantes da cultura, devem liderar o processo de recuperação da Cidadela para que cumpra seu objetivo original.

Solicitar a reintegração de posse, não para se encastelarem nela e sim para que vicejem as manifestações culturais, como um bem maior a que o joinvilense tem direito. Sem esta mobilização e sem um vigoroso processo de reivindicação e valoração do espaço, não é só a Cidadela quem esta em risco. É a própria cultura que está ameaçada. A maior ameaça fica evidenciada pelos parcos recursos previstos no orçamento municipal para a cultura. Sem recursos, não há como fazer uma política cultural de qualidade.


Ao longo da semana, não faltaram os que entram no debate para tumultuar, para desmerecer, para desmoralizar. Eles são importantes para o blog e para os leitores do blog, porque eles cumprem o papel de bobos da corte, os que fazem rir a todos com suas idiotices. 

15 comentários:

  1. como alerta e descaso com o patrimônio publico joinvilense concordo e dou meus parabéns ao texto, agora utilizar aquele local para mais um templo da cultura joinvilense, sei não, já não temos tantos museus abandonados, expocentro, centroeventos, teatro juarez machado e até mesmo a expoville. acredito em utilizar aquele espaço para outras prioridades para os munícipes.
    Salezio

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  2. "cumprem o papel de bobos da corte". Definição perfeito para os "articulistas" neste risível blog de "debates".

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    1. É verdade. Tudo isso sem contar o erro histórico. Isso de falar em corte num tempo de república só mostra a falta de preparo dos articulistas. A propósito, você não é o...???

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  3. Infelizmente a manutenção tem se tornado um "mico" na mão em todos os aparelhos públicos. Como meu pai já dizia: comprar é fácil, difícil é manter. Agravado quando loteado, quando morre de fome como o cão com dois donos.

    Urgente licitar econômos

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    1. Dirk,
      Este é só um exemplo. Não é o único e esta longe de ser um caso isolado. Uma pena.

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  4. Fico cada vez mais sem perspectiva que o poder público municipal assuma a tarefa de restaurar a Cidadela. A ultima vez que fui lá, há uns 4 anos atrás, o barranco que caía nos fundos não havia sido contido, continuava a ceder, os galpões dos fundos estavam em vias de cair, com telhado e algumas paredes pendendo. Deve estar muito pior, e o custo que já era alto deve estar estratosférico se tratando de obra pública. Dinheiro que a prefeitura não tem.
    Falando nisto ela não tem recursos de investir para mais nada, nem para hospitais, escolas, buracos das ruas, ampliações, sub-prefeituras, inflação dos servidores, etc. Pensando desta forma aquele espaço não tem outro jeito senão uma parceria público privada que destine uma porção para lazer e uso público, até mesmo como forma de atenuar os inexplicáveis aluguéis de tantas secretarias, fundações e autarquias, que acabam desviando os mesmos recursos que faltam para os investimentos e manutenção da maquina pública.
    Agora se por outro lado não contermos cargos comissionados, politicagem, mordomias, cobrarmos mais eficiencia, planejamento, prioridades, profissionalismo, metas, prazos, etc, aí fica dificil mesmo...

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    1. O dilema é ser rea;ista ou ser pessimista. Tem muita gente no governo que acham que ser realista é ser pessimista.
      E não gostam.

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    2. Com o Carlito éra a mesma coisa.

      Fiz críticas realistas e fui ignorado...

      Político é tudo igual.

      NelsonJoi@bol.com.br

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  5. Jordi,
    Fique relaxado. Não gostar de teatro não é uma razão para ser queimado em praça pública. Eu falei somente que a AJOTE tem direito de uso de uma (ou: de duas, três) sala. AJOTE é uma associação que conquistou o espaço e levantou o debate da Cidadela como um espaço de fazer/expor/pesar o teatro, assim como outras linguagens artísticas. A cena teatral local mantém um trabalho continuo e experimentando muita coisa na teoria/prática teatral.
    Eu concordo com um projeto de ocupação. Mas ao sugerir, é preciso reconhecer as entidades de classe que realizam trabalhos no local. Fato que você não citou, até pra oferecer mais elementos para o debate.
    Abraço
    Ps: Vá mais ao teatro, já que faz tempo que o Borges de Garuva não entra em cena. Aliás, em agosto acontece a 10ª CENA, mostra de teatro da AJOTE.
    Maikon K

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    1. Maikon, já falei que fazia tempo que não frequentava o galpão da AJOTE...

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  6. Enquanto pensamos em cultura, a PMJ compra 98 ingressos(pra quem?) a R$100,00 para o jogo do Atlético-PR x Flamengo, total R$9.800,00, praticamente o mesmo valor que cobrou de aluguel(R$9.600,00).
    É só verificar no transparencia.joinville.sc.gov.br
    O caminho é Unidade Executora: FELEJ ... Outras Despesas Correntes -> Outros Serviços de Terceiros - Pessoa Jurídica -> Outros Serviços de Terceiros - Pessoa Jurídica -> ATLETICO PARANAENSE
    O engraçado é para algumas coisas tem dinheiro.

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    1. Aqui está o link: http://cloud.publica.inf.br/clientes/joinville_pm/portaltransparencia/home.php?id_entidade=MTFAdjYwaDNu&origem=categoria&exercicio=2013&dataInicio=01/01/2013&dataFinal=07/08/2013&tipo_categoria=3&filtro=categoria&nivel=NEB2NjBoM24%3D&id_empenho=NDgxMTAxNEB2NjBoM24%3D&codigo_nivel=My4zLjNAdjYwaDNu

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    2. Ivan, esse link não abre nada. Já tinha acontecido isso, por isto coloquei o caminho todo.
      Estranho a prefeitura comprar quase 100 ingressos para um jogo de futebol né? A R$100,00 ainda.

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  7. pelo que li hoje no jornal essa LOT vai acabar saindo este ano mesmo.
    cleuza Souza Peres

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