quarta-feira, 8 de outubro de 2014

Um debate polarizado, de novo

POR CLÓVIS GRUNER

Encerrado o primeiro turno, poucas surpresas ‒ a vitória de Aécio Neves sobre Marina Silva é uma “meia surpresa” ‒ e uma certeza: a política brasileira tem dificuldade de se desvencilhar da polarização PT x PSDB. Desde o retorno das eleições diretas para presidente, em 1989, já foram sete campanhas; petistas e tucanos se enfrentaram em seis delas, com a vitória do PSDB em duas (com FHC em 1994 e 1998, no primeiro turno) e do PT em outras três (2002 e 2006 com Lula; e 2010 com Dilma, todas no segundo turno). Fora do governo há mais de uma década, tucanos e aliados tem sede de voltar a ele e farão literalmente qualquer coisa para isso. Os petistas, por sua vez, sabem que enfrentam seu pleito mais difícil, e que pela primeira vez desde a vitória de Lula há o risco real de saírem derrotados no dia 26 de outubro.

Não será uma disputa fácil, portanto. E embora seja uma espécie de mantra afirmar que o segundo turno é uma “nova eleição”, penso que algumas possibilidades podem ser aventadas com base nos resultados do primeiro. A começar pelo destino dos votos de Marina Silva. Desde o começo da semana, a candidata sinalizava o apoio à candidatura de Aécio Neves, confirmado ontem, no mesmo dia em que Aécio recebeu também o apoio do PV de Eduardo Jorge o PSOL de Luciana Genro declinou de apoiar um dos candidatos, embora desaconselhe o voto no tucano. De todos, certamente o de Marina foi o golpe mais duro para o PT, que provavelmente esperava uma posição neutra, a repetir a posição tomada em 2010. Por outro lado, o apoio a Aécio Neves, se confirmado, pode repercutir a médio prazo nas pretensões de Marina, que corre o risco de perder definitivamente a credibilidade adquirida entre aqueles setores mais à esquerda que, descontentes com os seguidos governos do petistas, depositaram nela alguma expectativa de renovação.

Não acredito, como parte da militância marinista, que sua derrota se deva aos ataques desferidos contra ela pela campanha de Dilma. Primeiro, porque Marina não foi exposta nestes dois meses de campanha mais do que o PT nos últimos 12 anos e de Dilma nos últimos quatro. Ambos sobreviveram, e com chances reais de emplacar o quarto mandato. Seu discurso careceu de solidez e pecou por excesso de ambiguidade. Se é verdade que Marina foi exposta pelo programa e pela militância petistas, sua derrocada se deveu também e, penso, principalmente, ao fato dela mesmo ter se exposto, revelando suas muitas contradições. E isso, me parece, contribuiu mais para a perda de votos que o confronto com a candidata petista.

Junto aos eleitores mais à esquerda, Marina perdeu votos em função de seus flertes com as políticas econômicas neoliberais ou sua capitulação frente às pressões de setores conservadores; à direita, porque tentou aproximar sua candidatura justamente daquelas políticas que estes setores rejeitam, como ficou claro no último debate, quando insinuou que seu programa era mais parecido com o de Luciana Genro do que com o dos tucanos. Pretendendo não ser de esquerda, mas também não de direita, defendendo um princípio vago de governar com “os bons” de todos os lados e matizes, Marina não só perdeu votos ao ponto de nem figurar no segundo turno. Mas turbinou a campanha de seus adversários, principalmente a de Aécio Neves, para onde parece ter migrado boa parte deles.

UMA CAMPANHA DE MEDO E ÓDIO – A meu ver, o pior de Marina Silva ter ficado de fora foi, justamente, o retorno à polarização PT x PSDB que a candidata, por um breve momento, chegou perto de dissolver. Particularmente, eu a preferia em uma disputa com Dilma Rousseff, mas certamente as lideranças e os marqueteiros petistas não concordariam comigo. Tanto que investiram parte de seu tempo e energia para forçar um segundo turno com Aécio e os tucanos, e não é difícil entender as razões. Sob certa perspectiva, Marina representava um risco maior à reeleição de Dilma, inclusive porque suas trajetórias e perfis são, em alguns aspectos, bastante próximos, o que dificultaria o discurso polarizado.

A polarização entre petistas e tucanos interessa ao PT, que poderá afrontar seu adversário ao longo dos próximos dias recorrendo a um discurso baseado principalmente no medo de um passado que muitos eleitores não querem de volta e, contra o qual, o PT se apresenta como o único antídoto. Com Marina, este discurso era mais difícil, porque seu passado e de sua legenda provisória, o PSB, incluía uma passagem pelo governo petista. Tendo ela como adversária, a candidatura petista precisaria deslocar o temor do passado para o futuro. Mas este, como sabemos, é um horizonte de expectativas e pode ser tanto lugar de receio como de esperança. Será preciso esperar o resultado do segundo turno para saber se os estrategistas de campanha acertaram. Tenho dúvidas.

Particularmente, penso que o PT terá de investir mais na tentativa de mostrar aos eleitores que tem capacidade de se reinventar, mesmo depois de 12 anos de governo. E isso me parece fundamental por pelo menos duas razões. Primeiro, porque a quantidade de votos dados aos candidatos de oposição, incluindo os chamados nanicos, sinaliza um claro desejo de renovação. Cabe à candidatura petista mostrar que é capaz de fazê-lo, preservando as conquistas que apresentou ao longo do primeiro turno como seus principais trunfos políticos. Além disso, a quantidade expressiva de votos nulos e brancos, somada a um alto índice de abstenção, deixa claro um outro tipo de descontentamento, não apenas com este governo, mas com o debate político tal como posto hoje, polarizado e pouco criativo. Conquistar parte deste eleitorado é tarefa ainda mais difícil.

Por outro lado, se Aécio Neves tem, a favor dele, o consenso narrativo forjado ao longo dos últimos anos, segundo o qual o PT é a matriz de todos os males, ainda não deixou claro quais são suas propostas e suas soluções para os problemas que acusa no governo petista. Com sua dupla derrota em Minas Gerais, fica mais difícil simplesmente dizer que pretende fazer pelo Brasil o que fez pelo seu estado depois de ter sido rejeitado pela maioria dos mineiros. Sua campanha, fundamentalmente, se alimentou do e repercutiu o ódio contra o PT, e seus eleitores parecem mais odiar o governo petista que, necessariamente, aprová-lo – e a onda de violência contra os votos de nordestinos e pobres nas redes sociais, desqualificando-os, são um indicativo disso. E num ambiente político de paixões exacerbadas e onde, historicamente, poucos são os eleitores que escolhem candidatos baseados em propostas e programas, há o risco que a polarização partidária reverbere em outra, ainda mais nociva à democracia: a que opõem o medo ao ódio. 

terça-feira, 7 de outubro de 2014

O Papa Francisco e a ACIJ

Por JORDI CASTAN

Escrevi neste mesmo espaço faz poucas semanas que o resultado das eleições seria um suicídio para Joinville - Suicidio eleitoral 1 e Suicidio eleitoral 2 . Se você é leitor do Chuva, já estava sabendo o que vinha pela frente. Não era preciso ter uma bola de cristal para antever que com tantos candidatos locais e com tantos candidatos de fora garimpando votos em Joinville, o resultado não seria bom para a representatividade política da “maior” cidade do estado.

Sem surpresas. A campanha que a ACIJ capitaneou em prol de candidatos que defendessem os interesses de Joinville foi de uma estultice supina. Metade por pura desídia, e a outra por entender que a força da ACIJ nestes temas é equivalente a do Papa Francisco assomado ao seu balcão na Praça de São Pedro, conclamando palestinos e israelenses a buscar a paz, ou instando Putin a que cesse com suas agressões contra as ex- repúblicas soviéticas, ou a reduzir  as guerras e a violência em prol da paz mundial. O Papa faz o seu papel sabendo que nada mudará. A ACIJ fez o dela, e depois convidou aos eleitos para ocupar espaço na mídia e emplacar a imagem do tigre de papel que a entidade empresarial é em temas político-partidários.  

O resultado das eleições estava previsto: brancos e nulos aumentaram, em Santa Catarina 30%; em Joinville 35%,  bem maior que os 28% de votos perdidos na eleição passada. É bom lembrar que a mais alta de história. Depois ainda batem no peito dizendo que somos um povo politizado.  Candidatos de fora levaram mais votos que nas eleições anteriores, 19% frente aos 15% da eleição anterior, quando é preciso que se diga que  a entidade  se empenhou mais em defender o voto por Joinville. Assim se juntamos os votos brancos e nulos, os votos em candidatos de fora, e o excesso de candidatos sem expressão e sem possibilidades de ser eleitos, temos um quadro bastante claro de porque o resultado desta eleição foi um suicídio anunciado. A quem interessa? Essa é a primeira pergunta. Quem se beneficia? É a segunda.




Sobre as eleições presidenciais e o resultado do primeiro turno, ficou provado que não há nenhuma relação entre o resultado das urnas e o mapa do Bolsa Família. Que os estados em que há um maior numero de beneficiários do bolsa família sejam aqueles em que Dilma tenha tido melhores resultados, é pura casualidade. Todos aqueles que insistem em ver no Bolsa Família uma poderosa ferramenta para manter milhões de brasileiros dependentes de um beneficio público que não prevê a redução do numero de beneficiários, tampouco estimula sua inserção no mercado de trabalho e que estoura foguetes cada vez que aumenta o numero de beneficiados, estão errados. Não há nenhuma relação entre uma coisa e outra. Mesmo que os resultados das eleições insistam em querer mostrar que há. Por isso se alguém identificar alguma relação entre uma coisa e outra, deve ser porque os mapas dos resultados eleitorais foram elaborados  por algum instituto aparelhado para distorcer dados e informações e levar os eleitores a conclusões erradas.

segunda-feira, 6 de outubro de 2014

A volta do velho Brasil bipolar

POR JOSÉ ANTÓNIO BAÇO

Dilma Rousseff venceu. Sem surpresa. Mas os eleitores da atual presidente reagiram de maneira tímida, enquanto o pessoal de Aécio Neves comemora de forma efusiva. É uma questão de expectativas. A campanha de Dilma nutria uma esperança – remota – de arrumar a questão logo no primeiro turno. Aécio Neves tinha o pescoço no cepo e ir a segundo turno foi, antes de tudo, um alívio pelo fato de o machado não ter caído.

O entusiasmo dos tucanos é legítimo. Eles passaram as últimas semanas como figurantes e agora voltam à cena como protagonistas. Mas é melhor não ir com tanta sede ao pote. É só lembrar que nas eleições de 2010 o primeiro turno acabou com números não muito diferentes (Dilma 47%, Serra 33% e Marina 19%). Mas o segundo turno aumentou as distâncias e levou a um resultado largo:  Dilma (56%) e José Serra (44%).

Um fator a beneficiar o candidato do PSDB foi a disputa entre Dilma e Marina, nos últimos dias. Longe dos holofotes, Aécio Neves não teve que responder a perguntas incômodas e a sua imagem escapou incólume aos ataques dos adversários. Num segundo turno, o jogo será mais duro e a campanha de Dilma certamente vai recuperar a agenda de meses atrás. E ainda vamos ter que ouvir falar muito no aeroporto do tio, por exemplo.

É lógico imaginar que Marina Silva pode ser um elemento definidor no segundo turno, porque o seu apoio pode resultar em transferência de votos. Não foi assim há quatro anos, quando a sua candidatura tinha menos contradições, e não há razão para que aconteça agora. E a imagem de Marina Silva saiu chamuscada destas eleições. A tendência é de pulverização dos seus votos entre as duas candidaturas.

Tudo indica que há um namoro entre Marina Silva a Aécio Neves. Mas sabe-se que o apoio vai custar muito ao candidato tucano. O grande apoio de Aécio Neves tende a vir de certos setores mais conservadores da mídia, que, inclusive, já tinha atirado a toalha e desistido do seu candidato. É de prever fogo cerrado contra o Partido dos Trabalhadores, em especial com o tema da Petrobras. E também com factoides, claro.

Vai começar tudo outra vez e voltamos ao velho Brasil bipolar (em termos psicanalíticos também). Este segundo turno deve ser o mais apertado de todos, mas pelo menos os eleitores sabem com o que podem contar: o social versus o capital. Pelo que temos visto nos últimos tempos, é possível prever posições extremadas. Resta torcer pelo contrário. Para que não seja a democracia a principal derrotada.

Em tempo: se houve perdedores neste primeiro turno, não há dúvidas de que foram os institutos de pesquisa. Os caras não acertam mesmo.

É como diz o velho deitado: “Previsões só no final”.

sexta-feira, 3 de outubro de 2014

O Horário Eleitoral está ultrapassado

POR CHARLES HENRIQUE VOOS

É um fato que cada vez menos pessoas assistem ao Horário Eleitoral Gratuito. Mas, nos últimos anos, cada vez menos se comenta sobre o que acontece neste tempo das rádios e TVs dedicados ao processo eleitoral. Quanto o Tiririca aparece mais na mídia do que as propostas, é sinal de que alguma coisa está errada, e o erro, neste caso, está no próprio Horário Eleitoral.

Desde a abertura democrática vivida pelo Brasil nos anos 1980 nós temos o mesmo perfil de campanha eleitoral: candidato bonzinho, que mostra a família e as suas origens, fala que quer colocar sua prioridade nas políticas sociais, e deseja o melhor para todo mundo. Soma-se a isto a caricatura das propagandas. Maquiagem, estúdio perfeito, pessoas cooptadas que nem sempre falam a realidade, e desvio de informações são realidades nas mensagens dos candidatos. Parece comercial de margarina.Propostas genéricas dominam o tom de quem está ganhando nas pesquisas, e ataques daqueles que estão atrás desesperados por mais pontos percentuais nos levantamentos de intenção de voto. Para os partidos menores, sobram aberrações eleitorais e uma pífia qualidade de propostas, com raras exceções. A sensação que passa é a de repetição, independente dos nomes. Todos nós já sabemos o que será falado, fazendo com que o Horário Eleitoral fique ultrapassado por outras formas de atingir o eleitor. É aí que entra o poder da internet.

Como o eleitor está cada vez mais conectado à internet, é natural que a TV perca sua função como principal ou única fonte de acesso à informação. É uma premissa consolidada. Sendo assim, a internet cresce como principal ferramenta de pesquisa sobre a vida e proposta dos candidatos; seu passado como cidadão e seus aliados políticos. Por exemplo: a internet foi o principal palanque das propostas dos últimos prefeituráveis em Joinville para as eleições de 2012 e o Chuva Ácida, inclusive, foi decisivo para isso. Neste ano, a internet revelou que certos candidatos não estavam enquadrados na lei da ficha limpa, mesmo sendo condenados pela justiça. E todos os debates originados na internet repercutem no Horário Eleitoral Gratuito.

Quando a gente olha para o Tiririca fazendo paródias em pleno Horário Eleitoral, percebemos que ele está zombando deste, e com razão. É um meio ultrapassado pelas outras formas de comunicação, e seu conteúdo não atende mais as expectativas das pessoas, as quais se utilizam de outras formas para escolherem seus candidatos, nem que para isso usem da compra de votos ou a troca de favores pessoais para quando o candidato se eleger o seu principal método. A campanha acontece em todos os lugares, menos no Horário Eleitoral Gratuito.