sexta-feira, 9 de maio de 2014

E se o mendigo for da sua família?

POR ET BARTHES

E se aquele mendigo por quem você passa na rua fosse a tua mãe? Ou prima? Ou mulher? Será que você reconheceria ou relegaria à invisibilidade? Eis um trabalho que vale por muita sociologia.





quarta-feira, 7 de maio de 2014

Carta a Rachel Sheherazade

Selo de "qualidade" feito pelos fãs da moça
POR JOSÉ ANTÓNIO BAÇO



Olá, Rachel. Sei que não vais ter tempo de ler esta singela cartinha, porque és famosa e tens muitos seguidores para atender. Aliás, confesso que cometi um erro. Pensei que os teus seguidores fossem apenas os conservadores da classe média (se eu disser “reaças” levas a mal?), aqueles caras que têm sangue nos olhos e odeiam todos os que pensem diferente deles. Sabes do que estou falar, né? Mas errei numa coisa.



Hoje percebo que o teu público é mais vasto. Também és inspiração para uma turba selvática que precisa de poucos motivos para cair na barbárie. Parece que esse pessoal te ouviu  e agora embarcamos nessa onda de fazer justiça com as próprias mãos. Não importa se as vítimas são culpadas ou inocentes, homens ou mulheres, doentes ou sadias. São meros detalhes que não impedem um belo linchamento.


Outra questão. Não sabia quem eras exatamente. Primeiro pensei que fosses alguém a interpretar um personagem para conquistar a audiência de um punhado de imbecis. Depois imaginei uma arrivista a fazer o possível e o impossível para subir na vida. Mas hoje sei que estava errado: não passas de uma ignorantona a quem alguém, sem ter a noção do mal que estava a fazer, entregou um microfone na televisão.

Dizem que o sucesso é chegar onde se planejou chegar. Então, imagino que estejas feliz, porque te tornaste um símbolo daquilo que tens pregado ao longo dos tempos: a intolerância, a arbitrariedade e a falta de solidariedade para com o mais fraco. E são os mais fracos a pagar um preço alto demais. O que dizer de Fabiane Maria de Jesus, espancada até a morte no Guarujá? Ora, que talvez seja apenas mais um nome para as estatísticas da intolerância.

Não estou a dizer que és culpada. É claro que os responsáveis são os anormais que perpetraram o crime. É claro que o estado tem culpa porque não protegeu uma cidadã inocente. É claro que as comunidades têm culpa por assistir impassíveis à barbárie. É claro que os autores do site que espalhou o boato também são responsáveis pela tragédia. Mas não acho que possas ficar incólume... e aposto que tens muito para conversar com a tua consciência.

terça-feira, 6 de maio de 2014

40 meses sem licitação

POR CHARLES HENRIQUE VOOS

Está mais do que avisado para a grande maioria de que o transporte coletivo de Joinville opera através de uma permissão, concedida às empresas Gidion e Transtusa por vários governos municipais desde a década de 1970. Também sabe-se que o último grande contrato venceu em Janeiro deste ano, e a licitação não saiu. Talvez o que a grande maioria não sabe, e necessita saber, é que a Prefeitura teve a oportunidade de licitar o sistema de transporte coletivo nos últimos 40 meses e não o fez por sua própria incompetência, através dos órgãos gestores do assunto, como o Seinfra do IPPUJ.

Se voltarmos ao mês de Janeiro de 2011, na primeira audiência publica realizada para discutir a licitação do transporte coletivo, os movimentos sociais organizados (como o MPL) e outras vozes sociais (inclusive este que vos escreve) alertaram sobre as várias situações estranhas presentes naquele momento, como a falta de debate com a população, o desrespeito ao Plano Diretor e a não confecção de um Plano Setorial de Mobilidade para discussão sobre a mobilidade que a cidade precisa, para depois ser feita a licitação. Na oportunidade, faltavam 36 meses para o fim do contrato.

O assunto morreu por ali, mais uma audiência foi realizassem Fevereiro de 2011, e pouca coisa mudou naquele ano. O blog Chuva Ácida publicou desde a sua fundação vários textos sobre o assunto, inclusive de convidados, pedindo uma agilidade e transparência no processo, pois, afinal, o fim do contrato se aproximara. Entretanto, "os de sempre" foram ignorados e o Prefeito anterior não conseguiu cumprir a sua principal promessa de campanha (fruto de uma militância histórica de alas do seu partido), e de brinde reconheceu uma divida muito estranha com as permissionárias.

O atual Prefeito tinha, no ato de sua posse, poucos meses para fazer a licitação. Por mais que as "Jornadas de Junho" fossem muito brandas pelos lados de Joinville, as ruas pediam novamente mais agilidade e transparência, numa repetição dos anos anteriores. Novamente nada aconteceu, e o contrato venceu em Janeiro deste ano, 36 meses após aquela reunião com a população onde foram feitos os apontamentos necessários para a execução de todo o processo. Se neste tempo todo o governo não conseguiu fazer a licitação, estava óbvio que não conseguiria em míseros seis meses. E não deu outra: em 2014 Joinville não terá o seu transporte coletivo licitado.

O que mais me deixa desapontado é o tempo perdido. Muito tempo se passou e a sensação é de que nada mudou. O transporte coletivo continua sendo ruim, os governos insistem com megaprojetos de pontes, duplicações e mais investimentos em prol do transporte coletivo motorizado, e a população fica à mercê da incompetência de órgãos públicos repletos de profissionais que não cumprem com seus ofícios.

A desculpa oficial dada pela Prefeitura para que em 2014 nada avance, acreditem, é a realização de um Plano de Mobilidade antes da licitação. E anunciaram como se a roda fosse inventada pelos pensadores urbanos da Av. Hermann Lepper. "Os de sempre" já disseram estas coisas há 40 meses.

segunda-feira, 5 de maio de 2014

Revogue-se o bom senso

POR JORDI CASTAN

Não há limite na ânsia de retroceder até a idade das trevas: a aprovação da lei que permite o rebaixo do meio fio em toda a cidade e o consequente desaparecimento dos passeios como espaço para os pedestres, é uma prova que os denominados antropocentristas cedem espaço para a suas alas mais radicais, os “automóvelcentristas” e os “imovelcentristas”.

Depois da vitória da barbárie e da estupidez, pareceria que o mundo está perdido. Por sorte, cidades como Hamburgo e Berlim, na Alemanha; ou Vitoria-Gasteiz e Barcelona, em Espanha; ou Seattle e Nova Iorque, nos Estados Unidos, tem projetos de planejamento urbano para erradicar completamente o automóvel de grandes áreas do tecido urbano. Bogotá, aqui no nosso hemisfério, tem feito também grandes avanços no sentido de priorizar o pedestre e o transporte público em detrimento do automóvel, objeto do culto dos automóvelcentristas, adoradores do carro e que acreditam que Deus criou todas as coisas para servir ao automóvel.  Os sambaquianos, não satisfeitos com essa vitória, querem mais, e os imovelcentristas lançam uma ofensiva em que a ignorância e a idiotia são suas bandeiras de batalha.

Qualquer um que tenha mais capacidade intelectual que uma ameba ou um paramécio, sabe que a verticalização e o adensamento comprometem a qualidade da vida nas cidades, edifícios mais altos reduzem a insolação e a ventilação, fazem as cidades mais insalubres, propiciam doenças e aumentam a poluição. A insuspeita OMS (Organização Mundial da Saúde) estebelece normas e parâmetros para garantir um mínimo de insolação, de modo que mesmo nas cidades mais verticalizadas os seus habitantes possam receber um mínimo de duas  horas de sol no solstício de inverno. É oportuno lembrar que as recomendações da OMS são para TODAS as cidades, se consideramos que no caso de Joinville, pela sua localização e climatologia há abundancia de chuvas e elevada umidade, os conceitos de ventilação e insolação merecem uma atenção e uma consideração adicional. 

Além dos percentuais mínimos definidos pela OMS, há também outros critérios técnicos específicos a serem seguidos no planejamento urbano, além de colocar dezenas de siglas complicadas e ininteligíveis para o cidadão médio e colorir mapas de cidade.  Há normas técnicas, como as ISO, a 6241, por exemplo, e NBRs, como as 10152 e 15575. As normas e os estudos técnicos definem toda uma série de requisitos e critérios, estabelecem ângulos máximos de obstrução, níveis máximos de intensidade sonora, de permeabilidade do vento, percentuais de disponibilidade de áreas verdes, distância dos trajetos a serem percorridos a pé, distância mínima entre as unidades habitacionais e os pontos de ônibus, princípios de segurança urbana referente a mobilidade e a alturas de construção a serem seguidos na legislação urbanística, entre muitos outros. Há uma relação direta entre a altura permitida e a largura das ruas, o que os técnicos denominam a calha da rua. Para poder aumentar a altura dos prédios é preciso que as ruas sejam mais largas, assim não se comprometerá a insolação, por exemplo. Também há critérios sobre mobilidade e atividades econômicas, sobre poluição sonora e áreas residenciais, entre outras dezenas de critérios a serem considerados. Até agora nada disso tem sido visto por estes manguezais. E arrisco o palpite que se esses dados não tem aparecido, deve ser porque não existem; ou se fossem apresentados dificilmente resistiriam a uma análise medianamente isenta.

Aqui em Joinville tem sido dado a ordem de ignorar qualquer norma técnica que possa reduzir o lucro dos especuladores imobiliários e seus lobistas. Assim, a OMS, as ISO e as NBRs são consideradas organizações nocivas aos interesses defendidos pelo setor especulativo, agrupado em torno do grupo apelidado de “Gangue do Tijolo” ou “Talibans do Concreto”.  Caso o bom senso não de sinais de vida, será necessário que se verifique se o texto da LOT assegura o cumprimento dos coeficientes mínimos propostos pelas normas técnicas e se restabeleça o bom senso, para que se reduza a cobiça dos de sempre e possamos preservar um mínimo da salubridade e qualidade de vida.

sábado, 3 de maio de 2014

Sobre a Comissão Municipal da Verdade e o Dia dos Trabalhadores


POR FELIPE SILVEIRA

É bem provável que ainda neste ano seja criada a Comissão Municipal da Verdade em Joinville. Uma vitória dos movimentos sociais, que fizeram a proposta no evento de comemoração dos 35 anos do Centro dos Direitos Humanos Maria da Graça Bráz (CDH), do qual participou o coordenador da Comissão Estadual da Verdade. Escrevi sobre isso há cerca de um mês.

A comissão municipal está próxima porque, de fato, os vereadores Adilson Mariano e Rodrigo Fachini levaram a proposta a sério e, na quarta-feira (29), foi realizada uma reunião para debater a formação da futura comissão. Trata-se de um passo fundamental de resgate da memória – muitas vezes apagada de propósito - e conscientização sobre quem somos enquanto comunidade. Afinal, somos resultado do passado.

Sobre o resgate da memória, um exemplo bem claro e praticamente extremo foi dado pela professora e pesquisadora Iara Andrade Costa, chefe do Departamento de História da Univille. Presente na reunião sobre a comissão municipal, ela contou que vários jornais do ano de 1964 simplesmente desapareceram do Arquivo Histórico Municipal. Um apagamento escancarado da memória, promovido por aqueles que tem muito do que se envergonhar, certamente.

De fato, muitos não querem que se saiba sobre o passado recente. Muitos dos beneficiados ainda gozam os privilégios dos anos de chumbo. Aqueles anos em que “poucos” enriqueceram ao lado do governo militar, enquanto o povo explorado migrava do interior do Paraná e de Santa Catarina para cidades como Joinville, onde abundava emprego no chão de fábrica para quem “se comportasse direitinho”. Também escrevi sobre a coisa grotesca que é o “milagre econômico” aqui.

E quem lucrou continua a lucrar com o silêncio do povo que, na marra, aprendeu a ficar calado e assim se acostumou. Em Joinville, como em muitos outros lugares, tentam roubar o Dia dos Trabalhadores e colocar no lugar o “dia do trabalho”, esse troço tão glorificado por aqui. Não é à toa que as emissoras de televisão promovem grandes festas para comemorar o TRABALHO.

Ignora-se, assim, a origem do dia dos trabalhadores e a lutas dos mesmos por direitos básicos, assim como são ignoradas as lutas históricas e atuais da classe trabalhadora. O mundo, porém, pega fogo. Em todo o mundo os trabalhadores e oprimidos estão nas ruas, enfrentando tudo e todos. As “primaveras” ao redor do mundo, os occupy, as jornadas de junho, os garis do RJ...

Até dá pra entender quem faz de tudo para apagar a memória.
Além da vergonha, o medo...