Mostrando postagens com marcador bancada religiosa. Mostrar todas as postagens
Mostrando postagens com marcador bancada religiosa. Mostrar todas as postagens

terça-feira, 24 de março de 2015

Laico? Onde?

POR PEDRO HENRIQUE LEAL


militares em oração na Maré. Foto de Felipe Barra.

Como todos puderam bem ver, semana passada estourou uma polêmica tola por causa do beijo entre Fernanda Montenegro e Nathalia Timberg no primeiro capítulo de “Babilônia”. A demonstração de afeto entre as personagens das duas causou tamanha revolta, que a ala mais conservadora do congresso emitiu numerosas notas de repúdio ao folhetim global, além de vários cidadãos irados com tal “absurdo” se expressando online.

Mas bem, não foi só a Globo que provocou a ira dos conservadores neste mês de março. Além das telinhas, outras questões serviram de palanque para quem jura de pé junto que não é homofóbico (mas vê em relações homoafetivas “uma agressão”, como falou o ex-presidenciável Levy Fidelix). Da mesma maneira que aconteceu com Babilônia, certas pessoas decidiram que, se elas não gostavam do conteúdo de um certo programa, então esse programa teria que cair. E se elas se guiavam por uma dada escritura, todos deveriam também.

Esse foi o caso do vereador Jerônimo Alves, em Florianópolis. O dito cujo foi responsável por um projeto de lei (aprovado, para piorar) obrigando todas as bibliotecas da capital a terem a Bíblia Sagrada em “local de destaque”. Acontece que a Constituição Federal estabelece claramente que o Brasil é um estado laico - e como tal, não poderia privilegiar uma religião. A desculpa dele? A Bíblia, diz ele, é de todas as religiões. Me pergunto como se sentiria se colocassem o Quran em posição de destaque.

Tal norma constitucional, no entanto, tem sido tratada com intenso descaso pelos nossos representantes. Enquanto a constituição diz claramente que estado e religião devem permanecer separados, uma das maiores bancadas do congresso (com 57 integrantes, mais de um décimo das cadeiras da câmara) serve primeiro a religião. Essa mesma bancada já criou o hábito de transformar a câmara em local de culto, propôs coisas como “cura gay” e ensinar “criacionismo bíblico” nas escolas, e hoje tem um dos seus nomes maiores (Eduardo Cunha) na presidência da câmara.

E de forma previsível, Cunha apertou o cerco à laicidade estatal, e ampliou os poderes dos pregadores do preconceito. Desde que chegou ao poder, Cunha já colocou dois setores chave da câmara na mão dos religiosos: primeiro foram as comunicações, que passou ao deputado Cleber Verde ( PRB-MA, a primeira vez que as comunicações da Câmara, que incluem rádio, TV, jornal e site foram decididas pela mesa diretora, e não por um profissional de Carreira). A segunda vez foi na quinta-feira passada, quando Cunha passou o comando da Diretoria de Recursos Humanos da casa para a teóloga e advogada Maria Madalena da Silva Carneiro, que jamais ocupou um cargo de chefia na casa.

Antes estivessem apenas convocando boicotes inócuos a novelas e seus patrocinadores, mas nossos teocratas parecem ter força e sede cada dia maior. Semana passada o Ministério da Defesa publicou em sua página do Facebook a foto que ilustra este texto, onde militares faziam “uma roda de oração” antes de mais uma operação na Maré, no Rio de Janeiro. O problema não é a fé dos soldados, mas a exaltação da mesma por um estado que deveria ser laico.

Mas o caso da maré ainda é fichinha perto do absurdo divulgado por policiais militares em Goiás, em fevereiro. No vídeo, policiais militares lidam com um homem visivelmente alterado através de... um exorcismo. Me custa a dizer se a imposição religiosa por parte de agentes de segurança pública é pior ou a mesma coisa que a solução pela violência. A cada vez que essas tentativas de tomar o espaço público são combatidas, teocratas dizem que os “descrentes” estão se impondo. Pois bem: se as coisas continuarem como estão, devemos mudar o nome para República Teocrática do Brasil. A proposta para acabar com a laicidade já foi feita, pelo deputado Federal Cabo Daciolo (PSOL-RJ, que periga ser expulso do partido por isso). No começo do mês, alegando que “todos os joelhos se dobram para Cristo), o parlamentar queria retirar a expressão “todo poder emana do povo” do artigo 1º da Constituição Federal, e substituí-lo por “todo poder emana de Deus”. Houve quem defendesse alegando liberdade religiosa. Mas e a liberdade de quem não crê?


quinta-feira, 18 de outubro de 2012

Charlatões messiânicos

POR JORDI CASTAN

Nestes dias, circula na rede um vídeo que mostra um conhecido político local ocupando o microfone durante horas a fio. A capacidade que este pessoal tem para falar durante horas sem dizer nada de novo é extraordinária.  Mas a insanidade é tanta que por vezes fica difícil, para o espectador, separar a realidade da alucinação.

É um delírio. Na sua homilia, o pregador cita uma das epístolas de Mateus aos Corintianos (ou seria aos Coríntios?). Nem lembro direito, mas tenho memória de estar escrito que, caso o outro candidato fosse eleito, cairiam sobre Joinville todas as pragas bíblicas, de forma simultânea. Desde uma chuva de meteoritos até à conversão dos rios em sangue, passando pela pior de todas: a volta dos dois turnos na prefeitura. 

Ante o olhar de estupor do público, o pregador se anima e cita outra epístola, esta de João aos Fluminenses (ou seria aos Filipenses?). Desculpem, mas tenho uma verdadeira dificuldade para lembrar alguns nomes. Brada o pregador,  convertido de vez num charlatão messiânico, que se o nome do outro candidato fosse pronunciado de trás para frente representava em aramaico clássico o nome de Lúcifer. Quem o pronunciasse estaria convocando o demo em pessoa. 

Chegando neste ponto uma senhora da terceira fileira desmaia e é rapidamente atendida. Os gritos de aleluia, proferidos ao uníssono por alguns membros da plateia, são o disparador para que todos simultaneamente iniciem a declamação do mesmo mantra:  “aleluia, irmãos, aleluia”. E a plateia, formada principalmente por crédulos e fanáticos em transe, criam o momento propício para entrar na fase seguinte do discurso. 

Qual a  nova Joinville que surgiria caso o pregador fosse eleito? Seria a versão terrena do jardim do Éden. Frutas maduras cresceriam nas árvores de ruas e praças. Haveria um transporte público econômico e de qualidade. Quem não quisesse usar o ônibus, poderia usar o VLT, bicicletas ou simplesmente levitar. Elevados pipocariam como cogumelos e todos os gargalos do trânsito serão resolvidos como por milagre. 

As filas na saúde iriam desaparecer, porque as pessoas nesta nova administração não adoeceriam mais. Nas creches, vagas disponíveis para todos. Os salários dos professores  equiparados aos dos senadores da República e ainda com o décimo quarto e décimo quinto salário, para que não falte dinheiro no bolso. Nossas praças teriam mais flores e nossos rios mais peixes.

Uma nova Joinville surgiria desta administração que conta, desde já, com a proteção do Senhor, com a benção de Deus e com a colaboração dos anjos, dos arcanjos e até dos querubins. Seriam justamente os arcanjos os encarregados de fechar todos os buracos das ruas da cidade e de deixá-las horizontais como canchas de bolão.

Mas esta Joinville dos milagres só seria possível se todos os participantes do culto, seus amigos e parentes votarem no candidato que, tendo comunicação direta com o Senhor, poderia operar o milagre de voltar a fazer de Joinville uma cidade próspera, feliz e dinâmica.

O problema é que há cada vez mais gente que acredita nesses milagreiros e estão dispostas a embrenhar-se de novo numa aventura de alto risco.

Fim.

Em tempo: a irrupção na política das chamadas bancadas evangélicas não é um fenômeno restrito ao Brasil. Nos Estados Unidos também é conhecida a força retrógrada da bancada pentecostal. A direita ultrarradical encontra nela seus maiores expoentes. Em nada divergem do radicalismo islâmico ou dos talibãs, porque os extremos radicais se unem em torno de um único objetivo. A tomada do poder político através do uso da religião e da exploração da ignorância e a crendice.

quarta-feira, 19 de setembro de 2012

Os políticos e a religião



POR AMANDA WERNER

Tenho ouvido e lido muito por aí sobre os motivos que fazem as pessoas escolherem este ou aquele candidato. Uns votam porque têm simpatia pelo sujeito, outros porque acreditam que o candidato escolhido tem propostas mais realistas, alguns analisam os feitos pregressos do pretendente ao cargo. Os mais céticos se baseiam em fatos sobre os candidatos. Exemplo: este, de fato, é honesto ou é competente. Já realizou muitas coisas antes, não apenas fala.

Mas confesso que fico assustada quando ouço alguém dizer que vai escolher um candidato por ele ser da sua Igreja, um “homem de Deus”. E ainda justificam: este vai moralizar a política!

Aqui cabe uma distinção. O político religioso, não é o próprio Deus personificado. Esta confusão governante x religião, aqui no Ocidente, se dava na Idade Média. Era o período teocentrista. Nesse período, as pessoas eram proibidas de utilizar a razão, deveriam ser voltadas inteiramente para a igreja. Hoje, ufa, os tempos são outros.

Em todos os meios, e em todas as religiões, há pessoas boas e pessoas más. Os políticos, como todos nós, são apenas homens. E, como o próprio Santo Agostinho concluiu, corrompidos “pelo pecado”. Ou seja, passíveis de cometerem erros.

Querem alguns exemplos? Quem nunca leu sobre padres x criancinhas? Ou sobre o famoso pastor que ensinava como roubar os fiéis? Há ainda o Reverendo Moon que, creio, todos conhecem pelos fatos. Estas histórias são verdadeiras? Me parece que sim. São muitas e muitas. E não escolhem apenas uma religião. É só ficarmos atentos ao noticiário.

Querem exemplos mais factíveis de que políticos religiosos nem sempre moralizam a política? O Bispo Gê da Igreja Renascer e do DEM, em um famoso programa de televisão, ao ser questionado sobre o que achava da “farra das passagens aéreas”, onde deputados viajavam com a família ao exterior com tudo pago pelo dinheiro público, respondeu que “a verba é pública, minha esposa e meus filhos são públicos também”. 

Na época, era permitido, ou seja era legal. “Sempre foi assim”, alguns se defendem. Mas seria moral? Há exemplos mais próximos de nós. Lembram da denúncia feita aqui no blog, pelo colega Charles Henrique sobre os deputados que recebiam diárias no valor de R$ 670,00 para visitarem suas próprias cidades? Não? Então, aí vai o link: Deputados joinvilenses ganham diárias para “visitar” Joinville. Lembraram? Na denúncia havia um deputado “homem de Deus”. Por coincidência, o mesmo que pleiteia o cargo de prefeito na nossa cidade. As diárias são ilegais? Como já vimos, não. Mas se existe alguma moralidade em recebê-las ao visitar as suas próprias cidades, já é outro papo.

Votar em um político porque ele é do seu time, da mesma religião, ou coletividade, não deve ser o motivo determinante da escolha do candidato. O político de verdade deve governar para todos, não somente para grupos ou interesses pessoais.

É inteligível que por razões de religião, as pessoas não usem a pílula, façam ou não aborto. Mas opção religiosa não pode, de maneira alguma, ditar as regras para toda uma sociedade. Estaríamos indo de encontro à democracia. Afinal, o paraíso de um pode ser o inferno de outro.

Mas a recíproca é verdadeira? Eu não devo votar em político somente pelo fato de ele ser religioso? Creio que não. Demonstra tanta intolerância quanto os que agem em sentido oposto. Para votar consciente é preciso mais do que o fato do postulante ser religioso ou não. Os meus pré-requisitos estão no texto que fiz já há algum tempo aqui no blog : Eu, cidadã, confio. E os seus?