sexta-feira, 29 de julho de 2016

A complexidade dos Direitos Humanos e o olhar simplista do senso comum

POR LIZANDRA CARPES* 



E
m tempos de perigosos retrocessos na luta por direitos, é inevitável falar da evolução histórica dos Direitos Humanos e o que eles compreendem. Primeiramente falo para todas as pessoas que se entendem por seres humanos, depois é preciso compreender que na história da humanidade nem sempre tivemos acesso a direitos que temos hoje.

O Código de Hamurabi, por exemplo, é o registro mais antigo (1772 a.C.),  no que diz respeito a legislações, cunhado em pedra, na antiga Babilônia.  Contém 282 leis, porém nenhuma delas defendia o fim da escravidão humana. Muito pelo contrário, ele punia quem roubava escravos. Reza o Código que se algum recém-nascido da nobreza morresse após ser amamentado por uma ama de leite escrava, a mesma era condenada a ter os seios cortados. Ou seja, as leis eram pautadas nas classes sociais.

De lá para cá a história dos Direitos Humanos deu voltas, vestiu-se com a roupagem da igualdade entre todas as pessoas.  Muitos foram os pensadores que aprofundaram a ética pautada nos direitos naturais que passaram a ser tratados como Direitos Humanos no sentido de jurisprudência. Foi preciso transformar em leis as necessidades vitais e naturais humanas, porque “alguém”, de alguma forma, os nega. O mais pertinente a ressaltar nesta história é que “o mais forte ainda prevalece sobre o mais fraco”, ou seja, leis, tratados, pensamentos, declarações não têm força suficiente para garantir essa tal igualdade.

A Declaração Universal dos Direitos Humanos (DUDH), de 1948, é a compilação de uma observância histórica pós-guerras e inúmeras outas violações contra a pessoa humana que a Organização das Nações Unidas (ONU) preocupa-se em agrupar em 30 artigos, para pautar a defesa ao direito à vida digna para todas as pessoas. Este documento abarca avanços imprescindíveis, sempre partindo da premissa de que o ser humano nasce bom, a sociedade em que ele vive o corrompe, coadunado com o filósofo Jean Jacques Rousseau. Sabe-se também que ao longo da história as leis só garantem direitos onde existe fiscalização, resistência e luta.

Se observarmos a Constituição Federal Brasileira (CFB) de 1988, considerada uma das mais cidadãs do mundo, pautada nos Direitos Humanos, consta que o Estado deve garantir direito à moradia, à saúde, ao trabalho digno, educação, liberdade de expressão e aqui compreende a cultural e religiosa, ir e vir. No entanto, as leis não garantem nada.
Por que é tão importante memorar isto? Porque vivemos em uma sociedade sem memória e parte dela acredita que acordou um belo dia com todos os direitos garantidos e os tem simplesmente porque “deus” quis assim. Não avalia o quanto de sangue, luta, suor, tortura e lágrimas escorreram para serem conquistados e não sabe que, quem está no poder nunca precisou lutar por eles, luta apenas quem precisa. Daí surge a necessidade e a importância dos movimentos sociais e políticas públicas para pressionar a efetivação dos Direitos Humanos.

Tudo isso deveria estar muito claro por ser retrato da história. No entanto, o pouco investimento que tivemos em educação e a elaboração Plano Nacional de Direitos Humanos (PNDH) não foram suficientes para esclarecer e promover uma cultura de defesa destes direitos. A educação formal e informal não preparou de fato para as causas humanas, mas sim, se voltou para o mercado capitalista e mais especificamente em Joinville, para trabalhar na indústria. Se as pessoas não se derem conta de que, o que elas pensam delas mesmas não é delas, mas sim, fruto da visão e construção de outro sobre elas, não poderão iniciar o processo de libertação.

Então, DUDH, CFB, Educação, são mecanismos e instrumentos de efetivação destes direitos que precisam de atores que protagonizem a luta e a defesa dos mesmos. Sempre lembrando que eles são universais e inalienáveis, colocando a postura de defesa sob o olhar da comunidade internacional.

Os direitos defendidos nos artigos da DUDH trazem a reflexão da casa comum, do lugar onde se vive. Embora não faça citação à educação ambiental fica implícita a necessidade destes cuidados quando ela se refere à moradia digna, lazer, saneamento básico. Sugere que a humanidade se atente pelos bens indispensáveis para a sobrevivência e apela pelo respeito a qualquer tipo de vida. Logo, cuidar da terra, da água, do ar e de toda a biodiversidade, não com um olhar antropocêntrico, mas sim, observando a sustentabilidade integral é também lutar por Direitos Humanos.

Os Direitos Humanos compreendem também a Bioética. Nenhum ser humano pode ser alvo de pesquisas científicas sem que esteja ciente dos riscos/benefícios. Nenhuma pesquisa que envolva vidas humanas pode ser continuada sem passar pelos conselhos de ética das universidades. Esta preocupação perpassa também com pesquisas realizadas com animais. E estes também foram direitos adquiridos por manifestações de pessoas que perceberam na ciência, violação de direitos.


Nenhum ser humano deve ser sacrificado para benefício de outros. Ou seja, não vivemos em tempos messiânicos de um “deus” que nos dá e nos tira o que quiser.  Vivemos em tempos de lutas para garantir e proteger direitos e a resistência pautada na unidade das lutas é a marca registrada desta defesa. Por estes e outros motivos, olhar de maneira simplista para os Direitos Humanos é leviano e criminoso, coloca em risco vidas e contribui para a dominação do poder hegemônico.

* Lizandra Carpes é jornalista e assessora de comunicação do Centro dos Direitos Humanos de Joinville.

8 comentários:

  1. Quanta bobagem!

    Onde há retrocessos nos direitos dos brasileiros?

    A Constituição brasileira de 1988 não é considerada uma das “mais cidadãs” do mundo, é uma das mais DEMAGOGAS já escritas na face da Terra, fruto da cegueira de congressistas pós-regime ditatorial. Ou, qual Estado tem a capacidade de “garantir direito à moradia”? E o que viria a ser essa “garantia”, se nem no regime comunista esse direito é garantido a toda população? Ora, sequer educação, saúde e “trabalho digno”(?), são garantidos pelo Estado brasileiro. Até a liberdade de expressão, vira e mexe, é contestada, sobretudo pela esquerda?!

    O mercado capitalista é que propicia o desenvolvimento intelectual livre, a cidadania e a democratização. Há sistema capitalista em ditaduras, por outro lado, não há sequer uma só democracia distante do capitalismo.

    O “mercado capitalista” de Jlle, “voltado para a indústria”, é que levou milhares de cidadãos (os interessados!) a fazerem cursos de especialização em centros superiores. O “mercado capitalista” de Jlle, “voltado para a indústria”, é esse que AINDA mantém algum lastro empregatício num momento de crise profunda promovida por falsos-líderes incompetentes que os incautos colocaram no poder há treze anos.

    Mas eu sempre digo: é difícil para alguém que cresceu com ovomaltine, que estudou nos melhores colégios e aprendeu a ser esquerdista (comunista, fascista, progressista – essa gente não sabe a diferença!) com a pedagogia paulofreiriana ao inverso, pois a “liberdade” que tanto referia o pedagogo não é nada sem a verdade e o pragmatismo. Talvez o sistema “bancário” de ensino tenha mais resultados práticos benéficos aos cidadãos do que essa coisa passional e totalmente fora da realidade que cria monstrinhos colunistas de web-blogs.

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    1. Acho que você desconhece o sentido pleno da palavra democracia. O capitalismo é um sistema que matematicamente representado, seria uma pirâmide. É impossível todos ganharem! E isso não é uma opinião, é matemática. Cada vez que alguém decola de um jatinho particular, na outra extremidade muitos serão privados do mínimo. Ah, e por favor, não venham falar de sistemas que nunca foram colocados em pratica, como por exemplo o socialismo.

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  2. É. Fácil filosofar com o salário caindo no início do mês... Que tal falar sobre direitos humanos com os onze milhões de desempregados?

    Eduardo, Jlle

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    1. Direito humano não é um artigo de luxo.
      E sim uma necessidade para convivência civilizada. E se ela tem tempo e salário para pensar no assunto que mal tem nisso? Os desempregados não tem tempo para pensar nas questões profundas porque estão preocupados com a sobrevivência. Mas a longo prazo a convivência deve ser algo pensado.

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    2. Não sr., quem são as vítimas que deveriam ser assistidas pelos direitos humanos senão aqueles que perderam o emprego e estão sem perspectiva alguma de conseguir alguma fonte de recursos? Acontece que o trabalhador, aquele que paga as contas e é honesto, ganha uma banana dos “direitos dos manos”, pois não dá IBOPE.
      Direitos dos Manos, que é Direito dos Manos de verdade, tem de proteger bandido estuprador, aí sim esses hipócritas se sentem realizados.

      Eduardo, Jlle

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    3. Seu reacionário! Não disse em momento algum que só há direitos humanos para proteger "bandido".

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    4. Eduardo, apesar de seu problema ser, em parte, patológico, isso não elimina a possibilidade de que você leia sobre o que pretende comentar, especialmente quando se trata de tema tão amplamente divulgado e debatido.

      Sobre a Declaração dos Direitos Humanos, isso que você chama estupidamente de "Direito dos Manos":
      http://www.ohchr.org/EN/UDHR/Documents/UDHR_Translations/por.pdf

      Sobre direitos humanos, segurança pública e assistência a policiais vítimas de violência:
      http://www.dhnet.org.br/educar/balestreri/php/dh4.html

      http://www.ambitojuridico.com.br/site/?n_link=revista_artigos_leitura&artigo_id=13668

      http://www.marcelofreixo.com.br/opiniao/direitos-humanos-e-seguranca-publica/

      Sobre porque os Direitos Humanos devem atender também as vítimas da violência policial e institucional, mesmo que elas sejam criminosas:
      http://www.chuvaacida.info/2014/11/ja-somos-mexico.html

      http://www.chuvaacida.info/2013/07/dane-se-toulon-cade-o-amarildo.html

      http://www.chuvaacida.info/2013/09/e-isto-um-homem.html

      http://www.chuvaacida.info/2014/01/o-horror-o-horror.html

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  3. Os direitos humanos servem para evitar que o governo faça este tipo de coisa: http://outraspalavras.net/uncategorized/sequestro-de-adlene-hicheur-balao-de-ensaio/

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