sexta-feira, 24 de outubro de 2014

Vai terminar a pior campanha eleitoral da democracia brasileira

POR CHARLES HENRIQUE VOOS

Independente da vitória de Dilma ou Aécio, nós, brasileiros, não temos o que comemorar. Convivemos nos últimos três meses com o pior extrato possível de nossa democracia, materializada na corrida presidencial. O que já estava ruim no primeiro turno descambou para o patético e mediocredade no segundo. A sétima eleição para presidente após a redemocratização só evidencia que ainda estamos longe de um debate democrático sensato, inclusivo e igualitário.

Em primeiro lugar, não tivemos uma campanha eleitoral justa. Partidos menores, por mais que alguns destes sejam fruto da incapacidade nacional na questão da reforma política, deveriam participar de forma igual aos demais, sem exclusão ou tratamento diferenciado. Não foi isso que vimos na mídia, a qual se deu ao luxo de criar regras estranhas e nada coerentes com o que se diz democrático, priorizando os três porquinhos que lideravam todas as pesquisas.

Pesquisas estas que, contudo, precisam imediatamente de novos preceitos metodológicos diante dos erros abissais cometidos. A regionalidade é um fator variável na hora de analisarmos o comportamento eleitoral do brasileiro, mas oa levantamentos feitos pareciam se esquecer disto. Não há como fazer pesquisa eleitoral sem essa premissa.

Presenciamos, também, o perigo que é o atual sistema de financiamento de campanhas. Conforme o que já é debatido há muito tempo, a democracia corre perigo pois ela é altamente dependente dos altos investimentos privados para a potencialização do sucesso eleitoral de um candidato. Sendo assim, as empresas que mais necessitam de ações governamentais são as que mais investem na esperança de obter favores políticos em licitações, concorrências públicas e políticas setoriais e de subsídios. Consequentemente, as campanhas mais poderosas são as que mais permeiam os debates e as rodas de conversas dos eleitores comuns.

No primeiro turno, medimos a qualidade da campanha eleitoral pela zoeira virtual. As propostas perderam lugar para as brincadeiras, comparações e o sarro tirado com os candidatos porque, estes, esqueceram dentro dos escritórios dos marqueteiros as propostas de melhoria do Brasil. Temas importantes como mobilidade urbana (estopim das manifestações de 2013), combate à desigualdade, saúde, saneamento e segurança pública quase não foram pautadas. O sistema de debates, engessado, arcaico e repetitivo foi o principal responsável, em conjunto ao horário eleitoral gratuito, o qual serviu mais como palco para piadas do Tiririca do que apresentação de idéias.

Sofremos com o aparelho excretor, com a homofobia, com o preconceito e o ódio. Nadamos contra o respeito pela opinião alheia, por mais que ela fosse contrária a nossa. Partimos para uma agressão social gratuita. Ataques pessoais entre amigos infestaram nossas relações sociais, como se fosse um crime pensar diferente. O conservadorismo da ditadura rondou o imaginário de muitos. O desconhecimento sobre comunismo, socialismo e os programas de transferência de renda também. Nossa capital virou Havana e nosso pior inimigo era o bolivarianismo. Esquecemos do que era melhor para o país em troca de uma cegueira combinada à ilusão. Deixamos Everaldos serem estrelas e Marinas marinarem em um espectro de comoção nacional. A ideologia deu lugar ao individualismo e "liberdade de expressão". Ao invés de debates, tínhamos massacres.

E no meio disso tudo um acidente aéreo que abalou todas as estruturas e fez a "nova política" ruir na incoerência retrógrada de sua nova líder. Eduardo Campos mal morreu e já foi esquecido como se sua trajetória política fosse transferida para um patamar de herói de BBB. O "não vamos desistir do Brasil" foi esquecido no segundo turno.

Tudo aquilo que circulava pela internet foi transferido aos ataques de Dilma e Aécio, que pareciam crianças que se xingam mutuamente só pra ver quem fica sem respostas. A miséria foi tamanha que o tribunal eleitoral foi obrigado a intervir.

Agora estamos perto da decisão. Todos querem ganhar mas nos esquecemos da vergonha alheia que foi todo o processo. Saímos derrotados, sem exceções. Enquanto essa oportunidade de discutirmos o que de fato queremos, maior a chance de não sabermos o que cobrarmos lá na frente e repetirmos o pastoreio de ovelhas de junho do ano passado.

Ainda bem que vai acabar e, no dia sefuinte, poderemos tomar consciência e construir um processo totalmente diferente ao presente, olhando para trás, sem repetir de erros, e um futuro construído organicamente pelas lutas nossas de cada dia.

3 comentários:

  1. Discordo. Os partidos pequenos, representados por candidatos com menos de 2% dos votos, foram convidados a apresentar suas propostas e com tempos iguais para debater com os demais. Além dos “três porquinhos”, acompanhamos dois candidatos conservadores, um de centro-esquerda e outra ultra-mega-blaster esquerda. Todos tiveram tempo de apresentar suas propostas, mas, se a candidata do autor foi pouco questionada, é porque realmente não tinha muito a acrescentar nos debates além aquele clichê combalido sobre “subserviência ao capital”.

    No primeiro turno vimos o quão danoso é o aparelhamento do governo sobre empresas estatais, como os Correios, com carteiros obrigados a distribuir santinhos no lugar de correspondências. Agora vemos o mesmo sobre os órgãos de pesquisa e até sobre a Polícia Federal. A candidata à reeleição não apresentou programa de governo, é o que está aí e pronto. A única entre os “três porquinhos” a apresentar um programa de governo feito em conjunto com o seu antecessor falecido, foi alvo de um efetivo marketing mentiroso de desconstrução de sua imagem, o mesmo ocorre com o candidato de oposição. Não bastou aquela triste cena em 1989, no debate entre Lula e Collor, que favoreceu o último candidato. O PT aprendeu como usar e denegrir os familiares de seus opositores.

    Particularmente preferia uma terceira via no governo federal, ainda assim, sou favorável a rotatividade no poder para não correr o risco de transformar o Brasil numa ditadura, como muitas, travestidas, na América Latina. O próximo governo promete! Ora, no fundo todos nós sabemos o quanto os números são maquiados. Que o baixo índice de desemprego deve-se a diminuição da procura (isso foi comprovado pelo próprio IPEA). Que boa parte dos mais de 5 milhões de empregos criados no governo Dilma, não forma criados, mas legalizados. Que a inflação real já ultrapassou (e muito!) a meta. Que o dólar só tende a crescer e encarecer ainda mais os produtos (e não estou falando de Ipod!). Que os preços dos commodities (que alavancaram o crescimento do país) já voltaram ao normal. Que a indústria tem a mesma participação no PIB nos tempos de Juscelino Kubitschek, e vem caindo ainda mais. Que a participação do Brasil no comercio mundial vem decrescendo, mesmo com estatais brasileiras comprando, lá fora, plataformas petrolíferas construídas no país. Que o Brasil vai se distanciando dos grandes mercados, a não ser aqueles governados por ditaduras. Que um país que cresce 0,3% não tem condições de manter empregos.

    Prefiro olhar pra frente. Prevejo números maquiados, maniqueísmo, controles da imprensa, dos bancos, da poupança e falta de liquidez.

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  2. Concordo em parte, Charles, com a tua visão do alarido geral que tem sido esta campanha. Mas, há todo um debate maravilhoso e construtor de democracia rolando pelos meandros da rede. Há, sim, impaciência no ar, alimentada por enorme desinformação. Mas, por outro lado, nunca ficaram tão claras – pelo menos para mim e para várias outras pessoas que tenho ouvido e lido – as diferenças entre a proposta neoliberal (não aquela que está "copiada" no plano de governo do PSDB, mas a que é expressa pelos discursos do candidato tucano, por FHC, por seus possíveis ministros e por seus cabos eleitorais) e a do governo popular (que está sendo enriquecida com contribuições vindas também dos eleitores dos pequenos partidos, que querem um país pelo menos um pouco mais próximo daquele com que sonham). Enfim, a construção da democracia é lenta. Estamos a apenas 25 anos do fim de uma ditadura que nos emburreceu bastante do ponto de vista político. Precisamos ter um pouquinho mais de paciência histórica e continuar compartilhando nossas ideias. Eu também gostaria que fosse mais pacífico o caminho.

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  3. Teremos o que comemorar quando aécio for declarado eleito. Se não, será a continuidade da roubalheira patrocinada pelo calaboca do bolsa família.

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