
POR FELIPE SILVEIRA
Semana passada, mais precisamente na quinta-feira (22), foi celebrado o Dia Mundial sem Carro. A ideia é boa: fazer as pessoas refletirem sobre o uso excessivo do carro e pensar nas alternativas de mobilidade, como o transporte público e a bicicleta. Pensando nesse tema tão importante, nesse trânsito tão caótico, escrevi esse texto, que começa com a seguinte historinha:
Lá pelos 16 ou 17 anos, meu grande dilema era saber como voltar pra casa de uma festa que acabasse mais cedo, lá pelas 2 ou 3 horas, por exemplo. Sem carro nem permissão pra dirigir, sem bicicleta (não dava pra ir pra balada de zica), sem dinheiro pro táxi e sem carona, eu tinha que esperar, pelo menos, até as 4 horas pra voltar pra casa, que era mais ou menos a hora que o ônibus começava a rodar.
Por causa dessa dificuldade pra voltar pra casa, o meu sonho era fazer logo 18 anos e a carteira de motorista, para não me incomodar mais com essa situação. E, assim como eu, milhões de moleques não vêem a hora de sair por aí motorizados.
É claro que esse não é o motivo principal para alguém querer ter um carro, mas esse pequeno relato pessoal ilustra a questão que, para mim, é central para o debate da mobilidade urbana. O transporte público precisa oferecer vantagens reais para as pessoas, pois só assim será usado efetivamente. “Não adianta” trabalhar pela conscientização se, na vida real, andar de ônibus é um inferno. E é.
O mesmo vale para a bicicleta. Eu, que ando de magrela há 15 anos para trabalhar e estudar, tenho me sentido cada vez mais inseguro nas ruas sem ciclovias e sem respeito algum por parte dos motoristas.
O preço da passagem do ônibus é um absurdo. Simplesmente não vale a pena. Só anda de ônibus quem não tem condições (financeira ou outra) para andar de carro. Sem falar do desconforto e da demora do transporte público. Recentemente, eu tive a oportunidade de escolher entre ir trabalhar de carro ou de ônibus, pois o local era longe da minha casa. Fiz as contas e o carro saiu mais barato. Mesmo que a passagem custasse a metade do preço, ainda assim seria muito cara para a população optar pelo ônibus.
Ou seja, é urgente que se pense em tornar o transporte coletivo vantajoso para a população. A conscientização deve caminhar junto, mas ela sozinha não resolve. Quando conseguirmos pegar o ônibus pertinho de casa, viajar confortavelmente, e chegarmos rapidamente e próximo ao destino, com baixo custo (ou nenhum custo, como na proposta do Movimento Passe Livre) aí sim iremos avançar nessa questão.
Esse texto é apenas uma pincelada sobre a questão do transporte, que envolve muito mais coisas, como o direito de ir e vir, o acesso à cultura, ao lazer. Não há, aqui, nenhuma pretensão em dar uma palavra final sobre a questão. Espero que o debate se estenda nos comentários e em postagens futuras (minha e dos colegas).
Essa semana falei sobre uma alternativa que presenciei em Portugal, para que o Transporte Coletivo volte a ser vantajoso em nossa cidade, através da Mensalidade para uso ilimitado do serviço. Segue link da entrevista: http://portaljoinville.com.br/v3/?call=noticias.view&id=19225
ResponderExcluirMas essa questão apontada, sobre a volta da balada, também era preocupação do poder público português. Lá, além da mensalidade, que fazia com que os baladeiros não tivessem outro gasto, pois normalmente já tinham a carteira mensal, todas as madrugadas a polícia fazia blitz para pegar os motoristas que saiam dessas baladas alcoolizados, forçando ainda mais o uso do Transporte Coletivo. TODA SEXTA, SÁBADO E DOMINGO de madrugada havia blitz nas principais avenidas próximas as baladas.
Em Joinville foram criados os circulares da madrugada. Atendem toda a cidade e saem de uma em uma hora no máximo pra qualquer lado. Mas quase ninguém usa. A questão é cultural acima de tudo. Carro ainda significa poder...todo mundo se transforma ao volante, o pedestre vira o chato que atrapalha, o ciclista, o louco que se mete na frente...o ônibus vira um estorvo amarelo e quem anda de ônibus é o coitadinho...Quando isso vai mudar? Será que isso vai mudar?
ResponderExcluirQue bom que tocaste neste assunto, Felipe. Estas datas criadas para conscientizar e chamar a atenção da população para causas importantes, não raramente, acabam caindo na lógica do "cabe a cada um fazer sua parte". E quando tem questão ambiental, a tendência é ainda maior. Quando eu morei em Montreal, no Canadá, fiquei impressionada com a qualidade do transporte urbano: ônibus menores, com climatização (quente, por conta do frio intenso), muitas linhas e uma planilha de horários riquíssima, pontualidade impar, sistema online de verificação de horários e rotas (tinha, inclusive, um programinha online onde você dava seu ponto de partida e destino e ele criava várias alternativas de rotas, envolvendo todos os meios: ônibus, metrô, a pé...). Tudo integrado. Assim, tem muita gente que usa carro e acaba preferindo fazer tudo de ônibus, deixando o carro apenas para o final de semana.
ResponderExcluirDou o exemplo porque, antes de tudo, é preciso vontade política para criar um sistema de transporte urbano realmente eficaz e atraente para a população, começando pelas tarifas. No final das contas, tenho a sensação de que estes "dias" acabam servindo mais como estratégia de marketing para o governo do que qualquer outra coisa (vai todo mundo pra rua, secretários, prefeito, assessores, eita!!!)... Enfim, é uma boa questão pra debater! Beijo.
Hahaha,as idéias e propostas da Maria Elisa são ótimas, roteiros, horários, mapas. Aqui não temos nem pontos de ônibus decentes, nem informação de quais linhas passam por quais pontos. Tem tudo para melhorar... e esta é a melhor noticia.O transporte coletivo em Joinville tem um enorme potencial de melhora.
ResponderExcluirhttp://www1.folha.uol.com.br/colunas/gilbertodimenstein/979138-dia-mundial-sem-carro-e-um-sucesso.shtml
ResponderExcluirFelipe, discordo em parte que o transporte coletivo precisa ficar mais atraente. Moro numa região de SP que tem um transporte bem melhor do que no resto da cidade, e ainda assim, raras pessoas que moram por aqui, de classe média/média alta, utilizam o transporte coletivo. Porque realmente é uma questão de status. Aqui em SP o carro nem é tão mais confortável, os congestionamentos são infernais! Acredito que as pessoas precisam se conscientizar de que o carro é um meio de transporte individualista e mudar de hábito. Porque essa visão reflete em toda a questão de urbanidade. Se transporte público não for uma demanda importante da classe média, os governantes não vão se importar. E no fim das contas, quem mais sofre é a população das periferias.
ResponderExcluirCecilia, realmente, o domínio do carro é uma questão cultural justamente pela ausência do Estado que dá privilégios para as indústrias automobilísticas e produz o espaço urbano de forma que a cidade seja espraiada, com tudo longe. Um modelo norte-americano de planejar as cidades...
ResponderExcluirCharles, não sei se concordo. Acho que a questão cultural vem antes, e o Estado segue a demanda do eleitorado de classe média.
ResponderExcluirCito aqui o trecho de um post da Jeanne Callegari:
"A questão é se reconhecer como parte do problema. Todo mundo quer que se venda menos carros – para os outros. Todos acham que o transporte público deve ser melhor – para que os outros o usem e deixem a via livre para ele circular. Claro que, se todo mundo continuar pensando assim, não iremos muito longe (nesse caso, literalmente)."
Oi, Cecília. Em primeiro lugar, obrigado pela participação.
ResponderExcluirAgora, sobre a questão, penso o seguinte: É importantíssima a conscientização. Muito importante mesmo. Mas, com ela, precisa existir um serviço melhor de transporte público, como a Elisa citou que existe no Canadá, como existe na Europa. Sem vantagens pro cidadão, não há motivo para andar de ônibus.
Em SP, como você disse, andar de carro também é um inferno. Mas de ônibus é mais ainda. Se não fosse, as pessoas iriam optar pelo ônibus, tenho certeza. Se fosse barato, rápido e confortável, todo mundo usaria.
Aqui em Joinville é muito, mas muito, mais confortável andar de carro.
As duas coisas precisam andar juntas: conscientização e melhora no serviço. Uma sem a outra não funciona.
Na minha modesta opinião, claro.
:)
Vejo o governo diminuir impostos para incentivar a compra do automóvel (que mesmo assim ainda é bastante caro), mas nao vejo diminuição de impostos para bicicletas, transporte coletivo (combustível, peças, passagem, etc) Ou seja: CULTURALMENTE SE DÁ INCENTIVO OFICIAL AO CAOS URBANO.
ResponderExcluirEntão concordo com o Charles, que deve partir do poder público o primeiro passo para daí se tornar habito da população o uso de transporte coletivo. Eu, por exemplo, prefiro usar onibus ou bicicleta, mas muitas vezes isso é inviável por N motivos.
Sem grandes investimentos públicos nesta área nunca haverá mudança de comportamento do cidadão. Acho que isso também se aplica à reciclagem do lixo.
Na minha modesta opinião, acho que tudo é pensado pela contra-mão.
ResponderExcluirA população pensa: se eu não tiver carro, eu vou de ônibus.
O governo/empresas pensa: Se não tem ninguém usando transporte coletivo a essa hora ou por esse lugar, então não precisa ter linha nesse local ou horário.
Concordo com o Charles que há uma "cultura automobilística" muito forte enraizada em Joinville e precisa ser mudada, principalmente com apoio dos movimentos sociais. Mas não vai ser só com batuques, manifestações e mega-fones que isso vai acontecer. Essa luta não deve ser bandeira só de uma organização. É dever de toda entidade que se julga do lado da classe trabalhadora defender essa luta.