sexta-feira, 23 de maio de 2014

Copa, capital e povo na rua... vai ter!

POR FELIPE SILVEIRA

Ok, o nome do jogo é capitalismo, a indústria é do futebol, o dinheiro abunda e parece que a copa vai rolar mesmo. Beleza. Que venham os turistas, despejem sua grana, vejam seus jogos, vão embora e voltem sempre. Agora, o que eu não consigo entender é gente que reclama do povo na rua. Ora, o nome do jogo não é capitalismo?! Se é capitalismo tem povo na rua, cedo ou tarde.

Claro, há uma direita oportunista que se aproveita. Sabemos como são os parasitas. Mas daí a zombar da situação e da luta do povo é outra história. O povo tá na rua porque não tem teto, não tem terra, não tem parque nem praça. O povo tá na rua porque tem que madrugar para pegar uma ficha no posto de saúde, onde, quando é atendido, é maltratado. O povo tá na rua porque precisa madrugar pra trabalhar, pegar três ônibus, pagar três reais por passagem, viajar de pé e sem segurança. O povo tá na rua porque qualquer curso universitário custa mil reais a mensalidade, e tem que fazer. O povo tá na rua porque a polícia é violenta, e mata.

A copa não é a origem de todos esses problemas, obviamente, mas ela é uma representação imensa deles. Nunca ficou tão claro para o brasileiro como é esse lance da exploração. Nunca ficou tão claro quem ganha e quem perde nessa parada de capitalismo. Quem entra com o pé e quem entra com a bunda.

Ok, nem todo mundo chama o problema de capitalismo. Há um grupo que não tem dúvida que “a culpa é do PT”. Não acho, porém, que esse grupo tá na rua. Estão pelo facebook, nas caixas de comentários dos jornais e blogs como o Chuva Ácida. Quem tá na rua talvez já tenha confiado no PT para ajudá-lo a se livrar dos grilhões.

O nome do jogo é capitalismo. Ok, o povo já entrou em campo.

O problema, amigos, não é a copa. É o que ela representa: as contradições. E as contradições, bom, as contradições vocês sabem aonde levam...

quinta-feira, 22 de maio de 2014

O choque de gestão está aí

POR EDUARDO SCHMITZ

O título não é uma ironia. É a realidade. O prefeito Udo Döhler foi eleito atrelado à ideia de que seria o responsável por causar um choque de gestão. Ele é o gestor durão que faz as coisas acontecerem. E o choque está aí. Mas essa afirmação só faz sentido quando entendemos que existem formas diferentes de entender a tal gestão. Podemos falar da gestão administrativa, mas também da gestão política. É nessa diferença que surgem indignações como a segunda greve dos servidores.

Para o cargo de prefeito, cabe muito mais o papel de gestor político do que gestão administrativo. São mais de 10 mil funcionários na prefeitura. Sejam cargos comissionados ou de carreira, eles são os grandes responsáveis pelo funcionamento administrativo da cidade. Para o prefeito fica a missão de dar a linha política da coisa toda.

As notícias dos últimos dias se somam ao primeiro ano de mandato e evidenciam que, sim, o prefeito Udo Döhler deu um choque de gestão (política). Vocês lembram qual foi o primeiro dilema do prefeito quando ele assumiu o executivo? Dívidas. E quem saiu perdendo? O servidor, que, inimaginavelmente, recebeu o salário atrasado.

Gestão política implica em escolhas políticas. Nesse ponto, fico com uma visão completamente dualista. O prefeito pode escolher pelos interesses da população (representados pelos servidores, no contexto atual) ou por outros interesses que não são necessariamente coletivos. Exemplifico.

Crédito: Facebook do Sinsej
O jornal "A Notícia" do dia 14 de maio, na coluna de Jefferson Saavedra, traz a seguinte informação: "Em julho, a Prefeitura de Joinville completa o pagamento dos fornecedores do chamado grupo B, o pessoal que tinha dívidas entre R$ 100 mil e R$ 4 milhões. Desde o início do ano passado, esse grupo vinha levando R$ 2 milhões mensais". A coluna ainda informa que com o total dos pagamentos, a prefeitura terá desembolsado R$ 70 milhões até o final de 2016.

A mesma coluna, no dia 21 de maio, traz a informação de que o reajuste dos salários dos servidores, aplicando apenas a inflação (5,82%), terá um impacto de R$ 26,6 milhões no cofre da prefeitura até dezembro de 2014. Não é possível fazer uma comparação direta e proporcional, mas o que quero evidenciar é que ambas situações lidam com quantias expressivas de dinheiro público. E mais importante: elas só acontecem por causa de vontade política.

A escolha por um dos lados na gestão política do prefeito Udo fica clara quando vemos pelo segundo ano os servidores paralisando suas atividades para conseguirem o mínimo que avanço nos seus direitos e benefícios. Já os outros credores da Prefeitura tiveram sua vida facilitada. Ou alguém viu empresários "acampados" em frente à prefeitura com trio elétrico? Num estalar de dedos, todas as dívidas foram negociadas e tiveram pagamento programado.
"Se o prefeito Udo fosse mesmo o prefeito da mudança, ele bateria no peito e diria para os empresários esperarem. Mas mais ninguém aqui acredita em conta da carochinha, né? "

Eduardo Schmitz é jornalista.

quarta-feira, 21 de maio de 2014

Udo Dohler no AN: o prefeito em seu labirinto

POR JORDI CASTAN

O impacto da entrevista concedida pelo prefeito Udo Dohler ao jornal "A Notícia" tem sido maior que o esperado. Dificilmente poderia haver pior momento e a mensagem tem sido recebida pelos leitores do jornal com preocupação. É bom lembrar que uma boa parte do eleitorado natural do prefeito é composta por leitores do maior jornal de Joinville. Os marqueteiros políticos e os bombeiros de plantão tiveram que agir depressa para evitar que o desgaste fosse maior. Mas o estrago já foi feito.

Por que a entrevista repercutiu tão mal entre o joinvilense? Primeiro porque o eleitor está começando a ficar preocupado com o dia a dia da cidade. Nada parece andar e o proposto choque de gestão continua sem chegar ao cidadão. Os que deveriam ser os pontos fortes da gestão Udo não são visíveis. E o tempo passa: praticamente um terço da gestão já se foi e não há sinais no horizonte que prevejam mudanças a curto prazo.

Corrupção – O prefeito diz que há corrupção na sua gestão. É bom lembrar que quando uma fiscal da Seinfra foi detida pela Polícia Federal por corrupção, o prefeito já usou este discurso, mas nada foi feito que mostrasse uma vontade de mudança. Agora volta a falar de corrupção, mas não dá nomes, não diz em que setores e não apresenta alternativas concretas para combatê-la. Lembrando ainda que recentemente veio à luz uma denúncia envolvendo a licitação em andamento da manutenção da iluminação pública e que envolvia um super-secretário municipal.

O tema tem levantado ainda mais dúvidas sobre a imagem de um candidato que fez durante a campanha da honestidade o seu diferencial, quando todos sabemos que honestidade para um homem público deve ser um pré-requisito e não um diferencial. O resultado é descrédito sobre a sua verdadeira vontade de resolver o problema e a animosidade dos funcionários públicos honestos, que se veem colocados na vala comum dos corruptos.

Gestão – Definitivamente a gestão municipal patina, patina e não sai do lugar. Sem entrar na discussão das diferenças entre a administração pública e a praticada pela iniciativa privada, o fato é que ambas têm as suas diferenças, mas também seus pontos em comum: a busca da eficiência, os princípios da economicidade e da eficácia, unidos à planificação, controle e a gestão devem ser comuns a ambas. Na administração pública só pode ser feito o que a lei permite, na iniciativa privada o que a lei não proíbe está permitido. Está aí uma grande diferença, não é perceptível ainda a diferença entre uma gestão política e a gestão com uma visão empresarial. Transcorreu tempo suficiente para que as diferenças pudessem ser percebidas pela sociedade. Sem choque de gestão toda a proposta apresentada pelo prefeito na sua campanha é posta em cheque e o custo político é evidente.

Política – Quando eleito o prefeito teve a oportunidade e o crédito para poder fazer uma gestão diferente; para isso precisava tomar algumas decisões que evidenciassem a vontade de fazer um governo técnico e que se diferenciasse das gestões anteriores. Não o fez e optou por uma abordagem mais política. Um empresário que tenha administrado uma empresa com um faturamento superior aos R$ 100 milhões tem melhores condições de entender e administrar uma cidade com um orçamento 10 vezes maior. Saberá ler um balanço e tomar decisões baseadas em critérios técnicos e administrativos.

O problema é quando alguém tenta compatibilizar este perfil com um perfil político. O resultado é que mesmo com uma maioria absoluta na Câmara de Vereadores, o prefeito ainda não está satisfeito e preferiria um legislativo mais submisso e obediente, sem compreender o papel de cada um dos poderes no modelo republicano. Como político, Udo tem ainda muito por aprender. Os seis mandatos como presidente da ACIJ e os quase 20 anos à frente do Sindicato da Indústria Têxtil não proporcionaram o aprendizado político de que tanto precisa neste momento.

Foto: A Notícia
Clientelismo – Por favor, que alguém explique com urgência ao prefeito o que é clientelismo. Porque afirmar que há clientelismo e que esse é um entrave à gestão municipal - em especial vindo dele - parece um contrassenso. A impressão que ficou depois da entrevista é que o clientelismo pernicioso é o dos outros; quando o clientelismo tem como objetivo atender as demandas dos amigos do rei ou dos apoiadores da campanha, além de ser normal, deve ser visto exclusivamente de defender o que é bom para Joinville.

O prefeito parece atolado no tempo em que na ACIJ se dizia em voz alta que “o que é bom para ACIJ é bom para Joinville”. Nos dias de hoje a frase deveria ter outra sintaxe: “o que é bom para Joinville é bom para a ACIJ”, pois assim a frase ganharia um significado e repercussão muito diferentes. É provável, contudo, que o prefeito não tenha deixado ainda de pensar como presidente da ACIJ.

Democracia e participação popular –  O perfil do prefeito Udo Dohler não é e nunca tem sido o de um democrata; pois é conhecido pelo seu perfil autoritário. A frase que melhor o define é a de que é alguém que ouve, mas não escuta. Acostumado a mandar e a ser obedecido, não faz parte do seu quotidiano escutar, reconsiderar, lidar com vozes e opiniões dissonantes ou simplesmente distintas das suas. Quem o conhece melhor sabe o quanto de esforço pessoal deve representar para o prefeito ter de lidar com minorias que, como parte do processo democrático e utilizando-se dos espaços de participação democrática, discordem da sua visão da cidade e do mundo.

Há duas possibilidades: a primeira é que o desgaste político continue aumentando e a sociedade como um todo pague o preço da teimosia ou então que se produza uma mudança radical na forma de ver e entender o papel da sociedade organizada na tomada de decisão. A segunda parece improvável e deveremos ter até o final do mandato uma fase conturbada. O curioso disso tudo é que boa parte dos eleitores do Udo votou nele acreditando nessa imagem de turrão, no seu perfil autoritário, pois imaginavam que Joinville precisava de um prefeito com este perfil. Assim, o futuro das cidades como Joinville, que não podem ser administradas mais no grito ou na vontade, vão precisar de administradores que reúnam ao mesmo tempo a capacidade política de negociar com o conjunto da sociedade e integrá-la num projeto de cidade e capacidade de administrar uma máquina complexa com milhares de funcionários e orçamentos bilionários.

Judicialização - O Prefeito Udo Döhler apontou a “judicialização” como a causa do que chama de problema da tramitação da LOT. Disse ainda que, além de terem refeito tudo ao longo de 2013, estavam em contato permanente com o Ministério Público, a fim de não cometer nenhum descuido. Tais declarações são de causar espanto. O verdadeiro problema não é a “judicialização”, mas, ao contrário, o atropelo implícito ao planejamento do IPPUJ para execução – em rito sumário – de audiências públicas para debater tema fundamental para a vida dos cidadãos, verdadeira maratona de eventos em dias consecutivos e com duração, pasmem, de meras duas horas cada uma.
Foto A Notícia

Essa pretensão provocou reação dos munícipes, que não tiveram outra opção senão recorrer – por meio de oito associações de moradores – ao Ministério Público. Deste receberam apoio, sob a forma de recomendações para que o IPPUJ atue em consonância com a lei, propiciando aos cidadãos, com a devida antecedência, elementos necessários para que formem convicção abalizada sobre as implicações das propostas da nova LOT sobre suas vidas social, econômica e patrimonial.

O prefeito inverte, assim, a ordem das coisas: não foi a Prefeitura/IPPUJ que se coordenou ativamente com o Ministério Público, a fim de não cometer erros. Foi a partir de um erro que estava, sabe-se lá por que razões, prestes a ser cometido pelo IPPUJ, que o Ministério Público, a pedido de alguns moradores de Joinville, devolveu o assunto aos trilhos, determinando ao Poder Executivo que atue da forma que se espera do administrador público. Ou seja, agindo com transparência e cumprindo o que determina a lei aplicável ao assunto.

E se o Prefeito está insatisfeito com a velocidade de tramitação da LOT, só precisaria comandar seus subordinados do IPPUJ para que ajam nesses termos. Afinal, o cidadão está apenas se defendendo contra a incompetência de uma entidade que se tem mostrado incapaz de cumprir seu papel, abdicando de discussões educativas, abertas e cristalinas com a população, em nome do verdadeiro rolo compressor que até este momento tentou passar sobre pessoas cujo conhecimento sobre o tema beira a inocência. A judicialização é hoje o caminho encontrado pela sociedade para se proteger das arbitrariedades e da falta de participação democrática.

Em resumo, a entrevista do prefeito não foi um tiro no pé. Foi uma rajada. No pé, na perna, no joelho e nas costas. A pergunta que fica é se o prefeito sabia o que ia encontrar? Pessoas próximas a ele asseguram que foi avisado. O próprio ex-prefeito Carlito afirma que o avisou. O prefeito como sempre ouviu, mas não escutou.


Reprodução A Notícia

segunda-feira, 19 de maio de 2014

Vendendo seu peixe.


O que é ruim a gente esconde


POR JORDI CASTAN
Quem lembra ainda da frase que custou o posto de ministro a Rubens Ricupero, no governo do falecido Itamar Franco? O Brasil mudou muito e hoje ninguém mais perderia o cargo por isso.  Em Joinville, o MPSC investigava uma denúncia contra quatro secretários municipais pelo acúmulo de vencimentos, que recebiam, de forma cumulativa, o vencimento de Secretário e jetons da CAJ de R$ 3.000,00 - o que é vedado pela lei Orgânica do Município. A notícia divulgada pela imprensa foi que a ação foi arquivada.

A primeira leitura para o leitor desavisado é que nada havia de errado, que tudo não passou de mais um caso de “denuncismo” e que os secretários cujos nomes foram citados não cometeram nenhum ato ilícito. É bom pesquisar um pouco mais. Quem estiver interessado em conhecer a verdade dos fatos pode achar no site do MPSC as informações que são todas públicas. Até este momento somente os secretários Miguel Angelo Bertolini e Romualdo França devolveram o valor recebido irregularmente. 




O ÓBVIO ULULANTE - Parece que a recorrente concessão de liminares e intervenções da Justiça em seu governo - eufemisticamente denominadas pelo prefeito como acidentes de percurso - tornou-se o carimbo do cotidiano, envolvendo até os mais competentes e preparados auxiliares que fazem as vezes de dublê de secretários municipais e conselheiros do Conselho de Administração da Companhia Águas de Joinville. Nesta última semana, veio a público o resultado de uma investigação iniciada pela Promotoria no ano passado, concluindo o óbvio ululante: os secretários Nelson Corona, Miguel Angelo Bertolini, Romulado França e Braulio Barbosa não podem acumular os seus vencimentos de Secretários com os generosos jetons de R$ 3000,00 pagos por cada reunião com duração de uma hora do Conselho de Administração da CAJ- Companhia Águas de Joinville.

Inquiridos pela Justiça, dois secretários se apressaram em enviar um ofício (em anexo) para a Promotoria da Justiça e ao Presidente do Conselho da Administração da CAJ - um empresário indicado pelo prefeito Udo - dizendo que não podem mais receber o jeton de R$ 3000,00 devido à proibição existente na Lei Orgânica do Município. Imagino com deve ter sido doloroso aos eminentes secretários Miguel Angelo Bertolini e Romualdo França a devolução dos jetons percebidos nos últimos 10(dez) meses, cada qual a insignificância de R$ 42.052,14.



Ainda não se tem notícia que Nelson Corona e Braulio Barbosa devolveram a parte deles, mas acreditamos que isto deva ocorrer em breve. Pesou na decisão republicana do prefeito a eficiência administrativa, a preocupação com a gastança dos recursos públicos e a tolerância zero com as cifras douradas. Pena que isto só aconteceu por medo do pau comer na Justiça. Acidentes de percurso acontecem nas melhores famílias e ainda assistiremos muitos exemplos nesta (in)-eficiente gestão.

OBS: cifras douradas - é um conceito sociológico criminal que se refere as infrações contra o Estado praticados pela elite política e econômica que não são investigados pelos órgãos oficiais.



ACIDENTES DE PERCURSO - O prefeito tem se especializado em acidentes de percurso (é quase um campeão). Desde que assumiu a gestão do município de Joinville, Udo Dohler tem recitado o mantra da eficiência, da economicidade e da gestão profissionalizada. Acredito que ele seja fã do ex-prefeito de Nova Iorque, Rudolf Giuliani, famoso por criar a doutrina da Tolerância Zero, prima-irmã da Teoria das Janelas Quebradas de Chicago. Mas como o pensamento sem reflexão é como a água no pântano, a experiência obtida na iniciativa privada não tem surtido efeito esperado no trato com a coisa pública. O resultado é sintomático: falta de planejamento, inépcia dos serviços públicos e avaliação em queda livre.

Nesta última semana, o toque de Midas (inverso) do prefeito foi ofuscado por duas ações na Justiça. Uma delas impediu temporariamente que o prefeito terceirizasse o serviço de saúde, contratando uma instituição privada para desafogar a grande pedra do sapato em sua gestão: o caos que se tornou a saúde pública na cidade, com falta de leitos, ausência de medicamentos, falta de médicos e represamento de 200.000 consultas à população carente de Joinville atendida pelo SUS.

Depois da Justiça afastar o ex-secretário da Saúde, dono de um perfil cooperfildiano, pela sua capacidade em fazer desaparecer nomes das longas listas de espera por uma consulta, agora entendeu que a terceirização da saúde, uma atividade-fim do Estado, configura indícios de malversação de recursos públicos e atenta contra as regras da boa administração pública. Assim, os míseros 10 milhões de reais depositados na conta do Fundo Municipal de Saúde predestinados a sangrar, por ora ficarão em paz em berço esplêndido.

sexta-feira, 16 de maio de 2014

TV Revolta, rede de ódio e a alternativa

POR FELIPE SILVEIRA

A modinha da semana é a tal TV Revolta. Uma porcaria de página no Facebook que publica montagens com teor de direita e principalmente antipetista, além de algumas mensagens de auto-ajuda e outras supostamente engraçadas. É apenas mais uma neste mar de lixo, na rede de ódio que cria a cada dia um novo ponto distribuidor.

O sucesso, imagino, se deve ao modo meio disfarçado de ser de direita e à simplicidade das publicações, que não exigem reflexão alguma dos leitores. Também é diferente de páginas assumidamente fascistas, que exigem dos leitores que assumam preconceitos e o gosto pela violência.

Mas a TV Revolta não é o problema. Como já disse, ela é só mais um nó na rede de ódio que cresce a cada dia, pois odiar é fácil e fomos criados em um sistema que o estimula. O problema é que não conseguimos propor uma alternativa a isso.

O que podemos fazer para mudar os rumos dessa discussão? Investir maciçamente e promover o acesso de todos à educação? Criar vínculos e ações comunitárias que envolvam as pessoas de maneira que elas sejam protagonistas na sociedade? Ir em massas às ruas? Criar e exigir uma imprensa alternativa e transformadora? Criar e cobrar leis que promovam a emancipação e garantam direitos à sociedade?

Parece-me que tudo isso é extremamente importante, mas também muito lento. Enquanto isso a TV Revolta chega a milhões de pessoas, assim como as igrejas, certos radialistas locais, o Cidade Alerta, o Jornal Nacional...

O cenário é tão desolador quanto o sistema de abastecimento de água de São Paulo, mas, assim como a chuva pode cair a qualquer momento, uma ideia nova pode aparecer. E, se não aparecer, sigamos em frente, construindo nossos laços, nossa rede.

quinta-feira, 15 de maio de 2014

Amarrado 02


Vai ter Copa! E...?


Não é preciso entender alemão
POR CLÓVIS GRUNER

Desde criança me sinto um peixe fora d’água: nascido e criado em um país que fez do futebol uma espécie de patrimônio, passei a esmagadora maioria de meus anos sem entender, gostar, jogar ou acompanhar futebol. E mesmo tendo descoberto, só recentemente, que realmente pode ser divertido “jogar uma pelada” com os amigos, minha inaptidão para o esporte permanece inalterada: eu não apenas jogo mal sempre que entro em campo, como meu contato com o futebol se limita aos encontros de sábado à tarde com alguns camaradas e alunos. Embora agora jogue, eu continuo sem entender, gostar ou acompanhar futebol.

Por isso me causou certo estranhamento quando comecei a ver pipocar, nas ruas e demais redes sociais, o “Não vai ter Copa”. Indaguei-me algumas vezes acerca do por que em um país que sempre amou o futebol, e que amargou décadas esperando sediar novamente uma Copa do Mundo – sim, acreditem, já houve um tempo em que reclamávamos do descaso da FIFA –, muitos entre nós tratamos o evento não apenas com desdém, mas com sincero repúdio?

Não existe uma resposta única, nem tampouco óbvia, para a questão; da mesma maneira como não são unívocos os motivos que levam tanta gente a compartilhar a palavra de ordem #nãovaitercopa. Há muito oportunismo, sem dúvida, especialmente porque o evento coincide com o ano eleitoral e a oposição, desprovida de projetos e programas, aposta suas fichas no fracasso da Copa do Mundo para desestabilizar o governo e faturar uma casquinha eleitoral. Mas até aí nenhuma novidade. Faz parte do jogo, e o PT não faria diferente se fosse o contrário.

Há, igualmente, muita ingenuidade, um bom quinhão de desinformação e porções generosas de má fé. É ingênuo acreditar, mesmo vagamente, que os investimentos em educação e saúde, por exemplo, seriam maiores e melhores sem a Copa do Mundo ou que nossos problemas, estruturais alguns deles, estariam magicamente resolvidos não fosse o evento. Falta informação a quem insiste em afirmar que os investimentos feitos sangram os cofres públicos e contribuem para fragilizar ainda mais a economia; nossas incertezas econômicas não começaram com a Copa e não se encerrarão depois dela. Mas, principalmente, compartilhar uma notícia velha e descontextualizada, elogiando a decisão do ditador João Batista Figueiredo ao recusar, em 1983, sediar a Copa de 1986, como se isso o tornasse algo mais do que ele realmente foi, um presidente autoritário e truculento, se não é má fé, só pode ser estupidez.

COPA E DEMOCRACIA – Mas não acho que se possa ver a questão apenas sob esse prisma. Porque se há um pouco de quase tudo no movimento “Não vai ter copa”, há demandas legítimas que nos obrigam a avaliar a porção de responsabilidade principalmente do governo federal nas crescentes demonstrações de descontamento. Faltou, falta, transparência onde sobra truculência, e a recente declaração da presidente Dilma Rousseff, de “quem quiser manifestar, pode! Mas quem quiser manifestar não pode prejudicar a Copa”, não ajuda a amenizar a sensação de que o custo social e político da Copa, já alto, não cessa de subir.

Impressão reforçada com a matéria publicada na mais recente edição da revista alemã Der Spiegel. O texto ressalta a maneira enviesada como muitas das decisões foram tomadas e a herança violenta do campeonato: os operários mortos na execução das obras, conduzidas com pressa irresponsável; a ação higienizadora da polícia e do exército que, à bala de borracha e gás lacrimogêneo, expulsam das ruas os manifestantes, principalmente nas cidades-sede; os milhares de cidadãos brasileiros removidos à força em função das obras. Nesse sentido, o grito “Não vai ter copa!” tem também uma conotação simbólica fundamental. Porque não se trata, óbvio, de barrar um evento mundial – ninguém, acho, é ingênuo a esse ponto –, mas de confrontar o discurso estatal, sempre monumental e laudatório; de escová-lo a contrapelo para fazer aparecer, além da superfície lisa das imagens oficiais, as muitas asperezas que ele encobre.

Por isso me parece equivocado atribuir um caráter exclusivamente conservador às movimentações contra a Copa. Que oportunistas estejam a erguer uma bandeira, preocupados em simplesmente desestabilizar o governo; que uma oposição à deriva esteja a fazer dela um uso eleitoreiro; que setores principalmente das camadas médias estejam a aproveitar o ensejo para reiterar seu conservadorismo tacanho e ressentido, nada disso retira sua legitimidade. Porque junto a estes há também aqueles que vislumbram, nos protestos, a possibilidade de ampliar nossa experiência democrática e, a exemplo do que ocorreu em junho do ano passado, usam as ruas e as redes para construir alternativas de participação e ocupação do espaço público que não exclusivamente as que passam pelos mecanismos institucionais da política. 

Quase sem querer, o “Não vai ter Copa” revela uma faceta fundamental de nossas três décadas de retomada democrática, depois de duas de ditadura. Uma sociedade não vai às ruas questionar sua democracia, sem ter a segurança de que ela está suficientemente consolidada em seus aspectos formais para ser criticada e tensionada. E somente uma geração felizmente desacostumada à ditadura e, por isso, mais atenta às fragilidades e contradições da democracia, bem como à necessidade de fazê-la avançar, é capaz de fazer isso. Porque ela sabe que a democracia não pode limitar-se às formalidades institucionais, ainda que elas sejam importantes: ela precisa deslizar para o cotidiano e ser um pressuposto fundamental de uma cultura política e de experiências de vida efetivamente pluralistas. E talvez seja esse o principal legado da Copa.

quarta-feira, 14 de maio de 2014

Casa Grande é Casa Grande, Senzala é Senzala


Ilustração da capa do livro Casa Grande e Senzala

POR JOSE ANTÓNIO BAÇO

Hoje proponho um exercício. E se muitas das ações dos últimos anos – aquelas que foram alvo de duras críticas – não tivessem sido levadas a efeito? Ou seja, vamos imaginar como seria o Brasil se alguém desse atenção aos críticos e simplesmente deixasse muitas ideias para trás. Então, vamos usar um pouquinho de imaginação e pensar num país feito à imagem dos seus críticos.

- Vamos acabar com o Bolsa Família.
- Não vai mais ter Copa do Mundo.
- Podemos abrir mão dos Jogos Olímpicos, que vão para Londres.
- Acabar com as cotas nas universidades é outra medida inadiável.
- Que tal tirar a Petrobras das mãos do governo e entregar aos privatistas?
- Vamos deixar para lá esse investimento no Porto de Mariel.
- Revogar a lei do Marco Civil é algo que se impõe.
- Também vamos fechar as universidades criadas nos últimos anos.

Parece que temos exemplos suficientes. O que isso significaria? Ora, apenas um regresso à “normalidade”. Pobres sem lugar na economia (não-consumidores) e a continuar na exclusão. Negros fora das universidades. Um país sem eventos capazes de projetar uma imagem internacional e de iniciar uma cultura de turismo. Como em outros casos, uma estratégica empresa petrolífera nas ávidas mãos dos privados. A ausência de estratégias para integração numa economia globalizada. A internet nas mãos dos grupos que mandam mais.

É esse o Brasil vocês imaginaram, leitor e leitora? Aposto que sim. Mas pensemos: não é o mesmo Brasil que tínhamos há 30, 40 ou 50 anos? Exato. Mas é para onde essa gente pretende voltar. Porque tem saudades daquele Brasil onde as coisas estavam todas no seu devido lugar. Ou seja, o que os conservadores desejam é uma volta à velha sociedade onde as posições eram cristalinas: Casa Grande é Casa Grande, Senzala é Senzala. Uma sociedade onde pobre era pobre e não tinha que ficar sonhando com geladeira. Para que geladeira se não tem comida?

O que querem os conservadores? Voltar a um país com universidades apenas para os meninos das boas famílias. Um país fascinado pelo tal primeiro mundo e que, como poucos podiam viajar, criava uma ideia de distinção social. Um país dependente, acorrentado a decisões tomadas por credores externos, e para o qual a expressão diplomacia econômica não existia. Um país que andava de joelhos perante as instâncias internacionais. Um país onde cada um cuida de si e inexiste a solidariedade para com o mais fraco: aquela arenga do "dar a vara..."

Enfim, o que os conservadores propõem é o passado. 

segunda-feira, 12 de maio de 2014

A sociedade dos operativos

POR  JORDI CASTAN



Temos nos acostumado a avançar de forma espasmódica, a saltos. Se fosse bom, alguns poderiam dizer que avançamos a orgasmos. Mas não são orgasmos, porque não há gozo, só frustração. Temos desenvolvido a cultura do operativo e feito dela um modelo de gestão, que em Joinville cunhou o neologismo “geston”. Quem é daqui entende.

Aumentaram os assaltos no centro da cidade? Durante uns dias se monta um operativo e com grande movimentação de policiais, automóveis com sirenes e giroflex ligadas, motocicletas para cima e para baixo em alta velocidade e, se for preciso, até a cavalaria é colocada nas ruas para criar a impressão que se esta fazendo alguma coisa. Resolve? Provavelmente não muito, mas a impressão que fica é a de que se esta fazendo alguma coisa.

As ruas estão esburacadas, há mais remendo que asfalto original e a maioria delas não tem mais de 10 anos de asfaltadas. Será que não deveríamos prestar mais atenção à qualidade do asfalto? Quanto tempo deveria durar um asfalto sem começar a se desintegrar? Melhor não fazer muitas perguntas. Não seja que acabemos averiguando que o asfalto, esse que não dura e que recebeu o apelido de “casca de ovo”, foi executado na gestão de um futuro aliado político. Nada que não possa ser resolvido com uma nova “Operação Tapa-Buracos”.

O mato toma conta de parques e praças? Pois chegou a hora de pedir ajuda aos apenados e roçar tudo. Em poucos dias fica tudo roçadinho e com cara de limpo, o que não vai durar muito. E na roçada também foram cortados os canteiros de flor e arrancada a metade dos arbustos. Não é importante o operativo: “apenados contra o mato” foi um sucesso e, no próximo mês, teremos uma nova edição do mesmo operativo em outra praça.

A escola tem goteiras, os banheiros estão em péssimo estado e precisando uma mão de pintura? Nada de fazer manutenção preventiva, nada de ir reparando aos poucos. O certo é contratar um grande programa de reforma de todas as escolas e assim poder lançar um pomposo operativo, seja o "Pacto por Santa Catarina", os famosos PAC ou o "1, 2, 3 ou 4 tanto faz". Vivemos a base de choques de gestão. E o paciente depois de levar tanto choque não está reagindo mais.

A ideia do operativo está enquistada na nossa cultura. Somos levados a acreditar nos discursos marqueteiros e fantasiosos dos políticos candidatos, que falam de milhares de escolas, de centenas de creches ou de dezenas de novas ambulâncias para melhorar a saúde. E não verificamos o quanto há de verdadeiro.  Abominamos a manutenção preventiva, o cuidado diário, o fazer bem feito sempre e substituímos por esses pirotécnicos e custosos operativos que custam fortunas e são pouco eficazes. E nos levam a acreditar que uma boa manutenção que dizer que quando algo estraga é trocado rapidamente. 

Não ocorre a ninguém e que a boa manutenção é aquela que faz com que as ruas se mantenham sem buracos, seguras, os canteiros floridos, as lâmpadas acessas, as faixas de pedestres pintadas e os telhados das escolas, os PAs e dos demais edifícios públicos sem goteiras e os corredores livres de baldes a cada trovoada?