segunda-feira, 13 de outubro de 2014
Violência, postes e cachorros
O Brasil é hoje um dos países mais violentos do mundo. Entre as 50 cidades mais violentas do mundo, quase duas dezenas são brasileiras. Aliás, praticamente todas se encontram no hemisfério sul e em países em desenvolvimento. Assusta o nível de violência a que a sociedade brasileira tem se habituado.
É difícil acreditar que este aumento da violência não tenha uma resposta firme da sociedade. Há uma insensibilidade e uma aceitação desta situação, que ganha corpo a ideia que a violência é irreversível e está fora de controle e por isso o Estado não tem condições ou meios de enfrentá-la.
É difícil acreditar que este aumento da violência não tenha uma resposta firme da sociedade. Há uma insensibilidade e uma aceitação desta situação, que ganha corpo a ideia que a violência é irreversível e está fora de controle e por isso o Estado não tem condições ou meios de enfrentá-la.
Não há dia em que a imprensa não noticie algum homicídio, assalto, roubo ou a destruição de patrimônio público. Há uma banalização da violência e isso faz com que a sociedade deixe de reagir e acabe anestesiada frente à brutalidade quotidiana. Como resultado, deixamos de acreditar nas polícias e na Justiça e já nem denunciamos crimes menores Um fato que, entre outras coisas, distorce as estatísticas e falseia dados e indicadores, criando a ilusão de normalidade... até que alguém conhecido seja a próxima vítima.
O Brasil tem mais homicídios por arma de fogo que países como os Estados Unidos, aonde a venda e possessão de armas de fogo é livre. O Brasil tem mais mortos por violência que a maioria de países com conflitos armados declarados, incluindo estados em guerra aberta e isso em quanto o país enfrenta uma situação de declarada "normalidade".
Saúde, educação e segurança deveriam ser pauta obrigatória em qualquer processo eleitoral. Mas no Brasil estes temas ficam fora de um debate sério. A corrupção, o mau uso do dinheiro público e os escândalos que envolvem figuras públicas, em todos os níveis da administração, fazem que o combate a insegurança e à violência deixem de ser prioridade. Pior ainda. Recentemente foi noticia o caso um aposentado preso por disparar para se proteger, dentro da sua residencia, da ação de um criminoso. Essa história é tão comum no Brasil quanto poste mijando no cachorro.
sexta-feira, 10 de outubro de 2014
BRANCO
POR CHARLES HENRIQUE VOOS
No primeiro turno destas eleições, conforme manifesto feito aqui no Chuva Ácida, votei na candidata do PSOL. Os motivos estão todos expostos naquele texto e pretendo segui-los. Sendo assim, creio que seja o momento de dizer o porquê do meu voto em branco no próximo dia 26.
O voto em Luciana no primeiro turno foi também um voto de protesto contra os três grandes da eleição - Dilma, Marina e Aécio, os quais monopolizaram a maioria dos debates nos últimos meses. São, também, candidatos que não representam uma "nova política". Independente de quem chegasse ao segundo turno, daria no mesmo.
Com a ida de Dilma e Aécio para o segundo turno, chegou a hora de tomar uma posição coerente com tudo aquilo que defendo. É evidente que o voto no PSDB de Aécio representa um retrocesso, não somente pelas lembranças de Fernando Henrique Cardoso, mas também por tudo o que este partido vem fazendo na história recente do Brasil em São Paulo, Minas Gerais, no Congresso Nacional e em Joinville, principalmente.
Votar no PSDB de Aécio é concordar com o mensalão mineiro, com a falta de água em SP, com o cartel do metrô, com a intransigência da polícia nas áreas de ocupações irregulares, e todo o conservadorismo que marca os parlamentares tucanos em Brasília. Não consigo concordar com isto e nem com a filosofia dos seus aliados: Bolsonaro, Malafaia, Marina, e tantos outros. Puxando para a questão urbana, tema no qual me dedico a anos, votar em Aécio representa aceitar todo o esquema montado pelas grandes empreiteiras em prol dos tucanos nos últimos anos. É sabido sim que, quanto mais uma empreiteira injeta dinheiro em campanhas e em diretórios partidários, mais as cidades são formatadas em prol de interesses empresariais.
E em Joinville tivemos secretário da saúde do PSDB preso por corrupção.
Somado a tudo isto, não podemos esquecer os 27 motivos para não votar em Aécio, link que faz sucesso na internet.
Sobre a Dilma, preciso reconhecer todos os seus avanços no combate à desigualdade, combate à fome e à miséria. O Brasil tem políticas públicas reconhecidas mundialmente pela ONU e por entidades reconhecidas no estudo da desigualdade, como a Oxfam. Seria burrice de qualquer cidadão brasileiro não reconhecer este avanço. Por outro lado, e voltando à questão urbana brasileira, o governo Dilma representa o mesmo retrocesso que o seu oponente tucano.
Os recentes incentivos às indústrias automobilísticas rasgam todos os preceitos estabelecidos no Estatuto das Cidades, juntamente com o que mais moderno vem se fazendo nos países desenvolvidos: a abolição do automóvel e o incentivo aos modos coletivos e/ou aos modos não-motorizados. Para dar suporte ao projeto da Copa do Mundo, o governo petista se aliou às grandes empreiteiras, diretamente interessadas na construção de novos estádios e suas respectivas obras de apoio (avenidas, pontes, infraestrutura para o transporte coletivo, etc). Ao mesmo passo que isso acontecia, milhares de famílias foram despejadas de suas casas sem o devido tratamento (segundo a BBC Brasil, mais de 250 mil pessoas foram afetadas).
Por manter uma linha de coerência, creio que o ideal para quem defende a questão urbana brasileira seja, sim, o voto em branco. Antes que o leitor mais desavisado possa pensar que esta posição caminha rumo a uma neutralidade, antecipo o engano: é um posicionamento claro de que nem Dilma e nem Aécio me representam. Creio, por fim, que os dois também não representem as verdadeiras necessidades da política urbana brasileira. Independente de quem ganhar, as cidades serão as principais prejudicadas e, em consequência, os seus moradores.
quinta-feira, 9 de outubro de 2014
Sul e o Norte
POR CAROLINA PETERS
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O ódio é, acima de tudo, burro. |
-- Mas você não é daqui, né?
Eu respondia que não. E como o olhar insistia em mais informações, dizia que vinha de Santa Catarina. Floripa? Não, Joinville. Ah, mas você não fala como gaúcho.. Claro que não.
Depois da mostra de ignorância geográfica, vinha uma enxurrada de elogios às belas praias, às gentes bonitas e educadas, a qualidade de vida. Ao pedacinho de Europa, surrada e maltrapilha, mas Europa, que cultivamos como se existisse no sul do país. Mas por que razão? Por que deixar Santa Catarina?
O bom de São Paulo é que as placas são várias e não sabem ainda falar.
Por vezes, um mesmo que elogiava o meu estado vinha confessar que os migrantes do Norte eram a grande mazela de São Paulo. Aprendi que em SP, ser nordestino é xingamento, daqueles mais variados. “Baiano”, por exemplo, pode querer dizer tanto cafona quanto sujo ou mal educado. A xenofobia nunca é arbitrária ou incondicional. Alguns de fora valem menos, outros, valem mais.
Na minha primeira semana em Fortaleza, folheando o jornal, me deparo com o comentário de uma leitora sobre a sondagem eleitoral no estado do Ceará, que dava à presidenta Dilma ampla vantagem sobre Aécio e Campos - era maio: “Depois há quem reclame de ouvir dos habitantes do Sul e Sudeste que nós, nordestinos, não sabemos votar.”
Gosto muito de uma gravura feita pelo pintor uruguaio Joaquín Torres García em 1943, um mapa invertido da América do Sul. “El Sur es el Norte” é um manifesto de independência artística das escolas europeias e uma afirmação de humanidade dos habitantes do sul do globo. Meu Norte é o Sul: Uma noção que me orienta, um nacionalismo que é libertador, que busca romper com os padrões hegemônicos e produzir seus próprios paradigmas. Que não é xenófobo ou excludente. O oposto do sentimento separatista com o qual convivi em Santa Catarina e São Paulo.
Pensei em um livro que li no início desse ano, relatos de uma jornalista portuguesa que cobriu os dias que antecederam a queda do ditador Hosni Mubarak no Egito em janeiro de 2011. Lá pelas tantas, ao comentar o tratamento que a imprensa internacional dispensava ao levante popular e os posicionamentos de diversos chefes de Estado, ela escreve “para o ocidente, a vida dos outros povos pode sempre esperar”.
O Nordeste cresceu nos governos do PT. Os programas de distribuição de renda movimentaram a economia em pequenas e grandes cidades; o aumento do salário aumento o poder de compra. A economia nordestina cresce mais que a média do Brasil. O nordestino que reelege Dilma o faz por convicção e reflexão, não por ignorância.
O ódio aos homossexuais, aos negros, a misoginia, marcaram o primeiro turno nos debates. Proferidos de maneira explícita por dois candidatos menores que não valem citação, encheram a bola de Aécio, para quem fizeram linha auxiliar, colaborando para levar o tucano ao segundo turno. Apesar do desempenho pífio presidencial, o ódio mais caricato mostrou força nas disputas proporcionais e na disputa pela vaga do senado nos estados.
Na segunda volta, toma conta o ódio de classe que separa o Norte e Nordeste explorados do Sul e Sudeste beneficiários.
Este, ao menos, tem sofrido consecutivas derrotas. Pesquisas recentes e conversas entreouvidas no transporte público indicam que a percepção de que a pobreza é resultado da falta de oportunidade e da desigualdade social, não da preguiça e da vadiagem, como se dizia, tem crescido. Espero que a tendência siga.
Depois da mostra de ignorância geográfica, vinha uma enxurrada de elogios às belas praias, às gentes bonitas e educadas, a qualidade de vida. Ao pedacinho de Europa, surrada e maltrapilha, mas Europa, que cultivamos como se existisse no sul do país. Mas por que razão? Por que deixar Santa Catarina?
O bom de São Paulo é que as placas são várias e não sabem ainda falar.
Por vezes, um mesmo que elogiava o meu estado vinha confessar que os migrantes do Norte eram a grande mazela de São Paulo. Aprendi que em SP, ser nordestino é xingamento, daqueles mais variados. “Baiano”, por exemplo, pode querer dizer tanto cafona quanto sujo ou mal educado. A xenofobia nunca é arbitrária ou incondicional. Alguns de fora valem menos, outros, valem mais.
Na minha primeira semana em Fortaleza, folheando o jornal, me deparo com o comentário de uma leitora sobre a sondagem eleitoral no estado do Ceará, que dava à presidenta Dilma ampla vantagem sobre Aécio e Campos - era maio: “Depois há quem reclame de ouvir dos habitantes do Sul e Sudeste que nós, nordestinos, não sabemos votar.”
Gosto muito de uma gravura feita pelo pintor uruguaio Joaquín Torres García em 1943, um mapa invertido da América do Sul. “El Sur es el Norte” é um manifesto de independência artística das escolas europeias e uma afirmação de humanidade dos habitantes do sul do globo. Meu Norte é o Sul: Uma noção que me orienta, um nacionalismo que é libertador, que busca romper com os padrões hegemônicos e produzir seus próprios paradigmas. Que não é xenófobo ou excludente. O oposto do sentimento separatista com o qual convivi em Santa Catarina e São Paulo.
Pensei em um livro que li no início desse ano, relatos de uma jornalista portuguesa que cobriu os dias que antecederam a queda do ditador Hosni Mubarak no Egito em janeiro de 2011. Lá pelas tantas, ao comentar o tratamento que a imprensa internacional dispensava ao levante popular e os posicionamentos de diversos chefes de Estado, ela escreve “para o ocidente, a vida dos outros povos pode sempre esperar”.
O Nordeste cresceu nos governos do PT. Os programas de distribuição de renda movimentaram a economia em pequenas e grandes cidades; o aumento do salário aumento o poder de compra. A economia nordestina cresce mais que a média do Brasil. O nordestino que reelege Dilma o faz por convicção e reflexão, não por ignorância.
O ódio aos homossexuais, aos negros, a misoginia, marcaram o primeiro turno nos debates. Proferidos de maneira explícita por dois candidatos menores que não valem citação, encheram a bola de Aécio, para quem fizeram linha auxiliar, colaborando para levar o tucano ao segundo turno. Apesar do desempenho pífio presidencial, o ódio mais caricato mostrou força nas disputas proporcionais e na disputa pela vaga do senado nos estados.
Na segunda volta, toma conta o ódio de classe que separa o Norte e Nordeste explorados do Sul e Sudeste beneficiários.
Este, ao menos, tem sofrido consecutivas derrotas. Pesquisas recentes e conversas entreouvidas no transporte público indicam que a percepção de que a pobreza é resultado da falta de oportunidade e da desigualdade social, não da preguiça e da vadiagem, como se dizia, tem crescido. Espero que a tendência siga.
quarta-feira, 8 de outubro de 2014
Um debate polarizado, de novo
POR CLÓVIS GRUNER
Encerrado
o primeiro turno, poucas surpresas ‒ a
vitória de Aécio Neves sobre Marina Silva é uma “meia surpresa” ‒ e uma certeza: a política brasileira tem dificuldade
de se desvencilhar da polarização PT x PSDB. Desde o retorno das eleições
diretas para presidente, em 1989, já foram sete campanhas; petistas e tucanos
se enfrentaram em seis delas, com a vitória do PSDB em duas (com FHC em 1994 e
1998, no primeiro turno) e do PT em outras três (2002 e 2006 com Lula; e 2010
com Dilma, todas no segundo turno). Fora do governo há mais de uma década,
tucanos e aliados tem sede de voltar a ele e farão literalmente qualquer coisa
para isso. Os petistas, por sua vez, sabem que enfrentam seu pleito mais
difícil, e que pela primeira vez desde a vitória de Lula há o risco real de
saírem derrotados no dia 26 de outubro.
Não
será uma disputa fácil, portanto. E embora seja uma espécie de mantra afirmar
que o segundo turno é uma “nova eleição”, penso que algumas possibilidades
podem ser aventadas com base nos resultados do primeiro. A começar pelo destino
dos votos de Marina Silva. Desde o
começo da semana, a candidata sinalizava o apoio à candidatura de Aécio Neves, confirmado ontem, no mesmo dia em que Aécio recebeu também o apoio do PV de Eduardo Jorge – o PSOL de Luciana Genro declinou de apoiar um dos candidatos, embora desaconselhe o voto no tucano. De todos, certamente o de Marina foi o golpe mais duro para o PT, que provavelmente esperava uma posição neutra,
a repetir a posição tomada em 2010. Por outro lado, o apoio a Aécio Neves, se confirmado, pode repercutir a médio prazo nas pretensões de Marina, que corre o
risco de perder definitivamente a credibilidade adquirida entre aqueles setores
mais à esquerda que, descontentes com os seguidos governos do petistas, depositaram nela alguma expectativa
de renovação.
Não
acredito, como parte da militância marinista, que sua derrota se deva aos ataques desferidos contra
ela pela campanha de Dilma. Primeiro,
porque Marina não foi exposta nestes dois meses de campanha mais do que o PT
nos últimos 12 anos e de Dilma nos últimos quatro. Ambos sobreviveram, e com chances
reais de emplacar o quarto mandato. Seu discurso careceu de solidez
e pecou por excesso de ambiguidade. Se é verdade que Marina foi exposta pelo
programa e pela militância petistas, sua derrocada se deveu também e, penso,
principalmente, ao fato dela mesmo ter se exposto, revelando suas muitas contradições.
E isso, me parece, contribuiu mais para a perda de votos que o confronto com a
candidata petista.
Junto aos eleitores mais à esquerda, Marina perdeu votos em
função de seus flertes com as políticas econômicas neoliberais ou sua
capitulação frente às pressões de setores conservadores; à direita, porque
tentou aproximar sua candidatura justamente daquelas políticas que estes
setores rejeitam, como ficou claro no último debate, quando insinuou que seu
programa era mais parecido com o de Luciana Genro do que com o dos tucanos. Pretendendo
não ser de esquerda, mas também não de direita, defendendo um princípio vago de
governar com “os bons” de todos os lados e matizes, Marina não só perdeu votos
ao ponto de nem figurar no segundo turno. Mas turbinou a campanha de seus
adversários, principalmente a de Aécio Neves, para onde parece ter migrado boa
parte deles.
UMA CAMPANHA DE MEDO E ÓDIO –
A meu ver, o pior de Marina Silva ter ficado de fora foi, justamente, o retorno
à polarização PT x PSDB que a candidata, por um breve momento, chegou perto de
dissolver. Particularmente, eu a preferia em uma disputa com Dilma Rousseff, mas
certamente as lideranças e os marqueteiros petistas não concordariam comigo. Tanto
que investiram parte de seu tempo e energia para forçar um segundo turno com
Aécio e os tucanos, e não é difícil entender as razões. Sob certa perspectiva, Marina representava um risco maior à
reeleição de Dilma, inclusive porque suas trajetórias e perfis são, em alguns
aspectos, bastante próximos, o que dificultaria o discurso polarizado.
A polarização entre petistas e tucanos
interessa ao PT, que poderá afrontar seu adversário ao longo dos próximos dias recorrendo
a um discurso baseado principalmente no medo de um passado que muitos eleitores
não querem de volta e, contra o qual, o PT se apresenta como o único antídoto. Com
Marina, este discurso era mais difícil, porque seu passado e de sua legenda
provisória, o PSB, incluía uma passagem pelo governo petista. Tendo ela como
adversária, a candidatura petista precisaria deslocar o temor do passado para o
futuro. Mas este, como sabemos, é um horizonte de expectativas e pode ser tanto lugar de receio como de
esperança. Será preciso esperar o resultado do segundo turno para saber se os
estrategistas de campanha acertaram. Tenho dúvidas.
Particularmente, penso que o PT terá de
investir mais na tentativa de mostrar aos eleitores que tem capacidade de se reinventar,
mesmo depois de 12 anos de governo. E isso me parece fundamental por pelo menos
duas razões. Primeiro, porque a quantidade de votos dados aos candidatos de
oposição, incluindo os chamados nanicos, sinaliza um claro desejo de renovação.
Cabe à candidatura petista mostrar que é capaz de fazê-lo, preservando as
conquistas que apresentou ao longo do primeiro turno como seus principais
trunfos políticos. Além disso, a quantidade expressiva de votos nulos e
brancos, somada a um alto índice de abstenção, deixa claro um outro tipo de
descontentamento, não apenas com este governo, mas com o debate político tal
como posto hoje, polarizado e pouco criativo. Conquistar parte deste eleitorado
é tarefa ainda mais difícil.
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